Discurso durante a 23ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários acerca da decisão do Supremo Tribunal Federal de manter o Governador José Roberto Arruda preso, e sobre a decisão da Câmara Legislativa do Distrito Federal de abrir o processo de impeachment contra ele. Apoio ao projeto do Senador Tasso Jereissati, que dá um incentivo adicional aos filhos das famílias com Bolsa-Família. Defesa de projeto de lei, de autoria de S.Exa. (PLS 2, de 2010) que distribui proporcionalmente ao número de crianças na escola os recursos do fundo social formado a partir da exploração de petróleo da camada pré-sal.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF). POLITICA SOCIAL. EDUCAÇÃO. POLITICA ENERGETICA. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Comentários acerca da decisão do Supremo Tribunal Federal de manter o Governador José Roberto Arruda preso, e sobre a decisão da Câmara Legislativa do Distrito Federal de abrir o processo de impeachment contra ele. Apoio ao projeto do Senador Tasso Jereissati, que dá um incentivo adicional aos filhos das famílias com Bolsa-Família. Defesa de projeto de lei, de autoria de S.Exa. (PLS 2, de 2010) que distribui proporcionalmente ao número de crianças na escola os recursos do fundo social formado a partir da exploração de petróleo da camada pré-sal.
Aparteantes
Cícero Lucena, Geraldo Mesquita Júnior, Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 06/03/2010 - Página 6011
Assunto
Outros > GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF). POLITICA SOCIAL. EDUCAÇÃO. POLITICA ENERGETICA. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO POLITICA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), MANUTENÇÃO, PRISÃO, GOVERNADOR, INICIO, CAMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL (CLDF), PROCESSO, IMPEACHMENT, LEGALIDADE, ELEIÇÃO INDIRETA, PREVENÇÃO, IMPOSIÇÃO, INTERVENTOR, EXPECTATIVA, ESCOLHA, AUSENCIA, CRITERIOS, POLITICA PARTIDARIA, VALORIZAÇÃO, DEMOCRACIA, PRESERVAÇÃO, DIREITOS, VOTO, POPULAÇÃO.
  • SUGESTÃO, GOVERNADOR, RENUNCIA, BENEFICIO, RETORNO, LEGALIDADE, CAPITAL FEDERAL, RECUPERAÇÃO, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, TASSO JEREISSATI, SENADOR, CONCESSÃO, ADICIONAIS, BOLSA FAMILIA, ALUNO, INCENTIVO, APRENDIZAGEM, SEMELHANÇA, MATERIA, AUTOR, ORADOR, PARALISAÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, VALORIZAÇÃO, FREQUENCIA ESCOLAR, APLICAÇÃO, RECURSOS, POUPANÇA, LIBERAÇÃO, POSTERIORIDADE, CONCLUSÃO, NIVEL, ENSINO, VINCULAÇÃO, PROGRAMA ASSISTENCIAL, REGISTRO, EXPERIENCIA, DISTRITO FEDERAL (DF), GESTÃO, EX GOVERNADOR.
  • CONCLAMAÇÃO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, COMPROMISSO, MANUTENÇÃO, BOLSA FAMILIA, EXTENSÃO, PROGRAMA ASSISTENCIAL, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, DIRETRIZ, TRANSFORMAÇÃO, SOCIEDADE, SIMULTANEIDADE, MELHORIA, QUALIDADE, ENSINO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REGULAMENTAÇÃO, ROYALTIES, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL, NECESSIDADE, GARANTIA, EFICACIA, APLICAÇÃO DE RECURSOS, PREVENÇÃO, REPETIÇÃO, PERDA, HISTORIA, BRASIL, DEFESA, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, PRODUÇÃO, CONHECIMENTO, PROPOSTA, DISTRIBUIÇÃO, FUNDO SOCIAL, ESTADOS, PROPORCIONALIDADE, NUMERO, MATRICULA, CRIANÇA, UNIFICAÇÃO, AREA, DESTINAÇÃO, AMPLIAÇÃO, COMPROMISSO, CONCLAMAÇÃO, FORMAÇÃO, GRUPO PARLAMENTAR, DEBATE, MATERIA.
  • SOLIDARIEDADE, REIVINDICAÇÃO, MANUTENÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), RECURSOS, PARQUE NACIONAL DA SERRA DA CAPIVARA, ESTADO DO PIAUI (PI), DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, pergunto se o Senador Duque, que talvez tenha de viajar, não quer falar antes. Da minha parte, não tenho nenhum problema, porque fico aqui em Brasília.

            Sr. Presidente, sei que uma das regras fundamentais é não falar de mais de um tema no mesmo discurso, para que as pessoas se lembrem do que foi dito. Mas o processo que vivemos vai tão rápido que é impossível nos concentrarmos em apenas um ponto. Vou falar, portanto, de dois aspectos. Primeiro, não posso deixar de dizer do que aconteceu ontem com a decisão do Tribunal de manter o Governador José Roberto Arruda ainda preso. Segundo, da decisão da Câmara Legislativa de abrir o processo de impeachment.

            A abertura do processo de impeachment por dezenove votos a zero, com a ausência de cinco Deputados - todos os presentes votaram a favor -, creio, é um passo importante no resgate da importância que pode ter a Câmara Legislativa na solução do problema que nós atravessamos.

            A melhor maneira para enfrentarmos este problema hoje é termos um governador que seja capaz de fazer um corte, que seja capaz de fazer uma mudança, indicando, com clareza, à opinião pública o que houve e como não vai se repetir. Ao mesmo tempo, é fundamental que esse governador faça isso com credibilidade.

            Uma maneira, sem dúvida alguma, seria uma intervenção, desde que o Presidente da República escolhesse um interventor que passasse essa credibilidade e não a partidarização, por exemplo. Mas outra saída, que juntaria a legalidade de a própria cidade decidir o seu futuro com a confiança do seu povo nesse futuro imediato, era que a Câmara Legislativa elegesse indiretamente, como preveem as regras, um governador que tenha a cara, as mãos, o jeito de um interventor, mas escolhido pela própria Câmara Legislativa do Distrito Federal. Seguiríamos a legalidade, sem necessidade de interferência externa, porque o interventor não será ilegal; se o Supremo decide, é dentro da legalidade. Não será antidemocrático, porque cumpre a Constituição. Mas quebrará essa legitimidade e quebrará a importância da decisão pelas forças da cidade.

            Eu tenho escutado alguns dizerem até que o povo do Distrito Federal não deveria ter direito de eleger os seus representantes. Mas e nos outros Estados? A gente vai cortar o direito sempre que um governador cometer falhas graves? Por que só o povo do Distrito Federal não teria direito? Por que errou em algumas escolhas? Vamos olhar os outros Estados para ver se eles foram tão corretos assim no passado!

            É preciso dar uma chance ao povo do Distrito Federal e à legalidade e, ao mesmo tempo, que essa oportunidade passe confiança. A saída seria a escolha por eleição indireta, como se prevê nas regras, de alguém que faça o trabalho que um interventor faria, uma pessoa que não seja comprometida com nenhum partido, que não seja comprometida com nenhum grupo e que tenha a maneira de agir de quem quer de fato dizer tudo, para que nada fique escondido.

            Isso, entretanto, vai exigir que o Governador José Roberto Arruda entenda que talvez seja hora de ele perceber que o cargo precisa ficar livre. Não precisa esperar que haja impeachment. Ele pode dar início a esse novo momento que a gente vai viver se ele, por vontade própria, renunciar ao cargo e se a Câmara, por vontade própria, por sentimento, por consciência, escolher corretamente aquele que vai, até o final deste ano, governar o Distrito Federal.

            Por isso fica aqui a minha esperança de que nós possamos encontrar uma saída que tenha credibilidade na opinião pública brasileira, que parta da própria Câmara Legislativa e que conte para isso com a opção do Governador José Roberto Arruda. Não vejo outra saída neste momento: um novo Governador escolhido, mas com a função clara de fazer todas as auditorias necessárias, de fazer a revisão do Plano de Ordenamento Territorial, sobre o qual pesam suspeitas muito fortes. Que ele crie um conselho de personalidades desta cidade, de representantes da sociedade, com que ele debateria, discutiria e pelo qual seria assessorado.

            Mas eu disse que não dá para falar só em um tema, no mundo de hoje, com tanta velocidade como as coisas acontecem. E nesses últimos dias, o projeto do Senador Tasso Jereissati, que dá um incentivo adicional aos filhos das famílias com Bolsa-Família foi muito debatido. Eu quero vir aqui declarar o meu apoio a essa proposta.

            O Senador Tasso Jereissati não está propondo tirar benefício, está propondo acrescentar um benefício, e um benefício vinculado à escola e não ao estado de pobreza da família. Esse é um avanço no Bolsa-Família.

            Eu, pessoalmente, com um projeto que apresentei, que passou pelo Senado de uma maneira até muito discreta e está no final da discussão na Câmara, e que, inclusive, aparentemente, Senador Cícero, está parado no final e vão arquivar, propõe mais ou menos o mesmo que o Senador Tasso Jereissati propôs, com uma diferença: em vez de o dinheiro ser entregue a cada ano, esse dinheiro seria depositado numa caderneta de poupança. Em vez de a pessoa, a criança e a família receber esse dinheiro todo ano, como incentivo, esse dinheiro seria mantido numa caderneta de poupança até o final do curso secundário da criança.

            Podemos até fazer um pequeno ajuste como eu fiz no Distrito Federal quando Governador. Porque, como é muito demorado esperar pelo final do segundo grau, aqui a gente tinha esse programa, as famílias da Bolsa Escola recebiam um salário desde que a criança não faltasse à aula; faltou três dias por mês, não recebia. Agora, além disso, no final do ano, a gente depositava um dinheiro numa caderneta de poupança. A ideia era que só recebesse no final do segundo grau. Pelo menos essa foi a concepção que eu elaborei num documento que eu escrevi ainda quando professor apenas da Universidade de Brasília. Na hora de executar, fizemos um ajuste: a criança receberia metade do depósito quando terminasse a quarta série do ensino fundamental. A outra metade ficava. E continuava-se o depósito. Tirava-se outra vez a metade quando terminasse a oitava série, a metade continuava. E tirava tudo quando terminasse o ensino médio.

            Esse foi um projeto, Senador Cícero - e eu lhe dou daqui a pouco o aparte, com muito prazer -, executado durante três anos aqui, no Distrito Federal. E depois parou. Eu apresentei esse projeto e passou com algumas dificuldades no Senado, mas chegou na Câmara e ali não passou ainda.

            Eu conversei com o Senador Tasso Jereissati e ele aceitou que aqui no plenário a gente coloque uma emenda ao projeto dele para que, em vez de esse incentivo ser dado no final do ano, seja guardado numa caderneta de poupança. Talvez com isso a gente possa avançar no Bolsa Família, querendo chegar um dia a que esse programa volte a ser o Bolsa Escola na sua característica educacional.

            Tenho defendido, inclusive, que os candidatos a Presidente deveriam assumir dois compromissos: primeiro, que manterão o Bolsa Família para todas as famílias pobres deste País; segundo compromisso, que criarão um Programa Bolsa Escola para as famílias pobres com crianças que não faltem às aulas.

            Não dá mais para retirar o Bolsa Família. Esse virou um programa assistencial necessário. Agora, não dá para ficar só no Bolsa Família assistencial; é preciso criar uma ação mais do que assistencial, uma ação transformadora. E essa ação transformadora vem do incentivo do dinheiro para que a educação seja bem desempenhada pelas famílias, cobrando das crianças e pelas crianças estudando. 

            Ouvi críticas que surpreendem ao projeto do Senador Tasso Jereissati, como dizer que isso vai exigir demais das crianças - as camadas médias e ricas deste País exigem de suas crianças -; eu ouvi a ideia de que não se dá prêmio às crianças - as camadas médias e altas dão prêmios às suas crianças, dão incentivos às suas crianças. Nós inclusive damos incentivo a todas as crianças que saltam alto, que saltam à distância, que correm depressa nas atividades atléticas. Por que não dar também nas atividades intelectuais? Essa é a ideia. E a gente pode fazer com que, através dela, um programa que é hoje fundamental, necessário, generoso, positivo, chamado Bolsa Família, saia da pura e simples generosidade para dar um salto na transformação da sociedade.

            Mas isso ainda vai ser pouco, porque não adianta a gente acreditar que a criança indo a escola ela vai se educar, se a criança for como aquelas que a gente vê nas ruas, como aquelas que a gente vê pela televisão em alguns lugares do Brasil. Escola ruim não educa se a criança apenas estiver comparecendo a ela. Escola ruim só educa se ela ficar boa, se ela deixar de ser ruim.

            Por isso, é preciso combinar o incentivo à criança com a revolução na própria escola. E aí, mais um tema neste mundo dinâmico que é o Brasil de hoje, que me obriga a falar.

            Chegou ao Senado, está no Jornal do Senado de hoje, o projeto relacionado com o Pré-sal. Quero dizer que é um projeto de minha autoria nesta Casa e que vou brigar por ele tanto quanto briguei pelo piso salarial do professor. É sobre a distribuição dos royalties do Pré-sal, alertando, porque eu acho um absurdo que a gente levante o Pré-sal como uma saída. O Pré-sal, ninguém tem certeza plena da quantidade de petróleo, ninguém sabe qual vai ser o preço, ninguém sabe como vai estar a demanda de petróleo. Todos nós sabemos dos riscos do uso do petróleo do ponto de vista ecológico. Então, não podemos nos concentrar. De qualquer maneira, se esses recursos virão, é preciso aplicá-los bem. Não podemos repetir com esse dinheiro que poderá vir do petróleo o que gerações anteriores deste País fizeram com o açúcar, no começo da colonização, como fizeram com o ouro, fizeram com a borracha, fizeram com o café. E todo o dinheiro que foi gerado por essas riquezas naturais deste País, pelo esforço dos trabalhadores daquele momento, todo aquele dinheiro se esvaiu, queimou, desapareceu. Ou então, como no caso do ouro, serviu para enriquecer Lisboa e as indústrias inglesas. Não podemos deixar que isso aconteça. As gerações do passado foram mesquinhas, mas pelo menos podemos dizer que elas não tinham conhecimento do futuro, até porque não havia muitas experiências anteriores.

            Agora nós temos a experiência do que significa desperdício de recursos naturais deste País. Não podemos repetir. É preciso ter força, firmeza, convicção, para que aquele petróleo enterrado lá no fundo do mar sirva à construção de uma sociedade brasileira mais justa, mais eficiente, mais democrática, no futuro.

            É preciso transformar petróleo em neurônios. É preciso transformar petróleo na grande riqueza que este País vai ter, porque é a única grande riqueza do século XXI: conhecimento. Não haverá outro recurso. O recurso do futuro é conhecimento, porque o petróleo acaba, o processo industrial depreda. Nós vamos ter que fazer com que haja neste País uma imensa, enorme quantidade de conhecimento. E o conhecimento vem, em geral, da ciência e da tecnologia, ele vem do ensino superior. Mas a ciência e a tecnologia e o ensino superior começam na pré-escola. E a gente pode até casar a pré-escola com o Pré-sal. A gente pode até casar aquela lama enterrada em massa cinzenta para todos nós brasileiros.

            A minha proposta é de que os recursos do fundo social que o Governo apresenta sejam distribuídos proporcionalmente ao número de crianças na escola. Mas sejam distribuídos aos Estados com a finalidade de serem gastos na educação. O fundo que o Presidente apresentou é muito bem intencionado. Permite que seja o dinheiro gasto em projetos diversos na área da cultura, na área da ciência e da tecnologia, na área da educação, na área da luta contra a pobreza.

            Dois erros: primeiro, o dinheiro termina sendo espalhado e perde impacto por ter quatro setores e não um, que unificaria todos esses, que é educação. A educação é o melhor caminho para lutar contra a pobreza, é o melhor caminho para o desenvolvimento científico e tecnológico, é o melhor caminho para a cultura. Então, por que não ir diretamente àquele vetor fundamental dos quatro pontos que o Governo apresentou? Agora, além disso, vai permitir que o dinheiro se espalhe por projetos que qualquer pessoa, qualquer grupo, possa apresentar e pegar esse dinheiro, como os diversos incentivos que este País já teve e desperdiçou os recursos. E desperdiçou porque errou o setor e desperdiçou porque espalhou o dinheiro entre muitos beneficiados sem compromisso com a solução do problema.

            Vamos dizer: o nosso beneficiado é o conjunto de crianças que este País tem em idade escolar. Esse dinheiro irá para a escola. E quando a gente fizer isso, Senador Duque, o senhor que representa o Estado do Rio de Janeiro, que é o principal Estado da bacia onde está o Pré-sal, será o grande Estado beneficiado por excelência. O outro Estado beneficiado por excelência, o “segundo” dono, vamos chamar assim, das reservas, é São Paulo. Mas eles serão beneficiados não porque as reservas estão lá - porque as reservas estão no Brasil -, eles serão beneficiados porque são os dois maiores Estados do Brasil, porque a população que eles têm é a população maior de crianças na escola.

            Pela proposta que eu coloco, para que se tenha uma ideia, nós vamos ter, para o Estado do Rio de Janeiro, uma proporção de 6,7% de todo o dinheiro. Para São Paulo, 19%, mas de uma maneira muito justa, porque São Paulo tem 8 milhões de crianças na escola, 8 milhões e 800, e o Rio de Janeiro tem 3 milhões de crianças. O Estado do Espírito Santo, que é um dos “donos” também - entre aspas, porque essas reservas pertencem ao Brasil -, receberia quase 2%, 1,8%, porque tem 800 mil crianças na escola.

            Mas ao vincular esses royalties, estou falando dos royalties que vão para o fundo criado pelo Governo, não estou falando nem no resto dos recursos. Esses recursos do fundo se concentrariam num setor: a educação de base. E eles se distribuiriam por uma maneira muito justa, na mesma proporção de crianças na escola que aquele Estado tem. Não é a melhor maneira de investir para transformar uma lama preta em uma massa cinzenta do País inteiro? Eu não falo a massa cinzenta de cada brasileiro isoladamente, eu falo a massa cinzenta dos 200 milhões de brasileiros, interligados pela educação, pela cultura, pela ciência e pela tecnologia, mas tudo isso começa no abc, tudo isso começa nas quatro operações que uma criança aprende logo nos primeiros anos em que vai para a escola.

            Essa é a proposta que eu apresentei, que está correndo aqui, que é o Projeto de Lei nº 2, de 2010. E eu espero que a gente possa debater durante o período em que discutiremos o Pré-sal. Eu espero, porque hoje em dia tenho dúvida se a gente consegue discutir, a não ser nas sextas-feiras, quando a gente vem aqui, um pequeno grupo de pessoas, e tem mais tempo. Eu espero que a gente faça isso. 

            Ontem, conversando com o Senador Nery, pensamos uma idéia, para a qual quero convidar os Senadores: criar um pequeno grupo - pequeno, porque acho que muitos não irão, o ideal era que fosse de todos -, para que nos reunamos, nas tardes de um dia, como a de quarta-feira, em alguma sala do Senado, para discutirmos, um grupo fora do plenário, qual a melhor solução para o uso do pré-sal para o Brasil inteiro e para o futuro. Nem para desperdiçar no presente, como fizemos com o ouro, a borracha e o açúcar - consumimos tudo nos 1500, nos 1600, nos 1800, e nada ficou quase. Como fazer com que isso vá para o futuro? Como fazer com que isso vá para todo o Brasil e, ao mesmo tempo - e aí talvez seja o chamado ovo de Colombo -, como fazer, por pura coincidência, que os principais beneficiados disso sejam exatamente os Estados em que essas reservas estão? Por serem os com maior população, por serem os que têm maior número de crianças na escola, por serem, portanto, os que vão dar maior contribuição para o futuro do Brasil, não porque a natureza ou Deus colocou a reserva naquele exato lugar, em vez de colocar lá no Nordeste ou aqui, bem no Centro-Oeste; não embaixo do mar, mas debaixo da terra. Não, a natureza colocou ali, mas eles não seriam beneficiados pela sorte, pela loteria geológica que caracteriza a localização das reservas. Eles seriam beneficiados não pela loteria geológica, mas pela realidade social, pela realidade de serem os Estados com maior população de crianças e, portanto, com maior potencial de contribuírem para o futuro do Brasil.

            Eu vou querer brigar por esse projeto. Vou procurar o apoio para esse projeto. Vou querer, Senador Duque, que os Estados de São Paulo e Rio percebam as vantagens que terão desse projeto, e não se trata da totalidade dos royalties, somente os royalties que vão, já previstos pelo projeto de lei do Presidente, para o fundo que está sendo criado. Mas que esse fundo tenha uma finalidade clara, concreta e uma maneira responsável de ser aplicado.

            Esse era o discurso, Senador Mão Santa, mas, antes de concluir, quero passar a palavra ao Senador Cícero.

            O Sr. Cícero Lucena (PSDB - PB) - Senador Cristovam, apenas no início de seu pronunciamento, em que V. Exª caminhava pelo reconhecimento do projeto do Senador Tasso Jereissati, que foi aprovado, recentemente, na Comissão e que ainda vem a Plenário, eu recordava um fato a que depois V. Exª fez referência no seu discurso: a sua ação em relação ao Bolsa-Escola. De 1994 para 1995 - eu, então Ministro do Governo de Fernando Henrique Cardoso, de Políticas Regionais -, acompanhei, numa cidade satélite aqui, em Brasília, numa escola, o lançamento desse programa de V. Exª, que estabelecia exatamente o reconhecimento à presença do aluno na escola, tendo esta seu papel - a escola boa, claro - fundamental na formação do cidadão e na abertura das perspectivas futuras para as nossas crianças. Então, eu me fiz presente àquela solenidade, e aquilo me marcou como proposta, se eu tivesse oportunidade de fazer algo semelhante. O Bolsa-Escola tinha tido iniciativa em outros Municípios; V. Exª o estava implantando aqui como Governador do Estado. E, quando fui prefeito na cidade de João Pessoa, havia um lixão em que cerca de 300 famílias moravam. Não posso dizer que moravam: sobreviviam, de forma desumana, naquele lixão. Boa parte delas eram crianças, que não só sobreviviam naquelas péssimas condições, mas também trabalhavam na coleta, na seleção do lixo, disputando, imagens que todos nós conhecemos - infelizmente, ainda hoje existe esse tipo de lixão em nossas cidades. E nós criamos, também, o Bolsa-Escola para aquelas crianças. A condição era a de elas não trabalharem mais - até porque retiramos essas famílias, construímos suas casas, mas para que as crianças não fossem catar lixo e estivessem presentes nas escolas e nas creches que implantamos junto ao condomínio que construímos para essas famílias. Sem dúvida, isso deu um ganho muito grande. Não foi apenas a oportunidade de aprender na escola. Por incrível que pareça - nós podemos até lamentar, mas é a verdade -, essas crianças, que, muitas vezes eram mal tratadas em suas casas como um peso, como um custo, passaram a ser respeitadas pela própria família, porque aquela era, talvez, a única fonte de renda que aquelas famílias tinham em sua casa. Então, essa ideia de valorizar a educação na complementação da renda é fundamental. E, como V. Exª bem disse, o projeto do Senador Tasso Jereissati vem propor exatamente isto: essa discussão em nível nacional e com algo também referenciado por V. Exª: o fato de que agora ninguém mais vai poder dizer, principalmente usando a maledicência da campanha, que alguém vai acabar com o Bolsa Família. No caso específico, o projeto do Senador Tasso Jereissati representa o sentimento de todos nós, Senadores, de todos nós que fazemos o PSDB, e temos, sim, o compromisso de aperfeiçoar o Bolsa Família, valorizando aquilo que deve ser mais valorizado, que é o Bolsa-Escola. Fiz, então, questão de dar esse testemunho, porque estive ao seu lado, nesse projeto que V. Exª, como Governador, iniciou e implantou e que estaremos juntos defendendo, para que todo o Brasil tenha essa oportunidade.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Fico muito feliz. Antes de passar a palavra ao Senador Heráclito Fortes, quero dizer - pedindo ao Senador Heráclito Fortes que espere um pouquinho - que, quando alguém fica insistindo muito na paternidade de um filho é porque desconfia da fidelidade da esposa. Eu não fico por aí, insistindo na paternidade do Bolsa-Escola, mas como V. Exª levantou, quero lembrar que a idéia ficou bem clara em 1987, no Centro de Estudos Multidisciplinares da UNB. No Núcleo de Estudos do Brasil Contemporâneo é que essa idéia surgiu. Não importa se fui eu que a lancei. Ela surgiu ali. Depois, escrevi um texto que debati pelo Brasil inteiro, a partir de 1989 ou 1990 e que depois virou um livro que se chama A Revolução nas Prioridades, segundo o qual são 100 medidas para mudar o Brasil. A segunda, eu ainda a chamava de Renda Mínima Vinculada à Educação. A primeira era um programa de creches para o Brasil inteiro, a segunda era essa, e a terceira era a poupança-escola, ainda sem o nome de poupança.

            Em 1994, quando fui candidato a Governador, num primeiro momento, um assessor me perguntou se a gente não podia apresentar esse projeto para o Distrito Federal. A minha primeira reação foi contrária. Eu disse: se trouxermos um programa como esse para um Estado apenas, todo mundo virá para cá. Mas aí pensei, e colocamos, sim, no nosso projeto, a exigência de cinco anos, pelo menos, de moradia aqui, para receber o direito. A outra coisa que precisava, além da exigência de cinco anos, era criar um nome bonito, porque, com o nome de “renda mínima vinculada à educação”, ninguém consegue passar a ideia para a população. É bom para livro, é ruim para campanha eleitoral. E a gente queria não apenas criar o programa, mas ganhar votos também, é claro. Foi aí que preparei a ideia e levei para os marqueteiros. Criei a idéia do Bolsa-Escola por falta de outro nome. Não sei por que o nome foi esse, era uma bolsa vinculada à escola. Eles aceitaram. E, em 1994, comecei a divulgar isso.

            O meu primeiro gesto de Governo foi criar a Bolsa-Escola. Logo depois, a Poupança-Escola. E aí é que veio o grande erro. Essas duas coisas deveriam ter um nome só; a Bolsa-Escola deveria ser as duas coisas: a renda mensal com a exigência da frequência às aulas e o depósito em caderneta de poupança com a aprovação da criança. Deveria ser uma coisa só. Criamos como duas separadas, mas elas funcionaram aqui.

            O Presidente Fernando Henrique Cardoso, quatro anos depois - e quero dizer que lutei muito, nesses quatro anos do Governo, eu aqui e o Presidente Fernando Henrique lá, para que fosse criada.

            Lembro-me de que, quando fui visitá-lo na transição, no escritório dele no Lago Sul, ter levado o meu livro de presente para ele, sugerindo: Presidente, por que o senhor não cria esse programa? Aliás, quero fazer aqui um registro. Fui do governo paralelo, criado pelo Presidente Lula em 1990. Eu levei essa ideia para a reunião do governo paralelo, e foi recusada. O governo paralelo recusou essa ideia. Lembro-me bem de que o Dr. Barelli, que era assessor econômico, disse que não fazia sentido. E o documento que depois publicamos, que é assinado pelo Presidente Lula...

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - V. Exª pode repetir o nome do assessor?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Walter Barelli, que foi do Dieese. Foi ele que disse que não fazia sentido, e foi eliminado. Tanto que, no pequeno documento, assinado...

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Onde anda ele? V. Exª está aqui no Senado da República.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Não sei. O pequeno documento, assinado pelo então Luiz Inácio Lula da Silva, não presidente, e por mim, numa coautoria, era um documento com propostas para a educação, lançado em 1990. Não entrou o Bolsa Escola. O Lula perdeu aí a chance da paternidade, porque não entrou; entraram as outras medidas para a educação. E o PT não foi favorável ao Bolsa Escola aqui no Distrito Federal. Sofri muito para convencê-lo disso, especialmente o Sindicato dos Professores. Isso era chamado de política compensatória, era o nome que se dava. Lembro-me de que eu dizia: por que pagar uma criança para estudar é política compensatória, mas pagar em dólares para alguém já formado ir estudar na Europa não é política compensatória? É investimento? Esse era o debate. Aí diziam: “Mas é melhor colocar esse dinheiro para pagar melhor os professores”. Aí mostrei que, se aquele dinheiro fosse distribuído aos professores, o aumento seria de 1,5%; não ia adiantar nada, mas era um salário mínimo inteiro o que a gente pagava aqui, o que não proponho para o Brasil todo.

            Aqui sim, porque o número é menor, porque é possível, porque custa mais viver aqui do que em pequenas cidades do interior. Então, essa era a idéia, assim que surgiu. O Presidente Fernando Henrique no começo recusou. Eu tenho as cartas guardadas que eu mandei para ele, para o meu amigo Paulo Renato Souza, que esnobou a ideia no primeiro momento e insiste que começou em Campinas. Se fosse assim, o Governo Fernando Henrique Cardoso teria começado em 1995, se fosse uma coisa lá de Campinas. Agora, Campinas começou a executar praticamente no mesmo momento em que nós aqui. Por quê? Porque o prefeito tinha sido eleito dois anos antes de mim.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - O Grama.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Grama. Ele tinha sido eleito dois anos antes. Eu fui a Campinas ajudar a implantar. Fui lá, conversei com ele, debati com ele e ele implantou, na verdade, quase no mesmo momento; mas dois anos depois, no terceiro ano do governo dele e não era exatamente o Bolsa Escola, estava mais perto do Bolsa Família. Primeiro, porque a gestão era na Secretaria de Assistência Social, não na Secretaria de Educação; segundo, porque a vinculação à educação não era suficientemente rígida. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, então, demorou muito, mas no fim colocou. E, quando colocou - a isso é preciso fazer justiça - ele teve uma generosidade raríssima em um político: ele manteve o nome de um programa que vinha do governo de um partido a que ele fazia oposição. E nas reuniões de criação do programa dentro do Governo Fernando Henrique muitos sugeriram que mudasse o nome. E foi ele - eu soube depois - foi ele, o próprio Fernando Henrique que disse: ‘Não, esse nome está aí, vamos manter esse nome”. Essa é uma generosidade muito rara na política. O que mais a gente faz em política é mudar o nome daquilo que o governador, o presidente ou o prefeito de antes fez.

            O Presidente Fernando Henrique Cardoso manteve o nome. Se não fosse isso, o nome Bolsa Escola tinha desaparecido, porque - vamos falar com franqueza - o nome Bolsa Escola só se espalhou porque virou um programa nacional.

            Senador Heráclito, antes de lhe passar a palavra, as pessoas que vão à minha sala aqui ficam surpresas porque eu tenho diversos exemplares da autobiografia do Clinton. Todos perguntam: “Caramba, por que você gosta tanto desse Clinton?”. Eu digo: “Olha, eu nem li essa biografia”. Eu tenho em turco, em francês, em alemão, em inglês, e, obviamente, eu não falo turco, não falo alemão. Eu tenho todos esses para mostrar que a palavra Bolsa Escola, em todas as línguas, é citada em português. O Clinton, toda vez que fala do programa, cita-o em português.

            Eu conto até uma história, já que hoje é sexta-feira, de que eu vou comprando esses livros, quando viajo, em língua estrangeira e, uma vez, eu vi uma propaganda de um livro em chinês. Aí eu fui procurar se lá, em chinês, tinha escrito em português. E não achei, depois de quase meia hora. E, como eu não gosto de gastar dinheiro à toa, não comprei para ver se, depois, tinha. Coloquei o livro lá. E, quando eu ia saindo, o rapaz da livraria, uma livraria pequena em São Francisco, chegou para mim e disse: “Estou surpreso como o senhor lê chinês tão rápido!”, como se eu tivesse lido chinês. Não, eu fui atrás de onde estivesse escrito Fernando Henrique Cardoso, porque é perto de Fernando Henrique Cardoso que aparece Bolsa Escola, todas as vezes. E, como não achei, deixei. Por quê? A palavra virou um código internacional graças a Fernando Henrique Cardoso. Foi ele, foi quando ele colocou no Brasil que essa palavra cresceu, surgiu. Se fosse só no Distrito Federal, ninguém se lembrava mais. Então, essa é uma digressão, Senador Heráclito, mais uma, para lhe mostrar como sexta-feira é um momento de divagação. E eu aproveito e passo a palavra para o senhor.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Evidentemente que a sexta-feira, em lei, serve para isso e serve, inclusive, para algumas revelações. Acabei descobrindo e vou sair daqui convicto de que V. Exª teve a sua idéia fantástica do Bolsa Escola acolhida com mais facilidade pelos tucanos do que pelo seu próprio partido, o Partido dos Trabalhadores, o que é um contrassenso, o que é um contrassendo. Hoje, esse projeto de V. Exª é usado como carro-chefe eleitoral, sem sequer uma referência à sua origem, ao seu autor. Pelo menos testemunhei Fernando Henrique diversas vezes citando o nascedouro do programa. Mas é apenas um registro. Quando V. Exª falava, Senador Cristovam, eu via como este País é cheio de contrastes: dinheiro pelo ralo para coisas supérfluas e falta de dinheiro para ações concretas, como no caso da proposta do Senador Tasso Jereissati. Acho que era a consagração, era uma consolidação e era um aperfeiçoamento. Outro dia tivemos aqui a aprovação do Bolsa Cultura. Agora virou mania. Tenho um projeto em elaboração para criar o Bolsa Remédio. Quero ver até se conto com apoio de V. Exª. Devo entrar com isso breve. Não há sentido, já que temos o Bolsa Cultura, nós não termos também o Bolsa Remédio. Um complementa o outro. O preço que se paga, neste País hoje, de medicamentos só não é maior porque, lá atrás, de maneira corajosa, o então Ministro José Serra quebrou patentes e criou o genérico. Mas, Senador Cristovam, se nós analisarmos aqui as famílias carentes, a despesa mensal com medicamentos vai justificar essa ideia. Antes de apresentá-lo, eu gostaria, inclusive, de receber sugestões de V. Exª. Enquanto eu ouvia, atentamente, V. Exª, entro em um site do meu Estado e vejo um fato grave e que mostra os contrastes deste País. A Professora Niéde Guidon, que V. Exª conhece, que é quem comanda o Projeto da Serra da Capivara...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Conheço.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Diz ela aqui: “Parque Serra da Capivara pode perder R$300 mil da Petrobras”.São trezentos mil reais por ano que a Petrobras manda para a manutenção, Senador Mão Santa, do Parque Nacional Serra da Capivara. Ela diz que isso se deve à burocracia. Essa mesma Petrobras, Senador Geraldo Mesquita, é acusada aqui de jogar dinheiro para as ONGs, para as ONGs financiarem trio elétrico, festa junina e sei lá mais o quê. E um projeto dessa natureza se perde em um emaranhado de burocracia e de má vontade dos técnicos da Petrobras. Veja bem. Agora há pouco farei sobre a construção do Aeroporto de São Raimundo Nonato, que está por concluir. Ora, a sustentação do aeroporto, a justificativa do aeroporto é exatamente a Serra da Capivara. É falta de planejamento? É falta de responsabilidade? O que é que acontece? A Petrobras tinha que facilitar, aliás, aumentar essa participação anual de R$300 mil, que é irrisória. Queria fazer um apelo aos técnicos insensíveis da Petrobras: que revejam isso, facilitem e entendam que um trabalho como o feito pela Profª Niède Guidon, com as dificuldades geográficas, com as dificuldades que enfrenta lá na Serra da Capivara, não pode ser comparado a projetos desenvolvidos no ar-condicionado de São Paulo, Rio de Janeiro ou Brasília. É preciso do administrador, do gestor, essa sensibilidade. Daí por que eu pego uma carona no seu pronunciamento, uma vez que já usei meu tempo, e faço um apelo para que a Petrobras seja sensível a esse apelo, a esse desabafo que faz aqui a Profª Niède Guidon e que não crie obstáculos; pelo contrário, facilite a liberação desses recursos, aumente essas verbas. A Serra da Capivara é um patrimônio cultural da humanidade e um orgulho de todos nós brasileiros. Muito obrigado a V.Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador, eu me somo ao seu apelo e faço um alerta, explicando com mais tempo um pouco o que é a Serra da Capivara. É a mais importante, chamemos assim, reserva paleontológica do Brasil.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Exatamente. Registro da presença do homem no continente americano.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - E uma das maiores do mundo inteiro.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Do mundo inteiro.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Então, eu faço o apelo também, mas acrescento algo: tirar esse dinheiro vai ser considerado, no futuro, um crime.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - E ela se queixa aqui, Senador Cristovam, também da péssima qualidade das estradas. E essas estradas ruins estão fazendo com que os pesquisadores e os turistas abandonem o parque. De forma que eu, mais uma vez, peço desculpas a V. Exª, mas atravesso o seu discurso. Peço essa oportunidade. Quero ver se a carona do meu aparte no seu pronunciamento atinge a repercussão necessária nesse caso, exatamente no dia em que o Governador Wellington Dias completa 48 anos e poderia comemorar essa data sem o constrangimento de ouvir o desabafo da Profª Niède Guidon.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu imagino como vai ficar, na História, a Profª Guidon. Ela vai ter o seu lugar guardado. Agora, imaginem como vai ficar o Presidente da Petrobras que tiver cortado o dinheiro para esse projeto. Ele será muito cobrado no futuro.

            Eu vou passar a palavra ao Senador Geraldo Mesquita, lembrando que o Senador Duque tem que falar e tem que sair.

            O senhor não vai viajar agora, vai? E conte comigo para presidir, se for preciso, e para ouvi-lo.

            O Senador Duque talvez tenha de viajar rápido, mas não posso deixar de passar a palavra ao meu amigo, Senador Geraldo Mesquita.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - É muito rápido, Senador Cristovam. Primeiro, parabenizá-lo por ferir mais uma vez esse assunto de vital importância para o País, que é a educação, a busca do conhecimento. Quero, como V. Exª, também me associar à ideia do Senador Tasso, que causou e tem causado tanta polêmica, tanta discussão. Eu fico surpreso inclusive pelo fato de o Presidente Lula ter, em princípio, reagido à ideia de se premiarem os bons resultados, na educação, daqueles que são vinculados ao Bolsa Família. Acho que o Presidente da República deve refletir e acolher essa ideia, porque ela é muito apropriada, muito boa. Estou aqui também aguardando a oportunidade de votar favoravelmente a essa proposição do Senador Tasso Jereissati. Eu quero apenas, Senador Cristovam, que V. Exª me esclareça acerca do argumento que faz com que V. Exª proponha que esse e outros determinados benefícios se constituam numa poupança.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Sim.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Porque, olhe, eu tenho a seguinte reflexão: eu e minha mulher, vamos dizer, de classe média baixa, trabalhamos duro a vida inteira, e a poupança que a gente imaginou fazer, no nosso âmbito, foi proporcionar aos nossos filhos escola. Por outra, não juntamos dinheiro. O dinheiro que ganhávamos aplicamos na educação dos nossos filhos. Isso para mim era a nossa poupança. E é a nossa poupança. Porque é uma poupança que ninguém tira mais, nem deles nem da gente. Eu imagino, Senador Cristovam, que as pessoas que são beneficiárias do Bolsa Família têm de matar um leão por dia para se vestir, para sobreviver, para se locomover, para comer e para estudar. Eu acho que o mesmo raciocínio poderia ser aplicado a elas. A poupança em relação a essas pessoas deveria ser a aplicação imediata dos valores no processo educativo: a compra de um caderno, a compra de um livro, a compra de alguma coisa que possibilitasse a que, complementarmente à escola, elas pudessem crescer e adquirir, cada vez mais, conhecimentos. Eu queria, com toda a sinceridade, que V. Exª me convencesse da necessidade dessa poupança, de constituir essa poupança para que ela recebesse lá no futuro, porque, para mim, se ela recebesse ontem já era tarde! O que dirá daqui a um ano, daqui a dois anos, daqui a três anos? Entendeu o raciocínio?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Entendi perfeitamente. E vou lhe dizer como é que eu penso.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Pois não.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Primeiro, é que, para não precisar de matar um leão por dia, há o Bolsa Escola. É o papel da Bolsa Escola, ou Bolsa Família. Esse dinheiro é o que vai lhe dar o que comer; esse dinheiro é o que vai lhe dar - deveria pelo menos - o suficiente para justificar a criança não ir trabalhar e ir para a escola.

            Agora, por que, em vez de dar o dinheiro todo final do ano quando a criança passar de ano, a gente o poria numa caderneta de poupança?

            O senhor citou o caso familiar. Seus filhos, minhas filhas, já está dentro da cabeça deles ficar até o final do segundo grau. Mas não está na cabeça das crianças pobres, não está dentro das possibilidades delas. Ao colocar uma poupança vinculada à conclusão do Ensino Médio, ajudamos essas crianças a ficarem na escola; não saírem quando chegam à 8ª série, que é o que acontece hoje na maior parte dos casos - metade sai quando chega à 8ª série. Então, na verdade, ao fazer como poupança de dinheiro até o fim do segundo grau, a gente está ajudando a fazer a poupança do conhecimento que o senhor defendeu. Se a gente der o dinheiro no final do ano, chega um momento em que eles vão dizer: “Para que continuar estudando? Vamos trabalhar e pegar esse dinheiro”.

            Então, é um incentivo à permanência da criança na escola. Entendeu? É um incentivo para que ela continue, para que ela não deixe, dizendo sempre: “Tem tanto lá no banco em meu nome, mas eu só vou receber quando terminar o segundo grau”. Agora, para combinar essa vinculação à conclusão do Ensino Médio com a necessidade imediata é que, no Distrito Federal, a gente fez essa composição: não recebe todo ano - vai para uma caderneta de poupança -, mas quando terminar a 4ª série, matriculando-se na 5ª, aí recebe a metade do que tem lá. Tinha R$400,00, recebia, R$200,00. Eram R$100,00 aqui. Quando terminasse a 8ª, teria R$600,00; aí recebia a metade, R$300,00. Aí continuava todo ano mais R$100,00. Quando terminasse o Ensino Médio, levava os R$600,00 que estavam lá.

            Esta é a lógica da idéia: é fazer com que, ao sentir esses recursos na sua conta, o aluno trabalhe até o fim do segundo grau para colocá-los nas mãos. Não os coloca nas mãos no primeiro momento, para vincular à conclusão do Ensino Médio. No caso dos seus filhos, das minhas filhas, é natural que eles terminem o segundo grau. No caso daqueles que têm de matar um leão por dia, a gente tem que fazer alguma coisa a mais.

            Agora, se o dinheiro que está se dando não é suficiente para sobreviver, aumentemos o dinheiro que se dá. Mas mantenhamos alguma coisa vinculada à conclusão do Ensino Médio. Sem isso, vamos continuar com o que a gente tem: uma evasão brutal. Metade - metade! - das nossas crianças deixa a escola antes de chegaram ao Ensino Médio. Temos que segurá-las até o final do Ensino Médio. Uma maneira que eu encontrei e que funcionava aqui no Distrito Federal era essa. Vamos dizer que eles têm esse dinheiro guardado; esse dinheiro está à espera deles, mas para isso eles têm que fazer um esforço. Qual esforço? Concluírem o Ensino Médio. Essa é a razão.

            Não sei se o convenci, não sei se expliquei bem, mas estou pronto para continuar conversando sobre isso.

            Sr. Presidente, eu quero concluir, então, pedindo desculpas ao Senador Duque pelo tempo que tomamos - não foi só minha fala, mas também os apartes que enriqueceram o meu discurso. Agradeço a sua generosidade quanto ao tempo, mas eu acho que foi inspiração sua usarmos a sexta-feira de uma maneira livre, como temos usado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/03/2010 - Página 6011