Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos 10 anos da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA FISCAL.:
  • Comemoração dos 10 anos da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Publicação
Publicação no DSF de 06/05/2010 - Página 18382
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA FISCAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, ELOGIO, REFORMULAÇÃO, ECONOMIA, BRASIL, ELABORAÇÃO, PLANO, REAL, PROGRAMA DE ESTIMULO A REESTRUTURAÇÃO E AO FORTALECIMENTO AO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (PROER), GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, REGISTRO, HISTORIA, CONTRIBUIÇÃO, CONTROLE, INFLAÇÃO, ESTABILIZAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL.
  • CRITICA, POLITICA FISCAL, SUPERIORIDADE, GASTOS PUBLICOS, UNIÃO FEDERAL, PREVISÃO, ORADOR, AUMENTO, TAXAS, JUROS, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).
  • REGISTRO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, INCLUSÃO, UNIÃO FEDERAL, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, GARANTIA, FLEXIBILIDADE, AUTONOMIA, COMPARAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, SITUAÇÃO, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores e convidados de várias procedências, que acorreram muito espontaneamente ao Senado Federal para participar dessa singela, porém necessária, comemoração dos 10 anos da Lei de Responsabilidade Fiscal em vigor no Brasil.

            Figuras ilustres, entre as quais o Conselheiro de Contas do meu Estado, Presidente da Corte de Contas do meu Estado, Dr. Júlio Pinheiro. Figuras, enfim, que têm a noção muito clara do bem que essa Lei provocou - diretamente, para a saúde das finanças públicas brasileiras e, indiretamente, pelo que deu de segurança ao Brasil, inclusive com reflexos na forma mais robusta como o Governo do Presidente Lula pôde enfrentar a crise internacional tão recente.

            Sem as reformas feitas no Governo passado, o Brasil teria virado de cabeça para baixo. A Lei de Responsabilidade Fiscal, a renegociação da dívida de Estados e Municípios, o resgate de esqueletos que vinham desde os tempos da Ditadura, como por exemplo aquele do BNH; as necessárias capitalizações que foram feitas para um Banco do Brasil que estava em apuros, para uma Caixa Econômica que não era mais capaz de fazer o seu papel de banco de varejo e, sobretudo, banco de fomento.

            Algumas vozes, pouco avisadas em matéria de economia, diziam: “Ah, o Fernando Henrique encontrou uma dívida de R$60 ou R$70 bilhões e entregou com R$600 bilhões. A dívida, hoje, sem resgate de esqueleto nenhum, está em R$1, bilhão.

            E, para se chegar à estabilidade econômica, se teve que pagar alguns preços. E um dos preços foi a compreensão de que não era possível estabilidade com o esqueleto no armário. Teria que se tirar os esqueletos do armário para se lograr a estabilidade econômica que hoje é usufruída pelos brasileiros.

            Mas eu gostaria, Sr. Presidente, de registrar, até porque esta é a prática do meu Partido e esta é a minha prática pessoal, que nós não podemos deixar passar em branco uma data tão significativa quanto esta sem lembrarmos aqui das tentativas anteriores, todas elas visando ao fim da inflação e à estabilização da economia. Foram tentativas que malograram, mas que foram servindo de acúmulo para que um dia um grupo formado inclusive por pessoas que haviam participado das tentativas anteriores malogradas e que, com a experiência que adquiriram, tivessem compreendido algumas coisas. Por exemplo, que não se resolveria a questão da inflação com choque. Por exemplo, que não se resolveria por via heterodoxa nenhuma a questão da estabilidade. Por exemplo, que o Brasil sofria de um mal que era aquele monstro que, em algum momento, foi necessário para que o Brasil não morresse como organismo, mas que criou doenças muito profundas no corpo brasileiro, que eram as correções.

            Descobriu-se, por exemplo, que havia um fator inercial muito relevante que transmitia de setor para setor o aumento de preço. Ou seja: eu aumento o meu preço e você aumenta o seu porque eu aumentei o meu. O outro aumentava porque aquele outro aumentou e, no final, todos aumentavam o preço para não perder. Quem perdia era o trabalhador. Quem perdia era o mais pobre.

            Então, eu diria que a Lei de Responsabilidade Fiscal, no bojo das reformas feitas ao longo do Governo do Presidente Fernando Henrique, contribuíram em muito para proteger a vida, a saúde financeira da população brasileira como um todo, especialmente da camada mais pobre.

            Quero relembrar, Sr. Presidente, para fazer justiça, a tentativa do Plano Collor. O período Collor teve como grande atitude principiar a abertura da economia brasileira, que era fechada: televisão malfeita, carros mal produzidos, tudo me lembrava aqueles Ladas russos que eram tudo o que o regime conseguia produzir. Foi um grande sinal que a partir dali ficaria irreversível se abrir a economia.

            E o Plano Collor, que não poderia dar certo, até porque se retirava praticamente todo o meio circulante, todo o meio monetário de circulação e a inflação teria que cair, mas o dinheiro teria que voltar a circular e, quando voltasse, a inflação retornaria, como retornou, até porque as suas causas essenciais não haviam sido seriam atacadas. E o Brasil não sabia quais eram as causas essenciais que levavam àquela inflação que galopava e que obrigava a recursos extremos e a paliativos dolorosos como, por exemplo, os paliativos resumidos na correções.

            O Presidente Sarney antes já havia tentando, com o Plano Cruzado, que foi muito aplaudido pela sociedade brasileira, já havia tentado, dado a sua contribuição. Medidas subsequentes necessárias e complementares ao Plano Cruzado não foram tomadas.

            A eleição passou, o PMDB, Partido do Dr. Ulysses Guimarães, Partido do...Não sei se o ex-Presidente Sarney já era desse Partido, mas o PMDB, a meu ver, pressionou muito para que não houvesse ajustes no Plano Cruzado. O resultado foi que o PMDB elegeu quase todos os Governadores de Estado. Mas o Plano Cruzado II, que foi lançado logo após a eleição, marcou o desenlace do Presidente Sarney com a popularidade, e marcou uma era de inflação que passou a galopar sem piedade.

            O Plano Verão, do competente economista Maílson da Nóbrega - sou admirador muito fiel do que escreve - não podia fazer muito mais do que fez. Ali era fechar o Governo procurando garantir um mínimo de governabilidade para o próximo Presidente, que terminou sendo Fernando Collor.

            O Plano Bresser, o Plano Verão, esses já tiveram alcance menor, mas a intenção sempre era a mesma: procurar dar as condições mínimas de sobrevivência à economia brasileira.

            O Presidente Fernando Henrique foi nomeado, Sr. Presidente Marconi Perillo, de maneira muito surpreendente. E quero relatar aqui a V. Exª que ele estava na casa do Embaixador Sardenberg, chefe da missão brasileira junto à ONU, e recebeu um telefonema do Presidente Itamar. O Presidente Itamar liga para ele e diz: “Fernando, eu preciso que você seja o meu Ministro da Fazenda.” Ele diz: “Mas, Presidente, estou bem como Ministro do Exterior. Estou muito bem. Eu não sou economista, não é o meu ramo.” “Não, mas preciso de você mesmo”. Mas o resultado foi que o Presidente disse “não” a ele.

            O Presidente Itamar, que é um intuitivo, que é um homem de enorme inteligência intuitiva, ninguém pode negar isso nele, a par de não se poder negar também o seu espírito público, deu-se por satisfeito para inglês ver. Fernando Henrique volta para a mesa de jantar e diz: “Olha, o Presidente Itamar me convidou para Ministro da Fazenda, e eu tive que dizer não”.

            Quando é de madrugada, ele é acordado pela D. Ruth Cardoso, de saudosíssima memória, querida amiga. Ela disse: “Fernando, você enlouqueceu?” Ele disse: “Não, Ruth, eu estou acordando”. “O Itamar o nomeou e você aceitou ser Ministro da Fazenda? Já imaginou o que você vai enfrentar? Qual será o seu futuro?” Ele disse: “Ruth, para começar, eu estou acordando. Segundo, eu disse a ele que eu não queria”. “Mas ele te nomeou”. “Então, nomeou”.

            Aí combinou com o Presidente Itamar as regras que seriam bem à feição do Presidente Itamar: primeiro, nenhuma interferência política; segundo, carta branca para nomear a assessoria. O Presidente Itamar aceitou isso de muito bom grado. Quero aqui ressaltar, então, que não se deve esquecer do Presidente Itamar nesse episódio. Muito relevante o seu papel. Escolheu o Ministro da Fazenda certo, com muita intuição e no momento exato, no momento certo.

            E o Presidente Fernando Henrique reúne, então, um grupo de pessoas muito relevantes ao seu lado, que haviam participado ou não das experiências anteriores fracassadas; e esse grupo estudava, detidamente, todas as tentativas de estabilização na América Latina. Acompanharam, por exemplo, o início e o fracasso do Plano Austral na Argentina. Acompanharam as tentativas de estabilização econômica na Polônia. Acompanharam tudo o que se passava pelo mundo, inclusive em Israel.

            E já tinham firmado neles próprios a convicção de que a saída teria de ser ortodoxa. Não teria de haver nenhum golpe de mão, nada muito violento, nada muito brusco, mas, sim, algo que, pelos manuais mais ortodoxos da economia, fosse levando o País a enfrentar o drama da - me falta a palavra; já lembro, quando um preço para outro, Senador Jefferson Praia? - inflação inercial. Indexação! - muito obrigado. Não sei quem foi o anjo da guarda que soprou, mas eu estou muito resfriado e me deixa ainda talvez mais em dificuldade de atuar do que eu próprio penso.

            Mas o fato é que o Presidente Fernando Henrique e seu grupo perceberam que era para se atacar a indexação, que era para se criar uma moeda que tivesse credibilidade, que era para se tomar medidas muito duras. E elas foram tomadas. Era para se organizar - não reorganizar - o Banco Central.

            Eu gostaria muito que os membros desse grupo estivessem presentes, mas não estão e vão tomar conhecimento da homenagem que estamos fazendo a eles. Talvez eu omita alguns, mas não posso deixar de falar de Edmar Bacha, não posso deixar de falar em Pedro Malan, não posso deixar de falar de Gustavo Franco. Não posso olvidar tantas figuras que se reuniram para expiar seus erros do passado. Muitos haviam participado de planos anteriores, mas cumpriram com seu dever participando de planos anteriores e fazendo o seu melhor para que o Brasil pudesse lograr atingir a tão ansiada, a tão necessária estabilidade econômica. De repente, o Brasil virou um país normal, Senador Jereissati - a quem parabenizo pela iniciativa da propositura. O Brasil virou um país normal, virou um país com moeda. Então, é um país que tem direito a ter bandeira. Um país sem moeda não tem bandeira. Um país sem moeda não tem caráter, perde o caráter, perde a sua identidade. É um país sem identidade

            Nós não tínhamos moeda. Já esquecemos as moedas para trás. Se perguntarem qualquer coisa antes do real... Eu não sei dizer qual era a moeda que estava em vigência. Eu só sei que a inflação corroía todo e qualquer crescimento de Produto Interno Bruto. A inflação corroía todo e qualquer crescimento econômico que o Brasil pudesse apresentar. Não adiantava crescer os 10%, 11%, 12% do milagre brasileiro, porque a inflação de 40% ao ano, naquela época do milagre brasileiro, simplesmente anulava todos os efeitos, sobretudo na direção das camadas mais pobres.

            Então, a inflação concentrava renda. A inflação é essencial de ser combatida para valer, porque se controla a inflação, não se a mata, não se a extingue. E todos os países responsáveis sabem que devem mantê-la sob controle. E o país que é responsável, que é sério, deve crescer a taxas mais elevadas possíveis por ano, durante muitos anos seguidos, com inflação a mais baixa possível. Para mim, essa é uma equação muito simples que deve ser observada por qualquer governante que tenha responsabilidade efetiva.

            Senador Tasso, essa história, que ouvimos muito por aqui, de um pouco mais de inflação para ter um pouco mais de crescimento é um “me-engana-que-eu-gosto” terrível, porque qualquer crescimento com mais inflação é ilusório. Essa taxa, se não houvesse, a meu ver, gastança do Governo, gastança terrível do Governo, não houvesse uma política fiscal que não está indo bem... E eu louvo a política fiscal e a política monetária do primeiro Governo do Presidente Lula. Também não sou de desconhecer os méritos de adversários, porque simplesmente eu quero informar com correção as pessoas que estão me ouvindo. Não quero desinformar as pessoas, as novas gerações sobretudo.

            Considero que o primeiro Governo, até a queda do Ministro Palocci, foi impecável, do ponto de vista da política monetária e da política fiscal. Depois, continuou correto do ponto de vista da política monetária, mas está muito incorreto do ponto de vista da política fiscal: gasta demais, cresceu 27%, 26%, em sete anos e aumentou os gastos correntes em 75% nesses mesmos sete anos. Logo, é uma conta que não fecha. É uma conta que cobrará seu preço mais adiante.

            Eu gostaria de citar ainda outros técnicos, não necessariamente economistas, que participaram dessa tarefa. Já citei alguns, não citarei todos, com toda certeza, mas cito esse excelente economista, tributarista, que é José Roberto Afonso. Cito o ex-Ministro Martus Tavares, cito o Dr. Cid Heráclito, Álvaro Manuel, Selene Nunes e tantos outros nomes. Não dá para nós esquecermos que essas pessoas reuniram suas experiências e conduziram o País para um caminho correto, para um caminho justo.

            E mais: quando eu digo um país normal, eu digo um país que pode ter governos que fracassem ou que tenham êxito. Mas fracassar ou ter êxito com a economia estabilizada é uma coisa; fracassar ou ter êxito com uma economia onde a inflação galope é outra. A inflação baixa e a economia estável protegem a bolsa do trabalhador mais pobre. Esta é a grande verdade.

            Então, eu gostaria de passar, Sr. Presidente, alguns dados a mais. Estes aqui estão até escritos justamente para que a memória não me traia. Mas o fato é que, nesta semana, o Brasil comemora dez anos de entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, a LRF. Comemorar é, de fato, o termo mais adequado para se referir à data. Não há, hoje, voz nenhuma contrária à norma que revolucionou o trato das finanças públicas no País; algo muito diferente do que aconteceu quando, ainda projeto, ela foi discutida na virada do milênio.

            O atual Presidente da República e seu Partido estavam, ruidosamente, do outro lado e até foram, contrariamente à Lei de Responsabilidade Fiscal, às portas do Supremo Tribunal Federal. Aliás, ultrapassaram as portas, foram lá dentro do Supremo Tribunal Federal para questionar a constitucionalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal.

            Chamo a atenção para um outro fato, abro um outro parêntese. Imaginem o Presidente Lula enfrentando a crise que enfrentou em 2003 sem ter a protegê-lo a LRF.

            Cito a presença do Deputado João Almeida, Líder do meu Partido na Câmara dos Deputados.

            Imaginem o Presidente tendo que discutir com seus interlocutores do setor, Prefeitos e Vereadores, se não tivesse havido a absorção, pelo Estado, a adequação pelo Estado brasileiro, pela União - por isto aumentou a dívida interna -, por parte do Presidente Fernando Henrique.

            O fato é que tem uma herança muito bendita que foi passada para o atual Presidente. E nos deu muito orgulho quando vimos que o Governo do Presidente Lula, Deputado João Almeida, quando errou e quando acertou - ele errou e acertou no combate à crise que perifericamente atingiu o Brasil também -, ele pôde enfrentar essa luta estribado num país diferente, num país amparado pela estabilidade vinda do real, que ele combateu, um país estribado numa realidade diferente a partir da Lei de Responsabilidade Fiscal, que ele combateu, ou seja, um país melhor.

            E o bonito foi que ele próprio chegou com outra cabeça. A Carta aos Brasileiros fez do Presidente da República alguém que mostrou que tinha intenção de governar com responsabilidade. Agora mesmo quando o Banco Central - e há um contraste, há uma dicotomia de personalidade aí, porque, quando o Banco Central diz que precisa aumentar juros e aumenta juros, ele manteve a mesma independência autorizada, legal; tenho um projeto aqui que dá autonomia real para o Banco Central -, mas ele optou por mais juros, em vez de mais inflação.

            E mais: não vamos nos iludir, não. Este ano não termina sem o Banco Central colocar essa taxa de juros Selic em pelo menos 11,5%. Vamos falar a verdade de maneira franca e direta para o povo. Isto significa que o Governo fez a opção de aumentar juros porque não fez a opção de cortar gastos. E se não cuidou da parte fiscal, obviamente, a parte monetária tem que ser mais apertada, a política monetária tem que ser mais estreita, tem que ser mais restritiva.

            Muito bem. Se hoje o próprio Governo louva e enaltece, às vezes em brados, às vezes sussurrando, a Lei de Responsabilidade Fiscal, o fato é que, antes, tudo era muito diferente. No seu velho estilo, o PT votou em bloco contra a aprovação da lei, realizada em 25 de janeiro de 2000. Parlamentares que viriam a ocupar sete Ministérios do Governo Lula, dois Governos de Estado e muitas prefeituras pelo País afora estão na lista dos que disseram “não” àquela sessão histórica - aliás, outro fato do qual participou, de maneira proeminente, o Senador Tasso Jereissati, que à época nos honrava como presidente do meu Partido.

            O Presidente Lula se recusou a apoiar o Plano Real; convenceram-no de que o Plano Real era um embuste ou que não daria certo, seria mais uma tentativa que daria com os burros n’água. Ele dispunha, àquela altura, de 45% da aprovação popular, com possibilidade até de vencer a eleição em primeiro turno. Se ele tivesse - não tenho nenhuma dúvida - apadrinhado o Real, teria havido uma aliança entre o PSDB e o PT, e talvez o candidato a Vice-Presidente da República teria sido o então Governador ou ex-Governador Tasso Jereissati. Lula teria sido Presidente em 1994, e seu Ministro da Fazenda teria sido nada mais, nada menos que Fernando Henrique Cardoso. Ele não aceitou as regras do jogo que estavam estabelecidas e investiu, como sempre, em busca da popularização do seu Partido contra tudo e contra todos.

            Mas muito bem. Hoje nós sabemos que não dá para imaginar como governariam eles ou qualquer governo governaria se não tivesse havido tanto esforço pelas reformas estruturais, que contaram, todas elas, Presidente Marco Maciel, com o repúdio do PT, que tem que ter amadurecido como Partido, sem nenhuma dúvida.

            Mas, não satisfeitos com o resultado - a aprovação foi acachapante: 385 votos -, PT, PSB e PCdoB foram, como já disse, bater às portas do Supremo, arguindo a inconstitucionalidade da lei. Derrubada liminarmente - já concedo o aparte ao Presidente Marco Maciel -, o fato é que, até hoje, essa lei não teve seu mérito apreciado pelos Ministros da Corte. E, curiosa e simbolicamente, meu prezado Dr. Júlio Pinheiro, a Advocacia-Geral da União, já em 2008, no “novo Lula”, na nova fase do Presidente Lula - que eu saúdo, porque é um avanço -, já opinou pela “total constitucionalidade”. Eu abri aspas, porque essa expressão é da AGU.

            Ouço o Senador Marco Maciel. (Pausa.)

            O SR. PRESIDENTE (Marconi Perillo. PSDB - GO. Fora do microfone.) - Neste tipo de sessão, não há previsão de aparte.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sr. Presidente Marco Maciel, o Presidente Marconi Perillo nos adverte de que não há previsão de aparte nesta solenidade. Em sendo assim, sou eu que perco, e perde meu discurso. Mas sei que V. Exª fará o seu, e estarei aqui para ouvi-lo, porque V. Exª foi um dos baluartes da manutenção da estabilidade, porque uma coisa é dar o remédio certo para construí-la, a outra é ter a garantia de que o remédio vai produzir efeito. E eu digo que... Aliás, tanto o Presidente Fernando Henrique quanto o Presidente Lula foram muito felizes ao escolher seus Vice-Presidentes. V. Exª, pelo comportamento impecável, pela disciplina, pela capacidade de trabalho, pela capacidade de colaboração, pela modéstia, pela forma afirmativa, firme e, ao mesmo tempo, modesta, humilde com que se porta; e o Presidente Lula por ter escolhido esse homem que é um exemplo de vida para todos nós - nem o câncer pode com ele -, o Vice-Presidente José Alencar, que foi um verdadeiro avalista do Presidente Lula perante o empresariado, que tinha certo receio das bravatas passeateiras, que eram uma marca do PT, foram a marca por tanto tempo do PT.

            Devo fazer ainda justiça a dois homens: Rubens Ricúpero, que foi um excelente Ministro da Fazenda, muito aparelhado para discutir qualquer assunto e que cedeu o lugar ao ex-Governador do Ceará, Ciro Gomes, que fez o seu papel, cumpriu o seu papel, vocalizou o que era a essência do Plano muito bem, com muita coragem.

            Não dá para deixar de fora ninguém que tenha tido méritos, para que nós estabeleçamos um Brasil que não seja o Brasil “nunca antes neste País”, “começamos hoje”, “antes de mim era o dilúvio”, “depois de mim o Brasil virou uma maravilha”. Nada disso! Isso é desonestidade intelectual pura! Não podemos passar para as novas gerações a ideia de que somos um País que se representa nas câmaras legislativas e se representa no Executivo por pessoas desonestas intelectualmente. Nós temos que reconhecer os fatos.

            Gostaria inclusive de dizer, depois de citar todos esse nomes, que a Lei de Responsabilidade Fiscal, Deputado João Almeida, começou a nascer 12 anos antes - são dez anos de comemoração, dez anos de vigência, mas 12 anos antes -, ainda na Constituinte, quando o relator da Comissão de Finanças e Tributação tomou a iniciativa que resultaria no art. 163 da Constituição, prevendo a edição de uma lei complementar para disciplinar as finanças do País. Isso foi o embrião da Lei de Responsabilidade Fiscal. E quem tomou essa iniciativa foi, simplesmente, o ex-Governador de São Paulo, ex-Prefeito de São Paulo, ex-Ministro do Planejamento, ex-Ministro da Saúde e presidenciável do meu Partido, José Serra. Gostaria de não deixar de fora ninguém que teve méritos.

            Aos mais novos é sempre bom recordar: naquela época - como ainda permaneceriam durante um longo período à frente -, as finanças públicas do País eram pouco mais do que uma monumental balbúrdia. Era um País em que a inflação mensal teimava em não baixar de dois dígitos e que, ao ano, eram centenas de previsões orçamentárias que não passavam de mero exercício de futurologia; miragem, talvez.

            Com a engenharia do Plano Real, que pôs fim à cortina de fumaça que a inflação impunha às contas públicas, ficou evidente que havia gasto demais para dinheiro de menos. O processo seguiu-se, então, com o ajuste nas finanças de Estados e Municípios, que resultou no equacionamento de dívidas e na liquidação de instituições bancárias públicas, verdadeiro sorvedouro de recursos. Entre 1983 e 1991, a União, por exemplo, gastou R$61 bilhões com empréstimos e subsídios, como relembra o jornal Valor Econômico.

            E quero, Senador José Agripino, recordar-me aqui do Proer. Foi outra batalha campal para se aprovar o Proer, Deputado João Almeida - V. Exª estava presente, ao nosso lado. E o Proer foi oferecido pelo Presidente Lula ao Presidente Bush. “Vou dizer ao Bush que aqui está o Proer para resolver a crise bancária.” A verdade é que o nosso sistema bancário, o nosso sistema financeiro é um dos mais sólidos do mundo, graças ao Proer, que era tão antipático aos olhos da sociedade, porque havia uma militância para torná-lo antipático. Diziam: “Está dando dinheiro a banqueiros”. E o Brasil gastou, investiu no Proer 1,5% do seu PIB. Perguntem quanto pagaram, aí sim, de prejuízo no seu PIB Argentina, Venezuela, México e tantos países que não tiveram a previdência e a lucidez de fazer algo parecido com o Proer. Eu diria que eram percentuais de 12%, 14%, 18% do PIB. Nós investimos no Proer 1,5% do PIB. Quem era banqueiro e que havia falido deixava de ser banqueiro, nunca mais viraria banqueiro neste País.

            O que se protegeu ali foi a saúde da economia; o que se protegeu foi o correntista dos bancos. Mas a cantilena lá fora nas passeatas era: “Amigos de banqueiros”, “governo de banqueiros”. Fiquei tão feliz quando o Presidente Lula disse: “Bush, pega o Proer, está aqui o Proer, e resolve teu problema”. E o que é verdade: se esse Proer, que foi tão combatido pelo Presidente Lula e que foi tão útil no Governo dele, salvaguardando a saúde do sistema financeiro brasileiro, tivesse sido impedido, na hora de sua votação, o Brasil teria, primeiro, ido à garra; segundo, se os Estados Unidos tivessem tido a lucidez e a antecipação que o Governo Fernando Henrique teve, nós teríamos, sim, uma crise de efeitos menores do que aqueles que se manifestaram a partir da falência do Lehman Brothers.

            Muito bem, Sr. Presidente, eu vou tentar resumir. O fato é que nós vimos uma série de reformas que foram essenciais para a saúde das contas públicas.

            E gostaria de dizer que a Lei de Responsabilidade Fiscal é uma lei dura, e ela é dura para proteger o dinheiro, que não é do governante, mas sim de cada um dos contribuintes. Nós vemos aqui tentativas de driblá-la, de subterfúgios, enfim. É difícil.

            Eu tenho um projeto, por exemplo, que é um projeto que visa a incluir, na Lei de Responsabilidade Fiscal, também a União. Aí dizem os que são contra: “Mas a União pode enfrentar, de repente, uma crise global sistêmica. Como é que fica?” Eu digo que fica bem, porque nós podemos colocar nessa lei - e eu proponho - a salvaguarda, as fórmulas que, no momento de crise avassaladora, permitam à União sair dos mecanismos regulares da Lei de Responsabilidade Fiscal. Eu sei que o Estado não precisa disso, o Município não precisa disso, mas a União, que precisa disso eventualmente no caso de uma crise global sistêmica, teria sua válvula de escape. Agora, no ordinário da economia, tudo indo bem, por que não se limitar também os gastos da União? Estou falando isso quando, a meses de uma eleição, temos um candidato que está na frente - não significa que vá vencer a eleição, significa que está na frente na eleição. Estamos aqui falando que poderá ser o País administrado pelo Sr. José Serra, como poderia ser o País administrado pela Srª Marina Silva, ou o País administrado pela Srª Dilma Rousseff. Aquele que o Brasil escolher terá de encontrar as finanças públicas em ordem, terá de encontrar instrumentos que defendam este País.

            Muito bem. Portanto, Sr. Presidente - sei que já abusei do tempo -, eu queria apenas dizer que procurei fazer, misturando um pouco das lembranças que aqui estão postas pela minha competente e diligente assessoria com o que eu próprio tinha de vivência no trato da questão econômica e do acompanhamento da questão econômica como membro do Governo passado que fui.

            Mas volto a dizer: esta comemoração só tem sentido se nós, primeiro, resgatarmos o nome de todos aqueles que participaram desde antes do Plano Real, com os supostos fracassos, os diversos planos, que tinham todos a mesma boa intenção, servindo para o acúmulo de experiência que redundou no êxito definitivo. O real é a moeda brasileira, como o dólar é a moeda dos Estados Unidos. E ponto. O real é a moeda que não vai mudar. Não vai ter real novo, não vai ter real velho, não vai ter real mais ou menos; é o real.

            E, ao mesmo tempo, procurei aqui - e, se fiz alguma omissão, peço mil desculpas - lembrar o nome dos economistas que participaram dessa empreitada, o nome dos Ministros todos, o nome de todos os Presidentes que, com as suas diversas tentativas, foram contribuindo para o acúmulo.

            Que nós entendamos a Lei de Responsabilidade Fiscal como algo que aconteceu em 2000, no Governo Fernando Henrique, que foi um Governo extremamente feliz, do ponto de vista da reorganização das finanças públicas brasileiras. Mas que entendamos como mais do que um êxito do Governo Fernando Henrique Cardoso, entendamos como uma conquista da sociedade brasileira. A sociedade brasileira estava madura.

            Na sociedade soviética, Senador Roberto, se Gorbachev tivesse falado o que falava antes, teria sido preso e mandado para a Sibéria. É que ele pôde falar no momento em que a sociedade soviética queria ouvir aquilo e não permitiria a prisão dele de jeito algum, porque vários que pensavam como ele foram presos. Ele disse numa hora em que estava pronta para uma abertura política a sociedade soviética. Não vou discutir aí o fracasso econômico. Talvez tenham dosado mal as duas aberturas.

            O fato é que Fernando Henrique, no momento certo, com a sociedade madura para participar dessa empreitada tão bonita, apoiado nas experiências anteriores, apoiado inicialmente pelo patriotismo do Presidente Itamar Franco, logrou estabelecer a dignidade brasileira, dando-nos uma moeda de verdade e uma estabilidade que não haverá, de forma alguma, de ceder espaço para a anarquia econômica outra vez. É uma conquista que deve ser zelada por todos nós. Uma conquista que pertence a todos nós. É uma conquista que, sobretudo no primeiro Governo do Presidente Lula, revelou enormes méritos. Se eu esqueci as pessoas, não quero esquecer aqui do Ministro Antonio Palocci. Não quero esquecer, porque o Ministro Palocci foi essencial para debelar a crise.

            E, já que estamos falando verdades, só verdades, a crise não foi feita pelo Presidente Fernando Henrique, como tentam dizer. A crise de 2001 não existia. A de 2002 foi o “risco Lula”. Era preciso ele convencer as pessoas e os mercados de que ele não era perigo para a economia brasileira e para a estabilidade. Ele acabou provando que não era, àquela altura.

            O Ministro Palocci teve também inúmeros méritos e teve, de nossa parte e da parte da Bancada do PSDB, muito apoio ao longo da sua trajetória, até o momento em que teve de sair do Governo.

            Portanto, procurando ter feito justiça ao máximo de pessoas - e, se olvidei algum nome, peço realmente desculpas, não era possível lembrar tantas pessoas que trabalharam tão bem pela estabilidade econômica -, eu devo dizer que a Lei de Responsabilidade Fiscal veio para ficar. Ela precisa ter vindo para ficar. A Lei de Responsabilidade Fiscal é um marco sem o qual o Brasil não transporia os umbrais do chamado primeiro mundo. É um marco civilizatório, um grande passo. É um passo do qual nos orgulhamos, nos orgulhecemos.

            Por isso, parabenizo todos aqueles que acreditaram e todos aqueles que se converteram ao credo da Responsabilidade Fiscal, porque é uma obrigação mínima e básica. Não se sabe se um governante é bom só porque ele é responsável fiscalmente. Isso é um dever. Isso é um pressuposto. Ele é bom se, além disso e por causa disso, aplicar corretamente os recursos públicos em obras que sejam fundamentais para mudar a face dos seus Estados e Municípios e do seu País. Mas o pressuposto é este: responsabilidade fiscal. É nós gastarmos menos do que aquilo que arrecadamos. Isso serve para o indivíduo, serve para a família, serve para a empresa, isso serve para o País.

            Portanto, vida longa à Lei de Responsabilidade Fiscal, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Modelo1 5/12/249:50



Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/05/2010 - Página 18382