Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referência ao julgamento do casal Nardoni em São Paulo. Críticas ao sistema carcerário brasileiro.

Autor
Marisa Serrano (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Marisa Joaquina Monteiro Serrano
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PENITENCIARIA.:
  • Referência ao julgamento do casal Nardoni em São Paulo. Críticas ao sistema carcerário brasileiro.
Aparteantes
Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/2010 - Página 9214
Assunto
Outros > POLITICA PENITENCIARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, JULGAMENTO, CASAL, ACUSAÇÃO, HOMICIDIO, CRIANÇA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), CRIME, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), DISCUSSÃO, AMBITO NACIONAL, REDUÇÃO, LIMITE DE IDADE, IMPUTABILIDADE PENAL, QUESTIONAMENTO, CAPACIDADE, PRESIDIO, RECEBIMENTO, MENOR, REFERENCIA, REUNIÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA), DENUNCIA, DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS, SISTEMA PENITENCIARIO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, PRECARIEDADE, INFRAESTRUTURA, PENITENCIARIA, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), CONTRADIÇÃO, EXCESSO, NUMERO, PRESO.
  • ELOGIO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), DETERMINAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, LIBERAÇÃO, DETENTO, ALEGAÇÕES, INSALUBRIDADE, PRISÃO, MUNICIPIO, CARIACICA (ES), ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES).
  • COMENTARIO, TENTATIVA, GOVERNO ESTADUAL, REDUÇÃO, SUPERIORIDADE, LOTAÇÃO, PENITENCIARIA, ANUNCIO, INAUGURAÇÃO, PRESIDIO, MUNICIPIO, CAMPO GRANDE (MS), TRES LAGOAS (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), INSUFICIENCIA, ATUAÇÃO, RESOLUÇÃO, PROBLEMA, TOTAL, DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS.
  • COBRANÇA, RESPONSABILIDADE, SENADO, IMPORTANCIA, REFORMULAÇÃO, POLITICA, SEGURANÇA PUBLICA, SISTEMA PENITENCIARIO, PRIORIDADE, REINTEGRAÇÃO SOCIAL, RECLUSO, ELOGIO, TIME, FUTEBOL, CONTRATAÇÃO, EX-DETENTO, ASSISTENCIA, DELINQUENCIA JUVENIL.
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, GARANTIA, INCENTIVO FISCAL, INICIATIVA PRIVADA, EMPREGO, EX-DETENTO, ELOGIO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), OFERECIMENTO, DETENTO, CURSOS, QUALIFICAÇÃO, PROFISSÃO, OPORTUNIDADE, TRABALHO, PARCERIA, DIVERSIDADE, EMPRESARIO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

            Esta semana, boa parte dos brasileiros acompanharam e acompanham pari passu o julgamento do casal Nardoni, lá em São Paulo. O pai e a madrasta são acusados de terem matado a menina Isabella, de apenas 5 anos de idade, em 2008.

            A gente fica com desejo, acredito que todo brasileiro e qualquer pessoa no mundo, de que isso não fosse verdade. Que pai, mãe, madrasta, pessoas que estão próximas das crianças, acompanhando o seu desenvolvimento, que são responsáveis pela saúde e pela integridade física e moral dessas crianças não fossem nunca os culpados de terem tirado a vida dessas pequenas pessoas.

            Mas aí fica uma questão de dizer que a sociedade brasileira se comoveu muito com esse caso, como se comove com todos os casos que implicam principalmente o envolvimento de crianças.

            E quando a pessoa tem o dever de resguardar, de cuidar das crianças e não o faz, mais ainda incita as pessoas a acompanharem com tristeza casos como esse.

            Eu quero dizer que domingo passado, no meu Estado, Mato Grosso do Sul, na cidade de Corumbá, na nossa divisa com a Bolívia, uma mãe de 15 anos matou a facadas seu filho de um ano e meio. Quer dizer, é uma coisa que foge aos princípios de qualquer pessoa e não se pode dizer que é normal.

            Vocês viram, pela televisão, também, nesse fim de semana - e foi amplamente divulgado -, um garoto, nos Estados Unidos, de 12 anos, que matou a sua madrasta grávida de 8 meses. E aí se discute se um garoto de 12 anos deve ir à prisão perpétua, ou deve ir à cadeira elétrica.

            Enquanto nós, no Brasil, estamos discutindo a questão da maioridade penal, porque a nossa é de 18 anos, há pessoas que querem abaixar para 16 anos; e há outras ainda que acham que deve ser menos de 16 anos.

            Nos Estados Unidos, está-se discutindo se o garoto de 12 anos vai para a cadeira elétrica ou para a prisão perpétua. Aqui no Brasil, nós não temos esses casos nem de prisão perpétua, nem de cadeira elétrica. Mas temos uma outra coisa que é parecida: as nossas prisões. Quem entra lá é praticamente um morto-vivo. Prisões tão superlotadas que não dão o direito de que a pessoa volte para o convívio dos seus semelhantes.

            Na semana passada, nós vimos isso quando foi discutido na ONU, em Genebra, num painel paralelo à reunião do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, a questão prisional do Espírito Santo, que eles chamaram de masmorras capixabas. O sistema prisional brasileiro também foi discutido nessa Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Quer dizer, nós estamos sendo criticados no mundo todo pelo nosso sistema prisional.

            As prisões do Espírito Santo são o reflexo da falência completa do sistema carcerário brasileiro. Lá, 300 homens dividem um espaço que seria apenas para 36, homens que não podem nem ficar de pé, que fazem turno para quem fica de pé e quem pode ficar agachado, porque nem deitado pode ficar. Isso é completamente desumano.

            Não estou aqui passando a mão na cabeça dos criminosos. Em absoluto. Eu estou aqui dizendo que nós temos que reformar o nosso sistema prisional, que nós não podemos aceitar que pessoas sejam tratadas como bestas-feras.

            Eu quero dizer que não é só no Espírito Santo que acontece isso, mas esse Estado podemos exemplificar, pois agora está em todas as manchetes de jornais, não só aqui, mas no mundo todo.

            O Espírito Santo tem sete mil presos que estão espalhados em 26 cadeias, com uma superlotação de 1.800 presos. Quer dizer, tem 1.800 presos a mais do que comportam as suas cadeias. Como é que ficam essas pessoas?

            Ontem, o Supremo Tribunal de Justiça determinou que o Governo libere 433 presos que eram mantidos em contêineres de metal na cidade de Cariacica, no Espírito Santo, aqueles contêineres de metal que não têm ventilação, em que a pessoa assa porque morre de calor. E o Supremo Tribunal de Justiça, pela primeira vez no País, conforme notícia que tive, mandou o Governo liberar 433 presos que estavam nesses contêineres.

            No meu Estado, Mato Grosso do Sul, a situação também é drástica. Segundo a Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário, hoje, são 9.810 internos para 5.300 vagas, portanto, uma defasagem de 4.500 vagas, são 4.500 vagas que nós não temos nesse Estado e que as pessoas precisam ficar amontoadas para cumprir a sua pena.

            A cada mês entram mais de 200 presos no sistema prisional de Mato Grosso do Sul, cada mês mais 200 presos, só que não se constrói uma cadeia a cada mês.

            Muitos dos nossos detentos são originários de outros Estados e presos geralmente por tráfico de drogas. Aí para amenizar o problema, até final de abril, será inaugurado o presídio semiaberto agroindustrial em Campo Grande, com capacidade para mil detentos. Também há previsão de inauguração de outro presídio semiaberto em Três Lagoas, com mais 300 vagas. É alguma coisa. Mas o problema de superlotação vai continuar. A criação de vagas não se sustenta. Não é possível manter o fluxo de entrada nos presídios, que reflete a política de segurança baseada na repressão e no encarceramento, e na preferência da Justiça brasileira pela pena de prisão. E digo isso para todo o País, não só para o meu Estado.

            Citei apenas alguns exemplos que acontecem em todo o Brasil. São rebeliões, superlotação, falta de higiene e segurança, assassinatos e traficantes convivendo com ladrões de pequeno porte, falta de investimento no sistema prisional, desrespeito completo aos direitos humanos.

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - Senadora Marisa Serrano, eu gostaria de interromper. Sei que a senhora vai ficar satisfeita com a minha interrupção. Eu queria apenas agradecer a presença dos alunos do Colégio Desafio, de Goiânia, que estão assistindo a esta sessão e ouvindo V. Exª.

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Que bom, sejam bem-vindos à nossa Casa. (Pausa.) E vocês hoje estão ouvindo aqui algo que não é bonito e que não alegra o coração da gente. Estão ouvindo falar das nossas prisões superlotadas neste País, de homens tratados como se não fossem humanos.

            E quero, ainda, dizer: O que podemos esperar de uma pessoa que sai de uma cadeia dessas? Que ele seja ressocializado? Que ele possa ser uma pessoa que participe do nosso convívio, depois de estar numa prisão com condições infra-humanas, que ficam de pé, porque não podem nem sentar nem deitar, que fazem camadas para segurarem nas grades a fim de que outros possam ficar abaixo, porque não têm onde se encostar!? Quer dizer, nós temos que pensar o que fazer com essas pessoas que saem das cadeias, que saem das prisões.

            Aqui eu quero colocar a nossa responsabilidade, a nossa responsabilidade em ressocializar os presos, a nossa responsabilidade, nesta Casa, de achar um sistema que seja mais efetivo. Talvez, Senador Romeu Tuma, de pequenos presídios, talvez privatizar os presídios que nós temos.

            Ouço com muita satisfação V. Exª, se o Presidente me permitir.

            O Sr. Romeu Tuma (PTB - SP) - Eu peço até desculpas a V. Exª por interromper um discurso importantíssimo nesta hora. Hoje, pela manhã, na CPI da Pedofilia, tive oportunidade de falar sobre o julgamento dos Nardoni e, inclusive, sobre as cenas que foram montadas num filme pela perícia com o sofrimento e agressão que a criança sofreu. Realmente, quem é pai, quem tem família sabe que isso seria impossível, alguém do qual nasceu esta criança, pai ou mãe, ter a possibilidade de esganar, de agredir e de matar uma criança de cinco anos. Acho que isso é uma cena tão terrível e tão amarga que não dá nem para a gente dormir direito para não cometer injustiça, e não permitir que se repitam fatos como esse. Mas hoje, pela manhã, eu estava falando com os membros da CCJ para formarmos uma Subcomissão do Regime Penitenciário, porque não dá mais para recuperar preso que fica pendurado na grade, ou que às vezes mata dois ou três para poder ter um espaço maior. Então V. Exª tem toda razão, e desejo estar ao lado de V. Exª para nós formarmos uma subcomissão que analise profundamente o sistema carcerário, tentarmos modernizá-lo, trabalhar realmente para a socialização ou a reintegração na sociedade desses presos, seja qual for o tipo de crime que praticaram. Obrigado, Senadora.

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Obrigada, Senador Romeu Tuma, V. Exª coloca e justifica que precisamos fazer algumas coisas, tomar algumas medidas. Esta é uma boa medida: nos unirmos para discutir como fazer para ajudar a melhorar o Sistema Penitenciário brasileiro. Eu estava falando daqueles presos que saem das cadeias, daqueles que já cumpriram suas penas, que são ex-presos.

            Como é que a sociedade os recebe?

            Quero aqui dizer - não sou corintiana; sou palmeirense - que o Corinthians fez uma coisa incrível para ajudar os ex-detentos. Considerado um dos maiores times de futebol do País, o Corinthians está aceitando ex-detentos, contratando ex-detentos para auxiliar no Corinthians, para ajudar, e também está fazendo um trabalho com os jovens que saem da Fundação Casa, jovens de até 18 anos que estão detidos porque são considerados infratores. Então, o pequeno infrator também está sendo amparado, de alguma forma, pelo Corinthians.

            Eu queria, em nome desse time, divulgar a ideia de que todo mundo pode colaborar. Todos os empresários, todas as pessoas, conforme as suas possibilidades, podem colaborar. É hora de as empresas que, de fato, podem aceitar os ex-detentos colaborarem. É hora de ajudarmos aqueles que saem da prisão para que não precisem retornar, porque, se aqui fora não encontram guarida, é claro, evidente, que eles vão seguir o mesmo caminho de buscar as drogas e continuar cometendo crimes.

            O Sr. Romeu Tuma (PTB - SP) - Desculpe-me, Senadora.

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Pois não.

            O Sr. Romeu Tuma (PTB - SP) - Ontem, parece-me que o Presidente Gilmar esteve com o Presidente Sarney e entregou alguns projetos importantes para a área de segurança, e um deles prevê a possibilidade de criar incentivos para a contratação de ex-presidiários, para que, ao saírem da cadeia, possa haver a oportunidade de as empresas contratá-los. E o Ministro Asfor, que esteve aqui há pouco - ontem estive com ele -, está contratando deficientes físicos e ex-prisioneiros, na tentativa de recuperá-los, oferecendo-lhes trabalho dentro da própria Justiça. Então, acho que o Presidente Sarney... Foi, ontem, Presidente, que V. Exª recebeu o Presidente Gilmar, que trouxe alguns projetos importantes, inclusive, esse que V. Exª propõe da tribuna.

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - E, por isso, Senador Romeu...

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - Eu recebi ontem o Presidente do Supremo Tribunal Federal com alguns membros do Conselho, que me entregaram vários projetos nesse sentido. Já enderecei ao Senador Casagrande, que é o Relator do Código de Processo Penal, para justamente S. Exª ver se pode, ainda, consolidar essas ideias no Código Penal, que está em votação.

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Isso é muito bom.

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP) - Eu pediria a V. Exª, então, que, se fosse o caso, procurasse o Senador Casagrande e olhasse os projetos que estão lá no Conselho Nacional de Justiça.

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Isso é ótimo. Vou fazer isso.

            São notícias como essas, alvissareiras, que dão ideia de que nós não estamos imobilizados, de que estamos trabalhando, de que estamos procurando saídas, para auxiliar aqueles que mais precisam.

            Entrei com um projeto, na semana passada, justamente para garantir às empresas que possam receber detentos e que tenham incentivos fiscais. Acredito que isso vai ajudar também. Mas são todas ajudas paliativas. Nós precisamos muito mais do que isso. Precisamos reformular todo o sistema prisional que existe neste País. Não dá para continuar do jeito em que está.

            Gostaria, inclusive, de colocar aqui alguns aspectos mais importantes, principalmente do meu Estado do Mato Grosso do Sul, que tem trabalhado nesse sentido. Mato Grosso do Sul é um dos Estados que tem um índice maior de presos qualificados.

            (Interrupção do som.)

            A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - São presos que recebem uma qualificação, para, saindo das prisões, terem a oportunidade de trabalhar. Trinta e sete por cento trabalham por meio de parcerias com entidades públicas ou privadas e 15% estão em sala de aula. É o pouco que meu Estado, Mato Grosso do Sul, faz, mas é a garantia que todo Estado tem de dar a que esses homens, onde quer que estejam, possam ressocializar-se, estar juntos com a sociedade, oferecer a ela um pouco do seu trabalho e da sua visão de vida.

            Quero terminar, dizendo que, em nenhum momento, estou aqui defendendo criminosos. Em nenhum momento estou dizendo que aqueles que cometem delitos ou crimes não devem ser severamente punidos. O que estou dizendo é que não temos o direito de criar bestas-feras no lugar de homens e, assim, de criar para nossa sociedade muito mais problemas do que teríamos, se cuidássemos melhor dessas pessoas, que também têm de ter seus direitos humanos respeitados.

            Eram as minhas palavras.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/2010 - Página 9214