Pronunciamento de José Nery em 12/05/2010
Discurso durante a 71ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Homenagem ao pensador, escritor, diplomata, político e abolicionista pernambucano Joaquim Nabuco, em reverência ao centenário de sua morte.
- Autor
- José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
- Nome completo: José Nery Azevedo
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.
POLITICA SOCIAL.:
- Homenagem ao pensador, escritor, diplomata, político e abolicionista pernambucano Joaquim Nabuco, em reverência ao centenário de sua morte.
- Publicação
- Publicação no DSF de 13/05/2010 - Página 20249
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.
- Indexação
-
- SAUDAÇÃO, PRESENÇA, SENADO, DESCENDENTE, VULTO HISTORICO, DEPUTADO FEDERAL, MINISTRO DE ESTADO, SECRETARIA ESPECIAL, PROMOÇÃO, IGUALDADE, RAÇA, SESSÃO, HOMENAGEM, CENTENARIO, MORTE, JOAQUIM NABUCO (PE), EX-DEPUTADO, DIPLOMATA, ELOGIO, LUTA, ABOLIÇÃO, ESCRAVATURA, NECESSIDADE, CONCLUSÃO, TRABALHO, ERRADICAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, MELHORIA, ACESSO, SANEAMENTO BASICO, SAUDE, LAZER, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, INCENTIVO, EMPREGO, ATENÇÃO, JUVENTUDE, NEGRO.
- MANIFESTAÇÃO, FRUSTRAÇÃO, PARALISAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ESTABELECIMENTO, CONFISCO, AREA, COMPROVAÇÃO, TRABALHO ESCRAVO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, GARANTIA, EXTINÇÃO, ESCRAVATURA.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa; senhores convidados; Srªs e Srs. Senadores, quero saudar os bisnetos do homenageado, Joaquim Nabuco, o Sr. Pedro Nabuco e a Srª Isabel Nabuco; saudar a Câmara dos Deputados, na pessoa da Deputada Emília Fernandes, e o Exmº Sr. Ministro da Igualdade Racial, que nos honra com sua presença.
Começo perguntando, Sr. Presidente, o que diria Joaquim Nabuco, mais de cem anos depois da abolição da escravidão negra no Brasil, se visse, hoje, milhares de trabalhadores submetidos a maus-tratos, sem alimentação e acomodação dignas, presos em fazendas distantes ou nos canaviais por este imenso País.
A luta abolicionista, que Nabuco abraçou mesmo sendo filho de escravocratas, não acabou. O trabalho escravo ainda existe no Brasil. Não da mesma forma que a escravidão negra, não nos mesmos moldes econômicos da escravidão negra, mas é uma triste realidade no Brasil de hoje. E o trabalho escravo ainda existe porque, como o próprio Nabuco previu, não adiantou abolir a escravidão por si só, a obra da escravidão deveria ter sido destruída. Isso, Srªs e Srs. Senadores, infelizmente, não aconteceu.
Qual a obra da escravidão, então? É a desigualdade social, nunca solucionada em nosso País. Nenhum mecanismo até hoje foi capaz de diminuí-la ao ponto de evitar que trabalhadores e trabalhadoras que vivem na mais profunda miséria, nos mais pobres Municípios brasileiros, fossem levados a locais isolados, longe de suas famílias, e, ao chegar, se submetessem a humilhações, violência, prisão, dor, medo. Enfim, sofrimento.
E por que eles vão para esses locais? Porque não tiveram acesso a escola de qualidade, porque não há incentivo para a geração de emprego e renda para garantir a todos o direito sagrado ao trabalho, porque não foi feita a verdadeira reforma agrária.
Além de o trabalho escravo contemporâneo persistir, o fim da escravidão negra não acabou com a discriminação racial. Com a abolição, o processo de exclusão dos negros no Brasil só se acentuou. Ao longo de décadas, essa dívida social refletiu no número de jovens negros que não chegam às universidades, que não conseguem crescer profissionalmente por precisarem parar de estudar para sustentar a família, ou simplesmente pelo fato inadmissível de que algumas empresas preferem empregar funcionários brancos.
Refletiu também, infelizmente, na outra parte desses jovens, que, por serem muito pobres, morarem em habitações sem esgoto, saúde, educação, lazer e não vivenciarem uma sadia convivência familiar, entram na marginalidade e lotam presídios e delegacias.
E o que nos entristece neste momento, diante da homenagem que o Senado Federal presta à memória de um homem que tanto sonhou que o Brasil mudasse, é saber que, em nosso País, há setores conservadores, lideranças nacionais que não aceitam as políticas públicas direcionadas para os negros. É claro que todas essas políticas devem ser debatidas amplamente com a sociedade; porém, elas devem existir.
Mesmo hoje, com o racismo considerado crime inafiançável em nosso Código Penal, essa dívida precisa ser paga para com os descendentes daqueles que foram retirados à força dos seus países de origem, vieram para o Brasil e, mesmo com o sofrimento e a violência que passaram, contribuíram para a nossa cultura, para a nossa formação populacional, para o muito que somos hoje.
Temos, graças ao comprometimento da sociedade civil, vários “joaquins nabucos” na atualidade. Uma parcela significativa de parlamentares, de entidades da sociedade civil, de órgãos públicos, de intelectuais que abraçaram a causa da erradicação do trabalho escravo contemporâneo no Brasil.
Tenho certeza de que esta justa homenagem a Joaquim Nabuco, o grande pensador que se destacou no jornalismo, na poesia, na carreira diplomática e na política no seu tempo, torna-se muito maior.
Para todos nós, com certeza, Joaquim Nabuco sentiria alegria - como aqueles que sentem alegria e que lutam pela justiça e liberdade em nosso País - ao ver aprovada na Câmara dos Deputados, em segundo turno, a PEC nº 438/01, que prevê o confisco de áreas urbanas e rurais onde a prática criminosa de trabalho escravo for comprovada. É triste ressaltar, mais uma vez, que há seis anos essa PEC se encontra para votação na Câmara dos Deputados.
A forma contemporânea, atual, que se junta a esta homenagem que o Senado presta à memória, à história, à trajetória de Joaquim Nabuco, é somarmos todos os esforços para aprovar, também no Senado Federal, medidas legislativas que coíbam a prática da escravidão contemporânea, mas é neste momento a prioridade que deveria ser conferida pela Câmara dos Deputados à votação de uma emenda constitucional que vai contribuir decisivamente para a erradicação do trabalho escravo no Brasil.
Portanto, eu diria que o momento é de homenagens, mas também o momento é de luta. E, por acreditar que o Brasil pode ficar livre do trabalho escravo contemporâneo, que o Brasil pode ficar livre de todas as injustiças que fazem com que boa parte de nossa população não tenha ainda assegurados seus direitos básicos fundamentais, eu diria que a luta que possamos fazer nessa direção é uma forma concreta de continuar homenageando a luta, o trabalho e a história de Joaquim Nabuco.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quando verificamos o descaso para com a emenda constitucional que trata da erradicação do trabalho escravo, especialmente da sua punição exemplar, quando verificamos como é tratada aqui, no Congresso Nacional, especialmente na Câmara, e conhecendo a visão, a história, a luta de Joaquim Nabuco, acredito, sim, que ele sabia que a causa abolicionista não findaria com a Lei Áurea. Nabuco deixou o desafio para todos nós, até que consigamos mudar essa realidade.
Portanto, creio que, ao comemorarmos amanhã, 13 de maio, 122 anos da abolição oficial da escravidão, precisamos renovar o nosso compromisso para lutar contra as formas contemporâneas de trabalho escravo.
Nesse sentido, aprovar a PEC nº 438 na Câmara dos Deputados significa uma segunda abolição. Estamos, Sr. Presidente, recolhendo assinaturas em todo o País, pedindo apoio para a aprovação dessa PEC na Câmara dos Deputados. Pretendemos entregar esse abaixo-assinado no próximo dia 26. E é fundamental que possamos, nesses próximos dias, avançar na coleta de assinaturas para que o Brasil possa expressar, de forma muito clara, o seu apoio à aprovação da PEC nº 438.
Nesta homenagem, Sr. Presidente, à qual o PSOL se soma e em que manifesto a nossa satisfação de aqui estarmos participando, celebrando e reverenciando a memória do pensador, escritor e político Joaquim Nabuco, cuja trajetória foi tão bem relatada pelos meus pares, quero dizer que a luta por liberdade, a luta por justiça e a luta contra a escravidão contemporânea continua. Se essa foi a luta de Joaquim Nabuco, essa é uma luta de todos os brasileiros e brasileiras que querem construir um novo País.
Muito obrigado.
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