Discurso durante a 67ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários a respeito da falta de ética na política nacional. Defesa da criação de uma Constituinte exclusiva para analisar e propor a reforma política. Defesa da aprovação sumária do projeto "Ficha Limpa" tão logo chegue ao Senado Federal.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Comentários a respeito da falta de ética na política nacional. Defesa da criação de uma Constituinte exclusiva para analisar e propor a reforma política. Defesa da aprovação sumária do projeto "Ficha Limpa" tão logo chegue ao Senado Federal.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Renan Calheiros.
Publicação
Publicação no DSF de 07/05/2010 - Página 18731
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • BALANÇO, DIRETRIZ, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, COMPROMISSO, ATUALIDADE, DEFESA, ETICA, POLITICA NACIONAL, AVALIAÇÃO, PERDA, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, INCENTIVO, SONEGAÇÃO, CONTRABANDO, IRREGULARIDADE, PROPINA, EXTENSÃO, SOCIEDADE, DESRESPEITO, OBJETIVO, FAVORECIMENTO PESSOAL.
  • ANALISE, LEGALIDADE, FALTA, ETICA, ESPECIFICAÇÃO, EXCESSO, LUCRO, BANCOS, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, AUSENCIA, RETORNO, TESOURO NACIONAL, DESVIO, FUNDOS PUBLICOS, QUESTIONAMENTO, LEGISLAÇÃO, CORRUPÇÃO, PROCESSO LEGISLATIVO, INTERESSE, GRUPO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • DEFESA, SUGESTÃO, COMISSÃO EXTERNA, AVALIAÇÃO, ETICA, PROPOSIÇÃO, DIFICULDADE, ESCOLHA, MEMBROS, FALTA, GARANTIA, IMPARCIALIDADE, ATUAÇÃO, NECESSIDADE, BUSCA, MORAL, ATIVIDADE, LEGISLATIVO, AMBITO, CONTROLE EXTERNO.
  • JUSTIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, EXCLUSIVIDADE, DECISÃO, REFORMA POLITICA, DEBATE, CRITERIOS, ESCOLHA, MEMBROS, ALTERNATIVA, VICIO, ELEIÇÕES, PRE REQUISITO, INELEGIBILIDADE, REU, CORRUPÇÃO, ABERTURA, SIGILO BANCARIO, AMPLIAÇÃO, FISCALIZAÇÃO, SOCIEDADE.
  • JUSTIFICAÇÃO, FINANCIAMENTO, SETOR PUBLICO, CAMPANHA ELEITORAL, COMBATE, SUPERFATURAMENTO, OBRA PUBLICA, AMPLIAÇÃO, DEMOCRACIA, ACESSO, CANDIDATURA.
  • SAUDAÇÃO, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, INICIATIVA, AÇÃO POPULAR, INELEGIBILIDADE, REU, CORRUPÇÃO, PREVISÃO, APROVAÇÃO, EXPECTATIVA, URGENCIA, EXAME, SENADO, AUSENCIA, EMENDA, FAVORECIMENTO, INICIO, PROCESSO, ETICA, PRAZO, ELEIÇÕES, CONCLAMAÇÃO, APOIO, LIDER.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, li um dia uma entrevista do grande poeta gaúcho Mário Quintana, quando lhe perguntaram em que outra profissão conseguiria se imaginar. A resposta de Mário Quintana foi: “...eu queria ser um pajem medieval.. Mas, isso não é nada. Pois, hoje, eu queria ser uma coisa mais louca: eu queria ser eu mesmo!”. “E quem é o senhor?” Foi a próxima e última pergunta feita ao poeta Quintana.

            Quintana respondeu: “Eu não sou eu, sou o momento, passo.” - concluiu.

            O meu pai, meu querido pai, velho libanês e lutador, queria que eu fosse médico. Diferente, portanto, do pajem da imaginação do poeta, embora a saúde hoje também se pareça, muitas vezes, com a dos tempos medievais, uma imaginação.

            Eu, entretanto, percebi que para ser eu mesmo deveria seguir, desde muito cedo, quase desde criança, a vida pública.

            Depois de viver tantos momentos na política, eu também percebo, mais uma vez como o poeta, querido Quintana, que eu não sou eu, sou o momento; o momento, e eu também passo.

            Na política, meu querido presidente, já cheirei pólvora. Cheirei pólvora quando o momento era de luta pela liberdade. Já rasguei caminhos, rasguei caminhos quando o momento era de busca da democracia. Já marchei contra a corrente, marchei contra a corrente quando o momento era de defesa da nossa soberania.

            Estariam a liberdade, a democracia e a soberania em risco no momento atual?

            Eu penso que não. A soberania, quem sabe, quanto à globalização não respeita fronteiras. Quando o lucro perdeu, definitivamente, qualquer resquício de pudor. Quando se sabe que temos tudo o que pode a cobiça. Quando ainda não foram expulsos todos os vendilhões da Pátria. Se eu sou o momento e eu passo, e se eu ainda estou aqui, escolhido pelo povo do Rio Grande do Sul para representá-lo, qual é, então, o meu momento atual?

            Sr. Presidente, como se num verdadeiro dilema de Shakespeare, quem sou eu afinal? Um eterno enquanto vivo, guardião da liberdade, da democracia e da soberania? Certamente que sim. Embora não haja cheiro de pólvora no ar, quem sabe tenhamos ainda muitos caminhos a rasgar, correntes a enfrentar.

            Mas eu não tenho nenhuma dúvida de que o momento atual é o da defesa da ética e do combate à impunidade na realidade deste País. Quem sabe, no mesmo patamar da defesa da liberdade, da defesa da democracia e da soberania de outros momentos que nós vivemos ainda pouco tempo atrás.

            A não ser, repito, alguns sinais de risco à soberania, não vejo, no campo da minha visão, inimigos evidentes à nossa liberdade e à nossa democracia. Nem vejo entrincheirados, assim acredito.

            Mas, na questão ética, sim. Há inimigos visíveis e principalmente entrincheirados. A ética, normalmente, morre torturada nos bastidores. Repito: a ética, normalmente, morre torturada nos bastidores.

            A falta de ética e a impunidade são os grandes males desse momento em nosso País. E ouso dizer que não só na política. Acho, entretanto, que o grande espelho onde se refletem os demais campos, é a falta de ética na política.

            Os arranhões éticos, maiores ou menores, surgem quando a população perde a confiança nas suas instituições políticas e institucionais. Daí a sonegação; daí a pirataria; daí o jeitinho brasileiro nem sempre legal, nem sempre moral, como a ocupação de espaços reservados a deficientes, o desrespeito a filas, o pagamento de propinas, ainda que de pequeno valor, para levar vantagem sobre os semelhantes, e assim por diante. É a Lei de Gerson: levar vantagem em tudo.

            Se a política é o espelho na questão da ética, eu não vejo outro caminho que não uma mudança profunda no conteúdo e na forma de fazer política. Restaurar a legitimidade das nossas instituições. Mas é evidente este nosso momento, neste nosso momento que espero também seja passageiro, absolutamente e necessariamente, deve ser mudado. Mesmo o que está sendo protegido, mesmo o que esteja protegido pelo manto da lei, porque se coloca em xeque também o modo de fazer o nosso aparato legal. É legal? Como? Por quê?

            É ético, por exemplo, as instituições financeiras obterem o maior lucro da nossa história, em um país com tamanha carga tributária, que afoga inúmeros pequenos e médios empreendimentos, e com tantos semelhantes ainda abaixo da linha da pobreza, sem terem, nem mesmo, o que comer? Eu pergunto: é ético as nossas instituições obterem o maior lucro da nossa história?

            É ético também, ainda se referindo, e comparando, com milhões de caminhantes, caminhantes dos corredores da morte pela fome, festas como a noticiada na coluna sintomaticamente chamada “Gente Boa”, do jornal O Globo, do dia 3 de maio último?

            Para convivas ilustres? Sim!

            Para comemorar o aniversário de alguns de seus notáveis? Não!

            Para “celebrar o casamento entre dois cachorros... numa passarela de dez metros, decorada com motivos caninos. Bruna e Luy, os totós, vão se casar de vestido branco e fraque”.

            Seus donos gastaram uma fortuna para a festa. Serão 800 convidados na tal “celebração”, ainda que com uma ponta de ironia, divulgada pelo colunista, que consumirão o equivalente, nos custos a mais de dez toneladas de arroz, o mesmo arroz que poderia saciar a fome de tantos brasileiros, que nem sabem se chegarão vivos até o momento da grande “celebração” no próximo dia 15.

            Detalhe: o “casamento” dos dois “totós”, ainda segundo a notícia, será realizado aos pés “do altar com a imagem de São Francisco de Assis”. Pobre São Francisco! Que ética é essa? Quem sabe um acinte, um deboche à própria ética.

            O primeiro caso, o dos lucros financeiros, é decorrência direta de políticas geradas no setor público, nas decisões de política de governo. O segundo, o do casamento dos dois “totós”, poderia ser considerado um reflexo do primeiro. A sociedade, em estado de anomia social, faz as suas próprias “leis”, ainda que deturpando costumes antes considerados éticos e morais.

            Eu ouso dizer, também, que os maiores desvios de conduta, hoje, são legalizados. Repito: os maiores desvios de conduta hoje são legalizados. As privatizações, por exemplo, ontem e hoje - no Governo de ontem e no Governo de hoje -, são cantadas, em prosa e verso, como procedimentos legais dentro da legislação vigente. E é verdade. Mas, os desvios se deram na condução do processo, e a lei propiciou todas as lacunas para que, depois, se praticasse o desvio ético e se construísse, ato contínuo, o discurso da retidão.

            Os desvios da privatização aconteceram, por exemplo, na avaliação dos ativos, porque o método legal deu margem para a construção de cenários. Método e cenários que permitem o subjetivismo na identificação de indicadores. Que superestimam custos. Que subestimam as receitas e que diminuem, como decorrência, os preços mínimos. Deram-se, também, na montagem dos modelos de privatização, muitas vezes já direcionados para compradores anteriormente identificados, anteriormente privilegiados, e assim por diante.

            Dentro desse contexto, as privatizações foram legais?

            Difícil dizer que não, embora quase impossível dizer que transcorreram nos limites da ética. “Nos limites da irresponsabilidade”, não preciso dizer eu. Quem fez essa afirmação foi um dos atores mais privilegiados, um dos Ministros da privatização, pois, apesar das gravações, ele, Ministro, e todos os demais participantes daquele processo foram inocentados. Mas quem, até hoje, se considerados todos os altos escalões do Governo, foi condenado por desvios de recursos? Quem devolveu, até hoje, algum recurso público desviado para contas particulares? Poucos, para ser otimista. Quantos não sei.

            O Governador de Brasília foi detido por dois meses, na verdade, por tentar obstruir os trabalhos da Justiça. Não sei se devolveu; duvido que vá devolver.

            É triste observar que o dinheiro público desviado é utilizado para comprar os melhores advogados, para que o corrupto não seja preso e para que o mesmo dinheiro não seja devolvido.

            Não nego que a ilegalidade tem de ser investigada. Ao contrário. Mas o que não podemos deixar de lado, também, neste nosso momento político, é como as leis são formuladas, votadas e colocadas em vigor. A que preço? Com que interesses? A fachada legal pode não significar, por princípio, nem ética nem moralidade.

            Nos últimos tempos, ou momentos que temos vivido, o preço da lei tem sido o custo da campanha, mais os “lucros” do mensaleiro. Eu repito: nos últimos tempos, o preço da lei tem sido o custo da campanha mais os “lucros” do mensaleiro. Não têm sido analisados, ou investigados, como devido, os interesses que estão embutidos nos financiamentos de campanha.

            Não se trata, evidentemente, de “almoços de graça”. Os financiamentos de campanha, na verdade, são hoje algo como que investimentos, quase sempre de altíssimo retorno aos “investidores”. Quase sem riscos, eu diria. Esse mesmo retorno volta na forma de obras públicas superfaturadas, ou nas decisões de governo.

            Pior: esse “investimento” travestido de financiamento de campanha eleitoral não é feito com recursos próprios. Ele vem com o superfaturamento das obras públicas, inseridas nos orçamentos, ou do resultado financeiro da inclusão de interesses específicos, ora nos projetos de lei, ora nas emendas parlamentares.

            Não estou aqui me referindo ao financiamento do chamado caixa dois. Na época do mensalão, muita gente disse: “Não, não é corrupção; é caixa dois, que todo mundo usa”, que é o dinheiro paralelo, não contabilizado. Estou falando do financiamento legal, ainda assim, muitas vezes, não moral. É preciso que se avalie a possível correlação entre o eleito, o financiador de sua campanha e os projetos de lei ou emendas que ele apresentará depois da posse, quais são os verdadeiros interesses que estão embutidos nas “nobres” propostas.

            Hoje, quando um projeto é apresentado, ele segue, antes dos respectivos plenários, para as comissões temáticas e para a Comissão de Constituição e Justiça. Em outras palavras, ele é analisado segundo a sua constitucionalidade e a sua juridicidade, a técnica legislativa e a sua importância intrínseca. A sua importância vertical enquanto proposta para um segmento e horizontal no conjunto de todos os demais. O que não se avalia é a sua consistência ética: como surgiu a ideia, se atende a interesses individuais ou de grupos específicos, ou de conjuntos da coletividade, se há outros interesses, ainda que escusos, na decisão de propor tal mudança e assim por diante. Por exemplo, não seria o caso de avaliarmos quais são e serão as verdadeiras intenções embutidas em projetos e emendas relativas ao pré-sal, em discussão neste momento no Congresso Nacional?

            Como e por intermédio de quem agem as empresas as empresas interessadas no petróleo brasileiro? Como apareceu uma emenda, aceita na última hora, contrária aos interesses do povo brasileiro? Muitas vezes os interesses individuais ou de grupos são mais do que evidentes; outras vezes, nem tanto. Seria o caso de criarmos uma comissão permanente de ética exclusivamente para avaliar os aspectos da moralidade em cada proposta legislativa? A realidade diz que sim; a experiência diz que sem outras mudanças não, não adianta.

            Não nego que seria - quem sabe? - uma desmoralização ainda maior do processo legislativo propor que uma comissão de “éticos” analisasse propostas de parlamentares porque, em princípio, seriam consideradas suspeitas. Mas as respectivas Casas já têm as suas comissões de ética e, como se sabe, e principalmente pelas experiências recentes, nem sempre a ética move a própria discussão da existência ou não dos princípios éticos. A ética também nas comissões de ética dependem de interesses nem sempre éticos.

            Como seria então possível a uma comissão de ética analisar propostas legislativas? Obviamente, para ser isenta, teria que ser composta por pessoas que não integrassem as respectivas Casas legislativas. Mas quem escolheria ou quem elegeria esses mesmos integrantes? Qual o método de escolha? A quem recorrer? Tempos atrás, se diria, “só se for ao Papa”. O Sumo Pontífice sempre foi considerado, até mesmo pelo dogma da infalibilidade, um dos últimos guardiões da seriedade. Mas, pelo que se vê nos jornais neste momento, tem sido colocada em xeque até mesmo a realidade do que diz o Papa.

            Que diferença havia ou haveria entre os “eleitos” para fazer leis, e os escolhidos, ou também eleitos, encarregados de analisar os seus princípios éticos? A escolha, neste caso, seria isenta? O que nos garantiria essa isenção? Quem sabe? Porque o voto, hoje, é visto como uma busca de solução de cada problema individual, e não da coletividade. O que jamais pode ser esquecido é que a ética deve, ou deveria ser, um atributo pétreo para quem escolhe o caminho da vida pública. A política, se escolher uma rima, tem que ser com sacerdócio, não com negócio. Repito: a política, se escolher uma rima, tem que ser com sacerdócio, e não com negócio.

            É evidente que essa comissão permanente de ética para avaliar propostas legislativa é, apenas, de uma ideia, teórica, porque se cada proposição já viesse envolvida com suspeita ética, aí, sim, os legisladores estariam abaixo do rodapé da legitimidade da confiança popular. E a falta de princípios éticos não pode ser generalizada.

            Mas não se pode negar que as mudanças necessárias para a moralização da atividade legislativa, tão reclamada, não virão de dentro para fora. A atuação das atuais Comissões de Ética é o exemplo mais fiel de que nada se pode esperar enquanto as investigações forem apenas “intestinas”, internas.

            Aí também se enquadram todas as mudanças na chamada “reforma política”. Como diria o mestre Lampedusa, se ele analisasse o nosso momento político e acreditasse no discurso da “reforma política”: “Tudo muda para que tudo permaneça como está”.

            Essa minha ideia serve - quem sabe? - para ilustrar a necessidade de uma constituinte exclusiva para analisar e propor a tão desejada reforma política. Continuo colocando em xeque os critérios da escolha dos seus integrantes. Como garantir a necessária isenção? Eles seriam escolhidos pelos mesmos critérios, e com os mesmos vícios, das eleições atuais? De nada adiantaria, pois!

            Talvez tenhamos, infelizmente, que imaginar uma verdadeira reforma que inclua critérios de atuação moral possível apenas ao longo do prazo, não que o Brasil não tenha indicações suficientemente éticas para elaborar uma carta de princípios moldada pela moralidade. Aliás, poderiam ser milhões os possíveis integrantes da tal Assembleia, no conjunto da própria sociedade. É preciso, porém, quebrar o vício que ora elege parlamentares sobre quem pairam dúvidas de natureza ética, ora aqueles que não são imunes às luzes foscas do poder.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Permite-me, Senador Pedro Simon?

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Pois não.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Quero brevemente, dada a preocupação que V. Exª apresenta sobre a ética na política, os procedimentos, tendo em conta, sobretudo, a atenção que V. Exª tem tido para com o projeto de lei de iniciativa popular de mais de 1,6 milhão assinaturas sobre a ficha limpa e a atenção com que V. Exª tem acompanhado a votação na Câmara, gostaria, tendo em conta a presença do Senador Renan Calheiros, de fazer uma sugestão aberta, que, aliás já tenho feito: acho que seria próprio que o Senador Demóstenes Torres o indicasse Relator desse projeto. V. Exª já me disse que poderia ser o Senador Antonio Carlos Valadares, mas reitero que acho que V. Exª seria a pessoa mais bem preparada para fazer a apreciação desse projeto que V. Exª acompanha com tanta atenção. Ainda há poucos dias, fui testemunha de que a Comissão de Justiça e Paz da OAB e todas as entidades interessadas nesse projeto têm procurado V. Exª, assim como muitos de nós Senadores. Mas eu queria aqui fazer um apelo a todos nós Senadores para que, uma vez apreciada e votada, pois vai se completar na próxima semana a votação deste projeto, possamos todos realizar um esforço para que votemos com rapidez na Comissão de Constituição e Justiça e no plenário do Senado. Então, esse é o registro que gostaria de fazer relacionado ao tema de seu pronunciamento. Muito obrigado.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu agradeço a V. Exª o aparte e, logo ao final da minha parte expositiva, eu voltarei a este assunto, porque, também, para honra minha, chegou ao plenário o Senador Renan e gostaria de dialogar com S. Exª exatamente sobre esse assunto, não sobre a relatoria, mas sobre a votação. Fique tranquilo. Com relação à relatoria, já sei que nem do lado de lá nem do lado de cá existe interesse nesse sentido.

            Insisto na Assembleia exclusiva para a reforma política. Mas insisto também que os eleitos para a mesma Assembleia ou para o próprio Parlamento ou ainda para todos os cargos eletivos tenham ficha limpa. Ou como se dizia num outro momento do passado: tenham o nome limpo na praça. E, mesmo assim, se não forem imunes às tais luzes do poder, que se submetam, depois de eleitos, a comissões de ética realmente preocupadas com a moralidade pública.

            Mas como imaginar fichas limpas, se até a decisão de colocar em votação uma proposta que contém a assinatura de mais de 1,6 milhão de eleitores depende de quem não necessariamente quer a mudança? Daí a necessidade da continuidade da pressão popular. De fora para dentro. Eu não diria de baixo para cima, porque eu não posso atribuir, no caso, hierarquia. Todos estão no mesmo patamar de importância: o eleito e o eleitor.

            É preciso que todos os agentes públicos, além dos Parlamentares, tenham seus sigilos bancários realmente abertos e disponíveis. A organização política não pode se dirigir ao Congresso com espírito de investidor. Não negociar questões que são, por princípio, um direito. Não há retornos, mas direitos. É a sociedade moralizadora que tem de contaminar o Estado corrupto, e não o contrário. A sociedade tem de exercer o sagrado direito de cobrar, até mesmo para coibir interesses individuais que investem nos candidatos, ainda que travestidos de financiadores de campanhas ou de mantenedores de mensalões.

            Não é à toa que vozes poderosas são contrárias ao financiamento público das campanhas. Confundem o grande público, alardeando que seria mais um gasto público desnecessário, que iria, ainda mais, sangrar os cofres, já vazios, para a saúde, a educação e a infraestrutura. São os discípulos das lições de Lampedusa: pregam a mudança desde que tudo permaneça como está.

            Eu não tenho dúvida de que o financiamento público de campanha seria muito menos dispendioso para a população do que o modelo atual. Repito: é falácia a história de dinheiro particular no financiamento de campanhas. É mentira. Pelo menos, na sua maior proporção. O financiamento de campanha vem, em grande proporção, do superfaturamento de obras públicas. Dinheiro público, portanto. Só que mais caro! O mesmo dinheiro que falta na saúde, na educação, na infraestrutura, no combate à fome, à miséria, à violência, como alegam os que atacam a mudança do atual modelo de financiamento. O financiamento público não seria apenas menos dispendioso. Ele democratizaria o processo eletivo.

            O modelo atual tornou as eleições quase impeditivas para quem tem poucos recursos. Está lá o Líder, o Secretário-Geral do PT nacional dizendo que não é mais candidato, que não tem condições de fazer campanha nos métodos atuais, não tem como arregimentar a necessidade dos milhões para fazer campanha, porque ele não tem esse estilo e, por isso, está deixando a campanha política.

            Repito: o financiamento público não seria apenas menos dispendioso, democratizaria o processo seletivo. Como eu disse, o modelo atual tornou as eleições quase impeditivas para quem tem poucos recursos. Elege-se, muitas vezes, quem tem muito dinheiro, ou que tem as portas abertas para se submeter ao esquema de investimento dos financiadores de campanha, que são, na verdade, repassadores de recursos públicos. Melhor seria se todos tivessem condições semelhantes de eleição. Eleger-se-iam os candidatos mais representativos da sociedade. Os de melhores ideias e não os de melhores bolsos. Ou, pior ainda, os que buscam a imunidade para ritmar com impunidade. As eleições seriam, portanto, a construção de um novo espelho, refletiriam com melhor precisão os anseios da população. O Parlamento como refletor e reflexo da sociedade.

            Se esse é o meu momento, como diria, de novo, o poeta, que eu passe o mais breve possível, porque eu desejo - tenho certeza de que eu e outros quase 200 milhões de brasileiros - é que se restaure imediatamente a lisura no trato da coisa pública, como condição e como princípio para quem decide pela vida política.

            A realidade teima em nos sufocar no pessimismo, mas a esperança sempre nos socorre com o oxigênio do otimismo.

            Nesse momento, tenta-se folclorizar quem defende a ética na política, um jurássico, um pajem medieval. Não importa, nós todos somos o momento. O poeta nos inspira dizer que é loucura mais que saudável essa de sermos nós mesmos. O que importa é que passemos um país melhor para os que virão depois de nós, ou que se já vieram, porque há uma realidade que indica a premência da mudança. Que se mude então e, assim, como dizia o poeta, passaremos!

            Eu aproveito a presença do meu Líder para dialogar com S. Exª, se me permitir. Quero dizer que estou vivendo um momento muito feliz, Senador, com a atuação da Câmara dos Deputados. Eu não tinha nenhuma esperança nesse projeto de iniciativa popular, com 1,5 milhão de assinaturas, na Câmara dos Deputados, mas estou sendo surpreendido agradavelmente.

            Primeiro, com o comportamento do Presidente da Câmara e ilustre Presidente do nosso Partido, Michel Temer, que se comprometeu com as forças que compõem a luta pela aprovação desse projeto. Segundo, todos têm se comportado com a maior elegância e com o maior esforço. Terceiro, com os líderes. S. Exª tem se reunido com os líderes, tem debatido, tem analisado e tem levado a matéria ao final. Ontem, o projeto quase foi votado. O substitutivo do ilustre Secretário-Geral do PT já foi aprovado. Muitas das emendas que deformavam o projeto foram excluídas ontem. Está num caminho que leva a crer que, até a próxima terça-feira, o projeto será aprovado. Não é o ideal. Eu falo para V. Exª que, entre este projeto e o que eu defendo, há uma diferença muito grande, mas eu reconheço que já é o início. Nós podemos dizer que o projeto que a Câmara está em vésperas de aprovar e que, ao que tudo indica, aprovará na próxima terça-feira, já é um início.

            É algo realmente positivo que mostra que nós estamos no caminho para terminar com a chamada impunidade, esse absurdo. Se nós formos analisar, no fundo, no fundo, o Judiciário é mais responsável do que nós porque ele não funciona. Durante muito e muito tempo, a culpa era nossa porque, se havia um processo contra um Deputado ou contra um Senador, o Procurador dava entrada na Mesa da Câmara ou do Senado, a Mesa guardava-o na gaveta e não o colocava para ser votado em plenário, e o Congresso não dava licença. Logo, não poderia acontecer nada. Então, a culpa era do Congresso. Mas isso já mudou. O Congresso já mudou. O Procurador-Geral da República não precisa de licença do Senado para processar um Senador, e o Procurador-Geral da República não precisa da licença da Câmara para processar um Deputado. Então, a coisa não anda porque não anda.

            Esse projeto da Câmara é o início. É altamente positivo. E é um movimento...

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Se ele for aprovado - e parece que será aprovado -, que ele passe no Senado com rapidez, urgência urgentíssima e sem emenda. Não é o que a gente quer. Eu, pelo menos, sou obrigado... Vim para esta tribuna para dizer que não é o que imagino, mas é o possível, porque sabe V. Exª muito melhor do que eu que ele tem de ser aprovado até o dia 5; ele tem de ser lei até o dia 5, para que possa ser usado na próxima eleição.

            Falando desta tribuna, ainda antes da decisão da Câmara, o Senador Arthur Virgílio, do PSDB, disse que procuraria V. Exª, no sentido de que os líderes chegassem a este acordo, de votar o projeto na terça-feira e vir a esta Casa. E nós, com urgência urgentíssima, sem emenda, vamos assumir essa responsabilidade. Quer dizer, a Câmara votou porque nós apresentamos emendas. Nós discutimos. Voltar para a Câmara é o mesmo que dizer que não queremos o projeto. Então, vamos votá-lo como vier. É um avanço. Não é o ideal, mas é positivo. Foi aprovado por 350 contra 45. Foi uma votação espetacular. Então, há uma expectativa nesse sentido. As lideranças irão procurar, ou já devem ter procurado, V. Exª.

            O apelo que faço a V. Exª, tenho certeza...

            O SR. PRESIDENTE (José Nery. PSOL - PA) - Senador Pedro Simon, quero cumprimentá-lo pelo brilhante pronunciamento e dizer a V. Exª que, quanto a esse tema que o senhor trata neste momento, dialogando com o Senador Renan Calheiros, tratei, nesta tarde, desse assunto com o Senador Presidente José Sarney. Ele me disse do esforço que fará imediatamente para que, com a chegada do projeto ao Senado, tenhamos aqui um rito quase que sumário na apreciação e votação da matéria. Eu creio que é uma matéria que contará com V. Exª, que está solicitando a participação e o apoio de todos os líderes partidários para a aprovação do projeto Ficha Limpa.

            Quero também consultar V. Exª se poderia presidir a sessão a partir deste momento, em razão de compromissos inadiáveis, e para que os demais oradores, dentre os quais o Senador Renan Calheiros, possam usar da palavra.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu posso encerrar?

            O SR. PRESIDENTE (José Nery. PSOL - PA) - V. Exª pode concluir.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Posso concluir.

            Então, veja V. Exª, Senador Renan...

            O Sr. Renan Calheiros (PMDB - AL) - Senador Pedro...

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já lhe darei, com o maior prazer.

            O próprio Presidente está dizendo que o Presidente Sarney já concordou. Então, a figura chave é a de V. Exª. No momento em que o Presidente Sarney já concordou, no momento em que o líder do maior partido já concordou, se V. Exª concordar, a grande manchete de amanhã, com a palavra de V. Exª, é que a Câmara volte a votar. No que depender do Senado, votam terça lá, quarta-feira votamos aqui e o Presidente pode sancionar.

            O Sr. Renan Calheiros (PMDB - AL) - Não, Senador Pedro Simon, eu entendo que não só o PMDB, mas todos os partidos concordarão. E os líderes partidários expressam as vontades das suas bancadas. Então, o PMDB já tomou iniciativas...

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É verdade.

            O Sr. Renan Calheiros (PMDB - AL) - ...no Senado Federal com relação a essa matéria.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - E tem razão V. Exª. O projeto já foi votado aqui e está lá na Câmara. É verdade.

            O Sr. Renan Calheiros (PMDB - AL) - O projeto já foi votado aqui, iniciativa do PMDB.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É verdade.

            O Sr. Renan Calheiros (PMDB - AL) - E é assim, o PMDB se compromete com este rito que agora V. Exª defende: tão logo votemos na Câmara, nós precisamos votar, sim, também aqui, no Senado Federal. Conte comigo!

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço, emocionado, o aparte de V. Exª. Acho que estamos vivendo um momento muito importante. No momento em que V. Exª diz que o Presidente Sarney já concordou; no momento em que o líder do maior do partido e o Líder da Maioria concordam; no momento em que a oposição diz que concorda, hoje é um momento importante. Quer dizer, tudo leva a crer que, na terça-feira, vota a Câmara. A única coisa que pode acontecer... Muitas vezes, os Deputados mexem comigo, Senador, quando eu digo: “Nós, do Senado, já votamos verba pública para campanha, voto distrital e uma série de projetos e está tudo parado na gaveta”. Eles dizem para mim o seguinte: “É que vocês confiam no patriotismo da Câmara. Vocês sabem que fica na nossa gaveta”. (Risos.)

            Isso, pelo menos, eles vão ficar sabendo que, se eles votarem lá, não vai ficar na nossa gaveta. Aqui, vai ser aprovado.

            Acho que esta é uma hora muito importante. É um momento muito, muito, muito significativo este, em que nós, com a palavra do Senador Renan, com a palavra do Presidente Sarney e com a palavra do Líder Arthur Virgílio, podemos dizer: no Senado, se for aprovado na Câmara na terça, na quarta-feira nós aprovamos.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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