Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo à Câmara dos Deputados para que aprove a proposta, já acolhida no Senado, que visa a celebrar conjuntamente as comemorações, no ano de 2022, da passagem do Bicentenário da Independência do Brasil.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL.:
  • Apelo à Câmara dos Deputados para que aprove a proposta, já acolhida no Senado, que visa a celebrar conjuntamente as comemorações, no ano de 2022, da passagem do Bicentenário da Independência do Brasil.
Aparteantes
José Nery.
Publicação
Publicação no DSF de 09/02/2010 - Página 1543
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, VALORIZAÇÃO, HISTORIA, CONSTRUÇÃO, IDENTIDADE, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, CENTENARIO, INDEPENDENCIA, JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE RESOLUÇÃO, AUTORIA, ORADOR, APROVAÇÃO, SENADO, CRIAÇÃO, COMISSÃO MISTA, ORGANIZAÇÃO, COMEMORAÇÃO, DATA, EXPECTATIVA, AGILIZAÇÃO, EXAME, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • OPINIÃO, NECESSIDADE, PROGRAMAÇÃO, FESTA, SIMULTANEIDADE, OPORTUNIDADE, ESTUDO, DIVULGAÇÃO, HISTORIA, BRASIL, COMENTARIO, ANTECIPAÇÃO, PROVIDENCIA, PAIS, AMERICA LATINA, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PARTICIPAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA, INCENTIVO, DEBATE, DEMOCRACIA, ACESSO, CONHECIMENTO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente, nobre Senador Mão Santa.

            Sr. Senador José Nery, Senador Papaléo Paes, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, há um provérbio latino que diz que historia est magistra vitae, ou seja, a história é a mestra da vida. Nenhuma civilização, a meu ver, conseguirá sobreviver se não buscar construir sua própria identidade.

            Faço essas observações por insistir num fato que considero significativo para o Brasil, que é a circunstância de celebrarmos, em 2022, a passagem do bicentenário de nossa independência.

            Apresentei sobre esse assunto Projeto de Resolução para que constituíssemos uma Comissão - Senado Federal e Câmara dos Deputados - para celebrarmos conjuntamente a passagem de data tão marcante para a busca da nossa identidade. Apresentada em 2004 e aprovada no Senado ano passado, foi a proposição encaminhada à Câmara. Espero que aquela Casa, em breve espaço de tempo, aprove-a e possamos começar a preparar uma série de eventos que deverão ser realizados para que o bicentenário de nosso País não passe desapercebido por parte do seu povo e de sua gente.

            As efemérides são muito importantes para a vida dos nossos povos. Ao celebrar uma efeméride, é forma de refletir sobre nossas identidades através da preservação da nossa memória. No Brasil, infelizmente, não temos o hábito de trabalhar com a devida antecedência a programação desses eventos de significação, de grande potencial histórico, diferentemente do que ocorre em outros países do mundo.

            Recordo-me de que, quando os Estados Unidos completaram os seus 200 anos de existência, fizeram grandes celebrações. E poderia citar outros exemplos.

            Quando ocorreram no Brasil a passagem dos 100 anos da Republicam e também dos 100 anos da primeira Constituição republicana, de 1891, a celebração dos 500 anos do nosso descobrimento ou desse encontro de culturas, para dizermos talvez melhor, a passagem desses 500 anos do nosso descobrimento, não houve a repercussão que deveria ter. E acho que deveríamos trabalhar, para recuperar o tempo perdido e tratar de avançar nessa programação.

            É lógico que quando me refiro a celebrações, a festejos, isso não quer dizer que devam ser apenas eventos festivos; pelo contrário, diria que deverão ter um caráter de reflexão crítica sobre a nossa evolução histórica e representar também uma forma de fazer com que a sociedade deles possa tirar lições importantes para o nosso evoluir histórico.

            Essas celebrações, de alguma forma, representam um exercício de pedagogia cívica, e considero que, para esse fim, o tempo já está ficando curto.

            Agora, já estamos vendo que países, alguns dos quais nossos vizinhos, estão prestes a celebrar os 200 anos de emancipação. E eles já começaram a trabalhar de forma concreta e com um roteiro previamente estabelecido.

            Vou-me referir aqui ao que acontece no que diz respeito aos 200 anos do fim do império espanhol na América, que estão sendo comemorados ao todo por dez países, que, na melhor da tradição ibérica, elaboraram um extenso calendário oficial, com 18 anos de festejos, de 2009 a 2026, e um número interminável de comissões para coordená-los.

            Desses 10 países, apenas o Peru não criou comissão. Mas todos os demais estão trabalhando programas sobre a passagem do bicentenário relativo ao fim do império espanhol na América.

            A Espanha está associada a esses países. São dez países: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Paraguai, Equador, El Salvador, Venezuela, México e Peru.

            O título desses encontros é “Somos todos negros”, querendo com isso a Espanha e - por que não dizer - os países que se associaram mostrar que se busca a identidade, inclusive ultrapassando-se políticas colonialistas que foram adotadas por nações que tinham certo protagonismo na história desses 200 anos que estamos celebrando.

            A matéria publicada no caderno Prosa & Verso, do jornal O Globo, de 16 de janeiro passado, de Miguel Conde, diz, referindo-se à Espanha, que é desejo desses países, na celebração de sua independência:

            “...coincidindo com o nascimento e a difusão das ideias do liberalismo. Esperamos que a data signifique um novo impulso na comunidade iberoamericana em direção a governos democráticos, à coesão social e ao acesso ao conhecimento -- diz a primeira vice-presidente de Governo [da Espanha], María Teresa Fernández de la Vega, que preside a Comissão Nacional para a Comemoração dos Bicentenários.”

            E acrescenta Miguel Conde:

            “Dentro do próprio Governo espanhol, porém, há visões diferentes. Em Madri, o Museu Rainha Sofia se prepara para receber o seminário ‘Todos somos negros’, cuja intenção é ‘impugnar a noção dominante das comemorações’[...]”. O historiador brasileiro e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro Francisco Carlos Teixeira lembra que as visões sobre o passado colonial se alteram de país para país e o pesquisador Walter Miolo diz que os indígenas do continente ainda lutam pelo protagonismo político”, [ou seja, pela sua total emancipação enquanto Estado nacional].

            Devo salientar, por oportuno, que o título “Somos todos negros” faz referência ao art. 14 da Constituição haitiana, de 1805 - “Todos os cidadãos, de aqui por diante, serão conhecidos pela denominação genérica de negros, para lembrar que as independências na América Latina começaram antes de 1809, com reivindicações de liberação racial”.

            Feitas essas observações, Sr. Presidente, volto, então, a falar sobre os problemas que dizem respeito aos objetivos traçados pela Comissão que, instalada no Congresso Nacional, venha a fazer com que o Brasil se prepare, oportuna e adequadamente, para refletir sobre os 200 anos de sua Independência, e, aproveitando a ocasião, pense sobre o passado que venha a iluminar o futuro, revisitando a nossa história, fazendo uma avaliação daquilo que constitui fatores positivos em nosso processo de integração nacional e, ao mesmo tempo, criando condições para que possamos corrigir rumos com relação ao futuro.

            Concedo o aparte ao Senador José Nery.

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Senador Marco Maciel, sem dúvida, para me somar a essa importante preocupação que V. Exª manifesta, quando faz referência à necessidade de nos prepararmos adequadamente na elaboração e na realização da programação para celebrar os 200 anos da Independência do nosso País. E, quando V. Exª fala em revisitar a nossa história, sobretudo a história política, econômica, social, que os desafios que vencemos e enfrentamos ao longo dos 200 anos da Independência nos possam servir - a cada um e a cada uma dos quase 200 milhões de brasileiros e brasileiras - como uma oportunidade ímpar, para refletirmos sobre o significado desse período em que vivenciamos a possibilidade de uma maior participação política da sociedade, em que convivemos com graves problemas que ainda hoje se reproduzem, em pleno século XXI. Eu faria menção a uma questão à qual me tenho dedicado e que é parte constitutiva da nossa história: a luta contra a escravidão em nosso País, que, em pleno século XXI, ainda estamos a tratar. Cento e vinte e dois anos após o fim oficial da escravidão, que serão completados no dia 13 de maio de 2010, no entanto, nós, o Parlamento, o Governo brasileiro ainda estamos, junto com a sociedade brasileira e suas organizações, discutindo formas de enfrentamento dessa chaga social. Também é uma oportunidade para reafirmar, nas comemorações dos duzentos anos de independência, os feitos da sociedade brasileira, os avanços também que conseguimos e, sobretudo, o comprometimento a trabalhar, a cada dia, com a construção da cidadania, de um futuro de felicidade para todos os brasileiros e brasileiras, onde ninguém seja discriminado, onde ninguém deixe de ter acesso aos bens fundamentais para garantir uma vida digna. Portanto, essa preocupação e esse empenho que V. Exª manifesta para que possamos elaborar uma programação que tenha um cunho festivo, cívico e civilizatório, justamente no sentido de fazer os grandes debates, que possam ser realizados, da universidade às instituições da sociedade civil, nos parlamentos em todas as esferas, para que justamente possamos encontrar, revisitando a nossa história, como V. Exª bem mencionou, os melhores caminhos que afirmem todos aqueles princípios pelos quais lutamos, de justiça, de dignidade, de bem-estar de todos, que é o que motiva a nossa luta permanentemente em prol de um Brasil mais justo. Portanto, quero cumprimentar V. Exª por essas preocupações e pelo empenho para que a comissão organizadora, nas tarefas que couber ao Executivo, ao Legislativo e às diversas organizações da sociedade brasileira possam ser vitoriosas no sentido de fazer esse encontro de cada brasileiro e brasileira com a nossa história e com o nosso destino, que, esperamos, seja cada vez mais um destino de felicidade, de bem-estar para todos e todas. Parabéns a V. Exª por essa preocupação permanente. Desejo me incorporar, de alguma maneira, a esse debate, a essas proposições, no sentido de podermos comemorar, celebrar os 200 anos da independência do Brasil. Muito obrigado.

            O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE) - Nobre Senador José Nery, líder do PSOL no Senado Federal, gostaria de manifestar minha total adesão às palavras que V. Exª acaba de proferir com relação à necessidade de iniciarmos, o quanto antes, os preparativos para celebrar essas efemérides.

            Volto a lembrar que, quando ocorreram os 500 anos do “nosso descobrimento” - entre aspas - de nossa afirmação como Nação, enfim, como sociedade que se integrava ao mundo novo que surgia, observei que as celebrações foram pouco significativas. O mesmo se repetiu, podemos dizer, com relação à celebração dos 100 anos da vida republicana, da proclamação da República. Foram feitas algumas publicações, reconhecemos, inclusive a reedição do livro de João Barbalho Uchoa Cavalcanti sobre a Constituição de 1891, nossa primeira Constituição após a proclamação da República, e poucas outras providências foram tomadas com o objetivo de pensar o futuro do Brasil a partir do seu passado, mesmo porque o futuro tem sempre um coração antigo.

            Estamos nos aproximando de 2022 e alguns eventos já passaram sem uma merecida reflexão. Talvez o único que ressaltou nesse calendário foi o que dizia respeito à vinda da família real para o Brasil. De fato, saíram alguns livros em 2008 sobre o significado da transferência da Corte de Lisboa para o Brasil e quanto isso precipitou o processo de nossa emancipação.

            Todos os historiadores brasileiros, com pouquíssimas exceções - talvez apenas um que conheço que firmou bem sua posição; aliás, um historiador pernambucano Oliveira Lima, que divergiu desse ponto de vista -, entendem que a vinda da Família Real para o Brasil precipitou nosso processo de independência e, consequentemente, da afirmação nacional.

            Sabemos que muitos outros eventos estão ocorrendo. Inclusive, louvei-me num trabalho de Rio Branco, as chamadas “Efemérides Brasileiras”. Rio Branco fez um trabalho muito interessante, destacando, em nosso valor histórico, os fatos mais importantes. É lógico que ele morreu antes de concluir seu trabalho - “Efemérides Brasileiras” -, concluído, por indicação de Capistrano de Abreu, sobretudo por Rodolfo Garcia, também um grande historiador. Rio Branco deu uma contribuição para que fizéssemos um levantamento daquilo que foi nossa evolução histórica.

            Acredito que, com relação agora ao bicentenário da nossa Independência, razão maior talvez exige que pensemos nele. Portanto, considero decisivo que instalemos logo essa comissão e possamos refletir sobre nossa história. 

            Desse modo, Sr. Presidente, antes de encerrar minhas palavras, faria um apelo à Câmara dos Deputados para que aprove a proposta já acolhida no Senado para que possamos, a partir de então, começar a trabalhar para que esses eventos não ocorram sem uma reflexão crítica da sociedade brasileira, sobretudo num momento em que o Brasil se prepara para ter uma inserção cada vez maior na comunidade internacional.

            Desejamos que isso aconteça - creio que isso é um sonho possível. Certamente, muito vai depender de esforço que fizermos por meio de comissão dessa natureza que venha a suscitar um debate vivo e palpitante sobre as grandes questões do nosso passado, que nos ajudam, portanto, na construção do futuro.

            Muito obrigado a V. Exª, Sr. Senador Mão Santa, que preside a presente sessão.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/02/2010 - Página 1543