Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Observações sobre as conquistas na Administração Federal que foram se impondo no governo do presidente Lula, e a lentidão nos avanços em termos de reforma tributária.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Observações sobre as conquistas na Administração Federal que foram se impondo no governo do presidente Lula, e a lentidão nos avanços em termos de reforma tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 13/02/2010 - Página 3110
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AMBITO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, DEBATE, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), TAXAS, JUROS, QUESTIONAMENTO, POLITICA CAMBIAL, MOTIVO, PREJUIZO, CONCORRENCIA, BRASIL, MERCADO EXTERNO.
  • AVALIAÇÃO, PREJUIZO, EXPORTAÇÃO, BRASIL, SISTEMA TRIBUTARIO NACIONAL, DIFICULDADE, EVOLUÇÃO, DEBATE, REFORMA TRIBUTARIA, CONGRESSO NACIONAL, PARALISAÇÃO, MATERIA, CAMARA DOS DEPUTADOS, FALTA, APOIO, EXECUTIVO, NEGLIGENCIA, PREPARAÇÃO, CRESCIMENTO, PAIS, REGISTRO, DADOS, AUMENTO, IMPOSTOS, ACUMULAÇÃO, TRIBUTOS, EFEITO, SUPERIORIDADE, PREÇO, PRODUTO, INJUSTIÇA, INCIDENCIA, POPULAÇÃO CARENTE, CONFLITO, NATUREZA FISCAL, ESTADOS, AMPLIAÇÃO, ENCARGO TRABALHISTA.
  • DETALHAMENTO, INICIATIVA, GOVERNO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AREA, POLITICA FISCAL, NEGLIGENCIA, DEBATE, IMPLEMENTAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, EFEITO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PAIS, EXCESSO, TRIBUTAÇÃO, PERDA, INCENTIVO, PRODUÇÃO, INDUSTRIALIZAÇÃO, EMPREGO, PREVISÃO, AUSENCIA, PROVIDENCIA, ANO, ELEIÇÕES.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passados os primeiros meses do Governo do Presidente Lula, os setores mais qualificados da Administração Federal foram abandonando, alguns mais rapidamente que outros, o discurso da assim chamada “herança maldita”, que visava lançar sobre os ombros do Governo FHC a culpa por todos os tropeços encontrados em seu caminho, à frente da nova gestão federal.

            Aos poucos, conquistas tais como a estabilidade monetária, a responsabilidade fiscal e a estrutura já montada para sustentação dos programas sociais - a exemplo da Bolsa-Escola e da Bolsa-Alimentação, entre outras - foram se impondo, por força de sua importância para o conjunto da sociedade brasileira.

            Outro ponto a merecer - mesmo que de forma inconfessada - o respeito da então nova Administração, conforme se depreendia dos posicionamentos do ex-Ministro da Fazenda, Antônio Palocci, foi a virtual independência há muito concedida ao Banco Central, especialmente quando à sua atuação nas áreas dos juros e do câmbio.

            Neste último caso, entretanto, o nível de respeito a que me refiro é claramente menos consensual. É bem visível o incômodo com que determinados setores da base de apoio ao Governo “engolem” essa autonomia.

            Pedem esses setores, por exemplo, que a taxa de juros caia em proporções muitas vezes incompatíveis com o conjunto do quadro dos principais agregados macroeconômicos.

            Ora, todos nós gostaríamos que os juros caíssem, é óbvio! Mas, para isso, é preciso - entre outras coisas - que a equação fiscal, ou seja, a relação entre as receitas e as despesas públicas, esteja mais equilibrada. Tal equilíbrio, contudo, não pode ser alcançado com o veloz e continuado crescimento que, infelizmente, vem hoje caracterizando os volumes de custeio da máquina pública.

            Muitos desses setores também querem - e com razão! - que seja revertida, ao menos em parte, a grande apreciação do câmbio que, nos últimos anos, vem tirando a competitividade das nossas exportações, incentivando a compra de produtos estrangeiros e estimulando as viagens de turismo ao exterior.

            Ora, todos nós com certeza gostaríamos de incentivar as áreas da nossa economia voltadas à exportação, seja no setor agropecuário, seja no setor de mineração, seja, em especial, no setor da indústria, possivelmente o mais prejudicado pela alta cotação do Real.

            Pois bem: embora não seja o objetivo deste meu pronunciamento dar lições ao Governo acerca de como tratar a excessiva valorização do câmbio, é certo que medidas adequadas existem - variando desde o controle de entrada de capitais, sistemática bastante polêmica e controversa, até a montagem dos fundos ditos soberanos, para refrear a internalização de moeda estrangeira.

            Mas é importante frisar um ponto: não é só o câmbio que causa prejuízos à competitividade e à capacidade de penetração dos produtos brasileiros, no exterior. Há outras causas relevantes, sendo, talvez, a mais grave entre elas a maléfica estrutura tributária nacional, uma das mais atrasadas de todo o mundo, fator que opera em conjunto com a intolerável carga de impostos e de contribuições a que se submete o setor produtivo brasileiro.

            Nosso sistema, entre outras distorções, faz com que exportemos impostos - o que não acontece em nenhuma nação que de fato conte, no jogo do comércio internacional.

            O tema da reforma tributária, entretanto, é um tema morto, cuja liderança o Executivo vem sistematicamente denegando, como se seu papel fosse simplesmente o de comemorar o bom desempenho da economia, esquecendo-se do dever indelegável de garantir as condições de perenidade desse processo.

            É fácil liderar na bonança; mas os verdadeiros líderes, entretanto, não esquecem que seu dever também é o de preparar, agora, todo o necessário à garantia do futuro, mesmo que isso requeira sacrifícios, desgastes e, se necessário, o uso de algum capital político. Nada disso, entretanto, parece valer entre nós.

            Mal entraram em vigor os ajustes que a Constituição de 1988 determinou em relação às atribuições dos Entes Federativos - União, Estados e Municípios - e às suas respectivas fontes de financiamento, já ficou clara a necessidade de ajustar a estrutura de alocação das receitas públicas.

            Vejam que, no início da década de 1990, a carga tributária girava em torno de quase “módicos” 25% do PIB, embora agregando algo em torno de 3,5% do assim chamado “imposto inflacionário”, parcela que de fato ajudava a fechar o caixa governamental.

            A partir do Plano Real, esse mecanismo veio a ser substituído por sucessivos aumentos dos impostos, e a carga tributária chegou à beira dos 27% em 1995, para depois subir gradativamente a 30,4% em 2000, e a 34% em 2005. Já o número de 2008, vejam!, superou os 36,5%.

            A par dessa escalada voraz,

temos as várias e graves distorções que foram sendo agregadas ao sistema tributário brasileiro no decorrer do tempo, ocasionando cada vez mais perda da competitividade na economia, estímulo à evasão fiscal e incentivo à informalidade.

            A existência de bases cumulativas para as contribuições, por exemplo, encarece produtos e prejudica a competitividade das exportações; a guerra fiscal entre Estados desequilibra os orçamentos públicos; o excesso de regressividade dos tributos indiretos onera os extratos sociais mais carentes; os elevados encargos fiscais sobre o mercado de trabalho induzem à informalidade e prejudicam a geração do emprego.

            O que foi feito, entretanto, em socorro desse lamentável estado de coisas, a título de reforma tributária?

            A proposta de substituir os impostos indiretos estaduais e federais - a exemplo do ICMS e do IPI - por um Imposto sobre o Valor Adicionado, incidente sobre o consumo no destino e compartilhado com os Estados, nunca vingou. Temos somente que, em 1996, por força da crise cambial, foi aprovada a Lei Kandir, que desonerou as exportações e os investimentos do ICMS. Como é de conhecimento geral, a compensação desses valores aos cofres estaduais inaugurou um grave passivo no relacionamento federativo, mas essa também foi, inegavelmente e desde então, a mais significativa intervenção feita a título de reforma tributária.

            Em 2002, a cumulatividade do PIS foi eliminada, mas, em vista do concomitante aumento de alíquota, a arrecadação cresceu. Movimento semelhante, em 2004, determinou o fim parcial da cumulatividade da Cofins e, mais uma vez e pelos mesmos motivos, houve crescimento da arrecadação. A melhoria de estrutura infelizmente trouxe consigo, nesses casos, um agravamento da voracidade tributária.

            A atual proposta governamental, consubstanciada na PEC nº 233/2008, ainda tramita na Câmara dos Deputados, onde está hoje relegada, órfã da iniciativa e do estímulo governamentais.

            A PEC visa, em última instância, simplificar a estrutura fiscal, extinguindo tributos e reduzindo cobranças cumulativas. Seu ponto principal é a criação de um Imposto sobre Valor Adicionado federal, que extinguirá quatro tributos hoje em vigor (Cofins, PIS, Cide-combustíveis e CSLL), destinando parcelas da arrecadação federal para as ações de governo atualmente atendidas por meio de contribuições - nas áreas de seguridade social, amparo ao trabalhador e ensino básico.

            Estão previstas, ainda, a desoneração gradativa da folha de contribuição patronal à previdência e a unificação nacional da legislação do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS), ajudando a combater a assim chamada “guerra fiscal”. Mas, repito, a PEC foi na prática abandonada pelo Governo.

            Poderia até mesmo citar, por critério de justiça, outras iniciativas patrocinadas pelo Governo, cujo escopo foi, entretanto, extremamente limitado. São elas, a chamada “MP do Bem”, de 2005, e as diversas medidas de combate à crise mundial, adotadas nos últimos meses, cujas boas intenções, centradas em desonerar setores de inegável importância, tais como a construção civil, as microempresas, a informática e o de exportações, não podem esconder sua precária sistematicidade. De fato, embora corretas e tempestivas, essas medidas nada tem de estruturantes.

            Tudo isso posto, Srªs e Srs. Senadores, não há como concluir de modo diferente: o Governo somente avançou, em termos de reforma tributária, em dois tipos de situação. Uma, quando sua sustentabilidade estava em risco, a exemplo das iniciativas com foco na renovação da DRU e da CPMF, tributo esse corajosamente sepultado por este mesmo Plenário, em 2007. Outra, em situações emergenciais, sempre de forma tópica, limitada e incipiente.

            Com esse espírito, os resultados serão o que hoje vemos, à nossa volta: um país que ostenta uma das maiores cargas tributárias, em todo o mundo; um país que desincentiva o investimento, o empreendedorismo e a criação de empregos; um país que corre nítido risco de desindustrialização, em vista do cerco promovido à competitividade do seu setor secundário.

            De um lado, tudo clama, exige e impõe uma mudança no comportamento do Executivo, cuja posição no conjunto das instituições republicanas lhe nega o direito de descuidar certos deveres, de se furtar a determinados desafios. De outro, entretanto, fica a descrença de que, num ano eleitoral, o Executivo se disponha a empreender aquilo que por sete anos deixou de lado: a reforma tributária.

            Mas registro, Sr. Presidente, que nada me daria maior prazer que enganar-me, nesta análise, e ver o Governo Lula finalmente abraçar um desafio de caráter estruturante. Não um desses, voltados a aumentar a já alta popularidade de seu Chefe; mas um de outro corte, destinado a promover - com base na reforma do atrasado sistema tributário brasileiro - uma alavanca verdadeiramente adequada à construção de um futuro de prosperidade para o Brasil.

            Muito obrigado pela atenção!


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/02/2010 - Página 3110