Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da aprovação hoje, na Comissão de Relações Exteriores, de voto de solidariedade aos presos políticos cubanos. Questionamento sobre as relações do governo brasileiro com regimes autoritários.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Registro da aprovação hoje, na Comissão de Relações Exteriores, de voto de solidariedade aos presos políticos cubanos. Questionamento sobre as relações do governo brasileiro com regimes autoritários.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Eduardo Suplicy, José Agripino, João Tenório.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2010 - Página 6880
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, VOTO, SOLIDARIEDADE, PRESO POLITICO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, REFERENCIA, MORTE, GREVE, FOME.
  • CRITICA, POLITICA EXTERNA, APROXIMAÇÃO, DITADURA, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, IRÃ, CUBA, VENEZUELA, BOLIVIA, PARAGUAI, COBRANÇA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ALTERAÇÃO, CONDUTA, PRIORIDADE, RESPEITO, VIDA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, PAZ, DEMOCRACIA.
  • QUESTIONAMENTO, INTERESSE, GOVERNO BRASILEIRO, DIREÇÃO, AGENCIA, AMBITO INTERNACIONAL, ENERGIA NUCLEAR, CONTRADIÇÃO, AMIZADE, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, IRÃ, DESCENTRALIZAÇÃO, ARMAMENTO NUCLEAR.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Presidente.

            Sr. Presidente, a Comissão de Relações Exteriores da Casa aprovou hoje um voto de solidariedade aos presos políticos cubanos, que se expressam nesta foto, que, aliás, não é a pior, não é a mais drástica - esta foto do Sr. Guillermo Coco Fariñas: 48 anos, se não me engano, ele está pele e osso, prestes a morrer. É uma foto que exibo com muita tristeza, com muita compaixão. É preso político.

            É um regime de presos políticos depois de cinquenta anos de sua implantação; portanto, a mais deslavada ditadura que sobrevive no mundo e que merece uma consideração absolutamente incompreensível por parte do governo brasileiro, que é responsável por dirigir uma república democrática, de democracia consolidada há 25 anos.

            Por outro lado, parece-me que temos algo mais do que uma coincidência. Alguns dirigentes do atual governo - o Deputado Pauderney Avelino nos dá a honra de visitar o Senado nesta tarde - dizem que “temos relações de amizade com o Sr. Fidel Castro”. Eu responderia que qualquer um é livre para ser amigo de quem quiser, mas é bom ser amigo para o bem. Seria bom usar essa amizade para influenciar o governo cubano a não praticar essas atrocidades.

            Na verdade, quando o Presidente Lula votava na Arena, eu apanhava nas ruas a defender a liberdade e, àquela altura, eu era simpatizante do regime cubano, eu tinha muitos sonhos na cabeça em relação a isso.

            Compreendi, com o tempo e com o amadurecimento, que aquilo não passa de uma ditadura sórdida, como outra qualquer. Não conheço nenhuma ditadura que não seja sórdida. A ditadura brasileira foi sórdida. E qualquer ditadura, qualquer regime de supressão da liberdade é sórdido no nascedouro, na essência, no espírito, na alma, na ação e na atuação.

            Mas, olhando os demais regimes autoritários do mundo, é difícil encontrarmos um com o qual o Governo brasileiro não ache afinidades.

            A Venezuela, em catastrófica situação econômica, cujo ingresso no Mercosul - para terminar de liquidar o Mercosul de vez - está sendo imposto goela abaixo dos brasileiros, marcha para um futuro que não dá nem para se definir o que será esse futuro, não dá para dizer que será uma ditadura, porque não sei se sobreviverá àquele regime.

            Eu sempre digo e repito à exaustão desta tribuna que os ditadores típicos latino-americanos têm três escolhas na vida ou três possibilidades - não é nem escolha deles. Primeira: eles começam a lutar para implantar o regime duro, pedindo ação e a palavra das oposições. O segundo gesto é implantar a ditadura por ela mesma, fechando o Congresso, fechando o Judiciário. O terceiro passo é ou o assassinato do ditador, ou a sua deposição, ou o ditador chega ao desatino de fazer guerra com algum vizinho. A pequena Guiana seria a primeira vítima do desvario totalitário do Coronel Chávez.

            Mas o Brasil não fica aí. O Brasil se relaciona com Ahmadinejad, o ditador do Irã. E os argumentos da diplomacia brasileira são risíveis. Dizem, por exemplo, que não podem negar ao Irã o direito de enriquecer urânio acima de 20% porque, senão, o Brasil estaria, também ele próprio, cassado nesse direito, quando nós sabemos que a Agência Internacional de Energia Atômica, a AIEA, já garante ao o Brasil o direito de enriquecer o urânio acima de 20%. E o Brasil, que enriquece o urânio acima de 20%, se quiser, é signatário do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares. Portanto, é um País considerado normal, respeitável e respeitador das normas internacionais perante o mundo. Ao contrário do regime de Cuba, do regime de Chávez, do regime do Irã, que são regimes celerados, regimes de desrespeito aos direitos básicos da pessoa humana. Sabemos que o objetivo claro do Irã é ir à guerra. O objetivo claro do Irã, no fundamentalismo que o anima, é atingir Israel com um artefato nuclear.

            Senador João Tenório.

            O Sr. João Tenório (PSDB - AL) - Senador Arthur Virgílio, V. Exª, mais uma vez, demonstra sua preocupação constante com a liberdade. Talvez pelo que passou quando jovem, o que exatamente marcou-lhe a personalidade e a maneira de ser de uma maneira muito contundente e recorrente. V. Exª não abre mão de olhar esses pontos que, de uma maneira ou de outra, atingem as liberdades democráticas. O que acho estranho no Governo é a incoerência do seu comportamento. Por exemplo, quando ele deu proteção ao Zelaya, alegou que era a humanidade, o humanismo que era necessário e conveniente naquele momento, esquecendo-se das regras do país, que diziam que o Sr. Zelaya não poderia mais ser Presidente por uma série de razões. Agora, alega que não deve se meter na questão do jovem que se suicidou lá porque é uma regra interna do país.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Segundo o Presidente, ele não se suicidou, mas se deixou morrer. É uma terminologia nova.

            O Sr. João Tenório (PSDB - AL) - É uma incoerência incompreensível do Governo. Eu acho que, no que diz respeito a essa questão, tem sido muito incoerente. No que diz respeito à questão nuclear, eu gostaria de lembrar um ponto aqui, Senador Arthur Virgílio, que me parece muito importante. V. Exª lembrou que o Brasil e o Irã têm uma situação parecida: se por acaso o Irã passar a produzir 20% de concentração, as coisas passam a ficar parecidas com a situação brasileira. O Brasil hoje passa meio despercebido dessa situação - despercebido eu não diria, há uma condescendência com o Brasil sobre essa situação, pelo nosso comportamento não belicoso, comportamento que nunca levou o País a pensar em nada além de efetivamente utilizar a energia nuclear para fins pacíficos. Mas na hora em que o Brasil se junta ao Irã, que tem possivelmente uma postura, um compromisso com ele mesmo diferente desse, sem sombra de dúvida haverá um foco muito mais intenso, muito mais rigoroso sobre a nossa indústria nuclear. Eu acho que, independentemente de questões ideológicas, políticas, esta questão tem que ser levada em conta: o risco que corre a nossa indústria nuclear por nos ligarmos muito ao Irã, que está com todo o foco dos institutos, das instituições que controlam rigorosamente essa questão. E o Brasil tem tido uma certa condescendência exatamente pela sua postura, pelo seu comportamento histórico. Eu passei três dias em Angra dos Reis, conversei com o pessoal, e eles nos disseram que há um bom entendimento, uma boa vontade imensa dessas instituições, da ONU e tantas outras para com a situação brasileira. Mas, na hora que o Brasil se liga e diz que é parecido com o Irã, e não há esse enfoque, não há essa visão, não há a percepção dessas instituições com o Irã, isso pode vir a contaminar a nossa indústria nuclear.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador João Tenório, que fala sempre com a voz da razão, a voz da sensatez. Mas é um desfile, Senador José Agripino, de ditadores à frente do nosso País, prestigiados pelo nosso Governo; candidatos a autoritários, como por exemplo Evo Morales, Hugo Chávez - já o citei - e o Presidente não se deu conta de que se sua popularidade se mantém - imagino que se mantém alta; e isso é uma questão basicamente do povo brasileiro, eu nada tenho a ver com isso -, ele já sofreu um grande arranhão internacional, passou sete anos construindo uma imagem internacional, do operário que chegou ao poder, do democrata com uma história bonita, de ascensão social, inclusive mostrando como o Brasil seria um País de oportunidades, chegou ao Governo, inclusive, continuando políticas econômicas sensatas e mantendo o País equilibrado do ponto de vista macroeconômico, ele coloca por terra toda essa imagem quando vira parceiro e protetor de ditadores, ele que já fez...

(Interrupção do som.)

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Não sei se é o microfone. Se fosse em Cuba, já saberíamos o que era, mas como é no Brasil... Enfim, o fato é que, Sr. Presidente, o Brasil não poderia ligar a sua imagem a isso, o prejuízo é tão grande, Deputado Pauderney Avelino, aquele que ainda não podemos mensurar, que ele vai se refletir nas possíveis e futuras derrotas que o Brasil colherá quando colocar nomes disputando direção de organismo internacionais.

            O Brasil chegou a ter a pretensão, várias vezes publicada nos jornais, de presidir a Agência Internacional de Energia Atômica. Será que alguém, em sã consciência, acredita que é possível isso, que os demais países entregariam ao Brasil a direção da Agência Internacional de Energia Atômica se ele consegue manter relações privilegiadas com um regime celerado como o do ditador do Irã, regime celerado, regime marginal, regime fora da ordem internacional?

            Eu entendo, Sr. Presidente, que era preciso o Presidente dar uma mergulhada nas suas águas mais profundas e dela emergir com o sentimento do democrata que sempre procurei nele enxergar. Eu me condoo quando vejo o Sr. Fariñas à beira da morte. Decididamente - só um minuto, Senador Magno Malta -, à beira de morte, e nenhuma solidariedade. Intelectuais brasileiros que sempre foram tão ativos, de repente se omitem a dar solidariedade a quem vai morrer, aos morituri, presos políticos de Cuba. Eu não consigo entender essa incoerência, essa falta de respeito pela vida humana. Eu não consigo entender.

            Mas o fato é que o Brasil perde na sua imagem internacional, porque o Brasil deveria ter alguns princípios, não importa o sonho de juventude de quem quer que tenha sido. Não importa o compromisso anterior de vida, não importa até a simpatia pessoal. O Brasil tem que ser inflexível. Ferida aos direitos humanos tem que ser repudiada pela Diplomacia brasileira, pelo Governo brasileiro, em qualquer circunstância, em qualquer época, em qualquer latitude, venha de onde vier.

            Não podemos tolerar tortura em Guantánamo. E o Presidente Obama deve mesmo buscar fechar essa prisão, que não honra a tradição democrática do seu país. Não podemos tolerar a tortura de Esquerda. Não existe tortura progressista. Não existe tortura esquerdista. Não existe tortura do bem. Existe a falta de respeito à pessoa humana, que tem sido tolerada pelo Governo brasileiro. E essa, Sr. Presidente, não pode encontrar silêncio por parte da Liderança do PSDB. Não pode.

            Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Arthur Virgílio, eu aproveito a sua fala para, daqui, num aparte, solidarizar-me com o discurso feito ontem pelo Senador Suplicy. Uma linha parecida com a sua, obviamente não precisa ser igual. E falo aqui como Presidente da Comissão de Direitos Humanos. Eu não posso ficar calado diante do que está acontecendo. Eu considero inaceitável que nós fechemos os olhos e a boca para o fato de haver pessoas fazendo greve de fome por causa de suas opiniões. Eu não posso ficar calado, apesar de toda a simpatia que tive durante toda a minha juventude à Revolução Cubana. Até continuo tendo simpatia por muitos dos aspectos, por outros não tenho, e esse especialmente. Sobre o Presidente Lula, eu quero dizer que, mesmo que fossem presos comuns, bandidos fazendo greve de fome, a gente tinha que conversar com eles, tinha que dialogar, não podia deixar que morressem de uma maneira absurda como essa. E, finalmente, lembro que a greve de fome é um instrumento perfeitamente válido, que ficou marcado na história. Ontem, o Senador Suplicy lembrou Mahatma Gandhi, que fez a independência de seu país graças às sucessivas greves de fome e à compreensão dos colonialistas britânicos que negociavam com ele, na medida em que era preciso, no momento certo. Lamento muito que, em Cuba, uma pessoa tenha morrido e outras estejam em véspera de morrer por falta de diálogo e que eles estejam em greve de fome por suas opiniões. Deixo aqui o meu protesto, a minha solidariedade ao Senador Eduardo Suplicy e meu apoio à sua preocupação.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Agradeço a V. Exª, Senador Cristovam Buarque e concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Arthur Virgílio, primeiro considero que o Presidente Lula tem tido méritos extraordinários para ser considerado hoje um dos Chefes de Estado com maior credibilidade e importância...

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Então não deve jogar isso fora, apoiando ditaduras.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - E isso em função de tantos passos que ele deu na melhor direção. Inclusive, por vezes, colaborou para o melhor entendimento entre outros Chefes de Estado que tiveram divergências sérias. Logo de início, por exemplo, ele criou o Clube dos Amigos da Venezuela para tentar resolver o problema do golpe de estado que havia ameaçado o Governo Hugo Chávez. Em outras ocasiões, vimos o Presidente Lula também ajudar a superar...

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Mas, Senador, quando o Hugo Chávez foi deposto, por horas, por dias, o Presidente era Fernando Henrique, que foi solidário com ele naquele momento. Não foi Lula.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - É verdade, mas foi do Presidente Lula a iniciativa para criar o Grupo de Amigos, que incluía os Estados Unidos, o México, a Colômbia, o próprio Brasil e outros. Também, em mais de uma ocasião, o Presidente Lula ajudou a superar obstáculos, ainda que com dificuldades, nos diálogos entre o Presidente Álvaro Uribe e o Presidente Hugo Chávez. E ele teve um diálogo muito positivo com o Presidente George Walker Bush. Mesmo quando discordou da intervenção militar no Iraque, teve um atitude construtiva e respeitosa, como vem tendo também com o Presidente Barack Obama, com o Presidente Nicholas Sarkozy. Não é à toa que ele é hoje tão bem considerado pelos Chefes de Estado do mundo inteiro. Mas ontem ainda - afirmei e quero aqui, em consonância com o propósito maior de V. Exª... Eu participei da fundação do Partido dos Trabalhadores e ontem assinalei que, nos documentos de nascimento do Partido dos Trabalhadores, nós ressaltamos que é preciso a busca da justiça, da igualdade, sempre com democracia, com respeito aos direitos da pessoa humana. Temos lá documentos do nascimento do PT, onde dizemos que o socialismo só existe com democracia. Uma coisa depende de outra. Eu, em algumas ocasiões, aqui ressaltei as observações de Rosa Luxemburgo sobre a Revolução Russa: liberdade apenas para os membros de um governo, de um partido, por mais que ele seja, não é liberdade. Liberdade só é liberdade para quem pensa diferente. Ou seja, nós precisamos dizer para o Presidente Lula - eu, hoje, estou no exercício da Liderança do Partido dos Trabalhadores - que é importante que ele transmita ao Presidente Raúl Castro, ao Comandante e ex-Presidente Fidel Castro, com muita amizade, com a mesma amizade com que ele e João Paulo II foram recebidos - e João Paulo II disse aos cubanos que era necessário compatibilizar justiça com liberdade, justiça com liberdade religiosa, liberdade de pensamento. Eu aproveito essa oportunidade para solicitar ao Presidente José Sarney informação sobre resposta ao convite que enviou à Embaixada de Cuba, por solicitação do Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Senador Demóstenes Torres, por volta de novembro do ano passado. Ele encaminhou convite à Srª Yoani Sánchez, para que ela possa vir ao Senado falar das condições do cotidiano da vida em Cuba. Quero dizer que avalio ser próprio o Governo cubano demonstrar ao Congresso Nacional brasileiro, ao Senado brasileiro, que hoje estão caminhando na direção da liberdade de pensamento, da liberdade de expressão, inclusive para uma pessoa que escreve com a repercussão da Srª Yoani Sánchez, que faz críticas ao cotidiano da vida cubana e que são, conforme ontem eu disse, menos ferinas, por exemplo, do que os pronunciamentos que V. Exª por vezes faz com respeito ao Governo do Presidente Lula, à situação presente. Mas o Presidente jamais pensou em cercear o direito de V. Exª e de todos os Senadores da Oposição de expressarem críticas a quaisquer aspectos da vida brasileira. Então, quero até assinalar que considerei muito importante o artigo que o ex-Ministro da Justiça, José Carlos Dias, escreveu hoje em Tendências e Debates da Folha de S.Paulo. Ele recorda o momento em que acompanhou Frei Chico, irmão do Presidente Lula, à prisão, quando foi preso com Dalmo de Abreu Dalari e o Presidente Lula no Deops. Ele recorda as inúmeras situações de prisioneiros políticos, muitos dos quais amigos de Frei Betto, Frei Tito e outros, que, muitas vezes, realizaram greves de fome para protestar contra a situação em que então estavam, prisioneiros políticos que eram. Então, eu acho que até em memória de pessoas como Mahatma Gandhi, há pouco citado por Cristovam Buarque, Nelson Mandela, que fez uma grave de fome por seis dias, até que pudesse seu filho de três anos visitá-lo onde estava preso, e tantas pessoas no Brasil e em outros lugares...

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Em memória, também, de Orlando Zapata, que morreu fazendo greve de fome em Cuba, por absoluto descaso e crueldade daquele regime.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Também quero aqui externar que quero ver o Presidente Lula transmitir sua preocupação ao governo cubano com o mesmo sentimento de amizade e assertividade com que João Paulo II, tão bem recebido em Cuba, falou com respeito à importância de se ampliarem as liberdades religiosas - no que foi bem sucedido. Tanto é que Bento XVI, em dezembro passado, ao receber o Embaixador de Cuba na Santa Sé, disse: felizmente, hoje, o governo cubano está permitindo que missas estejam se realizando em Cuba com muito maior frequência do que antes acontecia, inclusive, hoje, nos cárceres. Então, houve ali um progresso. Ou seja, quando uma pessoa, com sinceridade, explicou ao Presidente Fidel Castro, perante o povo cubano, que era importante se ampliar a liberdade religiosa, ela conseguiu isso. E o Presidente Lula está em condição excepcional de, ao mesmo tempo em que defende o fim do bloqueio dos Estados Unidos a Cuba, defender também a ampliação das liberdades democráticas da pessoa humana em Cuba. Obrigado pela atenção.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado a V. Exª, Senador Suplicy. Eu tenho V. Exª na conta de um humanista. V. Exª, hoje, não está só no exercício da Liderança do PT; V. Exª é o único petista presente - e tem sido assim por algumas sessões. Os assuntos vão correndo e parece que não houve nada. Não houve o escândalo do Bancoop... Parece que não houve nada! Mas eu respeito V. Exª e respeitei sua anuência, hoje, na votação na Comissão de Relações Exteriores; esse voto de solidariedade aos presos políticos cubanos.

            Eu vou ser bem simples. Senador José Agripino, na juventude eu me considerava comunista. O Presidente Lula, não; ele era anticomunista. Ele era visto por nós com desconfiança. Nós não confiávamos nele. E ele, talvez, estivesse certo. Ele era muito pragmático e dizia coisas do tipo assim...

(Interrupção do som.)

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Alguém perguntou a ele uma vez: “Lula, você é comunista ou não?”. Ele disse: “Não, eu sou torneiro mecânico”.

            Eu não me arrependo um minuto da crença que tive. Mas eu deixei de tê-la na medida em que percebi que aquilo não resolvia a questão ambiental, só agravava; não resolvia a questão econômica e social; não distribuía riqueza; criava uma nova classe - que era a do partido. Hoje, Cuba está de um jeito que, até para uma moça se prostituir naquele Varadero, naquele local de veraneio, ela tem que ser ligada a alguém do Partido Comunista de Cuba. Essa é a realidade triste.

            Eu recomendo a V. Exª e a todos que leiam Pedro Juan Gutiérrez, que não é um direitista do tipo que adoraria morar em Miami. Ao contrário. É alguém que foi militante do Partido Comunista, foi professor de marxismo-leninismo da escola secundária, e que se desiludiu. Ele escreveu, por exemplo: Trilogia Suja de Havana; o Rei de Havana, e mais uma dezena de livros que ele produz. É uma figura tão importante, Senador José Agripino, que não se pode impedir que ele saia de Cuba. Ele sai e entra na hora em que ele quiser, e o governo cubano adoraria que ele saísse e não voltasse, mas ele volta, porque quer ficar lá para ver o seu país de novo... de novo, não, porque nunca viveu experiência de liberdade, mas viver um dia sob a égide de um regime de liberdade.

            Eu quero deixar bem claro: o Brasil tem alguns pressupostos... Preciso de um pouco de tempo, Sr. Presidente, para dar um aparte ao Senador José Agripino e para concluir. Veja bem, Senador Suplicy, eu vou ser bem claro. O Brasil tem alguns princípios dos quais ele nunca se afastou, nem no período do regime militar: o princípio da não-intervenção, da autodeterminação dos povos. Isso vem de governo para governo, como um patrimônio da diplomacia brasileira. O Brasil achou que podia intervir nos negócios internos de Honduras. Muito bem. Agora, há outros princípios que o Brasil tem que observar, como a democracia. A amizade fica em quinto plano. O Brasil não pode tolerar tortura, não pode estimular ditaduras, nem prestigiar ditadores.

            Eu digo a V. Exª: sou contra tortura em qualquer lugar. Sou contra tortura em Guantánamo, sou contra tortura numa delegacia brasileira, sou contra tortura em Cuba, sou contra tortura em qualquer lugar. Eu sou a favor de regime democrático, onde quer que eu possa vê-lo manifestado, e sou a favor de apoiar qualquer iniciativa que ajude algum povo a experimentar essa coisa boa e contraditória, mas bonita, que é a democracia, que o Brasil, por exemplo, experimenta hoje.

            Eu não estou aqui por uma concessão do Presidente. V. Exª e eu lutamos tanto para estarmos aqui, os dois - V. Exª dizendo uma coisa e eu dizendo outra e, muitas vezes, para alegria minha, nós dois dizendo a mesma coisa, como, por exemplo, a condenação a torturas, que faz parte da sua vida e faz parte da minha vida também. Eu estou aqui por designação do povo do Estado do Amazonas e estou aqui porque lutei também, como Lula lutou, por um regime democrático que me garante dizer o que digo. Em Cuba não é assim.

            Ou seja, para o Brasil seria tão simples dizer: “sou contra ditaduras. Não apoio. Voto contra regimes ditatoriais em qualquer organismo internacional”.

            Essa solidariedade precisaria acabar para o Brasil cortar esse cordão umbilical triste que o tem ligado nos últimos anos a esses regimes. Dialogar com esses regimes, manter diplomatas lá, manter embaixadores lá, isso é normal, é natural; não vejo que deva ser diferente. Mas está passando um ar de solidariedade, está passando um ar de cumplicidade. Isso é uma coisa grave, isso é ruim, isso suja a imagem do próprio Presidente no exterior e suja a imagem do Brasil.

            Senador José Agripino.

            O Sr. José Agripino (DEM - RN) - Senador Arthur Virgílio, há um ditado popular que diz: diz-me com quem andas e direi quem és. Quero fazer uma reflexão com V. Exª. O Presidente Lula, que tem grandes méritos, e tem defeitos, procura se acompanhar e se sente muito à vontade com figuras - veja se V. Exª não concorda cem por cento comigo - do tipo Ahmadinejad, Kadhafi, Evo Morales, Chávez, Lugo. V. Exª já viu uma fotografia do Presidente Lula com o premier Singh, da Índia? O Brasil, a Rússia, a Índia e a China formam o Bric. Devia ser um clube de pessoas que se afinassem e que tivessem interesses comuns. Já vi dezenas de fotografias, gostosamente tiradas, do Presidente Lula com o Evo Morales, de Lula com o Ahmadinejad - aquele que fica segurando na mão -, de Lula com Kadhafi. Agora, vê-se alguma fotografia de Lula com o Hu Jintao, que é o premier da China? Com o premier Singh, da Índia, ou com Putin, da Rússia? Ninguém vê. Ele não se sente à vontade, ele é afim com essas figuras que eu acho que não são o que de melhor convenha ao Brasil. O Presidente Lula tem uma afeição especial por Cuba, legítima. Cuba é um país pelo qual eu tenho um apreço especial, pelo país e pelos cubanos. Agora, não pelos erros de Cuba, não pelos erros de Honduras, não pelos erros de Fidel Castro. O Presidente Lula chega ao requinte de defender... Para ele, se for da turma dele, não tem defeito. Eu nunca vi uma palavra de admoestação do Presidente Lula a Chávez, a Lugo, a Evo Morales, a Ahmadinejad. A nenhum deles, nunca. A Fidel Castro, muito menos. E, quando se ataca alguma coisa de errado no regime de Fidel Castro...

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Eles não se pejam, Senador Agripino, de ofender a democracia italiana, no caso Battisti, e, ao mesmo tempo, no caso dos boxeadores cubanos, nós vimos como agiu o Governo brasileiro.

            O Sr. José Agripino (DEM - RN) - Senador Arthur Virgílio, quando o Presidente Lula foi criticado pelo fato de não se ter manifestado corretamente no caso recente de Cuba, de duas pessoas, um que já se suicidou, o pedreiro Zapata, e outro, o Fariñas, que está em vias de se suicidar - está esquálido, desidratado, a caminho da morte -, o que me preocupa é que esse acordo entre amigos está levando a coisas do tipo: vamos esconder o que está ocorrendo em Cuba com uma reação truculenta. Na hora em que há uma acusação sobre fatos que deveriam estar ocupando as manchetes internacionais só com acusação, aparece um líder, que é brasileiro, para defender ou para acusar aqueles que se suicidam pela greve de fome. Aparecem com argumentos do tipo: “Não posso interferir na justiça de um país estrangeiro”. Gozado, não hesitou em afrontar a justiça italiana no caso Battisti. Gozado, não pensou duas vezes em afrontar a justiça de Honduras no caso Zelaya, quando a justiça mandou que se realizassem eleições. É curioso, é uma sucessão de incoerências que eu acho que V. Exª, com o discurso que faz, repõe para este plenário, para que o Brasil reflita sobre o que nós estamos vivendo, porque democracia tem padrão universal: ou é democracia ou não é. Ou então é farsa, ou são dois pesos e duas medidas. A democracia que o Primeiro-Ministro Gordon Brown defende para o mundo tem de ser a mesma de Sarkozy, tem de ser a mesma do Presidente Obama, tem de ser a mesma de Zapatero, tem de ser a mesma de Durão Barroso, tem de ser a mesma de Fidel Castro, de Lula, de Zelaya, de todos eles e não dois pesos e duas medidas. Muito menos que o Brasil se apresente no plano internacional da forma defeituosa como está se apresentando. Eu quero cumprimentar V. Exª pela manifestação que faz, coerente, correta, que traz à reflexão deste plenário uma questão importante, que é a postura democrática de estadista que quer ser estadista e que, sendo estadista, quer merecer o respeito internacional.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Presidente. Eu concluo, peço a V. Exª um pouquinho de tempo para concluir. Eu gostaria de um minuto ou dois para agradecer o aparte do Senador José Agripino, que é consistente, que é lúcido, que vem cheio de dados e que só contribui para reforçar as ideias que procurei expender neste pronunciamento.

            O fato é que deveria haver um comportamento padrão, Senador Jayme Campos, um comportamento padrão. Tortura, o Brasil é contra, não importa de onde venha. Agressão aos direitos da pessoa humana, o Brasil é contra, não importa de onde venha, não importa quem pratique essa agressão aos direitos fundamentais da pessoa humana. Tem de ser no escuro, não se vê o cabeçalho, não se vê quem praticou o malfeito. O Brasil tem de ser contra e tem de assim proceder nas votações nos organismos internacionais, sob pena de estarmos contribuindo para estender, esticar, alongar o sofrimento de povos.

            Cuba saiu da infeliz, cruel, sangrenta e corrupta ditadura de Batista para entrar na sangrenta, cruel, fria e corrupta ditadura de Fidel Castro. Não conheço nenhuma ditadura que não venha, no fundo, no fundo, para acobertar corrupção. Não conheço nenhuma, nenhuma. Há inocentes que podem até fazer a repressão sem se locupletarem pessoalmente - eles, inocentes, pobres ingênuos -, mas nenhuma ditadura, no fundo, no fundo, deixa de ter como escopo fundamental a prática da corrupção.

            Então, para mim, tanto faz ser de esquerda, ser de direita, ser de centro. Não quero saber a cor da ditadura. Eu sou contra a ditadura e entendo que o Governo brasileiro deveria ser exortado a ter esse comportamento. Manter relação até com ditaduras pode manter, mas dar estímulos a que elas se reproduzam como modelo é algo que ofende a democracia pela qual tanto lutou o próprio Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

            Muito obrigado.

            Era o que eu tinha a dizer.


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