Discurso durante a 14ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre a crise ético-política por que passa o Governo do Distrito Federal, que culminou com a prisão do Governador, José Roberto Arruda, e está polarizando as atenções de todo o País. Defesa de intervenção federal no Governo do Distrito Federal.

Autor
Jefferson Praia (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: Jefferson Praia Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).:
  • Reflexões sobre a crise ético-política por que passa o Governo do Distrito Federal, que culminou com a prisão do Governador, José Roberto Arruda, e está polarizando as atenções de todo o País. Defesa de intervenção federal no Governo do Distrito Federal.
Aparteantes
Adelmir Santana.
Publicação
Publicação no DSF de 23/02/2010 - Página 3850
Assunto
Outros > GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).
Indexação
  • ANALISE, CRISE, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), DIVULGAÇÃO, PROVA, CORRUPÇÃO, PRISÃO, GOVERNADOR, INTERESSE, TOTAL, POPULAÇÃO, PAIS, PIONEIRO, DECISÃO, JUSTIÇA, EXPECTATIVA, REVERSÃO, IMPUNIDADE, BRASIL, ATUAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), JULGAMENTO, PEDIDO, INTERVENÇÃO FEDERAL, COMENTARIO, APOIO, SOCIEDADE CIVIL, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), UNIÃO NACIONAL DOS ESTUDANTES (UNE).
  • COMENTARIO, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), MAIORIA, OPOSIÇÃO, INTERVENÇÃO FEDERAL, DEFESA, COMBATE, CORRUPÇÃO, PRESERVAÇÃO, AUTONOMIA, POLITICA, MANIFESTAÇÃO, DIVERGENCIA, OPINIÃO, ORADOR, LEITURA, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ELOGIO, INICIATIVA, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, POLICIA FEDERAL.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, BANCADA, GOVERNO, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), TENTATIVA, AGILIZAÇÃO, VOTAÇÃO, IMPEACHMENT, GOVERNADOR, IMPEDIMENTO, INTERVENÇÃO FEDERAL.
  • ANALISE, CRISE, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), EFEITO, EXPECTATIVA, RETORNO, ETICA, POLITICA NACIONAL, JUSTIÇA, COMBATE, CORRUPÇÃO, ENRIQUECIMENTO ILICITO, CONCLAMAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, REPUDIO, IRREGULARIDADE, APLICAÇÃO DE RECURSOS, FRAUDE, FINANCIAMENTO, ELEIÇÕES.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a crise ético-política no Distrito Federal, desencadeada a partir da divulgação das chocantes imagens do Governador, de membros do seu secretariado e de parlamentares de sua base aliada na Câmara Legislativa, recebendo quilos de dinheiro vivo e que culminou, até o momento, na prisão do Sr. Arruda, essa crise está polarizando as atenções e os sentimentos cívicos dos brasileiros em todos os quadrantes da nossa Pátria.

            Posso testemunhar isso, Sr. Presidente, pois lá no meu rincão amazonense ou no nosso rincão amazonense - não é isso, Senador Arthur Virgílio? -, não apenas em Manaus, mas em várias localidades do interior, sou parado por cidadãos e cidadãs de todas as classes, cores e crenças que me pedem detalhes do episódio ou uma análise pormenorizada dos fatos e até mesmo previsões sobre os seus desdobramentos.

            É claro, Sr. Presidente, que tanta curiosidade e tanto interesse são compreensíveis e justificados quer pela ampla visibilidade de Brasília como centro das grandes decisões nacionais, quer pelo ineditismo do fato de um governador em exercício, pela primeira vez na nossa história republicana, ir para a prisão. Ou melhor dizendo, ir parar na prisão em razão de um inquérito de corrupção administrativa.

            O futuro do DF continua nas mãos da Justiça, pois de uma decisão plenária do Supremo Tribunal Federal dependerá a permanência ou não de Arruda na prisão. Assim como ao STF caberá julgar o pedido de intervenção federal no DF formulado pelo Procurador-Geral da República, Dr. Roberto Gurguel.

            Desde já, porém, a consciência nacional celebra a rápida e decisiva ação do Poder Judiciário neste caso.

            As velhas esperanças nutridas pelo meu inesquecível antecessor, Senador Jefferson Péres, quanto à refundação ética da política brasileira e ao seu inescapável corolário - o fim da impunidade -, tais esperanças foram revigoradas, primeiro, com a pronta resposta do Superior Tribunal de Justiça ao pedido de prisão de Arruda, formulado pela PGR quando o Governador foi flagrado na tentativa de subornar uma testemunha de inquérito e, logo em seguida, pela recusa do Supremo Tribunal em conceder habeas corpus requerido pelos advogados de defesa do Governador.

            Aqui fora, a voz das ruas - precisamos ouvir a voz das ruas - e o clamor da sociedade civil, manifestados por meio de entidades representativas de longa tradição democrática como a Ordem dos Advogados do Brasil, a União Nacional dos Estudantes, a União Estadual dos Estudantes do Amazonas convergem, cada vez mais, na cobrança da intervenção federal.

            Pessoalmente, tendo a concordar com essa reivindicação, mesmo estando consciente do fato de que se trata de uma medida dura e polêmica. Prova disso é a recente pesquisa que tivemos com internautas que frequentam o site do jornal Correio Braziliense. Ela mostra que à pergunta “Você é contra ou a favor da intervenção federal no DF?”, 34,23% dos pesquisados se manifestaram favoráveis, alegando que só assim o esquema de corrupção espalhado pelos poderes locais poderá ser desmontado. Mas, ao mesmo tempo, 65,77% dos que responderam essa pesquisa recusaram essa intervenção, reconhecendo que a corrupção tem que ser combatida, sim, mas não se pode, a esse pretexto, tirar a autonomia política do Distrito Federal.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vale recordar que o Constituinte de 88 demonstrou ponderação quanto ao emprego desse recurso a ponto de abordá-lo usando uma linguagem deliberadamente restritiva.

            Assim, o art. 34 da Constituição da República estabelece que:

            Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

            I - manter a integridade nacional;

            II - repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;

            III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;

            IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;

            V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que:

            a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior;

            b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei;

            VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;

            VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:

            a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;

            b) direitos da pessoa humana;

            c) autonomia municipal;

            d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.

            Pouco mais adiante, Sr. Presidente, o art. 36 estipula:

Art. 36. A decretação da intervenção dependerá:

I - no caso do art. 34, IV, de solicitação do Poder Legislativo ou do Poder Executivo coacto ou impedido, ou de requisição do Supremo Tribunal Federal, se a coação for exercida contra o Poder Judiciário [notem, Senhoras e Senhores, que esse é o argumento utilizado pelos defensores da intervenção];

II - no caso de desobediência a ordem ou decisão judiciária, de requisição do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do Tribunal Superior Eleitoral;

III - de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da República, na hipótese do art. 34, VII;

IV - de provimento, pelo Superior Tribunal de Justiça de representação do Procurador-Geral da República, no caso de recusa à execução de lei federal.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso reconhecer que bastou a imprensa comentar mais intensamente a possibilidade de intervenção federal para que a maioria governista da Câmara Legislativa do DF mudasse de comportamento. Do final do ano passado até a prisão de Arruda, esses Deputados Distritais se dedicavam a driblar a revolta da opinião pública local e nacional, opinião que se concentrou em verdadeira discordância de tudo o que estava havendo, Sr. Presidente.

            Agora, sob a ameaça de intervenção, a Câmara Legislativa passou a correr contra o tempo para votar o impeachment de Arruda e de seu vice, Paulo Octávio, bem como a cassação dos mandatos dos deputados distritais flagrados recheando suas meias, bolsas e cuecas com dinheiro roubado do contribuinte.

            Sr. Presidente, a palavra final, repito, caberá à Justiça. Porém, desde já, ela, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal merecem o nosso aplauso e nossas homenagens pela sua agilidade e pela sua sintonia com o sentimento nacional generalizado de repúdio à corrupção e à impunidade no Brasil. Elas nos dão sólidas razões para crer que outros escândalos do passado recente, que já iam sendo encobertos pelo véu do esquecimento, também não ficarão impunes.

            Da mesma forma, podemos acreditar que essa ação se projetará positivamente para o futuro, dissuadindo políticos desonestos que ainda circulam por aí, Sr. Presidente, livres, leves e soltos, da crença cínica de que o crime com o dinheiro público compensa.

            Agora, todo corrupto - e não são poucos, Sr. Presidente - ou aspirante a corrupto, que também não são poucos, sabe que não está mais acima do bem e do mal e nem a salvo do longo braço da lei.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vejo tudo isso de forma muito significativa. Brasília é uma cidade construída graças à visão arrojada do Presidente Juscelino Kubitschek, à genialidade de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer e ao suor de milhares de candangos anônimos que construíram esta cidade para ser a capital da esperança, a esperança de ter um país melhor.

            Penso também, Sr. Presidente, que o nome Caixa de Pandora, escolhido pelos policiais federais para batizar a operação que desmascarou o Governador do Distrito Federal e seus comparsas no Executivo e no Legislativo, não poderia ser mais apropriado. Afinal, na lenda grega, Pandora, ao abrir sua misteriosa caixa, espalhou aos quatro ventos todos os males que, desde então, passaram a afligir a humanidade.

            Ouço, com muito prazer, o Senador Adelmir Santana.

            O Sr. Adelmir Santana (DEM - DF) - Senador Jefferson Praia, no trajeto de outro compromisso para o Senado, vinha ouvindo o pronunciamento de V. Exª, que tecia considerações sobre os preceitos que norteiam a questão das intervenções. Todos são testemunhas do meu posicionamento contrário à intervenção. E a minha colocação não é em defesa deste ou daquele que esteja no exercício da governança. A minha defesa é dos princípios constitucionais. Eu acho que intervenção é um ato, como V. Exª mesmo disse, extremamente duro, pesado, forte, que contraria esses princípios da linha sucessória. A mim, não interessa quem é o terceiro, quem é o quarto, quem é o quinto nessa linha sucessória, mas interessa, sim, que seja mantido esse principio constitucional, como V. Exª colocou, que o Constituinte consagrou na Constituição Cidadã, de 1988. Para Brasília, a conquista da representação política ou da autonomia política foi da sociedade. Não podemos nos esquecer de processos de intervenção... Aqui, temos um exemplo quando do falecimento do Presidente Costa e Silva, em que não foi respeitada a linha sucessória. Foi o período mais duro que tivemos na Revolução, porque não se respeitou a linha sucessória. É claro que vivíamos momentos diferentes, mas não podemos abrir mão disso, não interessa quem esteja na vez de suceder este ou aquele governante. Os princípios constitucionais devem ser mantidos e consagrados por todos nós. Então, quando alguns agourentos falam inclusive na extinção do Distrito Federal como representação política, uma preocupação me chama atenção. Essas pessoas não estão pensando corretamente, porque foi uma conquista dura e difícil, que foi consagrada não por nós, não por mim, por exemplo, que não estava aqui na época da Constituinte, mas pelo Constituinte que sabiamente deu autonomia política para o Distrito Federal. Então, a minha linha é o respeito à linha sucessória. Intervenção, não, porque é um desrespeito constitucional. Muito obrigado a V. Exª.

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Adelmir Santana, pelo aparte de V. Exª.

            Acredito, Senador Adelmir Santana, que o povo brasileiro está atento a essa questão e quer que a decisão a ser tomada esteja dentro do contexto, Sr. Presidente Mão Santa, do que estabelece a Constituição da República.

            Deveremos ser, sim, rigorosos, porque não podemos mais continuar com o que tanto percebemos, que são escândalos e mais escândalos, corrupção atrás de corrupção, sem que os verdadeiros culpados sejam punidos. O povo brasileiro quer isto: quer respeito com os recursos públicos, quer que a coisa pública seja cuidada de forma correta; ele não quer ver maus exemplos.

            Infelizmente, hoje, na política, há muitos que passam a participar dela com outros objetivos, Sr. Presidente, Senador Adelmir Santana, Senador Arthur Neto; objetivos pessoais ou de grupo. Chegam ao poder e não representam o povo; chegam ao poder com o objetivo de enriquecer de forma errada, porque não há enriquecimento de forma correta como representante do povo.

            Não consigo ver isto: como você se torna vereador e chega a ganhar dinheiro de forma correta; como você se torna deputado estadual e chega a ficar rico, Sr. Presidente; como você se torna deputado federal e enriquece - ou governador, ou prefeito ou senador, ou ministro - apenas com o que ganha. Temos que repudiar, de forma veemente, esse tipo de comportamento no Brasil.

            Eram essas as palavras que eu gostaria de deixar neste momento, para que façamos uma reflexão no Senado.

            Hoje, toco num assunto relacionado ao Distrito Federal, mas é um assunto nacional. Estamos aqui para tratar de assuntos nacionais, assuntos que estejam relacionados ao Brasil como um todo.

            O Brasil inteiro está com os olhos voltados para este caso. Os jovens que participam da política estão com seus olhos voltados para este caso, e o que acontecerá se não tivermos um resultado para servir de exemplo? Infelizmente, esse; apenas esse.

            Que daqui para frente todos sirvam de exemplo, Sr. Presidente. Está na hora de este País parar com os acordos que colocam panos em cima de atos de corrupção. Está na hora de este País parar, Sr. Presidente, com eleições fabulosas, com eleições que envolvem muito dinheiro e com prestações de contas que não são a verdade. Está na hora de pararmos com isso, ou sempre haverá comportamentos como o que estamos vendo na atualidade, e não quero fazer parte do grupo daqueles que concordam com isso. Não faço parte do grupo de pessoas que concorda com a má aplicação dos recursos públicos.

            Devemos lutar para que tenhamos recursos públicos bem aplicados e para que tenhamos, Sr. Presidente - e aí concluo -, homens de bem, pessoas com espírito público, cuidando da coisa pública: vereadores, prefeitos, governadores, deputados estaduais, deputados federais, senadores, ministros, presidente. Que cuidem da coisa pública, Sr. Presidente, de forma muito mais responsável do que com o próprio dinheiro até. Tem que ser assim. Esse é o Brasil dos meus sonhos e acredito que é o Brasil dos nossos sonhos...

(Interrupção do som.)

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - ... falo de nós, que estamos aqui, hoje; sonhos, certamente, do Senador Adelmir Santana, do Senador Arthur Virgílio, sonhos de V. Exª, que é termos um País...

            Não sou ingênuo de afirmar que acabará a corrupção, mas, da forma como ela está, precisamos dar um basta.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/02/2010 - Página 3850