Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a tragédia social que se abate em várias partes do país, em razão da chamada epidemia do crack. Registro de artigo do escritor Moacyr Scliar, publicado no jornal Zero Hora, intitulado "O crack é mais que uma droga".

Autor
Sérgio Zambiasi (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Sérgio Pedro Zambiasi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA.:
  • Preocupação com a tragédia social que se abate em várias partes do país, em razão da chamada epidemia do crack. Registro de artigo do escritor Moacyr Scliar, publicado no jornal Zero Hora, intitulado "O crack é mais que uma droga".
Aparteantes
Cristovam Buarque, Geraldo Mesquita Júnior, Mozarildo Cavalcanti, Papaléo Paes.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/2010 - Página 12948
Assunto
Outros > DROGA.
Indexação
  • APREENSÃO, EPIDEMIA, DROGA, BRASIL, REGISTRO, GRAVIDADE, PROBLEMA, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, PROVIDENCIA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, ZERO HORA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), SUGESTÃO, SOLUÇÃO, REDUÇÃO, CONSUMO, DROGA, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, PAES, DEFESA, AUMENTO, PUBLICAÇÃO, RISCOS, ENTORPECENTE.
  • COMENTARIO, EMPENHO, SENADO, COMBATE, DROGA, ANALISE, IMPORTANCIA, REPRESSÃO, TRAFICO, PREVENÇÃO, CONSUMO, RECUPERAÇÃO, VICIADO EM DROGAS.
  • REGISTRO, PROJETO, AUTORIA, ORADOR, UNANIMIDADE, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, SANÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUTORIZAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, CELEBRAÇÃO, CONVENIO, MUNICIPIOS, PREVENÇÃO, CONSUMO, DROGA, EFETIVAÇÃO, REINTEGRAÇÃO SOCIAL, USUARIO, PROJETO DE LEI, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, AUMENTO, PENA DE DETENÇÃO, TRAFICANTE, PROPOSIÇÃO, ANDAMENTO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), POSSIBILIDADE, REVISÃO, DECISÃO, PERITO, PREVIDENCIA SOCIAL, CANCELAMENTO, AUXILIO DOENÇA, VICIADO EM DROGAS, ANTERIORIDADE, CONCLUSÃO, TRATAMENTO.
  • APREENSÃO, EXPANSÃO, CONSUMO, ENTORPECENTE, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), RELEVANCIA, ATUAÇÃO, PROFESSOR, CONSCIENTIZAÇÃO, JUVENTUDE, APOIO, FAMILIA, SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), MINISTERIO DA SAUDE (MS), DIVULGAÇÃO, INFORMAÇÕES, EFEITO, DROGA, COMPORTAMENTO, USUARIO, OBJETIVO, AUXILIO, IDENTIFICAÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Senador Mão Santa, mas a minha decisão é irreversível. Eu a tomei há muito tempo, muito consciente, entendendo que esse tempo que cumpri aqui o fiz com muita dedicação, com disciplina e pude contribuir para o meu Estado e para o Brasil, atuando inclusive como membro da base do Governo sem nenhum interesse que não o de contribuir para o Brasil, sem qualquer indicação para cargos no Governo Federal, nenhum tipo de troca. Foi uma decisão tomada coletivamente, mas a minha foi muito pensada e comprometida com as causas sociais do meu Estado e do Brasil. Essa razão me levou a fazer o voto de apoio ao Governo Federal. Não me sentiria à vontade se esse apoio fosse em troca de qualquer cargo no Governo, feriria inclusive os meus princípios.

            Quanto á reeleição, Senador Mão Santa, torço muito pelo senhor. O Brasil ama muito V. Exª, gosta muito de ver sua atuação.

            O Senador Mão Santa tem uma filha que já está adquirindo a cidadania gaúcha, trabalhando na Santa Casa de Porto Alegre, que é o maior hospital do Rio Grande do Sul. Passam por lá 20 mil pessoas por dia, uma assistência feita com muita dedicação, com muito respeito àquela comunidade periférica que busca tratar-se nesse hospital que é fruto exatamente do esforço coletivo da sociedade gaúcha. É uma referência da saúde brasileira a Santa Casa de Porto Alegre. E muito nos orgulha ter a sua filha em Porto Alegre. Queremos que ela permaneça lá como profissional. Precisamos de grandes médicos, como o é a médica filha do Senador Mão Santa que lá está. E todos torcemos pelo seu sucesso lá no seu Piauí, tão distante do Rio Grande, mas tão próximo por meio da sua presença aqui no Senado.

            Venho à tribuna hoje, Presidente Mão Santa, para falar mais um pouco de um tema que tem sido recorrente em minhas manifestações que é a verdadeira tragédia social que se abate em várias partes do Brasil em virtude agora da chamada epidemia do crack. Vou continuar insistindo neste tema, não desisto dele. Infelizmente ainda não vi ações realmente fortes do Governo, do Ministério da Saúde, do Ministério da Educação.

            Esse deveria ser um tema de sala de aula, um tema de todos os profissionais da área de saúde; deveria haver a verticalização no processo, para que definitivamente esse tema pudesse ser do cotidiano das pessoas, um alerta e uma conscientização.

            Aqui, nesta Casa, pelo menos nós estamos procurando fazer a nossa parte, combatendo o estrago que essa droga está provocando na sociedade, alcançando-a em todos os seus níveis, destruindo lares de todo tipo de família, seja a mais pobre ou a mais bem-sucedida, Senador médico Mozarildo Cavalcanti. Quero aqui não só reforçar a nossa preocupação quanto ao tema, mas também anunciar que esta Casa já está tomando, então, essas primeiras medidas que vão ao encontro dessa terrível realidade.

            Esse assunto deve ser tratado cotidianamente, mas hoje eu considero um dia especial. Ontem, dia 7 de abril, lembrávamos o Dia Mundial da Saúde, tendo como tema a cidade e a saúde. Em artigo publicado no último dia 6, no Jornal Zero Hora, de Porto Alegre, sob o título “O crack é mais que uma droga”, o escritor gaúcho Moacyr Scliar faz um interessante paralelo entre esse tema proposto pela Organização Mundial da Saúde e o uso de drogas, especialmente o crack.

            Destaco aqui alguns trechos do artigo que considero como pontos importantes de reflexão para essa discussão. Diz o médico e escritor Moacyr Scliar:

O crack não é apenas uma droga. É o resultado de uma ilusão perigosa, associada ao uso de substâncias, como o ópio, o haxixe, o tabaco

            Mais adiante, ele afirma:

Evitar o consumo é um passo importante para resolver o problema, mas isso não pode ser feito apenas pela repressão.É preciso saber o que as pessoas buscam no crack, o que as motiva nessa busca. No caso dos jovens, trata-se em geral do desamparo, da falta de perspectivas. [E diz Moacyr Scliar] Procurem não usar o estigmatizante termo “drogado”, que equivale a um veredicto. O dependente é um elo fraco na cadeia familiar e social, o elo que se rompe em função das tensões geradas na vida em comum. Daí a busca da droga que, como toda substância que é ingerida ou aspirada, pode representar uma gratificação fácil de caráter basicamente infantil. Se os pais tiverem isso em mente, procurarão, no contato com os filhos, na conversa franca e afetiva, proporcionar-lhes o apoio que desesperadamente buscam.

            Gostaria, Presidente Mão Santa, que fosse registrada nos Anais desta Casa a íntegra desse artigo, dada a lucidez com que Moacyr Scliar aborda a questão. Esses dois pontos resumem a estratégia para combater essa terrível praga. Devemos proporcionar informação em abundância, para que todos saibam o que é o crack, e o mal que ele faz. Dessa forma, poderemos reduzir a ocorrência do primeiro consumo da droga, que no caso do crack vicia no primeiro contato, na primeira pedra, Senador Mozarildo.

            O enfrentamento dessa questão depende, portanto, do fortalecimento de um tripé fundamental: a repressão, a prevenção e a recuperação. Nesse sentido, como já anunciei em outras ocasiões, apresentei três projetos, que poderão dar ao Poder Público melhores condições de intervir nessa problemática.

            O primeiro deles, após a aprovação unânime das duas Casas do Congresso Nacional, foi sancionado na semana passada pelo Presidente Lula, transformado na Lei 12.219, de 2010. Esse instrumento legal vai permitir que a União possa celebrar convênios diretamente com os municípios, com o objetivo de prevenirmos o uso da droga e possibilitarmos a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes. Com isso, fortalecemos uma base desse tripé, que é a prevenção.

            Tramita aqui o PLS 187, de 2009, cujo texto prevê o aumento da pena até o dobro para o tráfico das drogas mais danosas à saúde, como é o caso do crack. Devemos, sim, punir mais severamente quem trafica esse tipo de droga, uma vez que o dano à sociedade como um todo é muito maior.

            Esse projeto fortalece a ponta da repressão e já foi aprovado por unanimidade na Comissão de Assuntos Sociais. O nobre colega está aqui presente. O Senador Jarbas Vasconcelos é o Relator desse projeto na Comissão de Constituição e Justiça, última comissão antes da análise pela Câmara dos Deputados.

            De fato, as apreensões de drogas, em especial o crack, têm aumentado significativamente no País, mas as penas atuais ainda não são suficientes para coibir o tráfico. Concordamos que o aumento da pena isoladamente pode não surtir o efeito de inibir o tráfico, mas, dentro de um conjunto de ações que estamos propondo com esses projetos, pode ser um aliado poderoso nesse enfrentamento.

            Temos ainda o PLS 202, de 2009, que tramita atualmente na Comissão de Assuntos Sociais, sob a relatoria do nobre colega Senador Renato Casagrande. Trata-se da possibilidade de revisão, Senador Mesquita, de ofício, da decisão do perito médico da Previdência Social, que opinar pela cessação do benefício do auxílio-doença antes do término do tratamento.

            O tratamento de um dependente químico é muito delicado. O processo de desintoxicação leva tempo e não se adequa aos prazos tradicionais de concessão do auxílio-doença. O que ocorre, na prática, é que o beneficiário da Previdência Social, ao se submeter ao tratamento de dependência química, muitas vezes, tem o seu tratamento bruscamente interrompido, pois a avaliação do perito é a de que está apto a voltar ao trabalho.

            Ocorre, efetivamente, que a aparência física do viciado, de fato, melhora após os dois ou três primeiros meses de tratamento, mas, em 90% dos casos, o tratamento dele deveria durar mais tempo, pelo menos seis meses. O resultado é que, com isso, invariavelmente, o indivíduo retorna ao vício rapidamente. Ele recebe o benefício por dois ou três meses, melhora a aparência, vai fazer a perícia, aparentemente está bem, perde o benefício, volta para a rua, volta para a atividade, volta para o convívio social e volta novamente ao vício. Vira uma bola de neve, vira um círculo vicioso para o viciado, em prejuízo para a família, em prejuízo para a sociedade, em prejuízo para o orçamento nacional, o orçamento da Previdência Social, porque, em seguida, ele vai retornar para novos tratamentos, a um custo social extremamente alto. Então, ele vai necessitar de nova internação, como disse, de novos procedimentos de concessão de novos benefícios. Eu entendo que devemos atuar na diminuição da burocracia nesses casos, para que os tratamentos sejam mais eficientes e, como eu disse, mais econômicos para o Governo.

            Presidente Mão Santa, o problema é cada vez mais grave e assusta a toda sociedade, pois parece estar fora de controle. Nos últimos dias, várias reportagens dão conta do crescimento dessa epidemia nacional. Aqui mesmo, aqui, em Brasília, no Distrito Federal, vimos, na semana passada, que o tráfico e o consumo de crack acontecem livremente bem próximos dos prédios públicos do Governo Federal e do Governo local. Até quando vamos ficar assistindo impassíveis a essa situação? Será que não está claro que esse é um inimigo a ser enfrentado urgentemente por todos nós?

           Devemos agir de forma massiva, nos moldes da atual campanha da vacinação contra a Gripe A, por exemplo. Todo o sistema de saúde está mobilizado para imunizar a população contra essa doença que atingiu milhares de brasileiros em 2008 e 2009. Por que não intensificar, do mesmo modo, a conscientização do combate ao crack? A informação deve ser capilarizada de forma a que chegue a todo o canto deste País, pois o primeiro passo para a mudança é a informação.

           Presidente Mão Santa, concluo esta manifestação, trazendo uma reflexão: de que forma podemos contribuir para que a epidemia do crack, das drogas em geral, deixe de ter o tamanho que tem hoje? Não é novidade que os usuários do crack foram antes usuários de drogas chamadas lícitas. Sim, é isso mesmo. Eles começaram com aquela cerveja que muitos pais acham perfeitamente normal em algumas festas de que os nossos filhos costumam participar. Ou com aquele cigarro que muitos pais acham o máximo por ter sido da mesma marca da sua preferência. Ou pior, aquela maconha, que se ficar só nela, tudo bem. Esse alerta é feito pela Doutora em Psicologia Renata Brasil de Araújo em texto publicado também no Zero Hora do último dia 6, nesta semana.

           Que tipo de ensinamento estamos dando às gerações futuras para que não entrem nesse mundo, muitas vezes sem volta, do vício, da destruição e da morte certa?

            Vamos juntos reverter esse quadro, e digo juntos o Governo, a sociedade e, sobretudo, a família bem conscientes do nosso papel na luta contra as drogas.

            Finalmente, aproveito a cobertura da rede de comunicação do Senado Federal para alertar a todos nós pais, familiares e amigos sobre alguns comportamentos que podem auxiliar na identificação de possíveis dependentes de drogas em nossos círculos mais íntimos:

1.     Baixa no rendimento escolar;

2.     Aumento repentino de gastos. O jovem ou adolescente pede cada vez mais dinheiro justificando diferentes motivos;

3.     Troca do círculo de amizades;

4.     Agressividade e irritabilidade;

5.     Emagrecimento acentuado e descaso com cuidados básicos de higiene. Usuários de crack podem perder mais de dez quilos num mês;

6.     Sono e troca do dia pela noite;

7.     Mentiras recorrentes e descaso com compromissos;

8.     E sumiço de objetos de valor de dentro de casa.

           Essas são algumas observações que podem ajudar a identificar um dependente e, com isso, quem sabe, por meio de um diálogo franco e aberto em casa, possa se encontrar um caminho para esse retorno, que é extremamente difícil. Mas insisto que tem que haver uma consciência nacional.

            Entendo que especialmente os Ministérios da Saúde e da Educação devem integrar-se plenamente no processo. Está aqui conosco o Senador Cristovam Buarque, ex-Ministro da Educação, que sabe o quanto a palavra de um professor na sala de aula é importante no sentido não apenas de informar, mas também de conscientizar. Acho que esse tema deve fazer parte não sei se de um currículo, não sei se do currículo obrigatório em sala de aula, mas entendo que uma palestra por mês ministrada por alguém com um mínimo de experiência... Há inúmeras ONGs e voluntários que se dispõem a fazer esse trabalho em sala de aula para os alunos, para aquela criança que está saindo da pré-escola, que já pode receber as primeiras informações.

            Eu lembro agora ainda da Drª Renata e seu artigo cujo título é O Velho do Saco. Alguns anos atrás, nossos pais nos criavam aquele temor com a história do velho do saco: Cuidado com o velho do saco, se aparecer o velho do saco ele pode te seqüestrar, ele pode te levar embora.

            Então, todos temíamos, vivíamos com esse susto desse tal de velho do saco que não sabíamos exatamente o que era, porque ele existia apenas nas cabeças dos nossos pais e nas nossas mentes também, por sua influência. Mas isso tinha implicações, obviamente, no nosso comportamento e na nossa conduta.

            Hoje, não se fala mais no velho do saco. Hoje, ali na esquina, está o jovem oferecendo a pedra por R$2,00, R$3,00, R$5,00. E seria interessante que se ouvisse aqui alguém que tenha entrado nesse caminho, para ele dizer como funciona, o efeito impressionante de uma pedra, que pode tornar o sujeito dependente.

            E, a partir dali, depoimentos que chocam profundamente, como eu ouvi ainda sábado passado um jovem, na rua, em Porto Alegre, que me disse que não tendo mais o que vender para trocar pelo crack, pela pedra, ele começou a vender o telhado, as telhas do barraco onde morava. Depois de furtar objetos da sua mãe, objetos do seus irmãos, já não tendo mais o que furtar da família, ele passou, então, a vender o telhado da casa onde morava para trocar pela pedra. E eu perguntei: Mas tem gente que compra? Tem gente que faz essa troca? “Está ali na esquina!”, disse ele. “Está ali na esquina!”.

            Eu vou continuar nessa caminhada, eventualmente vindo aqui à tribuna para tratar desse tema. Eu acho que a Casa tem responsabilidades. Como disse, já aprovamos um projeto, temos mais dois andando, e espero que brevemente o Plenário possa apreciá-los.

            Agradeço este...

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Por favor, queremos aparte! É possível?

            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Claro! Fico muito feliz com a oportunidade de a Casa manifestar-se e pronunciar-se sobre esse tema, porque nós temos uma enorme responsabilidade no sentido da conscientizar e de produzir aqui leis que possam mudar a relação da sociedade com a droga.

            Senador Mozarildo!

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Eu quero dizer a V. Exª que fico muito feliz de ouvir o seu pronunciamento, como médico, como, pai, como avô, como cidadão e também como Senador. V. Exª colocou muito bem: isso não é uma responsabilidade só do Poder Executivo; aliás, na Constituição diz que é dever do Estado e direito do cidadão a saúde. E essa é uma questão de saúde, saúde pública. Não é só da saúde do Fulaninho de Tal daquela família, não; é de saúde pública! O crack é a droga da moda, do momento. Mas, como V. Exª colocou muito bem, existem outras tantas drogas que os pais toleram, que o professor tolera, que até religiões toleram, porque acham que não fazem mal, que não são tão maléficas. Não há droga inocente! Pode haver droga que faça menos mal, mas todas fazem mal. E essa que V. Exª aborda com muita propriedade, o crack, é realmente uma droga de efeitos devastadores e rápidos. Então, louvo a iniciativa de termos leis mais duras contra os traficantes, porque quem trafica é lógico que sabe das consequências do que está fazendo, sabe do mal que está fazendo. Não há traficante inocente, que pensa que está vendendo uma mercadoria que não faz mal. Agora, o usuário, que - digamos assim - é a vítima desse processo, merece, como V. Exª disse e eu quero repetir, primeiro, ter a informação, a educação sobre a questão. E isso não é um trabalho só da escola, é um trabalho da família, é um trabalho das igrejas, da religião, e de outras instituições. Quanto ao tratamento, é evidente que há que se investir mais nisso aí. Investir e ter mais cuidado, como V. Exª disse com muita propriedade, não ter pressa de dar alta a uma pessoa que efetivamente não esteja recuperada. Porque é nosso dever cuidar da sociedade e a mobilizarmos. Pode muito bem ter gente dizendo: “O que é que tem a ver o Senador Zambiasi estar abordando um tema desse?”. Tem muito a ver, sim. Não é só porque V. Exª viu lá no seu Estado, não; isso é uma coisa que está em nível nacional e até mundial infelizmente. Mas eu quero me solidarizar com V. Exª, dizer que temas como esse deveriam ser muito mais debatidos, não só aqui no Senado, mas em todos os setores da sociedade. E os pais devem ser chamados a atenção para os sintomas que V. Exª citou, assim como os professores também e os religiosos. Eu quero, portanto, parabenizar V. Exª pela abordagem adequada de um tema tão importante para a sociedade brasileira.

            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Obrigado, colega Mozarildo Cavalcanti.

            Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Zambiasi, duas coisas o seu discurso me provoca. Primeiro que temos aqui, e funcionando muito bem graças ao Senador Magno Malta, uma CPI da Pedofilia. Precisamos começar a tratar aqueles que desviam o jovem para a droga como tratamos os pedófilos. Pedófilo, felizmente, hoje, é um grupo que a população deseja até mesmo castrar, como estão defendendo. Há um ódio contra a pedofilia. Mas não temos o mesmo ódio contra os que destroem a vida de um jovem ao colocá-lo na droga. Está na hora de a gente criar esta palavra. Precisa-se sabe como é “jovem” em latim. Imagino que talvez o Mão Santa saiba, porque ele sabe tudo e estudou no tempo que estudei. Mas deve ter uma palavra filia, “jovemfilia”, do jeito que há pedofilia. Segundo, o senhor lembrou algo aqui que confesso que mesmo tão envolvido eu não havia pensado. Trabalhamos tanto para termos mais policiais para lutar contra a droga, e esquecemos que temos dois milhões de professores, que, se bem dedicados, se bem respeitados, inclusive com os salários, e bem formados para isso, podem ser a solução. Essa é a solução. O senhor trouxe bem: a solução do problema da droga está em duas coisas - a boa convivência familiar e o professor sendo capaz de ter um papel. Outra coisa é criar uma mística, uma bandeira para que a juventude lute, e acabar com esse vazio que sofre o jovem hoje, ao mesmo tempo em que há uma perspectiva de vida ruim para eles. Aí caem na droga, ou por falta de algo pelo que lutar, ou por falta de perspectiva para ter uma vida digna, decente. Mas essas duas coisas demoram muito. Até lá é reprimir os pedófilos da droga, os que fazem esse crime absurdo de desviar um jovem; e utilizar nossos dois milhões de professores para que sejam também orientadores na adolescência - logo antes da entrada daquele menino e menina no grupo de risco. Esse seu discurso merece ser transformado em algo ainda mais concreto, que leve todos nós - e lamento que não esteja aqui o Paim, que também é um que luta muito por isso - a procurarmos um caminho. O caminho está por aí, o senhor já acenou, falta detalhar como fazer isso.

            O Sr. Papaléo Paes (PSDB - AP) - Permita-me, Senador Zambiasi.

            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Obrigado, Senador Cristovam.

            Senador Papaléo Paes, médico também.

            O Sr. Papaléo Paes (PSDB - AP) - Senador Zambiasi, parabenizo V. Exª pelo assunto que traz ao plenário. É um assunto extremamente sério e que realmente preocupa a todos nós. Ouvimos o Senador Mozarildo e o Senador Cristovam, e vemos que realmente temos que fazer uma mobilização de chamar a atenção de todos aqueles que podem participar de uma cruzada contra as drogas e, principalmente, contra o crack. Outro dia, lemos numa revista um artigo sobre um cidadão que, no primeiro trago que deu no crack, sentiu que ela já impregnou na sua alma e no seu corpo. Um trago e ele passou a ser viciado. Vimos também, na televisão, Senador Cristovam, aqui, na Capital do País, um grupo de crianças, pequenas crianças, à vontade, circulando em via pública, cheirando crack, e não víamos a presença de ninguém, dos responsáveis, que existem logicamente - o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece responsabilidades. Se vamos ali - não sei nominar bem os locais aqui, em Brasília -, se vamos naquele estacionamento próximo ao Conjunto Nacional, ali atrás, na rodoviária, por volta das 17h30, 18h, vemos muitas crianças, e muitos adultos viciando aquelas crianças. É extremamente preocupante. O Senador Cristovam falou da questão dos professores. Lógico. Se temos os professores, a escola é uma continuação da educação que as crianças recebem em casa - da boa educação, claro. Só que, hoje, esses professores ficam reprimidos, oprimidos em agir, até em orientar, porque os traficantes estão na porta das escolas fomentando o vício nessas crianças. Inclusive, o Senador Cristovam diz que um professor foi assassinado exatamente por estar se contrapondo a essa ação. Então, a situação é muito difícil, precisamos da educação participando ativamente, mas que a educação receba proteção para poder participar, que as nossas escolas, os nossos professores, os nossos mestres tenham o respaldo necessário para poder defender, Senador Cristovam, essas crianças e que a repressão vá para a rua, vá agir. O que está aos nossos olhos tem de ser combatido, tem de ser reprimido. E nós não sabemos, não entendemos o porquê de vermos crianças na rua, a 1h, 2h da manhã, sem camisa, coitadinhos, cheirando crack. É lamentável! Então, V. Exª trouxe um tema para realmente despertar em todos nós a necessidade de participarmos ativamente no chamamento de atenção que o Brasil precisa para a questão da droga, principalmente essa que, hoje, tem a primeira dose sendo distribuída como amostra grátis, porque, da segunda em diante, o consumidor vai dar seu jeito: vai roubar, vai furtar para comprar a droga. Parabéns a V. Exª pelo tema.

            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Obrigado.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Senador Zambiasi.

            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Senador Geraldo Mesquita.

            O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - AC) - Senador Zambiasi, o que me deixa, por vezes, enervado mesmo em nosso País é que a gente fala, fala, fala e não vê as coisas acontecerem. Eu vou-lhe dar um exemplo claro, de dentro desta Casa. V. Exª disse, em seu pronunciamento, que as pessoas chegam ao crack depois de provarem drogas lícitas. Não é isso? Pois olhe, desde o início de meu mandato, eu apresentei um projeto aqui nesta Casa que, em suma, retira do ar a propaganda de bebida alcoólica da televisão e do rádio brasileiro. Olhe, meus filhos cresceram depois da retirada da propaganda do consumo de cigarro da televisão e não aprenderam a fumar. Acho que assim é com toda a geração deles. Grande parte talvez tenha deixado de ingressar no vício do fumo por conta desse fato de a propaganda de cigarros ter sido retirada da televisão e do rádio brasileiro. E, naquela época, não vi ninguém acusar o Congresso Nacional ou seja lá quem fosse de aviltar o direito à informação. Com relação às bebidas, os representantes das cervejarias vieram aqui certa feita - o Senador Buarque presidia a Comissão de Educação - e, cinicamente, disseram que a propaganda não induz ao consumo, que ela atua apenas na concorrência das fábricas. Isso é de um cinismo impressionante. O Congresso Nacional embarca nesse cinismo. Talvez meu projeto nem esteja na gaveta mais, talvez já tenha sido jogado na lata de lixo. É isto que eu digo: a gente fala, às vezes toma iniciativas, e nada acontece. Olhe o cruzamento dessas informações aqui. Senador Zambiasi, nós temos, no Brasil, e digo que com certo sucesso, campanhas contra a poliomielite. Todo ano tem o dia da vacinação, não sei se duas vezes por ano, e temos outras campanhas na área de saúde. Por que o Brasil não adota uma campanha como essa, de conscientização, de esclarecimento, de combate ao consumo de drogas, lícitas ou não? O Senador Buarque deu a pista, assim como V. Exª e os aparteantes. Não é preciso nem uma iniciativa legislativa aqui para o Governo Federal concitar os Estados e Municípios, junto com ele, a, talvez uma vez por mês - o que custa isso? -, as escolas públicas de todo o Brasil - e tenho certeza de que as privadas adeririam a uma campanha dessas -, uma vez por mês, a dedicarem um dia ao debate na escola para o esclarecimento, a troca de informação ou conhecimento, porque é por ali que começa mesmo, é na porta da escola que o cara vai entregar a pedra grátis para o menino se viciar. Isso não precisa nem de iniciativa legislativa. Basta o Governo, que ainda não se aparelhou para o combate... Porque essa questão envolve duas pontas: a prevenção, que compreende medidas como essa, e o combate e a recuperação inclusive. V. Exª mencionou a questão da recuperação. O Brasil ainda não se encontra bem aparelhado nem para o combate nem para a recuperação. Prova disso, Senador Zambiasi... Um dia desses eu vi, pela televisão, que, em São Paulo, na Cracolândia, a polícia prendeu mais de cem usuários. Cinco horas depois, a Justiça mandou soltar porque não tinha onde botar, não tinha casa especializada para o tratamento. A Justiça mandou soltar porque eles estavam num local lá que não era completamente adequado. Então, o Estado ainda não está preparado. Portanto, poderia, para compensar esse despreparo, botar o pé numa campanha como esta: uma vez por mês, em todo o País, as escolas públicas dedicariam o dia inteiro para debater essa questão. Eu vou oferecer uma sugestão a V. Exª, que capitaneia esta luta aqui, no Senado Federal. Por vezes, fazemos, aqui, sessões especiais de homenagem a pessoas, a entidades. Eu acho que chegou a hora de usarmos a Hora do Expediente da sessão, um dia por semana, que poderíamos escolher, para trazer especialistas e educadores para debaterem essa questão com os próprios Parlamentares. Acho que seria uma contribuição muito expressiva para o País inteiro. Muita gente vê a TV Senado em todo o País. Já pensou uma sessão dessa para discutir a questão do uso da droga, trazendo especialistas, abrir o Senado Federal para essa experiência? Se V. Exª topar, eu subscrevo uma proposta dessa com o grande Senador Zambiasi, do grande Estado do Rio Grande do Sul.

            O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Obrigado, Senador Mesquita. Deixo aqui o pronunciamento que teve o privilégio de acompanhar apartes de quatro colegas. Em todos os apartes, recebemos inúmeras contribuições e sugestões. Por isso, é importante esse debate, é importante que o tema permaneça dentro deste plenário para que nós possamos trabalhar o que eu acho fundamental, que é a conscientização e a informação.

            Eu estava pensando aqui, colegas, que um dos problemas, na realidade, é que a forma de contaminação do crack é diferente da forma de contaminação da gripe, por exemplo, em que um laboratório impõe uma vacina mundialmente e as suas ações vão à estratosfera. Ou, então, a contaminação da própria dengue. No meu Estado, houve um problema no Município de Ijuí, com mil casos de dengue na região, que gerou verdadeiro pânico, com manchetes nas capas dos principais jornais do Estado e dos principais programas de jornalismo das TVs e das rádios em todo o Estado, necessitando e provocando uma reação imediata, urgente de todos os órgãos vinculados à saúde no Rio Grande do Sul.

            Dizia o Secretário Osmar Terra - Deputado Federal, que renunciou à Secretaria para retornar ao Congresso - que, na questão do crack, os estudos mostram que 1% da população já está com esse problema. São, portanto, 60 mil gaúchos e gaúchas jovens que estão nessa dependência. Se nós projetarmos em nível de Brasil, seguramente nós temos mais de um milhão de pessoas.

            Mas não há vacina; a contaminação é diferente. E para essa contaminação o remédio é outro. Assim, a própria indústria farmacêutica não entra com a força que poderia entrar e, em consequência, obviamente, os efeitos esperados não acontecem.

            Eles só vão acontecer quando realmente a sociedade, como um todo, se envolver - a igreja, a escola, a família, o Estado, o professor, a professora, mesmo com sua ainda baixa estima pela forma como nós os tratamos no Brasil, mas como principais agentes da informação e da conscientização. É a única vacina que nós temos hoje disponível, mas espero que ela ainda sirva e seja suficiente para que a gente possa enfrentar essa gravíssima epidemia que está ocorrendo em nosso País.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR SÉRGIO ZAMBIASI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

O crack é mais que uma droga


            Modelo1 5/8/243:50



Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/2010 - Página 12948