Discurso durante a 35ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Referência à visita feita por S.Exa. à sexagésima segunda Expogrande, em Campo Grande/MS. Comentários sobre a história de catorze haitianos refugiados no Brasil.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Referência à visita feita por S.Exa. à sexagésima segunda Expogrande, em Campo Grande/MS. Comentários sobre a história de catorze haitianos refugiados no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2010 - Página 8768
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, FUGA, PESSOAS, PAIS ESTRANGEIRO, HAITI, INGRESSO, TERRITORIO NACIONAL, CAPTURA, POLICIA FEDERAL, MUNICIPIO, CAMPO GRANDE (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), AUSENCIA, VISTOS DE ENTRADA, BRASIL.
  • ESCLARECIMENTOS, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, HAITI, VITIMA, CALAMIDADE PUBLICA, ABALO SISMICO, CRITICA, POSSIBILIDADE, DEPORTAÇÃO, REFUGIADO, REGISTRO, EMPENHO, ORADOR, MANUTENÇÃO, GRUPO, TERRITORIO NACIONAL.
  • RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, FAIXA DE FRONTEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, PARAGUAI, COMBATE, TRAFICO, DROGA, CONTRABANDO, CONTRIBUIÇÃO, REDUÇÃO, VIOLENCIA, COMENTARIO, AQUISIÇÃO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), AERONAVE, APOIO, CONTROLE, FRONTEIRA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, na terça-feira passada, subi a esta tribuna, para solidarizar-me com o povo do Haiti em razão do doloroso flagelo que o martiriza e que tem levado tanta gente ao desespero, à desilusão, à falta de esperança.

            Dois dias depois de ter feito esse pronunciamento, viajei para Campo Grande. Fui lá, para participar da 72ª Expogrande, tradicional feira do agronegócio promovida pela Associação dos Criadores e que tem uma forte repercussão na economia de Mato Grosso do Sul, do Centro-Oeste e mesmo dos países vizinhos.

            Ao chegar à minha cidade, Campo Grande, o que eu não esperava era encontrar um fragmento do Haiti em plena capital de Mato Grosso do Sul. A notícia estava estampada nos jornais da capital. Nas emissoras de rádio e televisão, o que se comentava era exatamente a presença dos haitianos em nossa capital.

            Eram 14 pessoas que conseguiram ingressar em território brasileiro, depois de empreender uma espetacular fuga do nosso vizinho, do nosso irmão caribenho. Valeram-se de todos os meios de deslocamento e, em alguns trechos, Sr. Presidente, eles viajaram a pé, tão grande era a determinação, tamanho era o sonho de se livrar das dificuldades, dos tropeços que enfrentam lá no Haiti. Passaram pelo Panamá, pelo Peru, chegaram até a Bolívia e, de lá, atravessaram a fronteira do Brasil para chegar ao Município de Corumbá.

            Quando se deslocavam para Campo Grande, foram abordados por agentes da Polícia Federal. Todos eles eram portadores de passaportes, mas não possuíam o visto de entrada no Brasil. Por isso, estavam na iminência de sofrer um processo de repatriação.

            Confesso, Sr. Presidente, que senti um profundo constrangimento com essa notícia. Imaginem os senhores o que representaria para esses migrantes a deportação depois de se submeterem a uma verdadeira epopeia para escapar, para fugir, dos escombros e dos riscos a que hoje o Haiti expõe os seus filhos, os seus moradores, a sua população. O que os esperava, na verdade, eram a frustração e o desencanto com o Brasil, que acreditavam generoso e amigo.

            Inconformado com o drama dos haitianos, liguei incontinenti, na mesma quinta-feira, para o nosso colega Heráclito Fortes. Lembrei que ele tem cumprido importante papel, tem tido uma extraordinária atuação na Comissão de Relações Exteriores desta Casa e imaginei que pudesse necessitar do seu concurso para socorrer os nossos irmãos haitianos.

            Pedi que ele ficasse de sobreaviso, porque teríamos de encontrar um meio para evitar a expulsão desses migrantes. Afinal de contas, seria extremamente doloroso assistir, passivamente, a esse tipo de desdobramento.

            Na mesma tarde, logo depois dessa conversa, fui avistar-me com o Superintendente da Polícia Federal, Delegado José Lara, e a titular da área de migrantes daquela Superintendência.

            No diálogo que tive com ambos, fui informado de que nenhum indício de ilícito pesava sobre os estrangeiros. Portanto, estava muito à vontade para pedir socorro e não corria nenhum risco de, de repente, ser surpreendido por uma notícia que sinalizasse uma detenção deles em razão da prática de algum delito que geralmente ocorre nas fronteiras.

            A luta pela sobrevivência foi o que impulsionou, de fato, aqueles nossos irmãos a realizarem essa extraordinária maratona para chegar ao Brasil. A irregularidade deles era simplesmente a falta do visto de entrada em nosso Território.

            Mesmo sabendo que cumpriam o seu dever, os policiais não conseguiam esconder a contrariedade de manejar os procedimentos burocráticos para mandar de volta aqueles forasteiros. Então, senti naquele momento, Sr. Presidente, que os policiais, acostumados com a dureza, com as agruras da atividade policial, mesmo calejados de enfrentar delinquentes que andam pela fronteira, que atravessam a fronteira praticando os crimes típicos dessas áreas, estavam visivelmente emocionados e constrangidos também com aquele episódio.

            A minha parte, como cidadão, eu procurei fazer. Ao convencer-me de que o caminho para evitar a expatriação dos haitianos passava necessariamente pela formalização do pedido de refúgio, coloquei o meu escritório parlamentar, coloquei os meus assessores a serviço deles.

            E os nossos assistentes, Senador Cristovam, foram deslocados para a Superintendência da Polícia Federal com a missão precípua de traduzir o que eles queriam dizer e de procurar dar o encaminhamento burocrático, atendendo as exigências legais, a fim de que eles pudessem se livrar daquele constrangimento.

            E meus assistentes, Sr. Presidente, só deixaram o recinto da Polícia Federal quando conseguiram fazer, conseguiram elaborar, conseguiram preencher o último requerimento de refúgio que orientamos os haitianos a fazer e a protocolar. Com essa medida, conseguimos afastar, pelo menos provisoriamente, o risco da expulsão.

            O superintendente da Polícia Federal, naquela ocasião, nos informara que seria inevitável a notificação para essa expulsão. Mas, com a medida que adotamos, conseguimos abortar até mesmo a notificação.

            No entanto, Sr. Presidente, a solidariedade que nós prestamos ali, como brasileiros, que é a solidariedade de que o Brasil tem dado sobejas demonstrações com a sua presença no Haiti, não se pode esgotar nessa autorização para a permanência deles em nosso território.

            Eles chegaram sem dinheiro, sem alojamento, com dificuldades para se comunicar e sem rumo para tomar. Uma ONG denominada Psicólogos sem Fronteira, coordenada por um desses profissionais, o ex-Deputado Getúlio Gideão, tem sido o ombro mais amigo que os haitianos encontraram em Campo Grande.

            De nossa parte, ainda cumpre promover diligências junto ao Conare, Comitê Nacional para Refugiados, a fim de agilizar a concessão da autorização para a permanência desse grupo em nosso País. Aliás, o governo brasileiro, especialmente o Ministério da Justiça, deveria estudar imediatamente algumas medidas para destravar a burocracia para receber os refugiados haitianos daqui para frente, porque não se justifica que, estando as forças brasileiras presentes no Haiti, conquistando a amizade e a confiança dos nossos irmãos daquele país - circunstância essa que acaba projetando um horizonte para aqueles que querem se refugiar -, ainda restem óbices em nosso território, óbices quase intransponíveis para a permanência dos haitianos no Brasil.

            Chega a ser até incoerente fazer as exigências que hoje são feitas e que a Polícia Federal não receba nenhuma recomendação para facilitar a vida dos nossos irmãos que têm vindo aportar em nosso país procedentes de um país onde o sofrimento medra por todos os cantos.

            Quanto à ação da Polícia Federal, cumpre destacar que foi em razão de uma operação chamada Sentinela, que hoje a Polícia Federal realiza na fronteira Brasil/Bolívia, que se detectou a presença irregular dos haitianos em nosso território. Nesse particular, nós temos de ressaltar a virtude da operação.

            Temos ocupado esta tribuna para pleitear uma ação de controle das nossas fronteiras. E temos travado essa discussão em razão de uma certa omissão do governo quanto à política de fronteiras adotada, que não leva em conta que é vindo exatamente da Bolívia e do Paraguai que têm ingressado não só as drogas como também armamentos contrabandeados. Já tive oportunidade de ocupar esta tribuna para defender, inclusive, a participação das Forças Armadas, já que não estamos falando em segurança pública interna, mas estamos falando do acesso permanente que as nossas fronteiras permitem a estrangeiros e brasileiros que trabalham no crime organizado, trazendo para cá drogas e armas.

            Mas agora temos de reconhecer aqui, de público, que há uma operação desenvolvida pela Polícia Federal com apoio do Departamento de Operações de Fronteira do Mato Grosso do Sul e do Ministério da Agricultura. Tanto a Receita Federal como o Ministério da Agricultura, que estão fazendo parte dessa operação, têm interesse direto, já que essa operação ajuda a Receita Federal no momento em que controla o contrabando e ajuda o Ministério da Agricultura com relação ao controle de doenças de fronteira.

            Portanto, Sr. Presidente, essa operação, que acabou abordando os haitianos, na verdade, é uma operação que deveria se transformar numa política de fronteiras. Se isso acontecesse, sem dúvida alguma, haveria uma redução significativa da criminalidade nos grandes centros urbanos, porque equivaleria a cortar a corrente, a cortar o caminho por onde transitam as armas contrabandeadas e as drogas, o que fatalmente repercutiria na redução da criminalidade que ocorre no Rio de Janeiro, em Minas Gerais, em São Paulo e em todos os grandes centros.

            O Ministério da Justiça está adquirindo aquele veículo aéreo não tripulado, destinado à vigilância. Assim, é de se pedir também desta tribuna que sejam disponibilizados alguns exemplares desse veículo para a Polícia Federal de Mato Grosso do Sul, de modo a permitir um maior controle dessa fronteira, já que esse veículo tem a possibilidade de alcançar até trinta mil pés de altura e tem trinta horas de autonomia. Portanto, seria um meio de se conseguir um controle mais efetivo da fronteira por parte do governo brasileiro para que se possa estancar ou, pelo menos, reduzir significativamente os crimes que têm trazido tantos danos à família brasileira.

            Ao fazer este registro, quero dizer que, nesse episódio dos haitianos, tive o constrangimento de saber que eles entraram em nosso País em uma situação de irregularidade e que sofreram uma certa admoestação, porque a autoridade policial não poderia abrir mão de cumprir as suas funções burocráticas, as suas funções policiais.

            No entanto, ao mesmo tempo em que tivemos esse desapontamento, tivemos também a alegria de saber que a Polícia Federal realiza uma operação que deveria se transformar, na verdade, em uma política de fronteira para que o nosso País pudesse estancar, no nascedouro, na fonte, um pouco da criminalidade.

            Era essa a nossa fala de hoje à tarde.

            Sr. Presidente, agradecemos a tolerância de V. Exª e, ao encerrar, esperamos que possamos criar aqui mecanismos para socorrer melhor os haitianos que se deslocam para o nosso País.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2010 - Página 8768