Discurso durante a 52ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração pela concessão de liminar que suspende leilão da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Comemoração pela concessão de liminar que suspende leilão da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/2010 - Página 14873
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, DECISÃO, JUSTIÇA FEDERAL, CONCESSÃO, LIMINAR, SUSPENSÃO, LEILÃO, SELEÇÃO, EMPRESA, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, RIO XINGU, ESTADO DO PARA (PA), AÇÃO CIVIL PUBLICA, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, ACUSAÇÃO, IRREGULARIDADE, FALTA, REGULAMENTAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, USINA, TERRAS INDIGENAS, EXPECTATIVA, JULGAMENTO, AÇÃO JUDICIAL, QUESTIONAMENTO, LICENÇA, MEIO AMBIENTE, ELOGIO, ORADOR, MOBILIZAÇÃO, POPULAÇÃO, LOCAL, ESPECIALISTA, ENTIDADE, CRITICA, VIABILIDADE, NATUREZA ECONOMICA, IMPACTO AMBIENTAL, RISCOS, SECA, DEBATE, SOCIEDADE, COMENTARIO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, SENADO, DENUNCIA, LOBBY, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), PEDIDO, DEMISSÃO, TECNICO, DISCORDANCIA, INTERFERENCIA, NATUREZA POLITICA, MANIPULAÇÃO, PROGRAMA, ACELERAÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • QUESTIONAMENTO, MODELO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, VALORIZAÇÃO, CAPITAL ESPECULATIVO, DESRESPEITO, POPULAÇÃO, PREVISÃO, SEMELHANÇA, SUBDESENVOLVIMENTO, PROXIMIDADE, USINA, MUNICIPIO, TUCURUI (PA), ESTADO DO PARA (PA), REITERAÇÃO, COMPROMISSO, OPOSIÇÃO, USINA HIDROELETRICA, BUSCA, ALTERNATIVA, ENERGIA, DEFESA, CRIAÇÃO, COMISSÃO MISTA, VISITA, LOCAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, primeiro, quero agradecer ao Senador Geovani Borges pela permuta, que me permite fazer o pronunciamento antes de viajar ao Pará.

            Venho a esta tribuna, Sr. Presidente, para registrar em meu nome e no de meu Partido, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), a nossa satisfação diante da notícia veiculada amplamente desde ontem à noite de que, por determinação da Justiça Federal do Pará, foi concedida, nesta quarta-feira, liminar que suspende o leilão que vai selecionar as empresas que construirão a hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, marcado para o próximo dia 20.

            A liminar foi pedida pelo Ministério Público Federal paraense, que moveu ação civil pública, apontando irregularidades no empreendimento, argumentando que falta a regulamentação do art. 176 da Constituição e que seria necessária a edição de uma lei ordinária para a construção de hidrelétricas em área indígena.

            A decisão do juiz Antonio Carlos Almeida Campelo, que suspende a licença prévia para a construção da hidrelétrica e cancela o leilão até o julgamento do mérito da ação, é, antes de mais nada, uma vitória da mobilização, da pressão e da força dos movimentos sociais que, desde o primeiro momento, se opuseram a esse trágico empreendimento. Pela liminar, o Ibama não deve emitir a nova licença ambiental para construção da hidrelétrica e a Aneel - Agência Nacional de Energia Elétrica - não deve fazer novo edital para o leilão, ficando ambos sujeitos à multa de R$1 milhão em caso de descumprimento da liminar.

            O Ministério Público Federal disse que aguarda também o julgamento de outra ação proposta, que aponta irregularidades ambientais na licença de Belo Monte. A obra, uma das vitrines do Programa de Aceleração do Crescimento do Governo Federal, é alvo de contestações por parte dos moradores locais, especialistas e entidades nacionais e internacionais. Eles criticam a viabilidade econômica da obra, o impacto para comunidades indígenas, e temem a seca em grande parte do rio Xingu.

            Até agora, só um consórcio estava confirmado para participar do leilão: o formado por Andrade Gutierrez, Vale, Votorantim e Neoenergia. As indústrias de áreas alheias à construção civil participam porque têm interesse em obter a energia gerada pela hidrelétrica. As construtoras Camargo Corrêa e Odebrecht, que formariam um segundo consórcio, anunciaram, no começo de abril, que não participarão do leilão. Elas alegaram que, após análise detalhada do edital de licitação da concessão, assim como dos esclarecimentos posteriores fornecidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), as empresas não encontraram condições econômico-financeiras que permitissem sua participação na disputa. Em outras palavras, queriam ainda mais contrapartidas por parte do poder público para garantir seus lucros com mais segurança.

            Faço questão de ressaltar que a ausência de debates com os setores sociais envolvidos por parte do Governo Federal é uma afronta à sociedade brasileira e abrirá caminho, caso não fosse detido a tempo, para uma tragédia socioambiental de consequências tão graves quanto imprevisíveis.

            Devemos recordar o que já alertávamos durante a importante audiência pública para debater este tema, realizada no âmbito da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, por nossa iniciativa, no último dia 2 de dezembro, aqui no Senado Federal.

            A licença, ora questionada pela Justiça Federal do Pará foi concedida após intenso processo de pressão de cima para baixo e de fora para dentro da área técnica de análise ambiental do Ibama. Não foi outro o motivo que ensejou, há tão poucas semanas, a saída de dois dos mais qualificados técnicos do órgão - o Ibama, no caso - justamente por não concordarem com o processo de ingerência política que já havia alcançado níveis simplesmente inaceitáveis.

            Contrariando o bom senso e violando o princípio basilar da cautela que deve nortear a autorização de empreendimentos que impactam de forma agressiva o nosso patrimônio natural e humano da Amazônia, o ex-Ministro do Meio Ambiente Carlos Minc, sob ordens direta do Palácio do Planalto, autorizou a emissão de uma licença ambiental.

            É um desastre de enormes proporções que nos aguarda, se este rumo não for imediatamente alterado. A liminar expedida pela Justiça Federal no Pará é apenas uma batalha na guerra que temos travado desde muitos meses. Por isso, manter a pressão e uma postura vigilante é mais do que necessário, é indispensável, Sr. Presidente.

            Ora, Srªs e Srs. Senadoras, a usina de Belo Monte tem sido apresentada como a joia da coroa do PAC, indispensável ao desenvolvimento nacional. Antes, pelo contrário, as grandes obras de infraestrutura, notadamente na Amazônia, estão vocacionadas, isto sim, a aprofundar o nível de dependência do Brasil aos ditames do grande capital nacional e internacional, deixando ao nosso povo, ribeirinhos, quilombolas, agricultores, nações indígenas e população pobre das cidades, apenas, Sr. Presidente, o gosto amargo de estar sendo, mais uma vez, ludibriado pelas mesmas promessas que estiveram na base de outros grandes projetos já implantados na Amazônia.

            E, para fazer referência também à obra na área de energia, lembro da tragédia da usina hidrelétrica de Tucuruí. Muitos dos assentados, até hoje, não tiveram todas as suas indenizações pagas. Um preço social e ambiental altíssimo, o que revela que os grandes projetos, tal qual a usina hidrelétrica de Tucuruí - e disse isso, inclusive, durante uma reunião com empresários e a sociedade civil em Altamira, há dois anos. se querem saber o que será Altamira e os arredores com a construção da hidrelétrica de Belo Monte, façam uma visita a Tucuruí e verão, nas periferias, nas comunidades rurais, ao lado do lago da Usina de Tucuruí o que significa desprezo aos direitos do povo, ao direito dos trabalhadores.

            Logo, reafirmamos, os grandes projetos na Amazônia não têm servido ao desenvolvimento e à garantia das condições mínimas de dignidade ao povo paraense e aos amazônidas em geral. Portanto, quero aqui, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, somar a minha voz à de todos que têm se rebelado a mais de trinta anos contra a construção de Belo Monte.

            Em 1985, no I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, ali se realizou um gesto e um ato quando a índia Tuíra, representando os povos indígenas levou um facão junto à goela do Presidente da Eletronorte à época e hoje Presidente da Eletrobrás, Sr. Antonio Muniz, dizendo com aquele gesto que os povos indígenas não vão abrir mão do seu direito, não vão permitir que, ao arrepio da lei, seja construída a usina de Belo Monte, como afirmou ontem o Presidente Lula.

            Não. O povo do Xingu, sobretudo os que têm compromisso com a vida. E saúdo o trabalho do Comitê Xingu Vivo para Sempre, que congrega várias entidades da sociedade civil, o trabalho da Igreja, que o Protagonismo do Bispo Dom Erwin Krautler, o trabalho realizado pelo Ministério Público Federal no Estado do Pará, que tem sido exemplar para não permitir que ilegalidades absurdas nesse processo se consumam.

            Ontem, a Justiça Federal, por decisão do Juiz Antonio Carlos Almeida Campelo, cancelou, por medida de decisão liminar, o leilão de Belo Monte.

            Soube há pouco pela imprensa que a AGU, Advocacia-Geral da União, tenta, junto aos Desembargadores do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, insistentemente, neste exato momento, derrubar a liminar concedida pelo Juiz Antonio Campelo, a liminar que suspende o leilão das obras do Belo Monte, marcada para o próximo dia 20.

            Em outras oportunidades, quando do famigerado processo de privatização, o Brasil sabe o quanto a Justiça brasileira e inclusive o Tribunal Regional Federal foi muito ágil para cassar liminares que impediram a venda doação do patrimônio público, no Governo Fernando Henrique.

            Espero que o Tribunal Federal Regional tenha juízo, respeite a Constituição, respeite o povo do Xingu, respeite os indígenas, respeite os brasileiros, que não toleram tanto desrespeito à lei e à legalidade.

            Se, mais uma vez, for constatada uma decisão da Justiça Federal, especialmente do Tribunal Regional Federal, em sentido diferente do que preconiza a Ação Civil Pública que recebeu a liminar do Juiz Antonio Campelo, será lamentável. Mas eu tenho esperança, como a decisão ainda não foi exarada pelo Tribunal Regional Federal, que essa decisão seja aquela que garanta o respeito à Constituição e ao direito dos povos indígenas daquela região.

            Portanto, quero parabenizar o Ministério Público Federal e apoiar, com muita ênfase e determinação, a decisão do Meritíssimo Juiz Antonio Carlos Almeida Campelo, que, de forma lúcida e independente, soube tomar a decisão necessária à defesa dos povos do Xingu e daqueles que vivem naquela região.

            Sr. Presidente, espero que seja feita justiça ao povo ribeirinho, aos indígenas, aos agricultores, aos quilombolas e aos habitantes daquela região.

            Espero que, mais uma vez, não tenhamos assegurado o direito dos capitalistas de plantão que esperam, com esta obra, amealhar lucros de bilhões, pois o orçamento inicialmente previsto para a construção da usina, Senador Mão Santa, era de 16 bilhões de reais. Mas o Governo está dizendo que esse valor pode dobrar, chegando a 30 bilhões de reais para o empreendimento que vai ceifar vidas e a esperança de todo um povo, quando podemos pensar, elaborar e criar formas alternativas de geração de energia que não seja essa que destrua o ambiente e destrói a vida de muitas pessoas.

            Portanto, Sr. Presidente, Senador Mão Santa, ontem, aqui, o Senador Pedro Simon fez um brilhante pronunciamento sobre esse tema. Mas, aqui no Senado, ainda são poucas as vozes que se têm levantado contra essa indignidade.

            Quero, de público, convidar uma comissão de Senadores, mas a comissão deve ser do Congresso, que também inclua Deputados Federais, para que possamos ir ao Xingu, ir a Altamira, e ouvir mais diretamente o povo envolvido, seus reclames, suas reivindicações e, quem sabe, todos nós possamos aqui, o Senado Federal, o Senado da República, ajudar a pôr termo a essa indignidade que o povo do Pará, sobretudo os lutadores sociais, não aceitam. E, ao não aceitar, contam com a nossa solidariedade e com a nossa luta.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/2010 - Página 14873