Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Citação do artigo do jornal Valor Econômico de hoje, intitulado "À Mestra com Carinho", de José Luiz Fiori, sobre a Professora Maria da Conceição Tavares. Anúncio de encaminhamento de requerimento à CAE, solicitando seja convidada a Professora Maria da Conceição Tavares para apresentar uma análise da evolução e das perspectivas do desenvolvimento econômico brasileiro.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Citação do artigo do jornal Valor Econômico de hoje, intitulado "À Mestra com Carinho", de José Luiz Fiori, sobre a Professora Maria da Conceição Tavares. Anúncio de encaminhamento de requerimento à CAE, solicitando seja convidada a Professora Maria da Conceição Tavares para apresentar uma análise da evolução e das perspectivas do desenvolvimento econômico brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/2010 - Página 9285
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), HOMENAGEM, ANIVERSARIO, MARIA DA CONCEIÇÃO TAVARES, ECONOMISTA, PROFESSOR, DEPUTADO FEDERAL, PRODUÇÃO, DIVERSIDADE, ESTUDO, ECONOMIA, BRASIL, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, FORMAÇÃO, IDEOLOGIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • ELOGIO, VIDA PUBLICA, ECONOMISTA, INTERESSE, CRESCIMENTO ECONOMICO, VINCULAÇÃO, INCLUSÃO, NATUREZA SOCIAL, ANUNCIO, ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, CONVITE, PROFESSOR, APRESENTAÇÃO, BALANÇO, ANALISE, EVOLUÇÃO, EXPECTATIVA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, no Valor Econômico de hoje há um artigo que me comoveu e certamente a tantos brasileiros, sobretudo àqueles que, como eu, somos professores de economia, economistas. Refiro-me ao artigo: “À Mestra, com carinho”, de José Luís Fiori.

            Abre com uma citação da Professora Maria da Conceição Tavares, quando ela, certo dia, disse:

            "Eu pessoalmente já fui para a cadeia, sem nem saber porque, dado que sou apenas uma rebelde, pelo que escrevo, pelo que esbravejo. Mas a vocês quero dizer o seguinte: já estou velha e cansada, mas não desisti. Não desisti! Eu acho que tem que estudar mais, aprofundar, aprofundar a análise, batalhar.

            Maria da Conceição Tavares completa 80 anos no dia 24 de abril de 2010 [Daqui a um mês exatamente]. Matemática, economista, intelectual com vasta formação histórica, filosófica e literária, professora, militante, deputada federal, torcedora fanática do Vasco e admiradora...”

            Aqui houve um engano de José Luís Fiori, porque acabo de falar com a Professora Maria da Conceição Tavares, e ela falou: ‘Não, não sou admiradora da Portela; eu sou da Mangueira. Então, aqui fica registrado corretamente que ela é admiradora da Escola de Samba Mangueira.

            “Maria da Conceição se transformou, nos últimos 50 anos, numa figura pública emblemática e numa referência decisiva na vida cultural e intelectual brasileira. Conceição nasceu num povoado, no interior de Portugal, perto de Anádia, na região de Aveiro. A família de sua mãe era católica e monarquista, mas seu pai era anarquista, e essa divisão familiar, ideológica e política marcou toda a sua infância, vivida em plena ditadura salazarista e durante a Guerra Civil espanhola.”

            Em 1953, Maria da Conceição se graduou em Matemática, na Universidade de Lisboa, e pouco depois se mudou para o Brasil, aos 23 anos de idade, alguns meses antes do suicídio de Getulio Vargas. Em vários depoimentos sobre sua vida, Conceição confessa que se deixou envolver imediatamente pelo ‘otimismo brasileiro da década de 50’ e pela intelectualidade carioca; apaixonada pelo sonho de Brasília, do Plano de Metas, da Bossa Nova e do Desenvolvimentismo, cantado em verso e prosa nos salões intelectuais do Rio de Janeiro, liderados pela geração de Darcy Ribeiro, Mario Pedrosa e Aníbal Machado. Ao lado dos nacional-desenvolvimentistas do Instituto Superior de Estudos Brasileiros - Iseb, e da geração de cientistas que começava a se reunir em torno da SBPC.

            Em 1960, Maria da Conceição Tavares se formou em Economia na Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde foi aluna e assistente de Otavio Gouveia de Bulhões, ao mesmo tempo em que trabalhava com Inácio Rangel e com os economistas heterodoxos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE). Um pouco depois, já no escritório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, Cepal, no Rio de Janeiro, Conceição estabeleceu relações pessoais e intelectuais definitivas com Celso Furtado, Aníbal Pinto, e Raul Prebish. E foi assim, com um pé na ortodoxia neoclássica, o outro na heterodoxia estruturalista, e com uma forte formação marxista e keynesiana que ela ingressou no debate econômico latino-americano, ao publicar, em 1963, um artigo clássico, sobre o ‘auge e o declínio do processo de substituição de importações’, onde ela explicava, de forma pioneira, os limites estruturais da estratégia de industrialização que era preconizada -- naquele momento - por quase todos os economistas desenvolvimentistas.

            A partir daí, e nas décadas seguintes, Conceição participou de quase todas as grandes polêmicas econômicas, do Brasil e do continente: nos anos 60 criticou a ‘tese estagnacionista’ de Celso Furtado, e dos ‘teóricos da dependência’; nos anos 70, denunciou os limites financeiros do modelo de crescimento adotado pelo governo militar; nos anos 80, participou intensamente da discussão sobre a origem e a natureza da crise econômica e da hiperinflação no Brasil; e, durante a década de 90, escreveu inúmeros artigos e livros criticando as políticas e reformas neoliberais associadas à ideologia da globalização.

            Além disso, Maria da Conceição escreveu dois trabalhos de longo fôlego, sobre o ‘movimento cíclico da economia brasileira’, que se tornaram suas teses de doutoramento, em 1974, na Unicamp, e de livre docência, na UFRJ, em 1977. Nas décadas de 80 e 90, Conceição participou do debate internacional sobre ‘a crise da hegemonia americana’, inaugurando o campo da economia política internacional no Brasil. Nesse período, ela foi professora, sucessivamente, da UFRJ, da FGV-RJ, da Cepal, da Universidade do Chile, da Universidade Nacional do México e da Universidade de Campinas, onde teve o papel decisivo na formação da sua escola de economia.

            Depois do golpe militar de 1964, Maria da Conceição viveu no Chile, no México, e na França, antes de voltar ao Rio, e ser presa em 1974. No Chile, Conceição participou da equipe econômica do governo de Salvador Allende, e depois, já de volta ao Rio, militou na luta pela redemocratização brasileira, dentro do PMDB, onde ajudou a formular o seu primeiro programa de governo que se chamou de “Mudança e Esperança”, e foi escrito em 1982.

            Uma década depois, Maria da Conceição Tavares ingressou no Partido dos Trabalhadores, e foi eleita deputada federal pelo Rio de Janeiro, em 1994. Hoje, olhando em perspectiva, se pode ver com claridade o papel decisivo que as suas ideias tiveram na formação do ‘pensamento econômico da Unicamp’, que hoje é hegemônico dentro do segundo Governo Lula; e também na inflexão tardia e ‘desenvolvimentista’ do PT, partido que se formou no início dos anos 80 sem nenhuma concepção econômica própria e sob forte influência das ideias antiestatistas, antinacionalistas e antigetulistas de quase toda a intelectualidade paulista, liberal e marxista, desde os anos 50.

            Somando e subtraindo, Maria da Conceição Tavares, em toda a sua vida, foi sobretudo uma professora e uma humanista que ensinou várias gerações -- dentro e fora do Brasil -- a pensar o mundo com paixão, mas com absoluto rigor analítico; com coragem, mas com total lucidez; com espírito critico, mas com grande otimismo histórico; com rebeldia anárquica, mas com um profundo sentido de compromisso com o seu povo e com as angústias do seu tempo. Além disso, em todos os lugares onde esteve, Conceição foi sempre uma mente provocadora e incapaz de acovardar-se ou de negar o seu próprio passado. Poucos professores no mundo, ao chegar aos 80 anos, poderão assistir -- como ela -- uma eleição da importância da que ocorrerá no Brasil, em 2010, e saber que os dois principais candidatos à presidência da República foram seus alunos e se consideram, até hoje, seus discípulos [José Serra e Dilma Roussef]. Parabéns e obrigado, Maria da Conceição.”

            Essa é a palavra de José Luís Fiori, professor titular do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autor do livro O poder global e a nova geopolítica das nações, da Editora Boitempo, de 2007.

            Eu queria lhes dizer, querido Senador Inácio Arruda, que é também um admirador da Maria da Conceição, que, tendo em conta esta efeméride, este bonito fato - Maria da Conceição vai fazer 80 anos em 24 de abril, no mês da Revolução dos Cravos, que tem tudo a ver com ela -, eu quis, então, que o Senado participasse.

            Por essa razão, estou encaminhando um requerimento para ser apreciado na próxima terça-feira na Comissão de Assuntos Econômicos. Tenho certeza de que falo também em nome do Líder Aloizio Mercadante, que foi seu aluno, seu colega, professor, e seu amigo especial. Pois em nome também da Liderança do PT e de Aloizio Mercadante, quero requerer, com base no art. 93, inciso II, do Regimento Interno, que seja convidada a professora Maria da Conceição Tavares para apresentar à Comissão de Assuntos Econômicos uma análise da evolução e das perspectivas do desenvolvimento econômico brasileiro, para que ela possa fazer um balanço daquilo que aconteceu nesses últimos anos e décadas e também para que ela possa transmitir as suas recomendações ao novo governo. Será de Dilma Rousseff? Será de José Serra? De Marina Silva? De Ciro Gomes? Com todas essas pessoas, ela teve uma relação muito especial.

            Pois bem, eis a justificativa.

            Maria da Conceição Tavares exerceu grande influência sobre o pensamento econômico brasileiro. Tratou de assuntos variados, mas com uma única preocupação: o desenvolvimento de países “periféricos”, com especial ênfase no caso brasileiro, e como incluir a grande parte da população excluída do desenvolvimento econômico.

            (Interrupção do som)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Intelectual e professora, formou algumas gerações de economistas.

            Nascida no interior de Portugal, é uma das economistas de maior influência sobre o pensamento econômico brasileiro, se não for hoje a principal economista viva do País. Logo após se formar em matemática, em 1953, na Universidade de Lisboa, mudou-se para o Brasil, com 23 anos, onde se formou em economia pela então Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.

            Trabalhou na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, a Cepal. Aliás, conforme ela própria me contou, a Cepal a convidou para, em maio próximo - convite do professor Ocampo -, apresentar e discutir um trabalho escrito. Ela até me disse: “Mas, Eduardo, tenho essa responsabilidade, estou me preparando para ela, não sei se vai dar para estar aí em abril, na semana do aniversário”.

            (Interrupção do som.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Eu disse, então, que a Comissão de Assuntos Econômicos, o Senador José Garibaldi Alves, conversará com ela para que sua vinda possa ser marcada no dia em que ela puder ao longo deste semestre. Será ótimo podermos ouvi-la.

            Na Unicamp, ela participou dos centros de referência do pensamento econômico brasileiro. Nesses centros, formou algumas gerações de economistas, inclusive os principais candidatos à Presidência. Ela os influenciou.

            Sua carreira acadêmica e seus livros e artigos sempre se pautaram por suas convicções éticas e políticas, na defesa de uma sociedade mais justa e solidária. Por essa razão, ela tem grande afinidade com Raúl Prebisch e Celso Furtado, pessoas que sempre primaram por combinar a defesa da ética com os bons ensinamentos de economia. A defesa dessas idéias acabou por levá-la a pleitear uma cadeira na Câmara dos Deputados, mandato exercido de 1995 a 1999.

            Tornou-se célebre não só pelo vigor de seu pensamento, mas também pela paixão com que defende seus pontos de vista, sempre procurando identificar os interesses da grande maioria da população, excluída dos frutos do desenvolvimento.

            Sua obra é vasta e diversificada: escreveu artigos e livros influentes, tanto no campo teórico quanto acerca de aspectos variados da economia brasileira e da América Latina.

            Entre suas obras, destaco:

            - Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. Rio de Janeiro, Zahar, 1972;

            - Acumulação de capital e industrialização no Brasil. Campinas, Editora da Unicamp, 1986;

            - Ciclo e Crise: o movimento recente da industrialização brasileira. Campinas, Instituto de Economia, 1998;

            - TAVARES, Maria da Conceição e FIORI, José Luís (org.) Poder e dinheiro. Petrópolis, Vozes, 1997;

            - (Des)ajuste global e modernização conservadora. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1993.

            (Interrupção do som.)

            (O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, seu grande amigo, escreveu Uma reflexão sobre a natureza da inflação contemporânea, Paz e Terra, 1986.

            Será, portanto, de inestimável valor para a Comissão de Assuntos Econômicos ouvir Maria da Conceição.

            Faço referência a Maria da Conceição Tavares em meu livro Renda de Cidadania. A saída é pela porta - estou escrevendo o prefácio para a sexta edição -na página 167, ao lado da citação de Celso Furtado sobre a renda básica de cidadania. Ele afirma que “todo homem tem direito a uma renda, uma inserção social positiva”. E que:

            “Este é o problema mais importante para definir esse projeto para o futuro: como hoje em dia modificar o conceito de trabalho e de renda e admitir que toda a população, todo homem que nasce em uma sociedade, merece a solidariedade de todos os membros dessa sociedade”.

            Eu escrevo aqui:

            “Maria da Conceição Tavares tem salientado, em muitas das reuniões dos economistas do PT e convidados, que o conceito de renda básica deve ser defendido sob uma perspectiva que todas as sociedades precisarão ter. É importante que seja compatibilizado com os recursos existentes, e tratado como um instrumento que complementará os demais, para a erradicação da pobreza. Certamente constitui um dos elementos importantes de política econômica, ao lado da universalização do direito à educação e da assistência à saúde pública, da realização da reforma agrária, da capilarização do crédito, do estímulo às formas cooperativas de produção, da maior interação entre empresários e trabalhadores em todas as unidades produtivas”.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Senador Eduardo Suplicy...

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - E assim concluo, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Está certo! Agradeço.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Se me permite...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Permito.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Quero mandar um beijo carinhoso para a professora Maria da Conceição Tavares.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Pois não.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/2010 - Página 9285