Discurso durante a 11ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Leitura de artigo de autoria do Arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, publicado no jornal O Estado de S.Paulo, no dia 13 do corrente, em que S.Exa. discorre sobre a questão dos direitos humanos.

Autor
Romeu Tuma (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO ESTADUAL.:
  • Leitura de artigo de autoria do Arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, publicado no jornal O Estado de S.Paulo, no dia 13 do corrente, em que S.Exa. discorre sobre a questão dos direitos humanos.
Aparteantes
Flávio Arns.
Publicação
Publicação no DSF de 18/02/2010 - Página 3126
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, ARCEBISPO, IGREJA CATOLICA, ANALISE, FUNDAMENTAÇÃO, INALIENABILIDADE, DIREITOS HUMANOS, COMENTARIO, ENCICLICA, PAPA, DEFESA, LEGITIMIDADE, DIREITOS.
  • CUMPRIMENTO, GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ATENÇÃO, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu queria agradecer ao Senador Augusto Botelho, sempre gentil, um grande colega que os Srs. Senadores têm nesta Casa, homem amável, carinhoso, caridoso e sempre pronto a uma consulta médica para nos orientar em nossos comportamentos para não nos prejudicarmos durante o dia, não é, Senadora Marisa Serrano? Essa parcela de médicos que aqui se encontra sempre nos dá confiabilidade, e ninguém vai cair duro aqui. Estaremos sempre firmes com as orientações deles.

            Senador Augusto Botelho, meu Presidente; Srªs Senadoras e Srs. Senadores, o Senador Flávio Arns fez um pronunciamento aqui sobre a nova missão da campanha da fraternidade, que é a solidariedade.

            Tomo a liberdade, Sr. Presidente, de ler um artigo que foi publicado no sábado, 13 de fevereiro, do ilustre Arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer, que, segundo o Senador Pedro Simon, é um gaúcho da cepa, nascido na mesma região do Senador Paim e do Senador Pedro Simon.

            Dom Odilo Scherer diz:

Os ‘direitos humanos’ estão sendo motivo de controvérsias, ultimamente, e não é sem razão: algumas questões bem controvertidas estão querendo se fazer passar por ‘direitos humanos’. Embora não seja recente, esse conceito emergiu e se afirmou no século XX; a humanidade tomou consciência sempre mais clara sobre a dignidade humana, sobretudo diante das aberrantes atrocidades cometidas contra pessoas e inteiros povos por regimes totalitários. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em dezembro de 1948, representou um marco histórico na civilização. João Paulo II, no seu discurso às Nações Unidas em outubro de 1979, definiu-a como ‘pedra militar no caminho do progresso moral da humanidade’.

A Igreja Católica reconheceu no movimento que levou a sociedade a identificar e proclamar os direitos humanos um dos esforços mais relevantes da humanidade para responder, de modo eficaz, às exigências decorrentes da dignidade humana (cf. Dignitatis Humanae). A Declaração é um instrumento extraordinário para defender e promover universalmente a dignidade da pessoa. De fato, os direitos não são separáveis da dignidade da pessoa.

Infelizmente, porém, o respeito aos direitos humanos ainda não é um fato geral e consumado; sua violação, mesmo grave, continua sendo constatada diariamente; não é unânime a sua interpretação e, com frequência, o teor ideológico de certos discursos leva a olhar com desconfiança a própria questão dos direitos, com o risco de relegá-los ao descrédito. Hoje há também certa pressão de grupos para fazer valer, como direito humano universal, algo que é subjetivo e posição ideológica de parte. Não é aceitável afirmar os próprios interesses, os supostos direitos, passando por cima da dignidade e dos direitos fundamentais de outros.

Penso que seja necessário retomar uma reflexão serena e bem fundamentada sobre a questão, para que os direitos humanos não sejam desacreditados; isso abriria o caminho para um retrocesso preocupante da civilização humana, com o risco de fazê-la embrenhar-se novamente na barbárie. Alguns sinais já estão por aí, como o aumento da violência e a indiferença diante dela, a exploração da prostituição como mercado rentável, até com a pretensão de fazê-la reconhecer como profissão, uma entre as tantas, enquanto é pura escravidão degradante; ou as propostas de aborto, eutanásia e eugenia, por vezes envoltas em discursos pseudo-humanitários, como fizeram regimes autoritários do passado, hoje claramente identificados como bárbaros. É por aí que queremos enveredar? [Pergunta Dom Odilo.]

Qual é o fundamento dos direitos humanos? O consenso da sociedade? A posse de riquezas ou de poder?

            Senador Flávio Arns, esta é a pergunta que V. Exª, da tribuna, fez: qual é o fundamento dos direitos humanos? O consenso da sociedade, a posse de riquezas ou de poder? Essa é a pergunta feita por Dom Odilo no seu artigo publicado em O Estadão.

O poder do grupo reinante ou o poder conferido pela posse de riquezas não é base segura nem critério aceitável para a definição de direitos humanos fundamentais; o poder, isso sim, deve estar a serviço do respeito aos legítimos direitos. Certamente, o consenso da sociedade é importante, mas, por si só, não é base segura para definir direitos humanos. Estes, mais que concordados mediante um pacto, devem ser constatados e reconhecidos, como tais, pela sã razão e pelo bom senso, mesmo sem receber a aprovação das maiorias. Muito simples de exemplificar: o direito a existir e a viver não depende da aprovação da maioria; ninguém de nós aceitaria que fosse submetido a uma votação o nosso direito a viver... Da mesma forma, o direito a respirar, a se alimentar, de ir e vir, à liberdade de pensamento e de opinião, de aderir ou não a uma religião.

        Esses direitos são primários, não são outorgados por outrem, nem pelo conjunto da sociedade; pertencem à pessoa, por ser pessoa; são inalienáveis e precisam ser, apenas, reconhecidos. A competência e o dever de fazê-los reconhecer e respeitar é da autoridade constituída, mas também é tarefa de toda a sociedade.

         Já ensinava o papa João XXIII, na encíclica Pacem in Terris, [Paz na Terra] que a fonte última dos direitos humanos não é a vontade dos homens, nem o poder do Estado ou dos poderes públicos, mas a natureza do próprio ser humano e, enfim, Deus, seu Criador. Mais recentemente, Bento XVI, na encíclica Caritas in Veritate [Caridade na Verdade], lembrou que o fundamento dos direitos humanos não está apenas nas deliberações de uma assembleia de cidadãos; neste caso, poderiam ser alterados a qualquer momento, dependendo das convicções e da ideologia de quem está com a mão no poder; assim, os direitos careceriam de referência objetiva e universal, ficando diluído e sem eficácia na consciência dos cidadãos o dever de os reconhecer e respeitar.

A raiz dos direitos humanos precisa ser buscada na dignidade fundamental e originária de cada ser humano, membro da família humana; tal dignidade, apreendida antes de tudo pela sã razão, é inerente a cada pessoa, igual para todos. No horizonte do cristianismo, esse fundamento natural dos direitos é destacado ainda mais com a afirmação de fé de que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus e que o Filho de Deus uniu a si a nossa humanidade mediante seu nascimento entre nós; isso deu ao ser humano uma dignidade incomparável; ele também é chamado a viver como familiar e íntimo de Deus.

E isso não vale apenas para alguns, mas para todos, mesmo para aqueles que parecem ter perdido ou desmerecido a sua humana dignidade.

Universalidade e indivisibilidade são dois traços distintivos e inseparáveis dos direitos humanos, que também devem corresponder a uma exigência inalienável da dignidade humana. Portanto, direitos humanos não podem ser assimiláveis a bandeiras de luta ou interesses de grupos particulares.

            Essas foram as palavras escritas, no último dia 13, pelo eminente Arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Scherer.

            O Sr. Flávio Arns (PSDB - PR) - Senador Romeu Tuma.

            O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP) - Pois não, Senador.

            O Sr. Flávio Arns (PSDB - PR) - Senador Romeu Tuma, quero, em primeiro lugar, parabenizá-lo pela leitura do artigo de Dom Odilo Scherer, Cardeal-Arcebispo de São Paulo, que aborda, de maneira muito adequada, muito boa, muito concreta, uma reflexão importante e necessária sobre a questão dos direitos humanos. Eu, inclusive, gostaria - não tive a oportunidade de ler no dia - de ter a cópia do documento, porque ele sintetiza as preocupações de uma maneira geral. Quero, inclusive, dizer da minha preocupação também, porque o tema direitos humanos é extremamente caro e importante; tem que ser assim para todos nós, quer dizer, acompanhar o cidadão na sua trajetória pela vida, em termos de acesso à educação, saúde, assistência, trabalho, emprego, chances, oportunidades. E esse debate que vem acontecendo, na verdade, acaba causando, inclusive, na população uma perplexidade diante de algo que deveria ser maravilhoso. Inclusive, quando se coloca a questão da preservação e valorização da vida, e consta, lá, não se permitir o aborto...

            O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP) - São fatos que querem descriminalizar e que trazem prejuízo para a sociedade.

            O Sr. Flávio Arns (PSDB - PR) - Exatamente. Querem descriminalizar e isso traz prejuízo. Basta citar que, em relação à pessoa com deficiência, há dois anos, nós aprovamos a Convenção da ONU para os Direitos da Pessoa com Deficiência. Colocou-se, claramente, no texto da Constituição que não é possível fazer o aborto, é crime, caso a pessoa identifique que a criança que está sendo gerada é portadora de algum tipo de deficiência. É uma luta, no Brasil, a favor da vida, a favor de condições de educação para o jovem, de trabalho, de apoio, de assistência. A gente lamenta que tudo isso que está sendo dito, ao final, acabe trazendo essa inversão da importância de os direitos humanos serem respeitados em nossos País. Então, a reflexão de Dom Odilo Scherer é importante. A leitura do artigo por V. Exª foi fundamental e isso nos orienta, felizmente, em muitos aspectos, nesse debate que vem acontecendo no Brasil.

            O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP) - Muito obrigado, Senador. Eu pediria licença para incorporar ao meu discurso o belo aparte de V. Exª.

            Senadora Marisa Serrano e Senador Alvaro Dias, o Senador falou das pessoas com deficiência física. Eu gostaria de, através dos dois membros do PSDB, cumprimentar, com euforia, o Governador José Serra, pelas providências que tomou para proporcionar aos tetraplégicos banho de mar em cadeiras flutuantes. Ontem, ele as colocou, por 90 dias, nas praias de São Paulo e, pessoalmente, colocou um tetraplégico no mar sobre a cadeira flutuante.

            Aos senhores, que representam o bom Partido do PSDB, eu faria essa referência, cumprimentando o Governador José Serra.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/02/2010 - Página 3126