Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para o problema da escalada nuclear, referindo-se à Coreia do Norte e ao Irã, lamentando a impossibilidade de participar da reunião anual do InterAction Council (conselho internacional de ex-presidentes da República), realizada neste mês de abril, em Hiroshima, Japão, que tratou do tema "Armas Nucleares".

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Alerta para o problema da escalada nuclear, referindo-se à Coreia do Norte e ao Irã, lamentando a impossibilidade de participar da reunião anual do InterAction Council (conselho internacional de ex-presidentes da República), realizada neste mês de abril, em Hiroshima, Japão, que tratou do tema "Armas Nucleares".
Publicação
Publicação no DSF de 29/04/2010 - Página 16710
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, JAPÃO, CONSELHO, AMBITO INTERNACIONAL, REUNIÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DIVERSIDADE, PAIS, DISCUSSÃO, PROBLEMA, ARMAMENTO NUCLEAR, MANIFESTAÇÃO, FRUSTRAÇÃO, IMPOSSIBILIDADE, COMPARECIMENTO, PEDIDO, EMBAIXADOR, GOVERNO BRASILEIRO, REPRESENTAÇÃO, ORADOR.
  • LEITURA, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, AUTORIA, CONSELHO, RECOMENDAÇÃO, NECESSIDADE, COMPROMISSO, GOVERNANTE, RESPEITO, TRATADO, DESARMAMENTO, BUSCA, EXTINÇÃO, MOTIVO, TERRORISMO, EXIGENCIA, PAIS, REDUÇÃO, ELIMINAÇÃO, ARMAMENTO NUCLEAR, ESPECIFICAÇÃO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), RUSSIA, RECONHECIMENTO, CONFLITO, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL, PALESTINA, IMPEDIMENTO, PAZ, ORIENTE MEDIO.
  • MANIFESTAÇÃO, APOIO, SANÇÃO, USINA NUCLEAR, PAIS ESTRANGEIRO, IRÃ, COREIA DO NORTE, QUESTIONAMENTO, IMPEDIMENTO, ORGANISMO INTERNACIONAL, INSPEÇÃO, USINA, SUSPEIÇÃO, CRIAÇÃO, ARMA NUCLEAR, REITERAÇÃO, POSIÇÃO, BRASIL, COMPROMISSO, PAZ, ESPECIFICAÇÃO, ATUAÇÃO, ORADOR, GESTÃO, GOVERNO BRASILEIRO, ASSINATURA, DIVERSIDADE, TRATADO, REPUDIO, REPRODUÇÃO, ARMAMENTO NUCLEAR.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP. Para uma breve comunicação. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, pertenço a um conselho internacional de ex-Presidentes da República, o InterAction Council, fundado em 1983 pelo Primeiro-Ministro Fukuda, do Japão. Hoje é presidido pelo Helmut Schmidt. Participam dele o Carter, o Clinton, Giscard d’Estaing, Felipe González e muitos outros. Do nosso Continente, tenho a honra de participar deste conselho juntamente com Miguel de la Madrid.

            Reunimo-nos duas vezes por ano. Uma vez é uma reunião de técnicos para examinar a pauta do que iremos discutir na reunião plenária, que se realiza sempre em lugar diferente do mundo. Já foi realizada, inclusive, uma vez no Brasil. Este ano foi realizada em Hiroshima, justamente pelo simbolismo que a cidade tem e pelos 50 anos em que, neste ano, a humanidade, tristemente, relembra o lançamento da bomba nuclear naquela cidade.

            Infelizmente, eu não pude comparecer. Compromissos que tinha no Brasil e, sobretudo, no Senado não me permitiram comparecer. Eu tenho sido muito assíduo a essas reuniões, que são muito úteis. O tema discutido, neste ano, foi o das armas nucleares.

            Sou um pacifista. Desde que participo da política, sempre condenei a corrida nuclear no mundo inteiro.

            Este conselho tem tido uma importância grande. Inclusive, no tempo da Guerra Fria, foi ele que iniciou a negociação entre os Estados Unidos e a União Soviética da primeira limitação do número de armas nucleares e vetores -- foguetes --, na Europa.

            Este ano, portanto, o tema foi justamente o das armas nucleares. Não podemos, jamais, deixar que o mundo possa avançar sendo negligente em relação ao controle das armas nucleares. Depois do desmoronamento da União Soviética, certamente, o perigo que passamos a ter foi muito maior, porque muitos técnicos daquela área, com o desmoronamento de diversos países que participavam do aparato nuclear da União Soviética, emigraram para outras partes do mundo. E, hoje, há uma visão quase generalizada de que o acesso à tecnologia nuclear passou a ser fácil. Então, é urgente haver uma ação política mundial para o controle dessas armas.

            E o mundo não pode ser negligente nem fraco, tem que ser realmente duro em relação a qualquer núcleo que possa desenvolver armas nucleares.

            Por isso acho que a posição que o mundo -- e sobretudo os países ocidentais -- está tendo, em relação ao que ocorre na Coreia do Norte ou no Irã é necessária, inclusive porque explicitamente a Coreia do Norte diz que deseja construir armas nucleares para que possa se tornar uma potência nuclear e assim afirmar-se. Quanto ao Irã, ele diz que deseja desenvolver tecnologia nuclear para fins pacíficos, mas, na realidade, até hoje tem se recusado a dar as garantias às agências internacionais de que realmente suas intenções são essas.

            Já assinei, ao longo da minha vida, todos os manifestos e participei de muitos movimentos contrários a armas nucleares. E tive mesmo, não só por palavra, mas por ação, a oportunidade de dar minha contribuição quando, juntamente com Alfonsín, desmontamos a possibilidade da corrida subjacente entre Brasil e Argentina para desenvolvermos artefatos nucleares. Através do acordo de Foz do Iguaçu e depois do acordo com a Argentina de 1988, conseguimos que realmente não tivéssemos no Continente possibilidade alguma de desenvolvimento desse tipo de arma de destruição da Terra. E isso se mostrou muito efetivo e foi feito de uma maneira pacífica, sem intromissão de organismos internacionais.

            O Brasil e a Argentina tomaram essa decisão. O Presidente Alfonsín me convidou para visitar a usina de Pilcaniyeu. E convidou não somente o Presidente, mas também todos os nossos técnicos em matéria nuclear. Isso significava que a Argentina abria ao nosso conhecimento tudo aquilo que eles estavam fazendo, desaparecendo, portanto, qualquer programa secreto.

            Eu devo abrir um parêntesis para dizer que nós constatamos, naquele tempo, que a Argentina estava dez anos à frente do Brasil nas pesquisas nucleares. Eles já estavam fazendo enriquecimento de urânio há muito tempo, e nós estávamos também desenvolvendo a nossa possibilidade de enriquecer urânio. Na Fábrica de Aramar, desenvolvida pela Marinha, durante o meu Governo nós descobrimos a maneira de enriquecer urânio.

            Pois bem, eu convidei o Presidente Raúl Alfonsín e também todos os técnicos argentinos para que visitassem as nossas instalações secretas, para que então a confiança entre os dois países fosse absoluta em relação a esse setor.

            Por outro lado, o Brasil foi signatário do Tratado de Tlatelolco, que baniu as armas nucleares no nosso continente. Eu apresentei, como Presidente, e o Brasil foi o patrocinador da moção aprovada pelas Nações Unidas, que declarou o Atlântico Sul como uma Zona de Paz, na qual não podem transitar armas nucleares a bordo de qualquer navio ou de qualquer outra maneira serem conduzidas nessa área.

            Por tudo isso, eu lamentei não ter ido a Hiroshima, mas mandei uma mensagem, que foi incorporada, e pedi ao Embaixador do Brasil em Tóquio que me representasse e, ao mesmo tempo, firmasse a declaração em meu nome.

            E foi feito um comunicado final sobre esse assunto, comunicado esse que peço a V. Exª que mande inserir nos Anais desta Casa como parte integrante destas minhas palavras.

            E nesse comunicado o Conselho InterAction fez as seguintes recomendações:

            1. Deve-se retornar a um mundo verdadeiramente multilateral a fim de lidar com desafios comuns de maneira mais eficaz.

            2. Deve-se reforçar que a questão primordial que impede a estabilidade no Oriente Médio é o conflito Israel-Palestina e que o Presidente Obama deve ser apoiado na sua oposição à construção de novos assentamentos em território palestino, inclusive Jerusalém Oriental.

            3. Israel deve estar em conformidade com o Parecer Consultivo de 2004 do Tribunal Internacional de Justiça sobre o muro construído em território palestino e obedecer às Convenções de Genebra de 1949.

            4. Os Estados devem entender que o terrorismo é uma ameaça ao mundo e que há diferentes causas para esse fenômeno. Os Estados não devem medir esforços para entender tais causas e, quando possível, minimizá-las.

            (...)

            6. Os Estados devem respeitar o processo democrático na Palestina e buscar a cooperação dos líderes eleitos democraticamente, independente de suas afiliações políticas.

            Enfim, outra série de recomendações que vão constar do comunicado que será transcrito nos Anais do Congresso. 

            Sobre o problema nuclear, o comunicado diz o seguinte:

            1. As potências nucleares devem confirmar e implementar suas obrigações de acordo com o art. VI do Tratado de Não Proliferação para negociar e alcançar o desarmamento nuclear.

            2. Todos os Estados possuidores de armas nucleares devem reduzir e, eventualmente, eliminar seu arsenais.

            3. Especialmente a Rússia e os Estados Unidos, que possuem os maiores estoques, devem reduzir substancialmente o número de ogivas nucleares, incluindo armas não estratégicas.

            Esses dois países possuem cerca de 16 mil ogivas nucelares. Bastariam umas poucas delas para destruir a civilização que nós atualmente temos e a vida na face do universo.

            Então é loucura que o mundo possa jamais pensar em desenvolver e aceitar a devolução, aceitar o desenvolvimento dessa tecnologia.

            4. Os Estados devem se comprometer a não fazerem o primeiro uso das armas nucleares.

            5. Uma convenção que proíba armas deve ser concluída da mesma maneira que convenções que proíbam armas biológicas e químicas.

            6. Todas as armas nucleares não estratégicas devem ser removidas para território nacional e devem ser desativadas e eliminadas assim que possível.

            7. Todos os Estados remanescentes devem ratificar imediatamente o Tratado de Interdição Completa de Testes Nucleares e fazê-lo vigorar prontamente.

            8. As negociações sobre um tratado proibindo produções adicionais de material físsil para armas devem começar prontamente e devem, também, levar em conta a questão dos estoques já existentes.

           9. Os Estados que fazem parte do Tratado de Não Proliferação devem ser pressionados a aceitar e ratificar o protocolo adicional de verificação de salvaguardas da Agência Internacional Atômica, devendo as potências nucleares ser encorajadas a colocar sob salvaguardas as usinas de enriquecimento e reprocessamento.

            10. Todas as potências nucleares devem remover suas armas nucleares da posição de lançamento imediato e aumentar o tempo de aviso e de decisão.

            (...)

            13. Os governos nacionais devem criar, dentro de suas fronteiras de atuação, unidades que lidem com o desarmamento nuclear e o apóiem e que considerem como os Estados podem administrar suas defesas sem armas nucleares.

            14. Os Estados devem substituir a filosofia da detenção nuclear pelo conceito de segurança comum.

            15. O Conselho de Segurança das Nações Unidas deve fazer do desarmamento uma parte central de sua missão. O Conselho de Segurança pode considerar a possibilidade de fazer um levantamento completo de armas nucleares em todos os países do mundo.

            E mais um rol, Sr. Presidente, de providências que devem ser tomadas em nível internacional para banir a possibilidade, em algum momento, de que o mundo possa ser vítima dos artefatos nucleares.

            Quero acrescentar a essas palavras que hoje alguns problemas desafiam o futuro da humanidade. Mas o primeiro deles é sem dúvida o problema nuclear. Temos outros, como doenças desconhecidas, como o crime internacional organizado, como o narcotráfico, como as drogas, enfim, muitas outras ameaças ao futuro da humanidade. Mas nenhum deles é tão importante, nenhum deles é tão fundamental quanto o problema nuclear.

            Portanto, mais uma vez, eu quero não só ler esse comunicado que é extremamente importante, que está sendo distribuído ao Secretário-Geral da ONU e aos Presidentes da República de todos os países do mundo, como também dizer que hoje nós temos mais um perigo, os materiais de uso nuclear serem comercializados mundialmente.

            Cerca de 500 pequenos fatos dessa natureza - negociação de projetos, materiais que podem ser usados em armas nucleares - já foram constatados no mundo. E podem cair em mãos de terroristas que, a qualquer momento, podem realmente ameaçar a humanidade.

            Então, a posição do Brasil, que está na Constituição, que é pela paz, deve ser cada vez mais dura, mais enérgica a esse respeito. Isso deve ser uma causa de consciência mundial e pessoal de cada um de nós.

            E é nesse sentido que eu peço a transcrição nos Anais desta Casa desse documento, sabendo que todos nós aqui estamos irmanados nesse desejo, certos de que devemos fazer todos os esforços para que o mundo jamais possa consentir que se proliferem armas nucleares.

            Muito obrigado a V. Exª.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR JOSÉ SARNEY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

InterAction Council - 28º Sessão Plenária Anual - Comunicado Final - 18-20 de abril de 2010 - Hiroshima, Japão 

InterAction Council

28ª Sessão Plenária Anual

Comunicado Final

18-20 de Abril de 2010

Hiroshima, Japão

© InterAction Council

 

            Ao longo do ano passado, a economia e os mercados financeiros mundiais começaram a demonstrar esperançosos sinais de recuperação. Tanto os Estados Unidos como a Rússia concordaram em conversar seriamente a respeito do controle das armas nucleares e há grande esperança de que já existam as condições para o desarmamento nuclear. Essas são razões para o otimismo; contudo, existem desafios específicos que exigem nossa atenção e nossos recursos. Alguns desses desafios pareciam intratáveis anteriormente, porém hoje estamos esperançosos com relação ao nosso compromisso coletivo e à nova liderança nos assuntos mundiais.

            Durante sua 28ª Sessão Plenária Anual, o InterAction Council reuniu-se em Hiroshima, Japão, em abril de 2010, a fim de discutir as questões mais desafiantes para a estabilidade mundial e o desarmamento nuclear. No que diz respeito ao desarmamento nuclear, o Conselho adotou a Declaração de Hiroshima, um plano para zerar as armas nucleares.

            Os Presentes Desafios a serem Enfrentados através de Ação Multilateral

            Desafios mundiais são complexos demais e abrangentes demais para qualquer solução, a não ser aquelas concebidas através de cooperação. Os Estados devem buscar oportunidades para fortalecer a ação multilateral, aderir a um mundo baseado em regras e respeitar a legislação internacional. Através da cooperação multilateral e de nossas instituições internacionais, os Estados têm um fórum para atuar colaborativamente a fim de fazer face às suas responsabilidades concomitantes.

            A União Europeia permanece como uma excelente expressão de cooperação multilateral entre nações. A ratificação do Tratado de Lisboa e o êxito da moeda comum criaram uma União Europeia forte política e economicamente, mas ainda faltam muitos anos para que existam uma defesa e uma política externa comuns europeias. Até lá, os grandes Estados na Europa continuarão a exercer a independência na política externa.

            Isso é lamentável, pois questões como o conflito Israel-Palestina, a Guerra do Afeganistão, transições no Iraque e o terrorismo internacional requerem liderança mundial, vozes alinhadas e ação unificada. O Presidente Obama deve ser apoiado quando focar sua atenção em questões intratáveis onde sua liderança é essencial.

            O Conselho de Segurança das Nações Unidas permanece como o fórum principal para a manutenção da paz e da segurança internacional. Os cinco membros permanentes devem estar conscientes de que carregam grande responsabilidade e representam todas as nações, não apenas seus interesses nacionais.

            A Ásia é uma brilhante região do planeta. Suas economias foram as primeiras a superarem a recessão econômica mundial e seus quadros multilaterais vêm contribuindo para a estabilidade e o crescimento mundial.

            Outro setor que requer ação coletiva é a regulação global dos mercados financeiros. Por muitos anos, um excesso de liberdade nos mercados financeiros e um apetite por fazer muitas dívidas, levaram a uma catástrofe econômica sem precedentes desde o fim da Segunda Guerra Mundial. É importante prevenir riscos excessivos assumidos irresponsavelmente. Durante a crise que se passou, as atenções voltaram-se para instituições e capitais financeiros, à custa do mundo em desenvolvimento que viu e sofreu com queda substancial no investimento estrangeiro direto, alta no desemprego e crescimento negativo do PIB. Governos do mundo inteiro intervieram, com razão, para apoiar instituições financeiras essenciais, mas quando o fizeram, desviaram recursos de outros setores como o de ajuda emergencial em casos de catástrofes e o da redução da pobreza. Especialmente na África, muitos que poderiam ter sido resgatados da pobreza não foram. A miséria econômica leva à instabilidade política e cria uma plataforma de recrutamento para organizações terroristas.

            Outras fontes para o terrorismo internacional são a instabilidade no Oriente Médio e as questões que envolvem o conflito Israel-Palestina. Dado o atual foco da liderança mundial, agora existe uma oportunidade de mudar de direção. Fazer isso irá tirar da mesa uma questão que é explorada por aqueles que tentam ameaçar a paz mundial com o terrorismo. As guerras no Afeganistão e no Iraque foram devastadoras para uma região inteira. É urgente que esses conflitos sejam rapidamente levados a um fim e que os Estados devastados pela guerra sejam recebidos na comunidade das nações de forma responsável.

            Portanto, o InterAction Council faz as seguintes recomendações:

1.     Deve-se retornar a um mundo verdadeiramente multilateral a fim de lidar com desafios comuns de maneira mais eficaz.

2.     Deve-se reforçar que a questão primordial que impede a instabilidade no Oriente Médio é o conflito Israel-Palestina e que o Presidente Obama deve ser apoiado na sua oposição à construção de novos assentamentos em território palestino, incluindo Jerusalém Oriental.

3.     Israel deve estar em conformidade com o Parecer Consultivo de 2004 do Tribunal Internacional de Justiça sobre o muro construído em território palestino e obedecer às Convenções de Genebra de 1949.

4.     Os Estados devem entender que o terrorismo é uma ameaça ao mundo e que há diferentes causas para esse fenômeno. Os Estados não devem medir esforços para entender tais causas e, quando possível, minimizá-las.

5.     Israel deve interromper a construção e a ampliação de novos assentamentos e levantar o bloqueio a Gaza que está ameaçando a saúde e a vida do povo e impedindo a reconstrução dessa terra devastada. 

6.     Os Estados devem respeitar o processo democrático na Palestina e buscar a cooperação dos líderes eleitos democraticamente, independente de suas afiliações políticas.

7.     A Guerra no Afeganistão deve acabar, não só através de ação militar, mas também do envolvimento de todas as partes, incluindo o Talibã, que tem interesse na construção de um Estado bem-sucedido.

8.     Os Estados de Coalizão devem preparar o Iraque, seus vizinhos e aliados para a retirada da Coalizão, a fim de mitigar conflitos religiosos internos e prevenir ataques terroristas.

9.     Os Estados da OTAN devem reconhecer que a expansão continuada da Organização antagoniza a Rússia. A segurança europeia também pode ser garantida através de diálogo e cooperação com a Rússia.

10.     Os governos devem reafirmar que bancos, fundos hedge, fundos de private equity, instituições financeiras e instrumentos financeiros estejam sujeitos a uma supervisão e regulamentação adequada e responsável.

11.     Os Estados devem comprometer-se a investir e ajudar a África, onde milhões de pessoas vivem na pobreza e sem assistência médica adequada.

12.     Os Estados devem perceber que o Haiti precisa de muito mais que ajuda estrangeira, para reflorestamento e fortalecimento de instituições, por exemplo, para que possa alcançar um crescimento sustentável a longo prazo.

13.     A China deve continuar a administrar seu crescimento pacífico. Saudamos a participação da China na economia mundial e sua contribuição para o crescimento e a estabilidade que ajudou a pôr em prática as condições necessárias para a recuperação da economia mundial.

            Um plano para Zerar as Armas Nucleares

            Em agosto de 1945 os Estados Unidos lançaram duas bombas atômicas nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, onde duzentos e trinta mil japoneses e coreanos perderam a vida até o final daquele ano. As consequências devastadoras e duradoras do uso acidental ou intencional de armas nucleares são bem conhecidas. No entanto, o desarmamento nuclear foi impedido por remanescentes da Guerra Fria; estruturas de seguranças defasadas, incluindo o princípio de dissuasão nuclear. Existe agora um fundamento legítimo para renunciar às lembranças da era da Guerra Fria. O desarmamento nuclear é uma necessidade urgente e agora está se tornando cada vez mais viável.

            Ao concluir o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares em 1970 os Estados concordaram com desarmamento, tecnologia nuclear pacífica e não-proliferação nuclear. Hoje sabemos que o TNP não conseguiu evitar a proliferação. Hoje sabemos que as potências nucleares não conseguiram cumprir suas obrigações de se desarmar sob os termos do TNP. Hoje estamos cientes de outras ameaças - sobretudo, o terrorismo nuclear e mais proliferação de armas nucleares para novos estados e outros atores internacionais que não obedeçam ao estado de direito. Essas novas ameaças devem ser tratadas imediatamente e com uma nova abordagem.

            Os americanos Henry Kissinger, William Perry, Sam Nunn e George Shultz - A Gangue dos Quatro - reviveram a questão do desarmamento nuclear em 2007, proporcionando um novo olhar sobre as possíveis ameaças e pedindo a abolição das armas nucleares. Seus apelos foram reiterados por ex-estadistas na Austrália, Bélgica, Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Países Baixos, Noruega, Polônia, Suécia e Reino Unido - muitos são membros do Conselho. Há outros sinais de progresso, saudados pelos líderes mundiais. O presidente Obama e o presidente Medvedev confirmaram seu compromisso com o novo START (Tratado de Redução de Armas Estratégicas) para prevenir a proliferação nuclear e o terrorismo nuclear, aprovando a eliminação de armas nucleares. A Cúpula de Segurança Nuclear 2010 afirmou que há uma determinação entre os líderes mundiais para enfrentar a proliferação e terrorismo nuclear. Entretanto, o êxito futuro dependerá do grau de cooperação multilateral, e em particular da possibilidade de a Rússia e a China apoiarem essas iniciativas ou não.

            O desarmamento nuclear não acontece e nem acontecerá no vácuo. Ele acontece no atual estado do mundo. Ele pode ser melhor atingido em um cenário de segurança em que o estado de direito é respeitado, assim como a soberania e segurança dos Estados. Essa meta só poderá ser cumprida se as questões regionais forem resolvidas. As potências nucleares têm que reavaliar suas concepções de segurança, a fim de serem menos dependentes de seus arsenais nucleares e tranquilizar seus aliados, atualmente sob o guarda-chuva nuclear. A controvérsia sobre o programa iraniano de enriquecimento de urânio está em um nível perigoso e deve ser solucionada. Continuam a existir dúvidas sobre o cumprimento do regime da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) pelo Irã. O artigo 7 do TNP prevê negociações regionais sobre zonas livres de armas nucleares, que têm contribuições positivas para o desarmamento global.

Acabar com a ameaça nuclear no mundo é certamente um desafio, porém é um desafio que devemos enfrentar. Embora o objetivo a longo prazo seja importante, é igualmente importante definir certos valores de referência a curto, médio e longo prazo para guiar o caminho. Uma das metas a curto prazo deve ser a eliminação, por parte dos Estados Unidos e da Rússia, de sua ordens de lançamento decorrentes de alertas de armas nucleares. Atualmente existem milhares de ogivas prontas para o lançamento. Um erro humano pode levar a um impacto catastrófico.

O objetivo final é um mundo livre de armas nucleares. É importante notar que o arsenal atual de mais de vinte mil ogivas nucleares é grande o suficiente para destruir o planeta varias vezes. No entanto, a legislação internacional não proibiu por completo o uso de armas nucleares. Um compromisso entre as potências nucleares de banir o primeiro uso de seus arsenais é necessário para apoiar os esforços do desarmamento. A Conferência de Revisão do TNP que ocorrerá em maio oferece um excelente fórum para promover um desarmamento global em uma estrutura multilateral e inclusiva. Os fracassos da Conferência de Revisão de 2005 não podem se repetir. O relatório recente da Comissão Internacional sobre Não Proliferação Nuclear e do Desarmamento patrocinada pela Austrália e Japão conta setenta e seis recomendações para a eliminação de armas nucleares. O InterAction Council apresenta o seu próprio relatório e a Declaração de Hiroshima para consideração da Conferência de Revisão.

O InterAction Council pediu a abolição das armas nucleares em quase todas as reuniões anuais desde que o conselho foi criado em 1983. Este ano nossa determinação foi reforçada mais do que nunca. Os membros do Conselho reuniram-se com os hibakusha, os sobreviventes do ataque nuclear em Hiroshima, que exigiram que ninguém mais sofra o que eles sofreram. Hoje, 65 anos depois, o Conselho está determinado a assegurar que os desejos dos hibakusha se tornem realidade. Devemos eliminar as armas nucleares para honrar a promessa feita no Cenotáfio no Parque da Paz de Hiroshima - “Que todas as almas aqui descansem em paz, pois nós não repetiremos o mal”.

Portanto, o InterAction Council recomenda que:

1.     Potências nucleares devem confirmar e implementar suas obrigações de acordo com o artigo VI do TNP para negociar e alcançar o desarmamento nuclear.

2.     Todos os Estados possuidores de armas nucleares devem reduzir e eventualmente eliminar seus arsenais.

3.     Especialmente a Rússia e os Estados Unidos, que possuem os maiores estoques, devem reduzir substancialmente o número de ogivas nucleares, incluindo armas não-estratégicas.

4.     Os Estados devem se comprometer a não fazerem o primeiro uso das armas nucleares.

5.     Uma convenção que proíba armas nucleares deve ser concluída da mesma maneira que convenções que proíbam armas biológicas e químicas.

6.     Todas as armas nucleares não-estratégicas devem ser removidas para território nacional e devem ser desativadas e eliminadas assim que possível.

7.     Todos os Estados remanescentes devem ratificar imediatamente o Tratado de Interdição Completa de Testes Nucleares (CTBT, na sigla em inglês) e fazê-lo vigorar prontamente.

8.     As negociações sobre um tratado proibindo produções adicionais de material físsil para armas devem começar prontamente e devem, também, levar em conta a questão dos estoques já existentes.

9.     Os Estados que fazem parte do TNP devem ser pressionados a aceitar e ratificar o protocolo adicional de verificação de salvaguardas da AIEA, devendo as potências nucleares ser encorajadas a colocar sob salvaguardas as usinas de enriquecimento e reprocessamento.

10.     Todas as potências nucleares devem remover suas armas nucleares da posição de lançamento imediato e aumentar o tempo de aviso e decisão.

11.     Os Estados possuidores de armas nucleares devem aumentar a transparência de suas capacidades, posturas e estratégias.

12.     Os esforços para promover a détente (distensão) global e a estabilidade regional devem ser empreendidos juntamente com o desarmamento.

13.     Os governos nacionais devem criar, dentro de suas fronteiras de atuação, unidades que lidem com o desarmamento nuclear e o apoiem e que considerem como os Estados podem administrar suas defesas sem armas nucleares. Recursos para a busca e implementação do desarmamento devem ser alocados.

14.     Os Estados devem substituir a filosofia de detenção nuclear pelo conceito de segurança comum.

15.     O Conselho de Segurança da ONU deve fazer do desarmamento nuclear uma parte central de sua missão. O Conselho de Segurança pode considerar a possibilidade de fazer um levantamento completo de armas nucleares em todos os países.

16.     As resoluções da ONU que pedem uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio têm de ser implementadas.

17.     Os Estados devem considerar ativamente o estabelecimento de zonas livres de armas nucleares adicionais, por exemplo, o Oriente Médio, incluindo Israel e Irã, e ainda o Ártico.

18.     O Conselho Ártico deve incorporar as questões de segurança a suas atribuições e começar a discutir uma possível zona livre de armas nucleares no Ártico.

19.     Através do Six Party talks (negociações entre seis países - China, Coreia do Sul, Coreia do Norte, Estados Unidos, Rússia e Japão), a Coreia do Norte deve ser induzida a abandonar seu programa de armas nucleares por meio de incentivos e desincentivos econômicos e garantias de segurança. A Coreia do Norte deve voltar a fazer parte do TNP como uma potência não-possuidora de armas nucleares.

20.     As Coreias do Sul e do Norte devem reafirmar sua declaração conjunta de 1992 de manter a Península Coreana livre de armas nucleares.

21.     As discussões diretas sobre o Irã devem ser retomadas, soluções devem ser encontradas no sentido de garantir ao Irã o direito de energia nuclear com finalidade de gerar energia elétrica e para outros propósitos pacíficos, mas não o direito de desenvolver armas nucleares.

22.     A Segurança Nuclear deve ser fortalecida universalmente de acordo com as conclusões da Cúpula de Segurança Nuclear.

23.     O mecanismo de reserva de combustível deve ser desenvolvido seguindo as recomendações da AIEA para reduzir o incentivo aos Estados de construir novas instalações para enriquecimento e reprocessamento.

24.     Passos devem ser dados rumo à internacionalização do ciclo de combustível nuclear.

25.     O financiamento da AIEA deve aumentar.

26.     Os Estados que vendem urânio só devem fazê-lo sob a condição de que o país comprador tenha salvaguardas, incluindo o protocolo adicional, e ainda que o urânio vendido esteja sujeito a essas salvaguardas.

27.     Os líderes mundiais, especialmente os de potências nucleares, devem visitar Hiroshima para entender o sofrimento e destruição causados por armas nucleares e ajudar a informar o público sobre os perigos de tais armamentos.

28.     Os Estados e a sociedade civil devem apoiar a iniciativa Prefeitos pela Paz, fundada pelos prefeitos de Hiroshima e Nagasaki, em prol da abolição de armas nucleares.

 

Lista de Participantes

Membros do InterAction Council

1. S. Exa. Sr. Helmut Schmidt, Presidente Honorário (ex-Chanceler da Alemanha)

(por participação em vídeo)

2. S. Exa. Sr. Malcolm Fraser, Presidente Honorário (ex-Primeiro Ministro da Austrália)

3. S. Exa. Sr. Ingvar Carlsson, Vice-presidente (ex-Primeiro Ministro da Suécia)

4. S. Exa. Sr. Jean Chrétien, Vice-presidente (ex-Primeiro Ministro do Canadá)

5. S. Exa. Sr. Andreas van Agt (ex-Primeiro Ministro dos Países Baixos)

6. S. Exa. Tun Abdullah Ahmad Badawi (ex-Primeiro Ministro da Malásia)

7. S. Exa. Sr. Yasuo Fukuda (ex-Primeiro Ministro do Japão)

8. S. Exa. Sr. Goh Chok Tong (ex-Primeiro Ministro da República de Cingapura)

9. S. Exa. Sr. Lee Hong-Koo (ex-Primeiro Ministro da Coreia)

10. S. Exa. Sr. Abdel Salam Majali (ex-Primeiro Ministro da Jordânia)

11. Sir James Fitz-Allen Mitchell (ex-Primeiro Ministro de São Vicente e Granadinas)

12. S. Exa. Sr. Benjamin William Mkapa (ex-Presidente da Tanzânia)

13. S. Exa. Sr. Tomiichi Murayama (ex-Primeiro Ministro do Japão) (membro ad hoc)

14. S. Exa. Sr. Tung Chee Hwa (ex-Chefe Executivo, Administração de Hong Kong)

15. S. Exa. Sr. Franz Vranitzky (ex-Chanceler da Áustria)

Membros Associados

16. S. Exa. Xeque Abdul-Aziz Z. Al-Quraishi, ex-Governador da Agência Monetária da Arábia Saudita (SAMA, na sigla em inglês) (Banco Central) (Arábia Saudita)

17. Prof. Thomas Axworthy, Presidente do Centro para Estudos da Democracia, Queen’s University (Canadá)

18. S. Exa. Sr. Jean André François-Poncet, Presidente do Comitê Senatorial sobre Planejamento Regional (França)

19. Dr. Lee Seung-yun, ex-Vice-Primeiro-Ministro da Coreia

20. Sr. Seiken Sugiura, ex-Ministro da Justiça (Japão)

Convidados Especiais

21. Dr. Tadatoshi Akiba, Prefeito de Hiroshima (Japão)

22. Dr. Abdulrahman H. Al-Saeed, Conselheiro - Corte Real, Presidente do Centro para Estudos Especializados (Arábia Saudita)

23. Dr. Hans Blix, ex-Presidente da Comissão da ONU de Vigilância, Verificação e Inspeção (Suécia)

24. S. Exa. Sr. Luiz Augusto de Castro Neves, Embaixador do Brasil no Japão (Brasil)

25. Sr. Sam Nunn, ex-Senador dos Estados Unidos e ex-Presidente da Comissão das Forças Armadas do Senado (Estados Unidos)

26. Sua Eminência Monshu Koshin Ohtani, Antigo Presidente da Federação Budista do Japão, Monshu do Jodo Shinshu Hongwanji-ha (Japão)

27. Embaixador Alexander Panov, Reitor da Academia Diplomática do Ministério de Relações Exteriores (Rússia)

28. Dr. Shen Dingli, Diretor do Centro para Estudos Americanos, Reitor Executivo do Instituto de Estudos Internacionais, Fudan University (China)

29. Sr. Masajuro Shiokawa, ex-Ministro da Fazenda (Japão)

30. Sr. Jitsuro Terashima, Presidente, Instituto de Pesquisa do Japão (Japão)

31. Sr. Karsten D. Voigt, (Representando o Presidente Honorário Helmut Schmidt), ex-Coordenador da Cooperação Germânica-Americana do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha (Alemanha)

Especialistas de Alto-nível

32. Dra. Rebecca E. Johnson, Diretora Executiva do Instituto Acronym para a Diplomacia do Desarmamento (Reino Unido)

 

33. Prof. Katsuko Kataoka, Professor Emérito, Hiroshima University (Japão)

34. Dr. Tilman Ruff, Presidente da Campanha Internacional para Abolição de Armas Nucleares (Austrália)

35. Dr. Randy Rydell, Encarregado Sênior das Questões Políticas, Escritório do Alto Representante para Assuntos de Desarmamento, ONU (ONU)

O InterAction Council manifesta sua mais sincera gratidão pelo generoso apoio dos Governos da Austrália, Canadá, Japão e Coréia, assim como o da Prefeitura de Hiroshima.

Tradução de Fernanda Fiorese Martins, Danielle Palhares de Almeida, Samir M. de Mello e Leonardo Brandão Castro. Revisão de Vanira Tavares.

Serviço de Tradução, SIDOC, Senado Federal


            Modelo1 3/28/246:12



Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/04/2010 - Página 16710