Discurso durante a 29ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Histórico da República no Brasil, destacando seus diversos presidentes e defendendo a tese de que o Estado do Rio de Janeiro dê ao País, por um político com atuação no Estado, um Presidente da República.

Autor
Paulo Duque (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RJ)
Nome completo: Paulo Hermínio Duque Costa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. HOMENAGEM.:
  • Histórico da República no Brasil, destacando seus diversos presidentes e defendendo a tese de que o Estado do Rio de Janeiro dê ao País, por um político com atuação no Estado, um Presidente da República.
Aparteantes
Alvaro Dias, Geraldo Mesquita Júnior.
Publicação
Publicação no DSF de 13/03/2010 - Página 7015
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. HOMENAGEM.
Indexação
  • REITERAÇÃO, DEFESA, POSSIBILIDADE, ELEIÇÃO, POLITICO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PRESIDENCIA DA REPUBLICA, REGISTRO, HISTORIA, REPUBLICA, BRASIL, DESCRIÇÃO, ESTADOS, NASCIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUSENCIA, UNIFORMIDADE, ATENDIMENTO, REGIÃO, PAIS.
  • HOMENAGEM, PINHEIRO MACHADO (RS), EX SENADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), COMENTARIO, HISTORIA, ATUAÇÃO, ELOGIO, VIDA PUBLICA, LEITURA, TRECHO, ATA, REGULAMENTAÇÃO, DISPUTA, EX-CONGRESSISTA, JORNALISTA, JORNAL, CORREIO DA MANHÃ, DISTRITO FEDERAL (DF).

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            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - V. Exª, Presidente Geraldo Mesquita, acaba de revelar um segredo de elegância. De qualquer maneira, nosso fotógrafo fez questão logo de ver o modelo. Mas, realmente, a classe, a categoria dos alfaiates está desaparecendo. Não é só do Rio de Janeiro não. É do Brasil inteiro. Demorei muito a encontrar um alfaiate aqui em Brasília, até que encontrei um que conseguiu fazer um terno para mim, com fazenda comprada aqui.

            Brasília merece todas as minhas homenagens. Brasília merece todas as minhas homenagens. Brasília merece todos os meus cuidados porque, na época em que foi criada mesmo para funcionar, na época em que os trabalhadores do Brasil inteiro conseguiram dizer “está pronto, Presidente, pode funcionar”, eu fui um dos que estive aqui. Por acaso, era do Ministério da Educação e estive aqui, mas não fiquei por uma série de motivos supervenientes. Então, Brasília - eu tive ocasião já de dizer -, para mim, é a Cidade Maravilhosa dois, porque a Cidade Maravilhosa um é o Rio de Janeiro.

            Sexta-feira é um dia dedicado a se falar para milhões de brasileiros que estão nos ouvindo. Não importa que o plenário esteja mais ou menos cheio. Tivesse só um Senador presidindo e só um Senador na tribuna, nós estaríamos sendo ouvidos por milhões de pessoas lá de cima do Acre até o Rio Grande do Sul, Minas Gerais, São Paulo. E eu tenho uma grande satisfação em dizer que, às vezes, recebo pedidos telefônicos de São Paulo, de Minas, de cidades do interior, solicitando livros, solicitando cópias de discurso, solicitando uma série de coisas que interessam ao povo ou que ao povo é dirigido.

            Hoje, com a liberdade que nós temos por ser uma sexta-feira tranquila, quero bater bem naquilo que venho defendendo há tempos. Defendo que a cidade do Rio de Janeiro, capital do novo Estado do Rio de Janeiro, tenha um Presidente da República. Até hoje nós não tivemos um Presidente da República, político. Até hoje, as forças partidárias não conseguiram ter para o Brasil um Presidente da República. E eu afirmo isso e trago aqui a relação.

            Digo aos Senadores de Alagoas, por exemplo, que seu Estado já teve o Marechal Deodoro e o Marechal Floriano. O Rio Grande do Sul já teve quatro Presidentes. Nem falo só do Rio Grande do Sul, mas vou mais além. Aliás, acho que o Rio Grande do Sul já teve mais. Se incluirmos os generais, o General Médici, o General Costa e Silva, o General Geisel, teve mais. Isso sem falar de Getúlio, por um breve período de tempo, e no Jango. Teve mais, muito mais.

            Mas vamos começar pelo começo: Deodoro e Floriano, ambos de Alagoas; Prudente de Moraes, de São Paulo. Com Prudente ocorreu uma coisa interessante, Presidente. Ele foi substituído, esteve doente, teve de ser operado, foi substituído por um vice, que era da Bahia, Manuel Vitorino, que pensou que Prudente talvez não retornasse. Então, reformou todo o Ministério, mudou a sede do governo, que era no Palácio do Itamaraty, na Rua Larga, antiga, comprou o Palácio do Catete do Conde de Nova Friburgo, instalou ali a sede do governo. Mas aí Prudente de Moraes ficou bom, retornou ao governo numa tarde, sem falar com ninguém, assumiu e nunca mais falou com o Vice-Presidente. Vejam só a nossa política, a nossa história, como é rica nesse tipo de detalhes, às vezes passionais.

            Em seguida vem Campos Salles, depois Rodrigues Alves, todos os dois de São Paulo. Então, São Paulo tem todos os motivos para ser um dos Estados mais ricos e mais fortes da República, porque, durante a primeira fase da República, a Presidência foi entregue a três paulistas, que deram o melhor do seu esforço.

            Mas aí Minas começa a acordar: “Não, agora é Minas! E vem Affonso Penna. Affonso Penna, imaginem, faleceu no Palácio do Catete, trabalhando, e foi substituído, por algum tempo, pelo Vice-Presidente, que era do antigo Estado do Rio, Nilo Peçanha, que ficou apenas alguns meses lá.

            Em seguida, articulado por Pinheiro Machado, que foi um dos grandes Senadores da República, chega ao poder Hermes da Fonseca, que foi Ministro da Guerra de Affonso Penna - tem um bairro inteiro com o seu nome no Rio de Janeiro, o Marechal Hermes. Um dos homens mais discutidos da República, chegou a ser Senador pelo Rio Grande do Sul, mas não tomou posse, não quis tomar posse. Casou-se com uma grande dama na época, filha do Barão de Tefé, que inaugurou um ciclo novo social no Palácio do Catete. Dona do antigo cinema Rian, ela, como caricaturista e artista, assinava Rian. Estou dizendo isso a V. Exª, que é do sul, e talvez se interesse por alguns detalhes.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Com certeza, Senador.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Mas chegou a vez de Minas Gerais, de novo. Minas mais uma vez no governo, com Wenceslau Braz.

            Mas vejam bem. Rui Barbosa resolve disputar a eleição. Ele tinha todo o talento do mundo, mas não tinha os votos, não tinha a estrutura eleitoral necessária para ganhar a eleição. Podia ser o maior sábio, mas não tinha as condições, e é derrotado pelo Wenceslau Braz, de Minas Gerais.

            Em seguida, vem Delfim Moreira, que morre muito cedo e não consegue terminar o governo. Era mineiro também. E Delfim Moreira tinha a saúde um pouco precária. Morreu muito cedo, não pôde mostrar a que veio para governar o Brasil. E é realizada uma nova eleição, Presidente, desta feita deixando de lado São Paulo e Minas. E é escolhido o Estado da Paraíba, com Epitácio Pessoa.

            Rui Barbosa não se conforma com isso e disputa a eleição contra Epitácio Pessoa, que, por incrível que pareça, vence o pleito estando fora do País, representando o Brasil no Tratado de Versalhes, no final da Primeira Guerra Mundial. É impressionante como era a política antigamente! Não tinha táxi, telex, digitação. Comunicação difícil. Mesmo assim, Epitácio Pessoa venceu a eleição fora do País, e de Rui Barbosa, um dos maiores brasileiros de todos os tempos.

            Epitácio era um nacionalista. Homem de muito vigor, não hesitou em fazer uma coisa praticamente impossível na época: colocou, como seu Ministro da Guerra, Calógeras; Pandiá Calógeras, Ministro da Guerra; e, Ministro da Marinha, Veiga Miranda. Já imaginou, Presidente? Um início do que está sendo feito hoje, em que temos um civil chefiando as Forças Armadas. Olhe só!

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - O gaúcho Nelson Jobim.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - É o Nelson Jobim. Só dá gaúcho aqui. Com Epitácio Pessoa, já tínhamos lá o Ministro da Guerra Calógeras, que não hesitou em prender o Marechal Hermes. Não hesitou: “Esteja preso”.

            Então, começou uma espécie de ebulição nas Forças Armadas, na política. Surgiu daí o chamado tenentismo, que foi brilhante, e houve o dia 5 de julho, o primeiro, a Revolta dos Dezoitos do Forte de Copacabana. Houve o segundo 5 de julho, em 24, contra São Paulo. Houve os cangaceiros de Lampião, fato que foi importante - comemoramos outro dia aí o Dia da Mulher; eu não pude comparecer, mas a minha intenção era vir aqui para falar sobre as cangaceiras, inclusive Maria Bonita, que foi objeto de tantas pesquisas e ainda hoje é, fez cem anos no Dia Internacional da Mulher. Não pude estar aqui presente, mas usei da palavra ontem ainda.

            E, com Epitácio Pessoa, começa uma espécie de guerra contra a classe política, porquanto o sucessor de Epitácio devia ser Arthur Bernardes, um grande nome, um grande nacionalista de Minas Gerais - era o Governador de Minas Gerais.

            Surgiram as cartas falsas que eram atribuídas a Bernardes. Essas cartas ofendiam o brio dos militares, que não aceitavam Bernardes de jeito nenhum. O clube militar fez uma série de reuniões para impedir isso, mas as cartas já estavam na mesa, a candidatura dele posta, de Arthur Bernardes, e, com o apoio do Governador de São Paulo, Fernando Prestes, pai de Júlio Prestes, ele afinal, Epitácio, garante a posse de Arthur Bernardes, que foi um grande Presidente: nacionalista, um patriota e que consegue passar o poder ao seu sucessor, dessa vez de São Paulo, Washington Luís.

            Quando V. Exª for ao Rio, Senador Cristovam Buarque, quando for passear ali na Avenida Atlântica e entrar no Forte de Copacabana, faça uma visitinha lá na sala em que, por vinte e quatro horas, ficou preso Washington Luís. Ele foi deposto, saiu do Palácio Guanabara, foi conduzido até o Forte de Copacabana, lá ficou preso vinte e quatro horas; embarcou no dia seguinte para o exterior e só regressou - veja só isso, como é interessante o detalhe histórico e moral - ao País depois que o chefe da Revolução de 30, Getúlio Vargas, foi deposto, em 1947.

            São detalhes que se passaram no Rio de Janeiro. É por isso que, quando eu falo no Rio de Janeiro, o pessoal diz: “Não, ele está falando muito do Rio”. É que o Rio, a História do Brasil foi escrita quase toda ela no Rio de Janeiro. E eu seria um insensato muito grande se não aproveitasse essa fase estrondosa, maravilhosa, brilhante deste Senado Federal, que ultrapassou com tanta classe essas crises políticas todas, representando o Brasil, se eu não pudesse lembrar desses fatos aqui. Porque, de lá, a capital veio para cá. Não fui contra, jamais fui contra isso. Acho que foi o grande passo. Como disse já o Senador Cristovam Buarque, foi uma epopeia. Claro que foi uma epopeia, como tivemos outras epopeias no Brasil.

            Mas a verdade é que Bernardes entrega o cargo, Minas entrega o cargo a São Paulo de novo, a Washington Luís. Veja, Presidente, como é interessante isto: estou dizendo que a cidade do Rio de Janeiro nunca teve um Presidente; não posso contar Washington Luís como tendo nascido em Macaé; ele é conhecido como o paulista de Macaé, porque nasceu no antigo Estado do Rio, em Macaé, foi para São Paulo, fez toda a sua vida política lá em São Paulo, foi Prefeito da capital, foi Deputado, foi tudo, Governador, e se elegeu Presidente da República, mas tudo por São Paulo. Ele nasceu em Macaé, mas eu não posso contá-lo como sendo um homem do Estado do Rio de Janeiro. Da mesma maneira, eu não posso contar o atual Presidente da República como tendo sido um homem de Pernambuco. Nasceu em Pernambuco só, mas desde cedo foi para São Paulo. Ele é Presidente de todos brasileiros, mas politicamente ele é muito mais paulista do que pernambucano, não tenho dúvida disso. “Ah, mas o Fernando Henrique nasceu...” Onde? Pode ter nascido no Rio, mas jamais fez política no Rio. A sua vida acadêmica sempre foi em São Paulo, tipicamente. Jango, João Goulart, Getúlio, sempre no Sul.

            V. Exª, Presidente, vê que não aparece o Rio de Janeiro, a cidade do Rio de Janeiro, os políticos do Rio de Janeiro, da capital da República. Durante esses anos, não aparece, na Presidência da República, nenhum deles.

            E o Ceará, já deu alguém? Sim, já deu, mais ou menos. Eu diria que José Linhares, que presidiu este País durante cinco meses, seis mais ou menos, mas foi do Ceará. Eu diria que Castelo Branco, o General Castelo Branco, foi do Ceará. Viveu no Rio na época do Juracy, de Cordeiro de Farias, dos tenentes, etc., mas era cearense.

            E Mato Grosso teve Presidentes, Geraldo Mesquita? Teve? Senador Geraldo Mesquita, teve dois: Eurico Gaspar Dutra e Jânio Quadros. Jânio, embora tenha feito sua carreira política em São Paulo, como vereador, prefeito, etc., ele, pelo menos de nascimento, foi de Mato Grosso. Eu computo dois Presidentes para Mato Grosso.

            O Rio de Janeiro, a cidade, a antiga capital, ainda não tem um Presidente.

            Vem Getúlio e depois o Rio Grande do Norte. Por que o Rio Grande do Norte? Porque João Café Filho era rio-grandense-do-norte. Foi Deputado muito tempo pelo Rio Grande do Norte e assume quando ocorre a maior tragédia da República, que foi o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954. Ele assumiu e foi deposto em 1955, mas são coisas da política.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Permite-me um aparte, Senador?

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Concedo um aparte a V. Exª, dizendo finalmente que Nereu Ramos, de Santa Catarina, também assumiu para dar posse a Juscelino. Até agora, a cidade do Rio de Janeiro, a capital da República antiga, não aparece na escala dessa sucessão.

            Concedo um aparte a V. Exª, com o maior prazer.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Muito obrigado, Senador Paulo Duque. Veja como as coisas são: hoje em dia, teríamos uma grande chance de ter um autêntico e legítimo carioca na Presidência da República. Bastaria que nosso Partido - o PMDB - criasse vergonha e indicasse um candidato à Presidência da República, que poderia ser Sérgio Cabral, nosso Governador do Rio, um grande carioca. Então, V. Exª não precisaria vir mais à tribuna para dizer que o Rio nunca teve um Presidente da República. Teríamos um autêntico carioca na Presidência da República.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - É verdade.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Bastaria que nosso Partido agisse dessa forma.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Mas o PMDB sempre foi, desde que me conheço, um Partido muito contraditório. Recentemente - lá se vão alguns anos -, lançou um grande Presidente, que era Ulysses Guimarães; e foi aquilo que se viu. Lançou Orestes Quércia, e foi aquilo que se viu. Ele é muito grande, mas falta alguma coisa além dessa grandeza, que é aquele sentido doutrinário de união, que vem ao encontro exatamente do que V. Exª acaba de dizer. Se ele tivesse sido candidato na conjuntura - o assunto é muito delicado -, na minha opinião, ele teria grande chance de vencer uma eleição presidencial nas atuais circunstâncias, sem dúvida alguma. Mas quem sabe? Ele é tão moço ainda! Já estou dobrando aquele cabo da boa esperança, do qual V. Exª está tão longe. Sérgio Cabral e Paim também estão tão longe dele! Mas quem sabe isso ainda pode acontecer.

            Tem de acontecer. Não é possível que o Rio de Janeiro, com sua história, sua tradição e seu passado, não tenha tido ainda um Presidente da República. Da mesma maneira, o Paraná ainda não teve, porque é uma injustiça muito grande. Essa é um injustiça enorme, porque o Paraná é um Estado tão limpo e puro. A gente chega a Curitiba e tem uma impressão tão maravilhosa de solidez e limpeza. E não houve ainda. Quem sabe, não é? A gente torce por isso.

            Nada contra Minas, São Paulo, Rio Grande ou o Nordeste. Pelo contrário, nada contra ninguém. Mas o Paraná e o Rio são dois Estados com muita afinidade e que não tiveram ainda a chance de ter um Presidente da República. A verdade é essa.

            O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Pois não, Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Paulo Duque, V. Exª faz uma homenagem ao Paraná e eu quero agradecer, como representante daquele Estado. E tem razão V. Exª. Isso é consequência de um conjunto de fatores. Certamente, o núcleo central da mídia nacional se localiza ou em São Paulo ou no Rio de Janeiro. E, apesar disso, V. Exª destaca bem, o Rio de Janeiro também não tem tido esse privilégio de governar o País. O Paraná tem uma desvantagem ainda maior. Fica muito próximo de São Paulo. Certa vez, o saudoso Deputado Álvaro Valle me disse isso. Ele estava fazendo essa análise que V. Exª está fazendo: por que o Paraná não tinha aberto espaço nacional para uma liderança própria que pudesse chegar à Presidência da República. E a conclusão dele: o Paraná está escondido atrás de São Paulo, está muito próximo de São Paulo. A grandiosidade de São Paulo contém os avanços paranaenses. Essa foi a análise do saudoso Deputado Álvaro Valle, que o pronunciamento de V. Exª me faz lembrar agora. Portanto, quando se faz uma pesquisa de opinião pública e se elencam os nomes dos presidenciáveis, por exemplo, é natural que aqueles nomes oriundos de grandes unidades da Federação acabem tendo vantagem. É óbvio. São Paulo e Minas Gerais são os grandes núcleos de eleitores do País. Então, obviamente acabam levando vantagem em relação aos outros. Esse é um outro fato que acaba contribuindo. Enfim, são muitos os fatores, é um conjunto de fatores que acaba fazendo com que os grandes Estados tenham essa vantagem em relação à disputa presidencial, com algumas exceções. Alagoas já chegou à Presidência da República, um pequeno Estado. Mas V. Ex.ª tem razão na análise que faz, e temos que refletir um pouco sobre isso. Parabéns a V. Exª.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - A redivisão territorial do País foi uma oportunidade muito grande que o movimento de 1964 perdeu. Naquela ocasião, podia-se fazer tudo. Era hora de criar mais um Estado dentro de Minas Gerais, fundir dois. Era a hora. Podia-se fazer tudo ali, inclusive a redivisão territorial. Saber se Minas Gerais tinha ou tem interesse ainda em que seja aberto um caminho para o mar, como foi feito com o Piauí. O Piauí não tinha caminho para o mar e houve uma troca de Municípios entre o Ceará e o Piauí, que ficou com um caminho de 65 km de litoral que não tinha.

            Então, Presidente, o Rio sempre foi muito acolhedor por isso; é uma terra acolhedora. E tornou-se mais ainda com Juscelino, mineiro que vivia no Rio, logo depois da sucessão de Carlos Luz e de Nereu Ramos, por Santa Catarina.

            Já falei em Mato Grosso, Jânio Quadros, mas ele, em São Paulo, ocupava eventualmente a Presidência; João Goulart, no regime parlamentarista... Que não deu certo, Presidente, porque não pode dar certo regime parlamentarista aqui, num País como o nosso; por mais tentativas que seu correligionário e conterrâneo Raul Pila tivesse feito, não dava certo o parlamentarismo aqui no Brasil. Mas o Rio, acolhedor como sempre... Vou mudar completamente de assunto agora, se me permitirem os Senadores Alvaro Dias, Geraldo Mesquita, Cristovam Buarque e Paim.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Permita-me, Senador Paulo Duque, pela audiência da TV Senado...

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Claro, pela audiência da TV Senado...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Alguém me socorreu agora aqui. O Paulo André, lá de São Gabriel, disse: “Ô Paulo Paim, assistir TV Senado é conhecimento, é cultura. Então, diga aí que foram seis gaúchos: Hermes da Fonseca, nascido em São Gabriel; Getúlio Vargas, nascido em São Borja; João Goulart, nascido em São Borja; Arthur da Costa e Silva, em Taquari; Emilio Médici, em Bagé; e Ernesto Geisel, em Bento Gonçalves.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Seis.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - V. Exª tinha razão: seis gaúchos.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Seis gaúchos, gaúchos mesmo, para valer! Agora, políticos mesmo, João Goulart, Getúlio...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Hermes da Fonseca.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - E Hermes, que, embora, gaúcho, foi mais pelo Exército naquela época.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Nascido em São Gabriel.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - E ele foi eleito depois que Pinheiro Machado foi assassinado, ele foi eleito Senador e não quis tomar posse. Viu que tinha acabado a carreira política dele; militar, não quis tomar posse.

            Mas eu queria falar hoje de um gaúcho, que tem completa admiração minha, completa, que é Pinheiro Machado.

            Ele era um homem de grande coragem pessoal. Essa coragem nasceu, talvez, ainda na adolescência, na Guerra do Paraguai. Jovem ainda, tinha 16 anos, fez questão de, em 1865/1870, ir para a Guerra do Paraguai. Ele não era obrigado a ir, não foi chamado, mas era um homem que nasceu valente. Foi um homem que fez uma carreira política muito interessante, esteve na Faculdade de Direito de São Paulo, formou-se, elegeu-se Senador pelo Rio Grande do Sul.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Há uma cidade com o nome dele, Pinheiro Machado.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - E mais: ele, em pouco tempo, conseguiu dominar o Senado - dominar o Senado no bom sentido: tinha influência na escolha dos candidatos. É que havia uma aberração naquela época: uma comissão especial do Congresso é que tinha de reconhecer quem podia ou não tomar posse, quem tinha ou não sido eleito, a tal Comissão de Reconhecimento tinha o poder de vetar candidaturas vitoriosas - aquilo era uma excrescência da Primeira República.

            Pinheiro Machado era, antes de tudo, um homem valente, mas a paixão e a emoção é que fizeram com que a legislação penal do Brasil e do mundo inteiro tivesse a figura da calúnia, da infâmia e da difamação. E a calúnia, a infâmia e a difamação são figuras que, às vezes, obrigam o homem a sair de sua conduta normal e ir para o desforço pessoal. Isso ocorre na política, na literatura, em toda parte onde há contradições e contraditórios.

            Havia um grande jornal no Rio de Janeiro...

            Sr. Presidente, eu tenho a impressão de que até já ultrapassei o meu tempo. V. Exª vai ser o juiz disso, porque eu não quero prejudicar nenhum dos outros oradores aqui.

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - V. Exª pode concluir o seu discurso.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Posso concluir? Então, vou concluir com Pinheiro Machado.

            Eu diria a V. Exª, Presidente José Sarney, que Edmundo Bittencourt, que V. Exª talvez tenha conhecido, fundou um grande jornal no Rio de Janeiro, o Correio da Manhã - infelizmente, já desapareceu esse jornal. E por vários motivos que aqui não convém lembrar, nem interessam, ele iniciou uma guerra jornalística contra o Senador Pinheiro Machado, que era, praticamente, o chefe da política nacional à época.

            De tal maneira e de tal forma eram os ataques diários desse jornal que Pinheiro Machado lançou-lhe um desafio: um duelo. Edmundo Bittencourt, dono do jornal, falou: “Bom, não há outra solução a não ser fazer um duelo com ele, já que ele não quer usar o bom senso, a justiça, os jornais, eu vou duelar com ele”. Pegou duas testemunhas: Marechal Hermes, que à época não era marechal, e o Deputado ou Senador Ramiro Barcelos, do Rio Grande do Sul. Pegou-os como padrinhos e foram ao jornal Correio da Manhã. Lá disseram: “Olha, estamos aqui na qualidade de padrinhos do Senador Pinheiro Machado para desafiar o senhor para um duelo”.

            O Rio, naquela ocasião, era uma cidade muito pequena - estou falando de 1906. A Zona Sul era um areal inteiro com muitas pitangueiras, não tinha ninguém, não tinha casa. E o Senador manda o desafio - imaginem se eu fosse fazer isso com os jornais que andaram falando do Paulo Duque agora!

            Mas o Edmundo Bittencourt era um sujeito, gaúcho também, corajoso. Ele não hesitou e disse: “Eu aceito”.

            Os candidatos ao duelo não se falavam, só se falavam por meio de seus padrinhos. Edmundo Bittencourt escolheu para serem seus padrinhos Vicente Piragibe, um criminalista, e Osmundo Pimentel, que era redator-chefe do jornal naquela ocasião. “Os senhores podem começar a estabelecer as regras do duelo”. E estabeleceram.

            Havia uma solenidade, lavrava-se uma ata, escolhiam-se as armas, estabeleciam-se as regras - regras que eram tão interessantes que vou lê-las. Eram apenas oito regras. Antes do desfecho, do final - estou querendo fazer um suspense. Vou ler para que os senhores saibam como é que foi o negócio.

Aos 22 dias do mês de maio de 1906, em uma das salas do Senado [foi no Senado que se lavrou esta Ata] compareceram as testemunhas representantes do Dr. Edmundo Bittencourt e do Senador José Gomes Pinheiro Machado, e com autorização de seus constituintes [os dois que constituíram], sob suas palavras de honra [estava em jogo a honra ali] sob suas palavras de honra, estabelecem as seguintes condições para o encontro que entre os dois cavalheiros acima citados, tem de realizar-se:

1ª) O duelo será a pistola. [viu, Geraldo Mesquita? O duelo será a pistola.]

2ª) A distância que deve mediar entre os dois contendores será de dez passos. [É para valer mesmo. Dez passos. É daqui para ali. Para valer.]

3ª) Os dois adversários, cada um em seu respectivo lugar, se postarão de costas voltadas[um de costas para o outro] e, à voz de comando, voltar-se-ão um para o outro imediatamente, não sendo permitida a visada demorada de pontaria. [Tem que apontar e “pumba.”]

4ª) As duas pistolas serão iguais em tamanho e calibre, sendo distribuídas à sorte entre os dois contendores. [Quem vai ficar de um lado e do outro.]

5ª) O lugar do encontro será na praia de Ipanema. [Em Ipanema, naquela época, 1906, só tinha montanhas e montanhas de areia.]

6ª) A hora do encontro será amanhã, 23 de maio, às oito e meia da manhã. [Isso era para não haver ninguém lá; não haveria imprensa lá, não haveria nada].

7ª) A testemunha que tem de dar a voz de comando será tirada à sorte.[Quem vai mandar contar: um, dois, três.]

8ª) A voz de comando será a seguinte, pronunciada alta e inteligivelmente: um - dois - três.

9ª) À voz - três - os adversários cumprirão o seu dever, segundo a cláusula 3ª [que é exatamente aquela em que poderia dar o tiro].

Rio de Janeiro, 22 de maio de 1906 (aa) Ramiro Barcelos [gaúcho], Hermes da Fonseca [gaúcho], Vicente Piragibe [carioca], Osmundo Pimentel [não sei de onde ele era, só sei que foi jornalista].

Na manhã do dia aprazado [no dia seguinte], medem armas os contendores, seguindo à risca o que fora combinado (...)

            E o que aconteceu no duelo? Existe uma ata das testemunhas, uma ata sobre o duelo, sobre o que aconteceu. Para não ter de ler a ata toda, eu vou dizer o que aconteceu.

            Quando o Ramiro Barcelos, que era uma das testemunhas sorteadas contou “um, dois, três”, eles se voltaram. O Edmundo Bittencourt, um pouco nervoso, foi o primeiro a atirar, mas errou o tiro. E o que fez o Pinheiro Machado? Por isso é que ele merece ter uma rua, como tem hoje, lá na minha cidade, com o nome dele. O que fez o Pinheiro Machado? Atirou para o alto. Olhem que gentleman! Atirou para o alto. Aí as testemunhas: “Escuta, vocês querem terminar o duelo aqui? Querem acabar?” O Edmundo falou: “Não - ele era valente, o Edmundo era valente -, eu quero continuar. Vamos ver o que houve”. Examinaram; não estava bem travada a pistola dele e, por isso, não disparou. Aí, substituíram as balas. Recomeçou o duelo. O Edmundo deu o primeiro tiro, como sempre, afobado. De novo ele erra. Dessa vez ele errou. Da primeira vez, a pistola dele enguiçou; da segunda vez, errou. Aí, Pinheiro Machado o acertou como se fosse na nádega, mas pela frente, mas pela frente, entendeu? Na fossa ilíaca. Poderia tê-lo liquidado na hora, mas, mais uma vez, deu uma prova do cavalheirismo gaúcho - posso chamar assim: cavalheirismo gaúcho? - e acertou a fossa ilíaca. Aí veio o médico etc. Foram embora.

            Então, estavam ali em defesa da honra, cada qual achando que tinha mais direito do que o outro de sobrepujar o outro, de pisar no outro. Não ocorre mais assim hoje. Acabou essa forma, muito embora houvesse outros e outros e outros duelos, que serão objeto de outras e outras e outras sextas-feiras, porque só mesmo na sexta-feira é que podemos falar de um assunto dessa natureza.

            Muito obrigado, Sr. Presidente, pela atenção dispensada às minhas palavras.

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - Muito bem. V. Exª trata de uma das figuras importantes da História do Brasil e que foi um dos consolidadores da República, pela qual ele tinha verdadeira obstinação e desejo de que a República jamais corresse perigo. Foi ele que, dentro do Senado, presidiu a famosa comissão da degola, pela qual só podiam entrar Deputados e Senadores que fossem favoráveis à República.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - É verdade. É verdade.

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - O Senador Pedro Simon teve a oportunidade de fazer uma coletânea sobre Pinheiro Machado também, aqui no Senado, e V. Exª agora recorda uma das figuras mais importantes que passaram pelo Senado Federal.

            O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - E, Presidente, se me permite, para terminar mesmo, para concluir mesmo, em 1915 ele foi assassinado ali perto de onde morava, no Hotel dos Estrangeiros, na Praça José de Alencar, tristemente assassinado. Mas em outra sexta-feira nós falaremos sobre isso.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/03/2010 - Página 7015