Discurso durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reivindicação da Sociedade Brasileira de Hepatologia sobre a expansão e a democratização do acesso dos pacientes do Sistema Único de Saúde à especialidade de Hepatologia e a ampliação da formação de profissionais naquela área. (como Líder)

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Reivindicação da Sociedade Brasileira de Hepatologia sobre a expansão e a democratização do acesso dos pacientes do Sistema Único de Saúde à especialidade de Hepatologia e a ampliação da formação de profissionais naquela área. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2010 - Página 8950
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, ENTIDADE, AMBITO NACIONAL, ESPECIALIZAÇÃO, DOENÇA GRAVE, REIVINDICAÇÃO, EXPANSÃO, DEMOCRACIA, ACESSO, PACIENTE, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), TRATAMENTO, AMPLIAÇÃO, FORMAÇÃO, MEDICO, ESPECIALISTA, GRAVIDADE, NUMERO, BRASILEIROS, CARENCIA, ATENDIMENTO, LEITURA, CARTA, PRESIDENTE, ASSOCIAÇÃO DE CLASSE, PROFESSOR, UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA (UFBA), DESTINATARIO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS).
  • QUALIDADE, MEDICO, SOLICITAÇÃO, ENCAMINHAMENTO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), JUSTIÇA, REIVINDICAÇÃO, SAUDE PUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, trago para registro no plenário do Senado Federal uma reivindicação da Sociedade Brasileira de Hepatologia sobre a expansão e a democratização do acesso dos pacientes do Sistema Único de Saúde à especialidade de Hepatologia e, ao mesmo tempo, a ampliação da formação de especialistas nessa área. Não estamos falando de um assunto simples, mas estamos nos reportando a oito milhões de brasileiros que encontram completa carência de especialidades em doenças de fígado no Brasil.

            É uma carta consistente, endereçada ao Ministro de Estado da Saúde, José Gomes Temporão, pelo Dr. Raymundo Paraná, atual Presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia. Faço questão de homenagear, pelo Senado Federal, essa reivindicação, trazendo-a ao conhecimento do Plenário. Ela diz o seguinte:

Sr. Ministro,

Na condição de Presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia, rogo ao Ministério da Saúde apoio para que tomemos medidas visando ampliar a formação de médicos hepatologistas no País.

Este apoio passa necessariamente pelo retorno da Hepatologia à condição de especialidade independente, de direito, pois de fato já acontece desta forma. Passa também pelo tema da ‘Residência Médica em Hepatologia no Brasil’.

Creio que os fatos e argumentos que irei discorrer justifiquem uma visão mais realista e estratégica para a formação de especialistas em doenças do fígado e vias biliares para os carentes centros de referência do País.

No Brasil, a Hepatologia voltou, inexplicavelmente, à condição de área de atuação da Gastroenterologia após alguma tempo de reconhecimento como especialidade. Por isso, temos que realizar um programa de residência médica com apenas um ano de formação, considerado insuficiente para formar um hepatologista.

A Sociedade Brasileira de Hepatologia se engaja hoje numa luta para que a Hepatologia volte a ser considerada uma especialidade independente da Gastroenterologia. Ao longo das últimas décadas, a Hepatologia sofreu espetacular modificação de conceitos e paradigmas. Hoje, as doenças hepáticas têm uma complementaridade maior com outras especialidades como a Endocrinologia (síndrome metabólica, hemocromatose, doença de Wilson) e Infectologia (hepatites virais, manifestações hepáticas da Aids, hepatoxidade dos antivirais).

Aos poucos, houve um distanciamento real entre a Hepatologia e a Gastroenterologia. Todavia, no Brasil, nos mantivemos ainda no antigo conceito da área de atuação, fato que dificulta em muito a formação de hepatologistas no País.

Assim, estamos vivendo uma escassez de profissionais hepatologistas para atender a pacientes com doenças hepáticas no País. Muitos Estados da Federação não possuem hepatologistas nos seus quadros de saúde. Apenas duas das endemias hepáticas (esteatose hepática/esteato hepatite e hepatites virais) afligem não menos do que oito milhões de brasileiros. Contudo, acreditamos que nem 10% desses indivíduos tenham tido oportunidade de uma consulta com profissionais com formação sólida em Hepatologia.

O Departamento de DST/Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde pode atestar essa carência, fato reconhecido como negativo quanto à implantação das políticas de assistência e prevenção às hepatites virais no Brasil.

Ademais, nas muitas unidades da Federação que hoje possuem médicos hepatologistas, a assistência aos portadores de doenças do fígado deixa a desejar. Esse aspecto, além de reduzir o acesso ao especialista, sobrecarrega vários Municípios, com dispendiosos tratamentos fora do domicílio. A região amazônica é o exemplo dessa injusta situação.

Tudo isso se dá pela escassez de profissionais, motivada pela dificuldade na formação dos mesmos, uma vez que, como área de atuação, o médico hepatologista no Brasil necessita passar dois anos na Clínica Médica, dois anos na Gastroenterologia e, posteriormente, mais um ano na Hepatologia.

Trata-se de um longo e tortuoso caminho que também encontra dificuldades nas questões financeiras, visto que o médico residente deverá ficar longo tempo fora do mercado de trabalho para uma especialidade clínica e sem procedimentos.

Além dessa adversidade supracitada, temos também a concorrência da endoscopia digestiva. Habitualmente, o médico residente em Gastroenterologia entra em contato precocemente com a endoscopia digestiva. Por se tratar de um procedimento com remuneração de mercado melhor do que uma especialidade genuinamente clínica, muitos gastroenterologistas acabam migrando para a endoscopia digestiva ao tempo em que abandonam a Hepatologia.

A Sociedade Brasileira de Hepatologia tem empenhado todos os esforços, junto ao Conselho Federal de Medicina e à Associação Médica Brasileira, no sentido de mostrar que não faz mais sentido a Hepatologia como área de atuação da Gastroenterologia.

Acreditamos que os programas de residência médica em Hepatologia no País devam ter dois anos de formação após a residência em Clínica Médica. A complexidade das doenças hepáticas requer formação mais completa para o hepatologista nos métodos de imagem, na biologia molecular, na histopatologia, além do transplante de fígado. Ademais, temos atualmente dez revistas médicas internacionais de impacto só na nossa especialidade.

Acreditamos que dessa forma estaríamos deixando claros os projetos pedagógicos de formação na nossa especialidade, ao tempo em que garantiríamos a qualidade dos profissionais que estão sendo formados para que os mesmos possam povoar os nossos carentes serviços públicos de saúde. Mais ainda, estaríamos possibilitando a ampliação dos programas de transplante hepático do Brasil. Esta é uma necessidade que não pode ser atendida com um programa de residência médica com apenas um ano como área de atuação.

O status da Hepatologia como área de atuação é um desserviço à população, ao sistema único de saúde e ao ensino médico no Brasil. Fígado e tubo digestivo se distanciaram no momento em que a Hepatologia ganhou espaço nos meios diagnósticos e terapêuticos. Sequer partilhamos a mesma clientela nos congressos e nos programas de educação médica continuada. Ademais, como explicar que especialidades menos complexas como a Mastologia, Medicina do Trânsito e outras mais tenham o status de especialidade, enquanto a Hepatologia continua como área de atuação.

Os mais ricos serviços de Gastro-Hepatologia do País, no eixo Sul/Sudeste, adotam o modelo compartilhado de assistência. Convivem hepatologistas e gastroenterologistas em paralelo, mas esses não cruzam as suas atividades acadêmicas ou assistências. De fato funcionam como dois serviços dentro de um serviço guarda-chuva. Já os serviços mais pobres, a maioria, penam em desenvolver a Hepatologia por falta de repertório de recursos humanos. Portanto, o modelo atual é perverso e inadequado.

Buscamos corrigir esta distorção em curto prazo, mas, para isso, necessitamos do apoio deste Ministério, através do reconhecimento da necessidade de formarmos hepatologistas no País com expressiva melhoria na quantidade e na qualidade. Em breve, a Sociedade Brasileira de Hepatologia se manifestará junto ao MEC no sentido de propor um programa mínimio de formação do Hepatologista no qual o jovem médico seja formado na área de Clínica Médica, Imagem, Laboratório, Histopatologia Hepática e Transplante de Fígado. Este modelo já é praticado em outros países, onde a Hepatologia não segue mais o ritual de área de concentração da Gastroenterologia. Este é o caso de serviços de ponta no mundo, como o da Universidade de Miami, Universidade de São Francisco, Universidade de Paris V, Universidade de Barcelona e tantas outras.

            É o que diz, Sr. Presidente, o Sr. Raymundo Paraná, professor-adjunto da Universidade Federal da Bahia, em nome da Sociedade Brasileira de Hepatologia.

            Encerro, prestando uma homenagem do Senado - que, tenho certeza é de todos os Senadores - à Sociedade Brasileira de Hepatologia e pedindo ao Sr. Ministro da Saúde que possa mediar esse entendimento, para que tenhamos o melhor resultado. E diante da reivindicação justa, solicito a V. Exª, como médico que é e como alguém que está presidindo com grandeza a sessão neste momento, que possa determinar o encaminhamento do meu pronunciamento e da carta anexa ao Sr. Ministro da Saúde e ao Sr. Ministro da Educação.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2010 - Página 8950