O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, um reparo só, Senador Mão Santa: há uma distância quilométrica entre este modesto advogado e o ícone do Direito que a todos nós ilumina, o grande Rui Barbosa. Mas, de qualquer forma, eu agradeço a distinção de V. Exª.

            Sr. Presidente, dirijo-me a esta tribuna hoje para fazer um registro comemorativo a um pacifista. Um pacifista que comanda uma entidade mundial, que trabalha pela paz, pela solidariedade, pelo respeito à dignidade e aos direitos humanos.

            Todavia, ao chegar no Senado, fui surpreendido por uma infausta notícia. Morreu nesta manhã, na cidade de Aquidauana, no meu Mato Grosso do Sul, um dos mais ilustres coestaduanos, um dos mais notáveis políticos do meu Estado, o ex-Governador José Fragelli.

           Tendo em vista que o político falecido exerceu os mais diversos mandatos eletivos, como Deputado Estadual, Deputado Federal Constituinte, Senador da República e, com extraordinária dignidade, exerceu a Presidência desta Casa e, eventualmente, até a Presidência da República, entendi que deveria fazer uma homenagem a esse ilustre brasileiro que tanto dignificou o exercício da atividade política, especialmente a atividade parlamentar.

           Aos 94 anos de idade, Fragelli era casado com Dona Lurdes, com quem tinha dois filhos: Nei e Nelson Fragelli. Filho de Corumbá, nasceu em 31 de dezembro de 1915. Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais, pela Faculdade de Direito de São Paulo, em 1938. Em Campo Grande, foi professor e diretor do Colégio Oswaldo Cruz. Nos anos 40, exerceu a Promotoria de Justiça e, logo em seguida, começou uma longa e muita honrada carreira política.

            Foi Senador nesta casa, Sr. Presidente, de 1980 a 1987 e exerceu a Presidência de 1985 a 1987. E veio para esta Casa depois de ter sido Governador de Mato Grosso antes da sua divisão. Portanto, representava, na verdade, naquela ocasião, os dois territórios: o de Mato Grosso e o de Mato Grosso do Sul.

            Quando esteve no exercício de mandato de Senador, realizou um trabalho de grande profundidade. Foram 2.649 pronunciamentos e 641 projetos de lei. Alguns desses projetos ainda hoje produzem grandes repercussões, especialmente na proteção ambiental, como, por exemplo, a chamada Lei Fragelli, que criminaliza o contrabando, a apreensão irregular de animais silvestres.

            Ele teve uma participação marcante em 1983, na articulação da candidatura do ex-Governador Tancredo Neves. Naquele ano, organizou um grupo de quatorze Senadores, que foi até as Minas Gerais para dizer que Tancredo representava o consenso, que Tancredo poderia ser a ponte para sair da ditadura e ingressar na democracia. Logo depois desse encontro, teve uma grande articulação com o Senador Pedro Simon, com o PMDB, para dizer que se o PMDB levasse o nome do então Governador Tancredo Neves ao Colégio Eleitoral, teria nele um apoio decisivo.

            Portanto, Sr. Presidente, a passagem do Senador José Fragelli por esta Casa teve momentos de grande relevância, porque, efetivamente, apesar de não estar no MDB, que era a síntese da resistência democrática, seu compromisso era com a sociedade que exigia o fim da ditadura.

            Fui, durante o início da minha carreira política, ainda jovem, um oponente gratuito do Senador, do ex-Governador José Fragelli. Afinal, V. Exª, que conhece a história deste País, sabe muito bem do clima de radicalismo que existia à época entre a Arena, que sustentava o regime, e o MDB. E nós estávamos sintonizados com aquele clima.

            No entanto, em Mato Grosso do Sul e no Brasil, a imagem que sempre foi preservada do ex-Governador e do ex-Senador José Fragelli era, sobretudo, a imagem de um homem íntegro, de um político que nunca foi fustigado por quaisquer denúncias de deslizes que pudessem conspurcar, que pudessem denegrir a imagem que construiu ao longo da sua carreira, ao longo da sua vida. Portanto, foi um político exemplar, que só trouxe para a sociedade brasileira motivo de orgulho de tê-lo nos vários postos que ocupou.

            Ao fazer esse registro, quero dizer que a política brasileira empobrece com a perda de um político dessa estirpe, que começa a dar sinais de extinção em nosso País. Quem acompanha a vida pública brasileira sabe que os maus costumes estão-se alastrando como praga de gafanhoto, em todos os cantos deste País. E Fragelli foi de uma estirpe diferente, de uma estirpe que preservava a honra, a dignidade, a honestidade, a condução reta nos negócios públicos e que, por isso, merece as nossas homenagens.

            Foi, no exercício da Presidência do Congresso, ocupante da Presidência da República. Exerceu, por dois ou três períodos, a suprema magistratura do País na ausência eventual de seus titulares. Portanto, Mato Grosso do Sul, perde não só um ex-Deputado, um ex-Constituinte, um ex-Senador da República, um ex-Presidente que tanto dignificou esta Casa, mas também alguém que exerceu a suprema magistratura do País.

            Sr. Presidente, queremos fazer esse registro, adiando para segunda-feira o pronunciamento que faríamos hoje, a fim de prestar uma homenagem a uma outra grande figura, a uma expressão que tem o respeito internacional na luta pela dignidade da pessoa humana e que, na própria segunda-feira, tem todas as razões para rejubilar-se, para comemorar, junto com os seus discípulos, mais um aniversário do seu comando à frente de uma grande entidade que prega a solidariedade universal.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

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