Discurso durante a 32ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à política externa do governo Lula.

Autor
Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Críticas à política externa do governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 18/03/2010 - Página 8050
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • RECONHECIMENTO, EFICACIA, POSIÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, DEFESA, FORMAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, PALESTINA, PARCERIA, CHINA, RUSSIA, INDIA, DENUNCIA, CONDUTA, GOVERNO ESTRANGEIRO, CONSTRUÇÃO, ASSENTAMENTO POPULACIONAL, AREA, CONFLITO.
  • QUESTIONAMENTO, DIRETRIZ, POLITICA EXTERNA, GOVERNO BRASILEIRO, RECUSA, ASSINATURA, PROTOCOLO ADICIONAL, PROIBIÇÃO, PRODUÇÃO, ARMAMENTO NUCLEAR, ABERTURA, INSTALAÇÃO NUCLEAR, INSPEÇÃO, AGENCIA INTERNACIONAL DE ENERGIA ATOMICA (AIEA), POSSIBILIDADE, PREJUIZO, PROGRAMA NUCLEAR BRASILEIRO, CONFIRMAÇÃO, APOIO, GOVERNO ESTRANGEIRO, IRÃ, AFASTAMENTO, POSIÇÃO, COMUNIDADE, AMBITO INTERNACIONAL, DEFESA, EX PRESIDENTE, PAIS ESTRANGEIRO, HONDURAS, APROXIMAÇÃO, ARGENTINA, BOLIVIA.
  • APREENSÃO, ADESÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), FALTA, ESTABILIDADE, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, RESULTADO, CONDUTA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, DESRESPEITO, DEMOCRACIA.
  • REPUDIO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMPARAÇÃO, PRESO POLITICO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, PRESO, CRIME COMUM, NEGLIGENCIA, DIREITOS HUMANOS.
  • ANUNCIO, PRESENÇA, SENADO, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), ESCLARECIMENTOS, CRIAÇÃO, EMBAIXADA, PAIS, REGIÃO, CARIBE, PRETENSÃO, PARTICIPAÇÃO, CONSELHO DE SEGURANÇA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), CRITICA, DIVISÃO, RESPONSABILIDADE, ORIENTAÇÃO, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, ASSESSOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

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            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, volto a esta tribuna para ainda abordar a questão das relações internacionais. A descoberta de novas plantas de processamento desnudou a intenção de Teerã de perseguir um projeto militar, contrariando os termos do Tratado de Não-Proliferação, TNP, do qual é signatário. Esse é um detalhe da maior importância. O Irã está descobrindo um tratado que ele mesmo assinou.

            O Presidente Mahmoud Ahmadinejad, por diversas vezes, manifestou seu desejo de varrer Israel do mapa, apoia grupos terroristas, a quem fornece treinamentos, armas e financiamento. De maneira clara, rejeita a ideia do morticínio industrial de judeus pelo regime nazista, que dominou a Alemanha durante a II Guerra Mundial. Ao todo, só para lembrar, foram seis milhões de vítimas. Para Ahmadinejad isso não ocorreu. Seria mera ficção, como também é ficção a ideia de que em seu País vigora uma democracia. Diariamente oposicionistas são presos. A polícia religiosa esmaga, de maneira sangrenta, manifestações contrárias à teocracia instalada em Teerã. Por isso, o apoio dado ao País dos aiatolás contamina a imparcialidade que deveríamos ostentar ao nos oferecermos como mediadores para o conflito entre palestinos e israelenses.

            O Brasil está certo ao defender a formação de um Estado palestino como preconizava, em 1948, a decisão das Nações Unidas que determinou a partilha da colônia britânica em dois Estados. Também está correto ao denunciar a construção de novos assentamentos nas áreas ocupadas por Israel em 1967 como resultado de usa vitória militar na Guerra dos Seis Dias.

            No entanto, peca ao oferecer um cheque em branco ao Irã, colocando-se em posição diametralmente oposta à da comunidade internacional, inclusive diante da Rússia e da França, País com o qual firmamos uma parceria estratégica recente nessa área da defesa. Essa posição, inclusive, traz riscos ao nosso programa nuclear de caráter pacífico.

            O Governo brasileiro, justificadamente, recusou-se a firmar o protocolo adicional do Tratado de Não-Proliferação, que determina a abertura de todas as instalações nucleares à inspeção dos agentes da AIEA. A razão da recusa está no desenvolvimento de um método próprio de enriquecimento de urânio, que emprega ultracentrífugas eletromagnéticas, que giram sem qualquer atrito. Essa tecnologia atrai a curiosidade de outros Países, e, para preservá-la, colocamos uma série de restrições aos inspetores da agência, que podem acompanhar o fluxo do produto sem ver as máquinas desenvolvidas por engenheiros brasileiros.

            Não foi a única vez em que a nossa política externa mostrou-se confusa. Na democracia não há sucedâneo para o voto. A diplomacia brasileira errou ao desconhecer essa máxima no caso de Honduras. Insistiu em apoiar o ex-Presidente Manuel Zelaya, hospedado durante quatro meses na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, mesmo depois da derrota de seus partidários em eleições livres, limpas e fiscalizadas internacionalmente, inclusive por alguns de nossos colegas Parlamentares.

            Havia, entretanto, um atenuante: Zelaya atentara contra a Constituição hondurenha, que veda a reeleição. Por isso, os Poderes Legislativo e Judiciário determinaram sua destituição. Num primeiro momento, nós mesmos, até por iniciativa minha, manifestamos a contrariedade, a preocupação com o cerco à Embaixada brasileira.

            A comunidade internacional foi rápida na condenação ao golpe e na exigência da restituição de Zelaya. Os Governos ligados ao Movimento Bolivariano, liderado pelo Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, apostaram no impasse. Embarcamos nessa tese quando o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva acolheu o ex-Chefe de Estado de Honduras no prédio da Embaixada do Brasil.

            Foi o primeiro talvez de uma série de equívocos mais recentes. O Itamaraty agravou o problema ao permitir a transformação da representação diplomática brasileira em palanque. Os zelaístas ocuparam o prédio. Foi necessária a intervenção do encarregado de negócios brasileiro para que recolhessem armas levadas irregularmente para o prédio.

            Esses incidentes, Sr. Presidente, levaram a comunidade internacional a retirar seu apoio ao líder deposto. Diante da intransigência do então Presidente de facto, como chamado, Roberto Micheletti, apoiado pelo Legislativo e pelo Judiciário de seu País, os Estados Unidos deixaram de considerar indispensável a volta de Zelaya ao poder, preferindo destacar a importância das eleições. Foi uma posição pragmática que contou com o suporte de Canadá, Colômbia, Peru, Costa Rica e Panamá.

            O Brasil, na companhia do bloco bolivariano e da Argentina, insistiu no não reconhecimento do resultado do pleito, principalmente depois que a Suprema Corte e o Congresso hondurenhos se recusaram a reempossar o presidente deposto para um governo de transição. Hoje, Porfírio Lobo, governante escolhido pelas urnas, já é reconhecido pelas principais organizações internacionais, inclusive pelo Banco Mundial. Insistir no erro é muito pior. É mais razoável que o Brasil reconheça e passe, portanto, a tratar oficialmente o Presidente Porfírio Lobo como Presidente de Honduras.

            A verdade é que encerramos o ano de 2009 sem que várias metas do Governo Lula nesta área de política externa fossem alcançadas. A diplomacia brasileira apostou na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio, que infelizmente não prosperou. Defendeu a candidatura fracassada do Ministro da Cultura do Egito, Farouk Hosni, para o posto de Diretor-Geral da Unesco em detrimento e em prejuízo de dois excelentes candidatos brasileiros: o Senador Cristovam Buarque, nosso colega, e o cientista Márcio Barbosa.

            Apoiou o resultado das eleições presidenciais no Irã, apesar dos fortes indícios de fraude, e manifestou-se favoravelmente às ambições nucleares do Presidente Ahmadinejad, como já mencionei. Como se não bastasse, com a adesão da Venezuela, iniciamos o processo de ampliação do Mercosul antes de consolidarmos o mercado comum.

            É bom ressaltar que não questiono aqui a importância das relações comerciais com Caracas, mas o Presidente Hugo Chávez, com suas declarações belicosas, traz um elemento de instabilidade às relações do bloco. Ele não aceita a economia de mercado e a democracia, regras básicas de conformação do Mercosul. Traz agora até mesmo a nacionalização de supermercados.

            É uma falácia dizer que a Venezuela é uma democracia porque faz eleições plebiscitárias. A democracia é independência de poderes, liberdade de imprensa, segurança jurídica, Estado de direito. Esses requisitos estão em perigo na Venezuela.

            Também erramos ao permitir que a Bolívia rompesse acordos juridicamente perfeitos ao ocupar as refinarias da Petrobras no País. Isso já vai ficando um pouco no esquecimento, mas é importante dizer que quem realmente defendeu a Petrobras fomos nós, da Oposição. O Governo, não; o Governo foi tíbio ao reagir à ocupação, pelo Exército da Bolívia, das instalações das refinarias da Petrobras.

            Mais recentemente, o Presidente Lula comparou presos políticos a criminosos comuns, numa posição incoerente com a sua própria história pessoal. Diz ainda não querer interferir em outros Países, mas o faz em relação à Itália, no chamado caso Batistti. Não quer interferir em Cuba, mas interfere numa democracia plena como é a Itália, ao duvidar da Justiça italiana.

            É dentro desse contexto que devemos analisar a criação de parte das 35 novas Embaixadas criadas desde 2003, principalmente os 7 postos localizados em Países do Caribe. Em conjunto, essas Nações, que possuem pequena expressão política e econômica, reúnem cerca de 267 mil habitantes. Sete Países, 267 mil habitantes, com uma população menor do que a cidade querida de Uberaba, em Minas Gerais, que possui 292 mil habitantes. Sete Embaixadas! Enquanto isso, milhares de brasileiros ainda estão carentes de assistência consular, como pudemos comprovar em visita de inspeção à Guiana Francesa, departamento ultramarino francês, e ao Suriname, onde a demanda é exatamente de melhor assistência por parte dos Consulados. Precisamos de novos consulados, expandir aqueles que existem. Seria muito mais bem utilizado esse dinheiro se, em vez de abrir Embaixadas em Países do circuito Caribe, nós tivéssemos a expansão desse Consulado.

            Ainda hoje, Sr. Presidente, eu tive o cuidado de olhar a última dessas Embaixadas que está aí sendo criada, que é a de Dominica, que tem exatos 72 mil habitantes. O Senador Flexa Ribeiro pediu informações adicionais. Nós vamos aguardar que o Itamaraty mande essas informações sobre Dominica, sobre quantos brasileiros moram lá, se existe um fluxo de turismo do Brasil em relação a esse País.

            Portanto, são pontos, são desvios, são erros que estamos aqui apontando. Evidentemente, nós, especialmente pela minha história política de Minas Gerais, não vou dizer que o Governo só erra. Absolutamente! O Governo tem acertado na relação com os Países emergentes, como eu disse aqui ontem em aparte ao Senador Arthur Virgílio. Nós estamos corretos em buscar aproximação com a Rússia, com a China, com a Índia; está correto o Brasil nessa relação com a África do Sul; está correto o Brasil na relação com os Países de língua portuguesa; está correto o Brasil em se aproximar mais dos Países latinos. Há vários acertos, não estamos negando isso. O que estamos dizendo é que existe uma espécie de autossuficiência do Governo neste momento, e essa autossuficiência está fazendo com que desconheça as críticas e desconheça a realidade do Senado brasileiro, que é o responsável pela fiscalização, que é o responsável pelo acompanhamento da política exterior.

            O Ministro Celso Amorim está agendado para vir ao Senado Federal, e esperamos poder discutir com ele alguns desses desvios que estamos apontando. O Brasil, por vezes, diz que essa criação de novas Embaixadas é uma estratégia para alavancar a candidatura brasileira a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Entretanto, para conseguir esse assento permanente, dependemos do consenso das cinco grandes potências: Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França e China.

            O Brasil terá que lidar cada vez mais com questões globais e, por isso, é melhor não ter posição de omissão como aconteceu agora em relação aos presos políticos de Cuba ou em relação às questões do risco nuclear do Irã. Não é com posições omissas que o Brasil vai se credenciar a um assento permanente no conselho da ONU. Claro que não. No momento de crise, devemos maximizar esforços em lugar de dispersá-los. Para conseguir esse posto, necessitamos tomar medidas pragmáticas que nos aproximem dos cinco grandes.

            Atribuo esses problemas a uma dicotomia, Sr. Presidente: nossa política externa é conduzida simultaneamente pelo Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e pelo Assessor Especial da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, que é uma pessoa engajada politicamente e que, com seu partido, o PT, em inúmeros momentos entraram em choque publicamente sobre temas chaves para o País. Devemos entregar a condução a quem de direito, o Itamaraty, dono de uma tradição conhecida internacionalmente, de profissionalismo e de competência. Não é com essa dualidade que traz partidarismo, que traz ideologia para as relações internacionais do Brasil, que seguiremos respeitados.

            O Brasil cresce, sim, como eu disse hoje na entrevista à Rádio Senado, desde Juscelino Kubitschek. Quando o Brasil começou a se industrializar, quando o Brasil caminhou para o interior com a construção de Brasília, com novas estradas, ele começou realmente a crescer. Desde aquela época, sobrou o mérito para vários Governos. Fomos crescendo com a globalização, com o aumento do comércio exterior. Isso faz com que o Brasil seja realmente mais reconhecido.Temos o orgulho de ver o nosso Presidente reconhecido também internacionalmente. Agora, “vamos devagar com o andor, que o santo é de barro”. Não precisamos de exageros. Não precisamos de ter realmente uma visão que seja megalomaníaca.

            O Brasil é um grande País, tem uma grande população, tem um grande mercado, tem uma grande área e um grande futuro. Mas vamos ser moderados nessa caminhada, sem exageros, que podem acabar nos levando a uma posição caricata, o que não queremos jamais.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/03/2010 - Página 8050