Discurso durante a 57ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Agradecimentos ao Senador Mão Santa pela homenagem prestada aos senadores com mais de 80 anos de idade. Posicionamento em relação à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA ENERGETICA.:
  • Agradecimentos ao Senador Mão Santa pela homenagem prestada aos senadores com mais de 80 anos de idade. Posicionamento em relação à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2010 - Página 16004
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • AGRADECIMENTO, MÃO SANTA, SENADOR, HOMENAGEM, CONGRESSISTA.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, CONTROLE, FUNDOS, PENSÕES, FUNCIONARIO PUBLICO, BANCO DO BRASIL, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), INTERFERENCIA, CONCORRENCIA, LEILÃO, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, RIO XINGU, ESTADO DO PARA (PA), APREENSÃO, REPETIÇÃO, PROBLEMA, AUSENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, OBRA PUBLICA, GARANTIA, ABASTECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, PERIODO, CRESCIMENTO ECONOMICO, MODELO, PRODUÇÃO, ENERGIA, REDUÇÃO, IMPACTO AMBIENTAL, COBRANÇA, ESCLARECIMENTOS, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EXIGENCIA, RESPEITO, BRASILEIROS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, agradeço a V. Exª a homenagem dos que estão aqui com mais de 80 anos.

            Sou um deles e quero dizer a V. Exª, meu querido Mão Santa, que é uma fase interessante esta de chegar aos 80. Com toda a sinceridade, olhando para trás, eu me pergunto se valeu a pena, no que a gente acertou, no que a gente errou, no que a gente contribuiu para a História do nosso País.

            Eu comecei a militar na vida coletiva muito cedo. Guri ainda, no Grêmio Estudantil do Colégio Do Carmo, em Caxias, depois no Grêmio Estudantil Rosariense no Colégio Marista de Porto Alegre, depois na presidência do Centro Acadêmico da Faculdade de Direito da PUC, depois na União Estadual de Estudantes e finalmente na UNE, ocupando o cargo, inclusive, de presidente da junta governativa da UNE. Dali a Vereador, professor universitário, advogado, Deputado por 16 anos, Governador, Ministro e Senador por 32 anos. Longa vida e tumultuada vida. Quando guri, eu vivi a época maravilhosa de Juscelino. Participei, como estudante, da caminhada e me emocionei com a vitória de Juscelino. Eu, que poucos anos antes, guri, lá em São Borja, no suicídio de Getúlio, assisti ao discurso de Tancredo, de Jango e o espetacular discurso de Oswaldo Aranha, na beira do túmulo de Getúlio Vargas. E assim foi.

            Político na época de Juscelino, quando fui ver uma ditadura militar e foi um longo período. E hoje estamos aqui, Sr. Presidente. Eu aqui fiquei para festejar o aniversário de Brasília. Eu caminhei pelas ruas do Eixo Monumental, vi gente, vi alegria, estranhei a falta dos figurões. Mas acho que em Brasília nós estamos vivendo nesse seu cinquentenário um momento novo: o afastamento do Governador. A prisão do Governador mostrou que as coisas começam a mudar em Brasília.

            Ontem assumiu o novo Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Presidente e a querida Ministra Vice-Presidente. Espero que sigam o trabalho de quem saiu, o trabalho de primeira grandeza.

            Hoje, assume a Presidência o novo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Tudo leva a crer que vamos iniciar um novo momento mais responsável, de mais credibilidade e de mais respeito à sociedade brasileira.

            Nos meus 80 anos, Sr. Presidente, posso ajudar pela experiência, posso ajudar pelo que já vi, já senti, já participei. Quando vejo V. Exª, neste seu primeiro mandato como Senador, V. Exª que já foi Vereador, Prefeito, Governador, reeleito Governador, quando vejo o seu entusiasmo, segunda-feira, eram 10 horas da noite, eu estava em casa, ligo a televisão, era a sessão da TV Senado ao vivo, passava das 10 horas e ainda o pessoal estava aqui reunido. Esse é o traço que V. Exª deixa a esta Casa. E é interessante porque as pessoas que assistem à TV Senado já estão acostumadas. Fui um dos que, na segunda-feira, entre o Jornal Nacional e a TV Senado, fiquei na TV Senado, porque acho que tinha muita coisa mais importante. Coincidentemente, naquele horário, falava o Líder do PMDB, o Líder do PSDB, o Líder do Partido Democratas, todos falavam; sete e meia da noite, oito horas da noite, oito e meia da noite e acho que eles ganharam no confronto com o Jornal Nacional. Obra de V. Exª, que entendeu que uma sessão que nem esta, numa sexta-feira.

            Não fora V. Exª, provavelmente não haveria essa sessão, nem abriria, nem abriria. Mas V. Exª abre e eu só vim por causa de V. Exª, mas V. Exª insiste tanto que eu digo. Mas eu não estou lá, o Mão Santa está lá cobrando: “Mas o Simon ainda não chegou?” Eu não nego, eu venho por causa de V. Exª, pelo carinho, pela dedicação, pelo esforço que V. Exª tem em fazer com que essas reuniões se realizem. E, para nós, pode até parecer, mas que sessão é essa da sexta-feira? Mas a verdade é que muita coisa... E eu vejo, Sr. Presidente, eu vejo comigo as respostas que eu recebo. O povo está fiscalizando, muitas vezes cobrando e eu às vezes me surpreendo, porque a resposta é completamente diferente do que eu imaginava. O povo sabe o que quer e todas com referências muito carinhosas a V. Exª. Eles estão entendendo o papel de V. Exª.

            Por isso, eu me amarguro com o meu Partido. Como o meu Partido deixou V. Exª sair do MDB, porque não ia lhe dar legenda para Senador? É uma piada grosseira, ridícula. Uma vaga para Governador, uma vaga para Vice-Governador, duas vagas para o Senado, e V. Exª, para ser candidato ao Senado, teve que sair do PMDB. Vou lá fazer propaganda de V. Exª - não interessa quem estiver do lado do PMDB -, porque ninguém representa mais os ideais pelos quais lutei do que V. Exª.

            Nós vivemos hoje um problema de manchetes permanentes na imprensa com relação à Hidrelétrica de Belo Monte. É interessante a polêmica que se está fazendo em torno dessa matéria. É interessante porque, eu mesmo, lendo a matéria, termino me confundindo e imagino o que o cidadão que lê as manchetes dos jornais deve estar achando dessa confusão em torno dessa hidrelétrica. É um debate que vem de longe, anos e anos a fio. É uma discussão que a gente conhece. Os defensores do meio ambiente, de uma maneira justa e correta, defendendo o meio ambiente. Ver crescer o desenvolvimento, o avanço de maneira justa, achando que vale a pena construir a hidrelétrica pelo que ela representa para o futuro do País. Mas uma matéria que nem esta, que há 30 anos está sendo discutida, não dá para entender como, de repente, as coisas estão explodindo de maneira irreal, explosiva. Ninguém entende o que está acontecendo.

            Na semana passada, Sr. Presidente, num longo pronunciamento - V. Exª teve a gentileza de me deixar quase uma hora e meia nesta tribuna -, fiz a análise de toda essa matéria. Analisei essa matéria no contexto inclusive de Governo anterior, mostrando que tinha acontecido no Governo anterior uma privatização. A maneira com que os fundos de pensão foram usados - segundo dizia o Ministro da época, até o limite da irresponsabilidade - terminou com a Vale na verdade sendo doada, com três bilhões dados pelo Governo.

            Na véspera, o Grupo Votorantim, que tinha tudo para ganhar, um grupo tradicional. Estava tudo feito, tudo resolvido.

            Com um telefonema, o fundo de pensão do Banco do Brasil saiu de um lado e foi para o outro. E criaram nos últimos dias o grupo que terminou ganhando. Ficou célebre.

            Eu cobrei, no debate coletivo, neste plenário, do Ministro, e ele reconheceu que houve o telefonema ao Banco do Brasil para a troca, o Sr. Barros teve a grandeza: saiu da tribuna, pegou o telefone, telefonou para o Presidente Fernando Henrique e pediu demissão do Ministério.

            Pois agora nós estamos numa situação - e eu contava isso - que não dava para entender o que estava acontecendo. As misturas, as trocas, os debates... Não se sabia onde se chegaria. E, na verdade, o grupo que estava certo que ia ganhar, que estava tudo certo que ganharia, não ganhou.

            E um grupo feito à última hora ganhou, bancado pelo fundo de pensão e com financiamento o mais alto da história feito pelo BNDES e com vantagens concedidas de uma maneira inédita até agora pelo BNDES.

            Ainda não se sabe exatamente como serão utilizados esses recursos em Belo Monte. A imprensa informa que será pela via indireta, por meio de empresas que os têm como associados.

            Todavia, meus irmãos Senadores, a história da utilização dos fundos de pensão, para turbinar iniciativas do Governo, nos obriga fazer um alerta. Até no regime militar, fundo de pensão era fundo de pensão. Não me lembro, podia ter algum general ou coronel no fundo de pensão, mas nunca ouvi falar que fundo de pensão era manobrado por A ou por B. Hoje, meu amigo Cristovam, fundo de pensão é cargo político. O fundo de pensão do Banco do Brasil é para o partido tal; o fundo de pensão da Petrobras é para o partido tal. E é uma briga enorme sobre quem indica os responsáveis pelo fundo de pensão, é indicação partidária. Mas isso é um absurdo! Imagina que o PT, o PT... um absurdo desses! Mas é isso.

            Fundo de pensão hoje, tristemente, é usado de maneira mais triste ainda. Nós temos o exemplo, repito aqui, da Telebrás, em 1998, quando o uso do Fundo de Pensão do Banco do Brasil, em associação com um dos consórcios concorrentes, virou um escândalo. E repito: em função desse escândalo, o Ministro das Comunicações caiu, não foi derrubado. Ele caiu, pediu demissão. Teve a dignidade de reconhecer que não tinha mais como continuar Ministro no limite da irresponsabilidade e se demitiu, daqui do Senado, em telefonema ao Presidente.

            Cá entre nós, ninguém pode ser contra a construção de uma usina hidrelétrica, que exatamente menos prejudica o meio ambiente. Ninguém pode ser contra.

            No Brasil, as deficiências na infraestrutura são notórias. Todos nós sabemos que precisamos de energia. Absolutamente, é preciso. Num país onde se fala que vai crescer 5%, a energia é fundamental.

            E a hidrelétrica é que está em primeiro lugar. O Brasil tem as maiores reservas de água do mundo e as condições de ter grandes hidrelétricas.

            Mas me espanta, me espanta mesmo essa controvérsia, esse debate, essa discussão em torno de Belo Monte. Não é de agora, vem lá de trás, vem de longe. E, mesmo com o Congresso fechado, os militares não tiveram coragem de determinar a construção de Belo Monte.

            Veja como a situação era complicada. Os militares tiveram a coragem de construir Itaipu, determinando a extinção de uma das belezas naturais e uma reserva imensa que tínhamos, que era Sete Quedas, fazendo uma união com o Paraguai. Na época, eu dizia que sempre ia ocasionar uma polêmica entre o Brasil e o Paraguai em torno do uso de Itaipu, e é o que está acontecendo.

            Os militares tiveram coragem de fazer Itaipu, mas não tiveram coragem, depois de tanta discussão, de levar adiante a construção de Belo Monte.

            E o Presidente Lula declara que vai construir de qualquer jeito. “Não tem cadeado”, diz Lula, “que quem assinou para entrar não possa sair, e, se for necessário, o Governo faz sozinho, banca sozinho, se for o caso.”

            Não sei se essa é a forma. Sinceramente, não sei se essa é a forma.

            Uma empresa constituída três dias antes substitui uma que estava sendo preparada há longo tempo, e não que tivesse aparecido uma grande empresa três dias antes, um grupo importante que se reuniu e ganhou, não. Quem ganhou foram os fundos de pensão, que saíram de um lado e foram para o outro, como aconteceu na Telebrás.

            Nós conhecemos as restrições de natureza ambiental, e essa é a discussão que inclusive está no Tribunal, e essa é uma longa discussão. Eu poderia entrar, debater, analisar, mas é a discussão que está aí, e eu respeito os que a defendem. Mas não é apenas a questão natureza; para mim, é também a questão técnica.

            Conforme dados da Eletrobrás, a energia produzida só será garantida durante quatro meses por ano. Num outro período, a usina funcionaria com 30% ou 40% de sua capacidade. A média anual seria em 4,5 mil megawatts, um terço da capacidade máxima.

            Cá entre nós, a média anual, 4,5 mil megawatts, é uma média reduzida comparada com o porte da obra, de cerca de 19 bilhões, mas todos dizem já que sairá por 30 bilhões, porque é uma despesa que deverá aumentar, e muito, quando forem contabilizados os custos da linha de transmissão, que será absolutamente necessária que seja feita.

            Nesse cenário, juro por Deus, eu não consigo entender a afirmativa do Presidente Lula de que vai construir a obra de qualquer jeito. Não está sendo feliz o Presidente na sua maneira de se expressar. E é nosso dever alertar para o quadro de incerteza que caracteriza Belo Monte.

            Afinal, qual é a razão real para empreiteiras de grande porte, com capacidade reconhecida, terem decidido se afastar do negócio? Por que de repente as grandes empreiteiras que estavam interessadas se afastaram, não querem mais? Qual é o motivo?

            Um jornal diz hoje que elas fizeram uma “avaliação política equivocada”. Isso soa muito estranho.

            Que avaliação política seria a mais correta? Que critérios seriam ou ainda serão utilizados para acertar essa avaliação?

            O Governo anuncia que vai buscar novamente a participação dessas empresas. Mas qual a razão de ele interferir na disputa entre as empresas envolvidas? Por que essa intervenção do Governo nesse processo que está lá e que deveria ser respondido pela mediação?

            Cá entre nós, o consórcio que teve um vencedor não era para valer? Era de mentirinha? É isso?

            Os tarifas, os preços que foram apresentados pela empresa vencedora abaixo da proposta do Governo não estavam bem calculados? O que está acontecendo?

            Eu dizia na semana passada: “Por amor de Deus, não vamos repetir a questão da Vale. Não vamos criar aqui uma interrogação em cima de um projeto dessa natureza, em que o BNDES entrará com 80% do valor da obra, ele financiará”. E o Presidente diz que, ser for o caso, o Governo, sozinho, bancará a construção de toda a obra.

            São estranhas essas confusões que aparecem quando estão os fundos de pensão, são muito estranhas. E é muito estranha a interrogação que todos nós temos em torno da maneira como são usados esses fundos de pensão. São quantias fabulosas, fantásticas, são bilhões. Quem usa, quem fiscaliza, quem controla, quem está por trás? Afinal, um percentualzinho desse tamanho significa bilhões na conta de alguém, que termina indo para o lado de lá ou para o lado de cá. 

            E, durante muito tempo, houve uma discussão muito longa de que empresas entraram nessa discussão de mentirinha, que havia, mais ou menos, um certo arreglo: essa entra; na hora, saiu fora; e aquela ganha. Isso era o que se esperava. Só que realmente essa saiu fora, mas a que ia ganhar não ganhou, porque, na última hora, apareceu uma empresa nova, com a força do Governo, que terminou ganhando.

            Pois não, Senador.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Eu não quero interromper o seu discurso, porque para mim está sendo um momento extremamente rico.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Não. V. Exª nunca interrompe. V. Exª orienta o debate.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Muito obrigado. De qualquer maneira, eu não quero deixar de entrar no seu discurso agora, ou mais adiante, ou, quem sabe, mais de uma vez, diante de que podemos ter hoje um bom diálogo entre nós. Senador Pedro Simon, esse tema deveria ser um debate de todo este Plenário, reunido um, dois, três dias. O Senado tinha que dizer o que pensa dessa obra. Tinha que dizer o que nós pensamos como alternativa para o déficit energético se essa obra não for feita, mas tínhamos que debater também os riscos que nós temos se essa obra for o caminho para resolver o déficit energético que naturalmente ocorrerá, porque vai crescer a produção e a oferta de energia tem limites. Nós deveríamos estar debatendo isso aqui nas comissões, fora das comissões e no plenário. O senhor felizmente está trazendo o problema aqui. E o senhor está trazendo dois problemas, a meu ver. O problema da opção de fazer uma imensa represa de 500 quilômetros quadrados de lago com riscos financeiros, porque não sabemos de onde virá este dinheiro, porque dizer que vem do BNDES e de fundos de pensão é dizer que é capaz de estar vindo no futuro, ou já, agora, do Governo? De onde sairá? O que deixará de ser feito? Nós temos um risco técnico, como o senhor levantou, cuja melhor prova é a fuga das empresas. Nós temos o risco ecológico. Nós temos mais do que risco, a observação, a previsão da tragédia social entre algumas comunidades que ali vivem. E nós temos outro ponto que o senhor traz que para mim é fundamental: é o risco de dois pontos de vista em relação aos fundos de pensão. Um ponto de vista é ético; quem está por trás das decisões de usar os recursos do fundo que não pertence ao Governo. Pertence aos futuros aposentados. E ninguém está se perguntando: se uma obra como esta gasta bilhões de reais e não dá retorno, quem vai depois pagar os aposentados? Ninguém está falando isso. O senhor mesmo é um dos grandes lutadores do problema que surgiu com o fundo de pensão da Varig. Há algum tempo, surgiu o problema do fundo de pensão de uma estatal. O Governo teve de colocar, creio que me lembro, nove bilhões. A opção de onde colocar esse dinheiro hoje de um fundo é a opção que vai dizer se os aposentados desse setor, no futuro, vão passar fome ou não. Se isso não der rentabilidade, os aposentados não vão ter as suas pensões. A gente não está pensando nisso. E aí vem outro ponto em que o senhor tocou. É o assunto da manipulação, por governos, dos fundos de pensão que me levam a pensar que, além da idéia da privatização versus estatização, nós temos mais dois conceitos que precisamos ou criar ou usar. É publicização versus “patotização”. “Patotização” é o dinheiro do Estado nas mãos de poucos. E a verdade é que algumas estatais, no passado, não eram estatais. Eram empresas administradas por patotas, inclusive nós, funcionários delas, que nos beneficiávamos com salários mais altos, com benefícios maiores. As estatais nem sempre são públicas. Às vezes, as estatais são “patoteiras”. Então, usar o fundo na base da decisão de um ou dois ou três do Governo, e não na base de uma análise cuidadosa das conseqüências financeiras que ocorrerão sobre o uso do dinheiro do fundo, é transformar uma coisa que tem relações com o Estado em uma coisa que tem relações com a patota, e a patota é pior do que a privatização. Primeiro, porque a privatização, pelo menos, é dinheiro privado em que o empresário joga e perde ou ganha. Segundo, porque a perda do empresário é a perda dele; mas a perda de recursos públicos por erro de uma patota é uma tragédia social. Creio que do assunto de Belo Monte nós ficamos de fora. Houve alguns debates em algumas comissões, mas debates que não se aprofundaram. E a gente tem que aprofundar de maneira mais radical; é pensar o próprio conceito de desenvolvimento que está por trás das decisões de fazer uma hidrelétrica ou pequenas represas, fazer uma hidrelétrica ou reduzir o nível de consumo de energia. A gente nunca pensa que talvez seja possível reduzir o consumo de energia; a gente só pensa que é preciso aumentar a oferta de energia. Será que a gente não tem condições de ser um povo feliz - não sem energia, porque não existe felicidade mais -, mas com redução no consumo? Será que essa tendência de aumento de consumo é aquela que está nas escrituras que vincula o futuro da humanidade ao consumo cada vez maior de energia? Ou a gente consegue administrar. Este País deu um exemplo: quando houve o apagão, a gente conseguiu viver com 20% menos de energia e não houve nenhum descontentamento maior do ponto de vista do bem-estar pessoal. Mas a gente se nega a discutir isso. Por que estamos, há 30 anos, discutindo Belo Monte? Por que estamos discutindo tecnicamente e não discutindo ideologicamente, conceitualmente, do ponto de vista de mudanças; não se o projeto vai ser maior ou menor, se vai ter que deslocar ou não a população, se vai custar mais ou menos, de onde vem o dinheiro. A gente fica discutindo isso e se nega a discutir se realmente o aumento da energia é uma condição fundamental do progresso ou deste tipo de progresso. A gente não quer discutir que há outros caminhos para progredir; a gente não quer discutir que é possível um modelo de desenvolvimento mais austero do consumo de energia. Até porque vamos supor que Belo Monte resolva a crise energética de 2015. E em 2030? E em 2050? E em 2100? O Brasil vai acabar até lá? Não. Como é que vai ser em 2100, quando já não tiver mais cachoeira para a gente aproveitar a queda d’água? Aí a gente vai fazer energia nuclear? É essa a opção? Vamos tomar uma análise: se for energia nuclear, poderíamos começar a fazer agora, não precisaríamos de Belo Monte; se não vai ser energia nuclear, a gente vai ter que reduzir o consumo de energia. Mas nós nos negamos a discutir a possibilidade de - em vez de aumentar, a qualquer custo, a oferta de energia - reduzir o consumo de energia. Então o debate está errado. Por isto a gente não chega a um acordo: porque a gente está olhando o problema com óticas diferentes. E até mesmo com éticas diferentes. Aí não se entende. E fica esse debate durante trinta anos até que vem um presidente e diz: vamos fazer de qualquer jeito. É, a meu ver - estou de acordo com o senhor -, um equívoco radical tomar essa decisão. Por um lado, até porque joga o seu nome para ser avaliado daqui a vinte anos, quinze anos, e pode ser que a avaliação não seja boa. Segundo, porque o processo não está com a transparência necessária para que ele possa dizer: Eu estou tomando essa decisão com base em informações que todos têm; em que os 83% dos que me apóiam estão de acordo. Não está; ou não estão. Então, nós estamos, a meu ver, num processo de tomada de decisões que não deixa de ser de uma forma autoritária, que talvez seja uma forma apressada, apesar de trinta anos, mas talvez seja, sim, porque não se esgotou o debate, não se procurou uma visão comum, uma ótica comum, uma maneira de observar em que todos falassem a mesma linguagem. E aí a gente fará democracia. Só existe democracia quando todos entendem o que está sendo discutido. Quando uns entendem de um jeito e outros entendem de outro não é democracia, e o problema de Belo Monte e outros problemas energéticos deste País estão sendo, felizmente agora, observados sem a visão única de que precisamos de mais energia. Começa a ter gente que diz: talvez a gente precise de menos energia. Tem gente que diz: precisamos de mais energia a qualquer custo. Tem gente que diz: talvez não; talvez seja melhor evitar as grandes represas e procurar outro caminho. Então, nós não estamos chegando a um ponto comum que nos permita chegar a uma decisão comum. Eu acho que o Presidente falha ao não provocar este debate além do modelo econômico de desenvolvimento que nós usamos. O Presidente Lula, eu não tenho dúvida, é um dos melhores presidentes que o Brasil teve; eu acho que tivemos muitos avanços, mas em um ponto nós regredimos: no debate ideológico. O debate ideológico parou no Brasil. Todo mundo ficou tão de acordo com o Presidente, com os seus 83%, que os intelectuais estão calados, que os sindicatos estão parados, que os estudantes estão quietos. Ele aquietou o Brasil demais. É boa a quietude do movimento, da violência, mas é ruim a quietude do pensamento. Houve uma aquietação no pensamento, nas propostas. Mesmo a Oposição não crítica o Governo Lula ideologicamente, critica pelo lado ético, por causa de escândalo, de corrupção, mas não do ponto de vista do seu projeto. Veja que Belo Monte a Oposição não crítica, quem crítica Belo Monte, entre os líderes que temos hoje, é a nossa colega e companheira Marina Silva, que trouxe o debate ideológico para a campanha presidencial; os outros candidatos não trouxeram. Então, estão querendo saber como crescer mais e não para onde crescer; estão discutindo a taxa de crescimento e não o ângulo de mudança de que este País precisa. Pois o seu discurso é oportuno. E lamento que a gente não consiga fazê-lo com 81, 80 Deputados sentados aqui - 80 aqui, um na Presidência, e o senhor aí falando - para que a gente pudesse aprofundar mais do que apenas Belo Monte, e a gente começasse a trabalhar qual é o futuro que a gente quer para o País e não apenas quanto mais quilowatts a gente precisa para continuar no mesmo rumo. Eu gostaria que este debate fosse muito mais longo, permanente, com outras pessoas aqui, falando sobre este assunto, dando suas ideias, porque eu mesmo não sei se estou certo ao querer procurar outra alternativa, vai ver que não existe, vai ver que só existe mesmo hidrelétrica ou queimar petróleo que é para a atmosfera pior do que hidrelétrica. Deveríamos debater mais. Pena que não é possível. Felizmente, pelo menos, entre nós dois, estamos querendo dar a nossa contribuição. E agradeço-lhe ter trazido o tema porque me permite pegar carona no seu discurso e dar a minha pequena contribuição.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Completou. Seu pronunciamento deu conteúdo ao meu discurso. Muito profunda a análise feita por V. Exª, muito correta, principalmente, quando diz que ninguém está criticando o Presidente Lula politicamente, mas alguém que está analisando o Presidente como político, mesmo porque ele fala meio demais. Podia falar um pouco menos. É que está dando certo. E a pessoa quando está dando certo está doida para falar. Agora, fazer a qualquer preço não é uma frase feliz. E acho que ainda é tempo de se esclarecer à opinião pública como as coisas estão sendo feitas.

            Até hoje o negócio da Vale está ali. Eu digo. Um dia, ainda vai-se analisar o problema da Vale. Não que alguém cobrou de mim, nos jornais fizeram uns editoriais: “O Simon ainda pensa em estatizar a Vale. Esquece que a Vale era minoritária, pequena, não resolvia nada e agora é uma das maiores empresas do mundo.” Eu não estou discutindo isso. Nunca me passa pela cabeça privatizar a Vale. Acho que foi bem feito. O que eu discuto é o preço. Isso que está sendo feito na Petrobrás, criando uma empresa para a questão referente ao Petro-Sal, eu defendia que fosse feito na Vale. Uma empresa pequenininha, que ficaria proprietária de todas as reservas minerais, das milhares de reservas minerais que, ao longo da história, quando a Vale era estatal, foram descobertas e colocada uma placa em cima, para que, no dia em que tiver dinheiro, serem exploradas. Essas reservas, na minha opinião, são do Governo. Podiam privatizar a Vale e tudo que ela está explorando, mas as reservas deveriam ser do Governo.

            Então, isso que o Governo está fazendo é correto.

            Agora, em relação à hidrelétrica, o que nos deixa pasmos é onde entram os fundos de pensão e não se entendem nada. O que me deixa pasmo é uma empresa ser criada três dias antes, e os fundos de pensão saem daqui e vêm para cá. O que me deixa pasmo são empreiteiras que, durante dez anos, se prepararam e, na última hora, caíram fora. O que está acontecendo? O que está acontecendo? Isso ninguém explicou; ninguém explicou até agora.

            Acho que o Presidente Lula pode dizer que vai fazer de qualquer jeito, mas ele deve explicações ao povo brasileiro com relação ao que está acontecendo lá. E tem razão V. Exª, Senador: é estranho o silêncio desta Casa. Numa matéria como essa, que está empolgando, não se fala, não se discute nada. Nem a Oposição fala sobre o assunto. Dizem que, de certa forma, a Oposição está com medo de trazer de volta o problema da Vale. Então, é melhor não tocar nesse assunto. A Oposição não toca nesse assunto, e o Governo não toca na privatização da Vale. Dizem que esse o motivo. É um troca-troca. Se, de repente, a Oposição gritasse o que está acontecendo em Belo Monte, os Parlamentares do Governo diriam: “E o que aconteceu na Vale?” Também não foi uma empresa de 48 horas antes criada? De repente, o Fundo saiu daqui e foi para lá; e a Votorantim, que era uma empresa tradicional e tinha uma equipe toda preparada, caiu fora e entrou alguém que não tinha tradição nem história.

            Mas é impressionante! A casa inclusive não tem nenhuma fiscalização nos bilhões que são os fundos de pensão. Fico impressionado como é um mar de dinheiro! É dinheiro exatamente daquelas pessoas que mais precisam e têm na aplicação desse dinheiro seu futuro. Isso é jogado fora a retorno praticamente zero.

            Ninguém acha nada importante. Ninguém acha nada grave. Ninguém quer fazer a fiscalização. Na Vale, a gente fez. Na Vale, a gente debateu. É que o PT era uma Oposição muito mais dura do que o PSDB. O PT, aqui, quando era Oposição - meu Deus do céu! -, funcionava. Eu, que tenho a posição de hoje igual à de ontem, tenho saudade daquela época, porque, naquela época, eu entrava, mas o PT berrava, gritava protestava pela ética, pela moral, pela seriedade e cobrava. Agora, foi feito um acordo impressionante nesta Casa: PT e PSDB estão fechados. Não falo o PMDB porque o PMDB pula para lá, vem para cá.

            Eu acho que aquilo que a Ministra falou do Serra, que o Serra é biruta de aeroporto. Eu acho que quem é mais biruta de aeroporto é o PMDB do que o Serra. O PMDB, sim, é biruta: vai para lá, vai para cá. Mas, naquela época, não. Naquela época, o PT fazia uma oposição bacana nesta Casa. Mas, hoje, o PT... A frase que o PT usa é: “Eu fiz, vocês já fizeram!” Referindo-se ao PSDB. “Eu estou dando dinheiro aqui, mas vocês deram lá para a Vale!” O que é verdade.

            E o PSDB, como oposição, é deste tamanhinho, perto da oposição que era feita pelo PT. O PT absorveu. O grande Líder do PT e do Governo nesta Casa é o Senador Jucá. Brilhante, diga-se de passagem. Eu tenho dito, meu amigo Cristovam, que ninguém está mais tranquilo com a sua consciência nesta Casa do que o Senador Jucá. Ele não mudou nada. Tudo o que ele disse no Governo do Fernando Henrique ele está dizendo no Governo do Lula. Absolutamente igual. Absolutamente igual!

            O que ele falava para defender os fundos de pensão no projeto da Vale é o que ele fala para defender os fundos de pensão em Belo Monte. É que o PT virou PSDB e o PSDB virou PT e a única coisa que a gente sabe é que o meu MDB, ganhe quem ganhar, o nosso Partido vai estar lá. O velho MDB, com a sua luta, com a sua tradição, com a sua história... A página mais bonita, neste País, foi escrita pelo meu Partido! O MDB hoje é uma biruta de aeroporto mesmo! Mas está no governo... Ah, eu não tenho nenhuma dúvida! Pelas informações que eu tenho, se ganha a Ministra Dilma, eu não tenho nenhuma dúvida de que o Jucá é o Líder. Mas o interessante é que o que a gente vê do outro lado é que, se ganhar o Serra, o Jucá é o Líder, porque é o que se identifica mais com a hora que nós estamos vivendo.

            É uma pena, Sr. Presidente! É uma pena!

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2010 - Página 16004