Discurso durante a 29ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo ao Presidente Lula para que interfira no caso do ativista cubano em greve de fome, e, por conseguinte, na condição dos presos políticos cubanos, e também que se dirija ao presidente dos Estados Unidos, solicitando o fim do embargo a Cuba.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. POLITICA EXTERNA.:
  • Apelo ao Presidente Lula para que interfira no caso do ativista cubano em greve de fome, e, por conseguinte, na condição dos presos políticos cubanos, e também que se dirija ao presidente dos Estados Unidos, solicitando o fim do embargo a Cuba.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 13/03/2010 - Página 7032
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SAUDE, JORNALISTA, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, GREVE, FOME, REGISTRO, CRITICA, IMPRENSA, BRASIL, MUNDO, OMISSÃO, GOVERNO BRASILEIRO, SUGESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MANIFESTAÇÃO, IMPEDIMENTO, MORTE, CIDADÃO, NACIONALIDADE ESTRANGEIRA, IMPORTANCIA, RECUPERAÇÃO, REPUTAÇÃO, CONFIANÇA, AMBITO INTERNACIONAL.
  • CRITICA, OMISSÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANTERIORIDADE, CARTA, AUTORIA, DEFENSOR, PRESO POLITICO, NACIONALIDADE ESTRANGEIRA, MORTE, MOTIVO, GREVE, FOME, REIVINDICAÇÃO, APOIO, GOVERNO BRASILEIRO, DIREITOS HUMANOS.
  • RECONHECIMENTO, ORADOR, QUALIDADE, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL, ANALISE, ALTERAÇÃO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMPARAÇÃO, INICIO, GOVERNO.
  • SOLICITAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, REIVINDICAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), EXTINÇÃO, BLOQUEIO, GOVERNO ESTRANGEIRO, CUBA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a esta tribuna para falar sobre um assunto sobre o qual eu já havia falado, e as manchetes do mundo inteiro continuam debatendo, discutindo.

            Se volto à tribuna, não é para voltar ao assunto anterior, mas para continuar 

            Não é para voltar ao assunto anterior, mas para continuar narrando o que vem sucedendo e o que aconteceu.

Jornalista cubano [agora se trata de um jornalista] em greve de fome desmaia e é internado.

O jornalista cubano Guillermo Fariñas está internado na UTI. E a causa do desmaio foi um choque hipoglicêmico .

Ele desmaiou por volta das 16h e já está no hospital, na Unidade de Terapia Intensiva.

            Fariñas, antes de sofrer o colapso, não admitia tratamento, não admitia nada que interrompesse a sua greve de fome. Trata-se de um dos grandes nomes da revolução cubana. Jornalista, psicólogo, Guillermo Fariñas, em greve de fome, considera-se “um filho da revolução”.

             “Seu a pai lutou com Che Guevara no Congo em 1965 e ele mesmo serviu na campanha de Angola, em 1981”.

            O psicólogo, que esteve na cadeia por 11 anos, recebeu visita de médicos. E ele já havia alertado que só iria ao hospital quando perdesse a consciência. Perdeu a consciência e foi ao hospital. Trata-se de um dos grandes nomes. Agora que ele se encontra em estado grave, eu me dirijo ao Presidente Lula. Desde que assumiu a Presidência, o Presidente, líder das manchetes mundiais, “o cara”, ganhando praticamente todos os prêmios, citações, inclusive no grande congresso liberal dos economistas lá na Suíça. Nos últimos dias, o Lula tem sido duramente criticado pela imprensa nacional e internacional. Foi muito azar do Presidente Lula chegar a Cuba exatamente no dia em que morria o preso político.

            Ele que queria fazer, da sua última visita como Presidente da República a Fidel Castro, uma visita vitoriosa, obteve um resultado negativo. E Lula não teve felicidade em seu pronunciamento. O episódio da carta que ele recebeu ou não recebeu está muito mal explicado. Ele mesmo falou, respondendo, que não recebeu carta nenhuma e que deveriam parar de dizer para os jornais que escreveram carta ou que não escreveram carta.

            Estou me referindo à carta que os defensores dos presos políticos mandaram para Lula, ainda no México, para que ele interferisse a favor de um preso que morreu exatamente no dia em que ele chegou. Agora vem a diplomacia brasileira e diz que houve a carta; mas que a carta não foi adiante porque não tinha assinatura ou, pelo menos, não tinha a assinatura necessária.

            Uma explicação burocrática de terceira categoria e que desmente o Presidente, que disse: “Não, isso não é verdade!” Deixa mal o Presidente, que disse que não tinha recebido, que não existia... E existia! Só que não a entregaram a ele. Ficou mal o Presidente. Mal mesmo ficou o Presidente com a declaração aqui.

            Em primeiro lugar, eu já me referi na sexta-feira passada... Ser contra a greve de fome? O Lula deveria se lembrar de que ele fez, ele fez greve de fome quando era metalúrgico contra a ditadura. Ele foi ao Presidente Fernando Henrique pedir que este interferisse para terminar com uma greve de fome. E a pedido dele, o Presidente Fernando Henrique interferiu e o resultado foi positivo.

            Agora, o Lula deveria ter categoria para dizer que errou. No momento em que ele compara os presos políticos em greve de fome, em Cuba, com os gangsters e assassinos nas prisões de São Paulo... O Lula dizer uma coisa dessas, por amor de Deus!

            Cá entre nós, o Lula é um grande homem, muito competente, está dando um show, mas não é fantástico. Ele pode errar como qualquer um. E errou. Comparar os presos políticos que estão fazendo greve de fome, como ele fez, e que têm o respeito do mundo inteiro, aos gangsters e assassinos de São Paulo... Dizendo o Lula: “E se de repente os presos e os bandidos de São Paulo resolverem fazer greve de fome pra valer, o que vai acontecer?”

            Ficaria muito bonito se o Lula pedisse desculpas, porque ele está sendo criticado nos jornais do mundo inteiro. Há uma perspectiva de interrogação. O que está havendo com o Lula? Como ele vai renegar o passado, como vai fazer uma afirmativa dessa natureza?

         Outra coisa que está deixando o Lula mal é que o Lula é fã de Cuba. Eu também sou, mais do que o Lula. Mas não sei o que o Lula fazia na época da Revolução de Cuba, eu sei que eu era um jovem que estava lá, torcendo, rezando, lutando, indo para a rua a favor de Lula e de Fidel Casto, torcendo para a vitória que eles tiveram, protestando contra os Estados Unidos, porque os Estados Unidos, desde o início, deram força para Fulgêncio Batista, garantiram a ditadura de Fulgêncio Batista até o fim. E a vitória de Fidel Castro foi espetacular, o mundo inteiro vibrou.

            Que a grande culpa do que está acontecendo - e nisso o Lula e o Chanceler brasileiro têm razão - é o americano que não termina com o embargo a Cuba. É um absurdo! E aí o Presidente americano podia... Disse que ia fazer isso. Por que não faz de uma vez? Por que não termina com esse embargo ridículo, estúpido que dura 50 anos? Qual é a razão disto?

            Tudo isso é verdade. Tudo isso é verdade. Mas daí o Sr. Lula não reconhecer que os presos políticos estão lá, que lutam por democracia e liberdade é muito grave. Então fica essa manchete dos nossos jornais, Estadão, Folha, O Globo e dos jornais internacionais.

            Ontem, um comentarista do Jornal da Globo dizia: se é terrorista de direita, é terrorista, é bandido, mas se é de esquerda, é patriota. Na hora do italiano, o Ministro da Justiça e tudo mais e o Lula garantindo... Condenado na terra dele. Mas na hora de Cuba, não.

            Estou nesta tribuna por uma razão muito singela. Não estou repetindo isso, meu amigo Cristovam, para voltar e repetir. Estou nesta tribuna para dizer que o Presidente Lula teria um gesto de grandeza, um gesto altamente positivo se ele interferisse agora com o jornalista que está preso. Faça agora, faça neste momento, interfira agora, pegue o telefone e ligue para o Raúl ou para o Fidel e diga: “olha, eu fiquei mal. Estou aqui levando pau do mundo inteiro, defendendo vocês”. Resolva essa questão. Resolva essa questão. E seria até um grande momento.

            O Lula disse, e ele tem razão, que o início, a culpa de tudo isso está lá nos 50 anos que os americanos não deixam Cuba crescer, desenvolver, avançar. É um embargo estúpido. Se o Lula está dizendo isso, e é verdade, ele pode, ao mesmo tempo em que conversam pelo telefone, fazer uma ligação de chanceler a chanceler: olha, cá entre nós, vamos resolver; e, ao mesmo tempo, cobra do Presidente Obama que termine com o embargo. Seria uma bela oportunidade, a essa altura, que se equacionasse o problema dos presos políticos de Cuba, e o Obama pudesse, em razão disso, cumprir a promessa eleitoral de que iria terminar com o embargo.

            Eu estou nesta tribuna para isso. Não estou aqui para voltar a falar o que eu falei na sexta-feira passada e que a imprensa vem repetindo, repetindo, com esses fatos novos. Eu estou aqui porque acho que seria um gesto de grandeza. É verdade que o Presidente Lula está vivendo um momento... Tenho dito desta tribuna que o principal problema do Presidente Lula, hoje, chama-se soberba. Soberba! Aquele líder sindical, aquela pessoa que saiu lá do Nordeste, aquela pessoa que lutou, que esteve preso, que criou um partido, que perdeu três eleições, e que está fazendo um grande governo, de repente, não mais do que de repente, é “lulismo”. O mundo inteiro fala no Lula, o homem. E ele tem razão de crescer, de estar alegre e de estar feliz. Cuidado com a soberba! Cuidado com a soberba, meu amigo Lula!

            Eu sei que as pessoas e amigos que tu tinhas, que nem eu, Pedro Simon, que nem Frei Beto e tantos outros que divergem, você não gosta. Você gosta dos “Josés Dirceus” da vida, que batem palmas, que acham formidável. Esse, meu amigo Lula, talvez seja teu calcanhar de Aquiles, nessa hora espetacular da tua vida, em que tu tiveste uma atitude altamente positiva, nota 10.

            Porque tu podias, Lula, assim como lá na Colômbia, lá na Venezuela, ali no Peru, querer uma terceira eleição. E se ele dissesse que queria, haveria um movimento e dificilmente não terminaria numa movimentação popular exigindo. O Lula teve grandeza e ele próprio disse: “Não quero”. Ele próprio disse aos Deputados dele: “Rejeitem essa emenda”. E rejeitaram.

            Ótimo. Mas afora isso, a soberba é o problema do Lula. Ele está se achando infalível. E ele talvez não esteja se dando conta. Hoje, no mundo, há uma posição meio ridicularizada com relação ao Lula. Ele deveria ter ficado quieto. Falaram no nome dele, mas ele deveria ter ficado quieto. Ele já falou que tem sido sondado para ser Diretor-Geral da ONU quando largar o Governo. Isso é assunto que não se fala. Os outros podem até falar, mas ele não deveria ter falado.

            É aquilo que começou no Governo de Fernando Henrique, por quem eu pessoalmente não tenho nenhuma paixão. Eu preferia um homem como Cristovam na Presidência do órgão mundial de educação da ONU do que um assento no Conselho de Segurança. Mas já tem gente dizendo que ele troca tudo pelo assento no Conselho de Segurança, ainda que seja um assento manchado de sangue e tudo o mais. Se o Lula vencer a soberba, e se o Lula tiver um gesto de humildade, e se o Lula chamar o chanceler, e se o Lula pegar o telefone e falar com o Raúl e com o Fidel: “Olha, eu estou com vocês desde o início. Há sete anos que eu estou no Governo e estou dando cobertura. Ainda agora, lá na reunião que nós fizemos no México, reunindo todos os países, à exceção do Canadá e dos Estados Unidos, da América Latina e do Caribe, por unanimidade nós aprovamos Cuba como integrante da América Latina. E eu estou ali, fui, não pedi, estou recebendo crítica do mundo inteiro com relação ao que aconteceu com o que morreu”. Mas agora vamos fazer isso. Vamos aproveitar isso que está acontecendo, vamos aproveitar esse incidente, mais uma vez - agora é um jornalista, agora não é um operário, é um jornalista importante, é um que lutou, é o que fez a Revolução de Cuba, ele e o pai dele -, nessa hora, vamos pedir: libera. Libera. E vamos cobrar do Obama o fim do embargo. Eu acho que este é o grande momento.

            E com essa saída de fazer a ligação do fim da greve da fome, liberada pelo Governo de Cuba, com o pedido para que Obama possa terminar com o embargo, o Lula transforma o limão numa limonada. E das críticas que hoje ele está recebendo dos jornais do mundo inteiro. Aliás, o mesmo jornal que é considerado o número um da língua espanhola, e é considerado, hoje, o jornal mais respeitado da Europa, que é o El Pais, que apontou o Lula, no final do ano passado, como o homem do ano do mundo, agora, está fazendo um editorial de uma crítica tremenda, dizendo o que está havendo com o Lula.

            E esta é a hora.

            Se fosse alguns anos atrás, eu sairia daqui, meu amigo Paim, iria lá no Lula, atravessaria a sala e iria lá falar com ele, porque eu tinha essa amizade, e diria isso que estou dizendo agora. Em outros tempos, eu falava com o Líder do PT e Líder do Governo e pediria para ele fazer isso. Agora, infelizmente, não tenho essas condições.

            Outro dia, numa reportagem de duas páginas do Lula no jornal O Estado de S. Paulo, cobrado pelo jornalista de como essa intimidade dele com o Collor, ele respondeu que ele respeita o Collor, que o Collor já pagou o preço, foi cassado, teve os dias de suspensão dos seus direitos políticos; e passou. Foi eleito pelo povo ao Senado. Aí o Lula disse: “Eu tenho pelo Collor o mesmo respeito que eu tenho pelo Senador Pedro Simon”. Muito obrigado, Lula. Mas eu tenho muito mais respeito pelo Lula do que pelo Collor. Embora os dois tenham sido eleitos Presidentes da República pelo voto popular, eu tenho muito mais respeito pelo Lula. Embora o Collor tivesse ido me procurar - eu, Governador - pedindo o meu apoio, eu subi no palanque do Lula no segundo turno, eu e todo o meu Governo, quando Governador do Rio Grande do Sul. E, apesar dessas questões, eu tenho, meu amigo Lula, muito mais respeito por ti do que pelo Presidente Collor. Por isso, eu não posso fazer o que eu tradicionalmente fazia: saía daqui e ia lá falar com o Lula. Isso que eu estou dizendo aqui, dizia para o Lula. Fizemos isso, Presidente Paim. A meu pedido, eu, V. Exª e o Zambiasi, ficamos cinco horas no Gabinete do Presidente da República com ele, com a Ministra e com seus Ministros debatendo algumas das questões que achávamos importantes. Naquela época eu tinha essa intimidade; hoje não tenho.

            Por isso eu pediria a V. Exª, do fundo do coração: leve ao Lula essa ideia. Fale com o Lula. Seria um gesto que mudariam as manchetes do mundo, manchetes que, em dezembro, eram todas de endeusamento do Lula - um homem, no mundo inteiro, lá na Suíça, o Congresso da Direita, da burguesia liberal, reconhece o Lula como um grande homem e em todos os lugares -, e agora, de repente, estão tocando no ponto que é a maior dignidade do Lula, que é a ideia, que é a bandeira, que é a luta dele, porque Presidente da República ele é e vai deixar de ser. Agora, a história dele, a biografia dele, o esforço dele, o caráter dele, a dignidade dele, a identificação dele com os problemas da sociedade e da liberdade, isto é muito importante e é nisto que estão mexendo. Será que a soberba dele não nota isso? Ele tem a chance hoje, Sr. Presidente, de se dirigir ao Lula - já lhe darei um aparte - e ao Raúl. “Olha, estou levando pancadas por causa de você, e eu dei cobertura. Aliás, há sete anos estou dando cobertura. Agora, um momentinho”. É a chance. Não é um ato isolado, não. É a chance de equacionarmos esse problema. Vamos resolver o problema dos presos políticos. Vamos equacionar essa questão e vamos pedir ao Obama que cumpra a sua decisão de campanha: fim da opressão.

            Com o maior prazer, querido Senador.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Pedro Simon, em geral, concordo com o senhor em algumas coisas. Hoje, concordo com tudo aquilo que o senhor está falando, a começar pela última parte: de respeitarmos muito mais o Presidente Lula do que o Presidente Collor. Eu estou com o senhor nisso também. Temos de reconhecer que o Presidente Lula, apesar da discordância e de críticas que faço, e de que ele não gosta - o senhor tem razão: ele, aparentemente, não gosta de uma crítica -, é um Presidente muito melhor do que muitos imaginavam e melhor, falemos com franqueza - eu não vou dizer de todos, porque pode amanhã aparecer um ou outro cuja história a gente não conhecia bem -, mas ele é um Presidente do porte dos melhores que o Brasil teve em toda a vida republicana, apesar do que deixa de fazer, sobretudo, no que era mais importante, a educação, apesar de ter perdido a grande chance de dizer: “Deixei o Brasil sem o analfabetismo de adultos.” E vai deixar praticamente o mesmo número que encontrou no Governo anterior. Então, concordo com isso. Concordo também, que nós, mesmo aqueles como eu, de uma geração que cresceu vendo a luta do povo cubano, ao lado dessa luta, respeitando os resultados positivos da Revolução Cubana, ainda que de vez em quando incomodado com algumas coisas e não querendo para o Brasil o mesmo, mas somos daqueles que jamais vão poder dizer que somos contra o que a Revolução Cubana fez. Somos críticos em algumas coisas, mas temos simpatia. Mesmo assim, não podemos deixar de manifestar nosso descontentamento com o fato de que prisioneiros de opinião entram em greve de fome e são tratados - aparentemente e pela morte de um, que a gente viu - de maneira incompatível com os direitos humanos - aqui, falo como Presidente da Comissão de Direitos Humanos também. Então, concordo com o senhor e também com o fato de que o Presidente Lula não está aproveitando seu potencial para tentar influir nesse ponto. Ele estaria fazendo um grande favor ao Governo cubano. Estaria fazendo um favor ainda maior ao Brasil, que ficaria como o País que teve força capaz de influir. Eu já pedi ao Ministro Celso Amorim, uma vez, para interferir por um prisioneiro no Irã, um intelectual americano, que estava ameaçado de pena de morte. Na diplomacia, a gente não sabe direito e, além disso, tem que se manter certa discrição. Então, eu não posso dizer aqui se foi feito, se não foi feito, se conseguiram, se não conseguiram, embora eu possa dizer que não houve a condenação à morte. O Presidente Lula poderia fazer o mesmo, porque é uma condenação à morte lenta uma greve de fome longa. O que eu me pergunto, e aí é que vem a dificuldade, é se ele está fazendo isso e prefere não dizer publicamente. Talvez esteja. Talvez esteja fazendo isso e prefira não dizer publicamente, para ter mais força para conseguir o resultado. Ou não está fazendo. Agora, se ele está fazendo de uma maneira discreta, está prestando um serviço às pessoas, mas está prestando um desserviço ao Brasil e à biografia dele, sobretudo quando ele dá afirmações que desmentem que estaria fazendo. Ao comparar esses presos com os presos comuns, ele cometeu, a meu ver, duas falhas. Uma, a comparação em si. E a segunda é que mesmo o preso comum, em greve de fome, merece ser atendido, não nas reivindicações, mas na saúde. A gente não pode deixar um preso comum, um bandido morrer por greve de fome. Tem que pegá-lo, levar para o hospital, tem que botar comida intravenosa, mas não se pode deixar de atendê-lo. E ninguém faz greve de fome por dinheiro, como eu li outro dia no jornal, a hipótese de que os americanos estariam pagando essas pessoas para fazerem greve de fome. Isso não consegue entrar na minha cabeça, não consegue entrar que seja possível uma loucura dessas pessoas! A greve de fome é uma coisa tão dolorosa, tão sofrida, que só pode ser quando as pessoas têm um propósito muito, muito, muito firme, como teve Mandela para ver o filho de três anos, o que, como lembrou bem o Senador Suplicy, o Governo da África do Sul, branco, não deixava naquela época; como teve Gandhi, diversas vezes, não uma só, pela liberdade de seu povo. Então, a greve de fome não dá para ser uma coisa tratada de uma maneira simplista. É uma opção por alguma bandeira. Pode até ser uma bandeira que a gente não queira. Pode ser! Pode ser até uma bandeira contra o que a gente pensa. E, finalmente, eu li hoje uma declaração do Frei Betto, essa figura que não tem quem não respeite neste País, dizendo que ele não fala mal de Cuba fora; quando ele quer fazer alguma crítica, ele vai e faz diretamente. Do ponto de vista dos resultados, pode ser até positivo, mas, do ponto de vista da biografia, do ponto de vista da honra, eu acho que termina não sendo positivo, porque passa a ideia de uma certa complacência, até de uma certa conivência com o fato. E, como eu sou ligado à educação, passa uma mensagem pedagogicamente equivocada. Deixa de educar a população, dizendo “isso está errado”, para poder até conseguir um resultado positivo. O lado pedagógico é fundamental. Este debate que a gente está tendo aqui, eu gostaria que fosse assistido por muitas pessoas para verem que nós precisamos nos educar sobre as dificuldades do exercício do poder, quando pessoas que são contra o que nós defendemos chegam ao ponto de fazer greve de fome. Exige uma negociação, um cuidado, um carinho com esses inimigos, porque, se estão em greve de fome, são inimigos do regime. E se a visão que o Frei Betto tem fosse positiva, durante o regime militar a gente não poderia deixar Dom Hélder Câmara criticar o regime militar lá fora. Ele só poderia criticar falando no ouvido dos generais. Não poderia ser assim. Dom Hélder Câmara chegou a ser acusado de que criticava o regime militar em palestras na França, e creio que poucos gestos foram tão patrióticos no Brasil quanto aqueles discursos de Dom Hélder Câmara lá fora, denunciando o regime militar aqui dentro.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Porque não deixavam ele falar aqui dentro.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - E porque não o deixaram falar aqui dentro, mas, se ele quisesse cochichar nos ouvidos dos generais, os generais receberiam. Não tenha dúvida de que receberiam, e poderiam até fazer umas concessões, mas ele viu que tinha a obrigação de alertar o mundo inteiro do que estava errado aqui dentro, e fez corretamente. Parabenizo-lhe e sinto que o senhor, o Suplicy e eu estamos, pelo menos, cumprindo uma obrigação que diria dolorosa. Dolorosa para mim pela relação que tenho com Cuba desde 1982, quando, pela primeira vez, fui lá, ainda clandestinamente, porque o Brasil não permitia essas viagens. Tive que ir sem que o passaporte mostrasse que eu fiz essa viagem porque levaria a uma prisão. Tive que voltar dando a maior volta. Fui e vim fazendo uma volta pelo mundo para que os militares daquela época e os serviços de fronteira não soubessem onde eu havia ido. Eu tenho admiração pela luta, mas hoje eu sinto um constrangimento muito grande pelo que está acontecendo na maneira como o Governo cubano está tratando esse assunto da greve de fome. E acho que o Presidente Lula, ou por soberba, como o senhor disse - pode ser -, ou por não se debruçar, ou por uma simpatia que termina sendo negativa, porque a simpatia exagerada, quando o aliado faz uma coisa errada, é uma simpatia negativa... Você não alertar um aliado do erro...

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Sim, pode ser uma simpatia muito grande, mas ele não está ajudando Cuba.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Mas não está ajudando! Não está ajudando de maneira alguma! Não está!

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Ele não está ajudando Cuba. Se ele quer ajudar Cuba, o procedimento deve ser diferente.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Exatamente. E, finalmente - e aí concluo realmente -, eu quero dizer que estou de acordo com o senhor, que grande parte dos problemas que vive Cuba, inclusive politicamente, decorre dos Estados Unidos. Não vou dizer que essa greve de fome é resultado dos Estados Unidos, porque aí simplificaria demais o processo. Mas grande parte vem do bloqueio, vem de uma intervenção permanente, através de rádio, por meio de mecanismos que os Estados Unidos usam todos os dias para tentar boicotar o regime cubano, que no mínimo tem uma qualidade: resiste há 50 anos. Nenhum outro país sul-americano resistiu 50 anos ao poder dos Estados Unidos. Então, esse seu apelo para que o Presidente Obama conduza o fim do bloqueio é um apelo corretíssimo, e seria o melhor que poderia fazer para aliviar o regime cubano naquilo que ele tem e que a gente não gosta.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço muito o importante aparte de V. Exª. V. Exª levantou uma questão que tenho a obrigação de analisar.

            Estou pedindo aqui uma manifestação pública do Presidente Lula. V. Exª levanta a hipótese de que ele possa estar fazendo sigilosamente, de uma maneira positiva, mas sem colocar manchete, tentando fazer isso. Pode ser. Com toda sinceridade, sou obrigado a reconhecer que o que V. Exª afirmou pode estar acontecendo. Quem não diz que o Presidente Lula, independente de colocar manchete e notícia, esteja fazendo isso que estou falando aqui, esteja falando, diplomaticamente, mas sigilosamente, sem colocar nos jornais, para esperar e colocar nos jornais a resposta concreta?

            Pode estar acontecendo.

            Mas V. Exª também tem razão. Se ele está fazendo isso de uma maneira tão sigilosa que não aparece nada, não está resolvendo. Não está resolvendo. Se ele está conversando, tentando convencer; Lula e Fidel Castro de um lado, tentando falar com o Governo americano de outro lado, ele está ficando numa posição tão negativa no âmbito da imprensa mundial, que está ficando numa posição difícil.

            Eu acho e repito que há uma página em branco excepcional, em que o Presidente Lula pode se manifestar: pedir ao Governo cubano que tome uma posição com relação aos presos políticos e pedir ao Presidente Obama que cumpra a sua promessa eleitoral de terminar com o embargo a Cuba.

            É o apelo que faço. Não vou lá, que nem ia outras vezes, e nem sei como seria recebido. V. Exª, sei que seria bem recebido, e faço a V. Exª, Presidente Paim, um pedido muito grande: faça chegar ao Presidente Lula este apelo.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/03/2010 - Página 7032