Discurso durante a 255ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Homenagem pelo transcurso, em 20 de novembro, do Dia da Consciência Negra. Comemoração pela sanção, pelo Presidente da República, na forma da Lei 12.073, do Projeto de Lei do Senado 640, de 2007, de autoria de S.Exa. que "institui a data de 10 de dezembro como o Dia da Inclusão Social".

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Homenagem pelo transcurso, em 20 de novembro, do Dia da Consciência Negra. Comemoração pela sanção, pelo Presidente da República, na forma da Lei 12.073, do Projeto de Lei do Senado 640, de 2007, de autoria de S.Exa. que "institui a data de 10 de dezembro como o Dia da Inclusão Social".
Publicação
Publicação no DSF de 17/12/2009 - Página 72565
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, DIA NACIONAL, CONSCIENTIZAÇÃO, NEGRO, OCORRENCIA, PROGRAMA, FESTA, ENCONTRO, MUNICIPIOS, HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, ZUMBI, VULTO HISTORICO, IMPORTANCIA, RESGATE, MEMORIA NACIONAL, LUTA, COMBATE, ESCRAVATURA, LIDERANÇA, REVOLTA, RESISTENCIA, QUILOMBOS, REGISTRO, LEGISLAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, INCLUSÃO, DISCIPLINA ESCOLAR, ENSINO, HISTORIA, CULTURA AFRO-BRASILEIRA.
  • NECESSIDADE, DEBATE, CONTINUAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, BARREIRA (CE), OBSTACULO, INCLUSÃO, DIFERENÇA, TRATAMENTO, MERCADO DE TRABALHO, EDUCAÇÃO, POLICIA, APRESENTAÇÃO, DADOS, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE).
  • SAUDAÇÃO, SANÇÃO PRESIDENCIAL, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, DIA NACIONAL, INCLUSÃO, NATUREZA SOCIAL, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, DATA, ANIVERSARIO, DECLARAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DIREITOS HUMANOS, CONCLAMAÇÃO, LUTA, RECONHECIMENTO, DIREITOS.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, INCLUSÃO, ALIMENTAÇÃO, DIREITO CONSTITUCIONAL, IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, COMBATE, FOME.
  • REGISTRO, SANÇÃO PRESIDENCIAL, LEGISLAÇÃO, REESTRUTURAÇÃO, DEFENSORIA PUBLICA, AMPLIAÇÃO, ASSISTENCIA JURIDICA, POPULAÇÃO CARENTE, GARANTIA, DIREITOS, INCLUSÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB -SE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o Dia da Consciência Negra será celebrado nesta sexta-feira, dia 20 de novembro. A comemoração acontece desde 1960 em várias partes do território nacional e é acompanhada de festas populares, inúmeras confraternizações, encontros culturais, palestras e manifestações de cunho político e religioso. A cada ano, o ato ganha mais força e mais adeptos. Amanhã, o evento deverá ser registrado em cerca de 300 Municípios brasileiros.

            A data tem dois grandes significados. Em primeiro lugar, ela relembra o dia da morte do maior herói negro do País, Zumbi de Palmares, em 1695. Em segundo lugar, ela conclama para uma reflexão sobre a situação do negro na sociedade brasileira. Assim, o Dia da Consciência Negra procura ser uma data de lembrança da resistência do negro à escravidão e de esperança em relação ao fim de todos os preconceitos e do racismo que ainda são muito fortes contra os negros em nosso País.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de continuar este pronunciamento falando um pouco da vida e da trajetória do maior resistente negro da História do Brasil, Zumbi, o grande líder da raça, o maior exemplo de força contra a opressão e contra a escravidão. Prova disso é que o seu nome continua sendo uma legenda e uma inspiração de luta e de afirmação para todos os negros brasileiros.

            Pesquisadores e estudiosos estimam que Zumbi nasceu em 1655 e era descendente de guerreiros angolanos. Ainda garoto, em um povoado do Quilombo, foi capturado por soldados e entregue a um Padre chamado Antonio Melo, da comunidade de Porto Calvo, que cuidou de sua criação e educação. Foi batizado com o nome de Francisco e aos 12 anos, já tinha bom conhecimento de português e de latim.

            Em 1670, com quinze anos, fugiu da Casa do Padre e foi para o Quilombo de Palmares, o mais famoso refúgio de brancos pobres, índios, mestiços e negros fugitivos das plantações do colonizador. Palmares ficava situado na Serra da Barriga, no Sul da Capitania de Pernambuco, hoje Estado de Alagoas. Lá, participou de inúmeras revoltas e em pouco tempo se tornou o maior líder contra a escravidão. Em africano, o nome Zumbi significa a força do espírito.

            O Quilombo de Palmares resistiu contra a escravidão durante quase cem anos, entre 1600 e 1695. Em seus limites viviam mais de 20 mil pessoas que garantiam a sobrevivência com a plantação de frutas, legumes, milho, mandioca, feijão, cana e batatas. Nos engenhos e nas senzalas, o Quilombo de Palmares era visto como a Terra Prometida, um lugar de salvação, uma Fortaleza bem protegida pela coragem e pelo gênio militar do seu grande líder, Zumbi. Durante anos, Zumbi e seus guerreiros resistiram contra inúmeras expedições militares e as derrotaram em vários combates sangrentos.

            Mas, em 1694, o domínio colonial elegeu como uma questão de honra a destruição total do Quilombo de Palmares. Para cumprir a missão foi encarregado o bandeirante Domingos Jorge Velho, aventureiro, desbravador de terras e conhecido exterminador de índios. No comando de uma legião de 9 mil homens, fortemente armados com mosquetes e canhões, Domingos Jorge Velho atacou e tomou o povoado de Macaco, principal aglomeração de Palmares. A campanha prosseguiu e no dia 20 de novembro de 1695, vítima da traição de Antonio Soares, um de seus homens de confiança, Zumbi foi morto por balas e punhaladas. Sua cabeça foi decepada e levada para Recife onde ficou exposta à execração pública.

            Nobres Senadoras e Senadores, 314 anos após o trágico fim de Zumbi de Palmares, sua memória continua viva. Como disse há pouco, a comemoração do Dia da Consciência Negra coincide com o dia de sua morte. Em sua homenagem, a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, incluiu o dia 20 de novembro no calendário escolar, data que ficou definida como o Dia Nacional da Consciência Negra. O mesmo diploma legal tornou obrigatório nas escolas o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira. Sem dúvida alguma, foi um grande passo contra a discriminação, a inclusão nas salas de aula de temas que retratam a história da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, o ensinamento da cultura negra e o negro na formação de nossa sociedade. Até então, só os brancos faziam parte da galeria dos grandes heróis da História do Brasil.

            Apesar das conquistas dos últimos anos, a luta dos negros brasileiros contra o racismo, contra o preconceito e contra a discriminação ainda está muito longe da vitória. É verdade que os tempos mudaram, mas é preciso não esquecer que com eles mudaram também as formas de dominação, de exploração e de racismo.

            Na época da escravidão, a violência contra os negros era física e direta. Hoje, ela é Estatal, premeditada, silenciosa, sutil, traiçoeira, maldosa e eficiente porque não usa os castigos brutais para se impor como usavam os Senhores de antigamente. Nos dias atuais, as barreiras políticas, sociais e econômicas que existem contra os negros são quase intransponíveis, mas apenas poucos conseguem vê-las, o que torna a luta para derrubá-las muito mais difícil. Em sã consciência, nenhum negro pode processar o Estado sob a alegação de que é visto na rua com desconfiança, que é vítima de olhares curiosos quando tem um relacionamento amoroso com um branco, é abordado pela polícia sem motivo aparente, não tem uma casa para morar, um emprego decente, um salário igual ao do branco, assistência de saúde correta, os filhos na escola, enfim, um lugar garantido no futuro como tem a maioria dos brancos.

            No final de 2005, segundo Relatório apresentado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 64% da população de baixa renda no Brasil era composta por pessoas negras, aproximadamente, 25 milhões de indivíduos. Quase 80% dos jovens assassinados entre 16 e 24 anos, eram negros. Em termos salariais, uma mulher negra ganhava quatro vezes menos do que uma branca para fazer o mesmo trabalho.

            Por sua vez, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em levantamento realizado na mesma época, revelou que apenas 36% dos jovens negros entre 15 e 17 anos completaram o Ensino Médio. Já entre os não-negros, o percentual foi de 60%. No Ensino Superior, o Instituto observou que, enquanto 57,2 dos não-negros entraram na Universidade, apenas 18,4% dos negros conseguiram uma vaga.

            Para finalizar, de acordo com o Movimento Negro Unificado, a realidade do povo negro no Brasil é cruel. Mais de 10 milhões de mulheres negras já foram esterilizadas e como se não bastasse, a violência policial mata jovens negros em todo o País, o sistema judiciário quase sempre impõe pesadas penas aos negros e o sistema econômico não lhes dá acesso.

            Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, lamentavelmente, esses são alguns aspectos que ilustram a real situação vivida pelos negros em nosso País. Amanhã teremos mais uma oportunidade para denunciar essas injustiças, exigir das autoridades os direitos que são devidos aos negros e repudiar a humilhação a que são submetidos.

            Como segundo assunto,Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quero dizer que o Projeto de Lei do Senado nº 640, de 2007, que tive a iniciativa de apresentar e a satisfação de ver aprovado pelos nobres Senadores e Deputados Federais, foi incorporado à ordem jurídica nacional. No último dia 29 de outubro, o Presidente da República o sancionou na forma da Lei nº 12.073, que “institui a data de 10 de dezembro como o Dia da Inclusão Social”.

            Nada mais relevante para a construção de uma sociedade democrática do que a noção de que todos devem usufruir de seus direitos e partilhar dos bens, materiais e imateriais, que foram obtidos pelo esforço coletivo. A história de nosso País demonstra, no entanto, que os bens e os direitos nunca foram distribuídos de forma justa e igualitária, restando vastos contingentes da população excluídos do seu usufruto.

            Obtivemos alguns avanços significativos nas décadas seguintes à redemocratização, consagrada pela Constituição de 1988. Não há como negar que o Brasil continua sendo um país excludente, quer se considerem os direitos individuais, quer os direitos sociais.

            Por isso, Sr. Presidente, julgamos importante eleger a data em que foi promulgada, pela Assembléia das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos - o dia 10 de dezembro de 1948 - para instituir um dia de reflexão, de alerta e de luta pela Inclusão Social de todas as pessoas que compõem o nosso País.

            Nessa mesma linha de atuação venho empenhando meu mandato para que alguns anseios sociais se tornem realidade. Nesse sentido, encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados a PEC 47/2003, de minha autoria que inclui o direito à alimentação no rol do artigo 6º da Constituição Federal. E o faço com a consciência de que é necessário tratar a questão da fome com a gravidade que ela merece.

            É sabido que as raízes da exclusão social e da fome estão encravadas na história social do nosso país, ainda que existam avanços como a Lei Orgânica da Assistência Social e a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional. Também vejo como avanço a iniciativa do Presidente Lula com a criação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome em 2004.

            Mas é preciso ir além. A nossa política social tem que ser permanente, tem que ser cada vez mais vigorosa, tem que construir nesse país um verdadeiro Estado do Bem-Estar Social, sólido e com abrangência nacional, que abarque desde cada capital até o último município do alto sertão.

            Também merece registro nosso empenho, como relator, pela aprovação do PLC nº 137/2009, pelo Senado Federal e sancionado pelo Presidente da República, o qual cria uma nova estrutura da Defensoria Pública mais moderna e participativa, que vai permitir o cumprimento, efetivamente, de seu papel constitucional de prestar assistência jurídica integral e gratuita às pessoas carentes, pessoas que, de outra forma, não teriam acesso à justiça, contribuindo, assim, para a efetivação do princípio constitucional da igualdade e da não-discriminação.

            Há também a previsão da ampla promoção e defesa dos direitos fundamentais - individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais - das pessoas carentes, notadamente de grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado, como as crianças e adolescentes, as pessoas com deficiência e as mulheres vítimas de violência doméstica.

            Não há qualquer justificativa válida para que continuemos a excluir diversos segmentos sociais do acesso pleno aos benefícios conquistados pela sociedade brasileira, tanto no plano jurídico como nos planos econômico, social e cultural.

            O Dia da Inclusão Social vem nos alertar para a urgência do reconhecimento, real e efetivo, dos direitos das pessoas portadoras de necessidades especiais; das pessoas exploradas, principalmente quando pobres ou miseráveis; dos discriminados em razão da origem étnica, do sexo, da orientação sexual ou da idade.

            A melhor maneira de compreender a inclusão social é buscar promovê-la, no sentido prático e efetivo; é fazer da inclusão social a vida real das pessoas, das famílias e comunidades.

            O segundo assunto que trago à tribuna, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diz respeito ao conjunto de tradições, lendas, crenças e costumes populares que compõem o folclore de cada região engloba as mais autênticas manifestações da cultura popular. É nesse conjunto de saberes e expressões artísticas, transmitido de geração para geração, que melhor se revela, que melhor podemos perceber a alma de um povo, o sentimento que ele tem de sua história, os ideais que ele projeta para seu futuro.

            Assim como no restante da Amazônia, o folclore do Amapá apresenta extraordinária vitalidade. Resultado de influências diversas - indígenas, africanas e européias -, a cultura amapaense combina, nas mesmas manifestações, traços sagrados, que denotam a profunda religiosidade do povo local, e traços profanos, por meio dos quais se expressa seu espírito festivo, alegre, amante dos prazeres da vida.

            Algumas das mais vigorosas expressões da cultura do Amapá são compartilhadas com outros Estados da região Norte do Brasil, a exemplo do Boi-Bumbá e do Círio de Nazaré. Outras, contudo, possuem feição nitidamente local.

            A mais autêntica manifestação folclórica do Amapá é, indiscutivelmente, a festa do Marabaixo, uma homenagem à Santíssima Trindade e ao Divino Espírito Santo que foi criada pelos escravos negros trazidos para Macapá, no século XVIII, para construir a Fortaleza de São José. Em várias ocasiões ao longo da festa, que começa no Domingo de Páscoa e tem duração de muitos meses, as pessoas cantam e dançam o marabaixo, ao som de dois tambores, solista e coro. Com efeito, essa dança típica se tornou tão conhecida no Estado que virou nome de bairro e de sorvete em Macapá.

            Essa tradição foi passada pelos escravos aos seus descendentes que vivem na Vila de Curiaú, a 8 km de Macapá, e também àqueles que moram na Vila de Mazagão Velho, no Município de Mazagão, e na cidade de Macapá, onde a tradição é especialmente forte nos bairros do Laguinho e Santa Rita. A festa do Marabaixo inclui missas e ladainhas, mas tem também seu lado profano, expresso no consumo da gengibirra, bebida feita de gengibre ralado, cachaça e açúcar, usada para garantir a energia dos dançarinos.

            Apenas na Capital amapaense, porém, o Marabaixo sobrevive com grande parte de suas características originais. Em Mazagão Velho, por exemplo, ele desapareceu completamente. Na Vila de Curiaú, o marabaixo ainda é dançado por ocasião da festa em louvor à Santa Maria, no fim de maio. A transformação que a festa sofreu ao longo do tempo, deve-se, de acordo com os estudiosos, a variáveis como a urbanização, a modernização e a migração rural.

            Embora a festa do Marabaixo comece no Domingo de Páscoa, com uma missa na Igreja de São Benedito, no bairro do Laguinho, seu ponto alto acontece no começo de novembro, com o Encontro dos Tambores, em Macapá. Nessa oportunidade, as pessoas cantam e dançam o marabaixo durante quatro dias.

            Outros momentos importantes da festa são a “Levantação do Mastro” do Divino Espírito Santo, na “Quinta-feira da Hora”, a “Levantação do Mastro” da Santíssima Trindade, na “Segunda-feira do Mastro”, e o “Domingo do Senhor”, o último dia do ciclo anual do Marabaixo. Nesse dia, os participantes dançam até às 18 horas, quando param para fazer a “Derrubada do Mastro” - na verdade, os dois mastros -, e, em seguida, recomeçam a dança, que se estende até tarde da noite.

            O Encontro dos Tambores reúne os grupos remanescentes de populações negras, com finalidade de reforçar as raízes e identidades, unindo diversas linguagens musicais. O evento também coloca em discussão os problemas das diversas comunidades negras. Como a cultura amapaense é calcada principalmente nos costumes negros, o Encontro dos Tambores representa uma grande oportunidade para assistir às apresentações dos mais diversos segmentos da arte afro-brasileira: dança, pintura, escultura e música, incluindo o batuque, o candomblé, o sahirê, o samba, o gingado da capoeira e o quase extinto zimba.

            A cultura do Amapá, contudo, Senhor Presidente, inclui muitas outras manifestações de extraordinária riqueza, além do Marabaixo. O Boi-Bumbá, por exemplo, tradição muito comum no Norte do Brasil, tem considerável destaque no meu Estado. Também no Amapá, as pessoas vestem fantasias e dançam para contar a história do boi que ressuscita graças à intervenção do pajé. Nosso Carnaval é muito animado, e inclui eventos peculiares e já tradicionais, como o “Futebol à Fantasia”, disputado na Segunda-feira Gorda, e a saída da “Banda”, um dos maiores blocos de sujos do Norte, na Terça-feira Gorda.

            O mês de junho é um dos mais movimentados em Macapá, sendo todo marcado por apresentações de grupos folclóricos, quadrilhas, bois-bumbás, encenados nas diversas praças públicas, bairros da cidade e, principalmente, no Sambódromo, onde é promovido o mais disputado concurso de quadrilhas.

            O Círio de Nazaré, que os brasileiros de outras regiões associam sempre a Belém do Pará, é realizado em Macapá desde 1934, quando a cidade ainda pertencia ao Estado do Pará. Em 6 de novembro daquele ano, graças ao entusiasmo do Major Eliezer Levy, Prefeito Municipal, realizou-se o primeiro Círio de Nazaré em Macapá, o qual, apesar das dificuldades da época, revestiu-se de grande beleza. São já, portanto, 75 anos consecutivos de realização dessa bela festa na Capital do meu Estado.

            Lá em Macapá, o Círio é realizado simultaneamente ao de Belém do Pará, sempre no segundo domingo de outubro, e a forma de realização da procissão macapaense também é fiel ao acontecimento de Belém. O Círio de Macapá tem início sempre num sábado, com uma carreata seguindo a imagem da Santa por diversos bairros da cidade. Em seguida, há missa e traslado da imagem da Igreja Jesus de Nazaré para a de Nossa Senhora de Fátima, onde, no domingo, o dia mais esperado, outra missa dá início à festividade e precede a procissão, que arrasta pelas ruas de Macapá uma verdadeira corrente humana.

            O Círio, a partir de então, é pontuado por terços de alvorada, missas, pregações, liturgia penitencial, que, juntos, integram o calendário litúrgico da festividade. Ao mesmo tempo, acontece o programa cultural, que inclui arraial na quadra da paróquia, com premiações, leilão e noite de animação.

            Não posso deixar de mencionar, ainda, a Festa de São Tiago, realizada entre os dias 16 e 28 de julho, na Vila de Mazagão Velho, situada a 29 km de Mazagão, Município distante 65 km de Macapá, às margens do Rio Mutuacá.

            Essa vila foi fundada em 1770, com objetivo de abrigar 163 famílias de colonos lusos vindos da Mauritânia, na Costa Africana, em decorrência dos conflitos político-religiosos entre portugueses e muçulmanos que ainda por lá perduravam. Por meio da festa de São Tiago, os habitantes de Mazagão Velho revivem as batalhas que cristãos e muçulmanos travaram no Continente Negro.

            A origem da festa está ligada à lenda que conta o aparecimento de São Tiago, anônimo que lutou heroicamente contra os mouros, e sua realização enfoca personagens interessantes, como São Tiago, São Jorge, Rei Caldeira, Atalaia e outros.

            Outras belas e ricas manifestações da cultura amapaense, Senhoras e Senhores Senadores, são aquelas realizadas pelas comunidades quilombolas.

            A apenas doze quilômetros do centro da nossa Capital, por exemplo, uma comunidade quilombola preserva seus costumes e crenças ao mesmo tempo em que luta para conservar a Área de Proteção Ambiental (APA) em que vive. Importante sítio histórico e ambiental, a APA de Curiaú é uma das principais atrações turísticas da região, atraindo turistas de outros Municípios do Amapá e de diversos Estados do Brasil.

            Na primeira comunidade quilombola reconhecida no Estado, onde vivem cerca de quatro mil pessoas, está a Igreja na qual, anualmente, é celebrada uma das mais importantes festas religiosas do Amapá. A Folia de São Joaquim, festejada em agosto mediante nove noites de novena com folia, atrai muitos visitantes.

            A APA de Curiaú destaca-se por suas belezas naturais e, na mesma medida, pela importância das manifestações culturais preservadas pela comunidade, que incluem o batuque, a ladainha e o marabaixo. São manifestações culturais que têm levado um grande público a conhecer o local. E, para garantir a transmissão desse riquíssimo legado cultural às novas gerações, a Escola Estadual José Bonifácio, que funciona na comunidade, busca valorizar a cultura afrodescendente. O estabelecimento mantém projetos que valorizam o batuque e que se empenham no resgate dos costumes locais. Seus alunos sabem dançar carimbó, batucar, cantar as cantigas dos santos.

            Por último, mas certamente não com menor importância, o Amapá conta com as manifestações culturais de seus mais antigos habitantes, os povos indígenas.

            Existem no Amapá oito etnias indígenas, sendo as três maiores os Karipunas, os Marwornos e os Wajapis. Para não me estender demasiadamente, vou mencionar apenas a manifestação ritualística consubstanciada na dança do turé, dos povos indígenas da região do Uaçá, que são: os Karipunas, os Galibi-Marwornos, os Palikurs e os Galibi do Oiapoque, que formam redes de intercâmbio social e cultural no Município do Oiapoque.

            O Ritual do Turé é uma festa tradicional desses índios manifestada por meio da dança ritualística, demonstrando uma apuradíssima habilidade e qualidade artística e técnica de sua arte plumária, pintura corporal e facial.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nosso País, com sua dimensão continental, com sua população de múltiplas origens e fortemente miscigenada, tem, como todos sabemos, uma cultura extremamente rica e diversificada. E o Amapá, no contexto da Federação brasileira, destaca-se pelo extraordinário vigor e peculiaridade da sua cultura, pródiga em manifestações folclóricas amorosamente cultivadas pelas comunidades da Capital e do interior do Estado.

            Em função da distância geográfica que separa o Amapá dos maiores centros urbanos do País, milhões de brasileiros ainda desconhecem quase que por completo a riqueza da cultura do meu Estado. É chegada a hora, porém, de avançarmos firmemente no sentido da plena integração nacional. É importante que todos os brasileiros possam usufruir do privilégio de conhecer, de perto, as belas manifestações culturais dos amapaenses.

            Era o que eu tinha a dizer.

            Muito obrigado.


Modelo1 4/25/249:00



Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/12/2009 - Página 72565