Discurso durante a 84ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Histórico da trajetória política de S.Exa. Anúncio do rompimento com o Governador do Mato Grosso do Sul, André Pucinelli, por parcialidade na escolha dos candidatos do PMDB ao Senado Federal, no pleito de 2010.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Histórico da trajetória política de S.Exa. Anúncio do rompimento com o Governador do Mato Grosso do Sul, André Pucinelli, por parcialidade na escolha dos candidatos do PMDB ao Senado Federal, no pleito de 2010.
Aparteantes
Jarbas Vasconcelos.
Publicação
Publicação no DSF de 27/05/2010 - Página 24282
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • BALANÇO, VIDA PUBLICA, ORADOR, INICIO, ATIVIDADE POLITICA, PARTIDO POLITICO, MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (MDB), PARTICIPAÇÃO, LUTA, MOBILIZAÇÃO, REDEMOCRATIZAÇÃO, EXERCICIO, MANDATO, CAMARA DOS DEPUTADOS, DIREÇÃO, DIRETORIO REGIONAL, ATUAÇÃO, TESOUREIRO, SECRETARIO, PRESIDENTE, LIDER, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), IMPORTANCIA, COLABORAÇÃO, SOLUÇÃO, CRISE, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), APOIO, CARREIRA, POLITICO, RESPEITO, FIDELIDADE PARTIDARIA.
  • ANUNCIO, ROMPIMENTO, NATUREZA POLITICA, GOVERNADOR, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), MOTIVO, FALTA, IMPARCIALIDADE, ESCOLHA, CANDIDATO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), DISPUTA, ELEIÇÕES, SENADO, REGISTRO, DESRESPEITO, ORADOR, CRITICA, EXISTENCIA, INTERESSE, BENEFICIO PESSOAL, AGRADECIMENTO, APOIO, BANCADA, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acabo de comunicar ao Líder do PMDB nesta Casa o meu rompimento político com o Governador do meu Estado, André Puccinelli.

            Na verdade, estou fazendo uma opção pela dignidade de uma história que ajudei a escrever ao longo de décadas de militância política.

            Tudo começou, Sr. Presidente, na segunda metade dos anos 60. Nessa ocasião, eu assinei a primeira filiação partidária da minha vida, no antigo MDB. Na época, eu tinha a clara convicção de que não subscrevia apenas um livro de adesão a uma agremiação partidária. Naquele momento, os antigos partidos políticos acabavam de sucumbir por um ato de força do regime militar naquela ocasião instaurado. Inscrevia-me, na verdade, numa embrionária frente que resistia à ditadura, que mostrava sua força e seus tentáculos.

            Ajudei a escrever outra página dessa mesma história quando um espasmo da ditadura tentou confiscar a identidade daquele que simbolizou toda essa resistência democrática. Para não perder sua épica história, o MDB crismou a legenda acrescentando-lhe a letra “P". Assim foi que esse Partido ganhou sobrevida, alcunhado de PMDB, Senador Tuma.

            Isso aconteceu no final dos anos 70, quando a elite militar já antevia o fim do regime e articulava uma espécie de armistício com as forças democráticas. Na época, o Partido fragmentou-se, dando origem a diversas outras agremiações.

            Entendi que deveria seguir as pegadas do Dr. Ulysses Guimarães e, por isso, permaneci no PMDB. A minha trajetória no Partido começou como simples militante que tinha a tarefa de ajudar a mobilizá-lo numa época em que isso era um verdadeiro desafio. Quem viveu aqueles momentos, especialmente lá no interior do Brasil, sabe o quanto era difícil mobilizá-lo e organizá-lo.

            Nunca fui processado pelo regime militar, mas a minha militância no antigo MDB valeu-me três arbitrárias e injustas prisões.

            Além dos perigos da repressão, era preciso superar um grande preconceito fomentado pela verdadeira lavagem cerebral que a ditadura promovia no rádio e na televisão.

            Lembro-me de um jargão que sintetizava claramente toda aquela intolerância com a oposição, com aqueles que rejeitavam o regime: “Brasil - ame-o ou deixe-o!” Para os detentores do poder, amava-o quem se submetia, quem se resignava aos ditames do regime autoritário. Os que se opunham ao regime não amavam a Pátria e, portanto, deveriam abandoná-la.

            Imaginem os senhores como essa propaganda repercutia na cabeça das pessoas mais simples do interior do Brasil - do Mato Grosso do Sul, do Mato Grosso, de Rondônia.

            No entanto, esse desafio que enfrentávamos no interior era compensado com uma forte retaguarda das lideranças nacionais do MDB. Quantas vezes estive engajado em mobilizações para receber, em meu Estado, a figura épica de Ulysses Guimarães, dos Senadores Paulo Brossard, Marcos Freire, Mário Covas, Franco Montoro, o combativo Pedro Simon e tantos outros! Em quantas reuniões pudemos contar com jovens Deputados de então, como Odacir Klein, Adhemar Santillo, João Gilberto, Alceu Collares!

            A verdade é que o antigo MDB unia cúpula e base num só projeto nacional, e seus parlamentares eram verdadeiros apóstolos que pregavam democracia por todos os cantos do País. Muitos daqueles que conheci quando eu era ainda muito jovem e um simples militante do Partido acabaram se tornando meus colegas de Congresso a partir de 1979, quando cheguei à Câmara dos Deputados pela primeira vez.

            Foi no início dos anos sessenta que passei a compor a estrutura organizacional do velho MDB de guerra. De lá para cá passei a exercer os mais variados cargos na sua direção estadual e nacional também. Dos diretórios do MDB ao PMDB de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul fui tesoureiro, secretário, presidente regional, presidente estadual e líder não só na Assembleia de Mato Grosso como mais tarde na Assembleia de Mato Grosso do Sul.

            No Colégio Eleitoral que elegeu Tancredo Neves Presidente da República e implodiu o regime militar, eu estava lá, representando a Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul por indicação do PMDB. Fui liderado do saudoso Deputado Freitas Nobre, já no final dos anos 70, e vice-líder dos então Deputados Luiz Henrique - hoje Governador de Santa Catarina - e Tarcísio Delgado.

            Por indicação do inesquecível Deputado Ulysses Guimarães, fui vogal na Executiva Nacional, na Presidência de Quércia e do hoje Senador Jarbas Vasconcelos.

            Em 1989, o PMDB havia mergulhado na sua mais profunda crise na história de Mato Grosso do Sul. O PMDB do meu Estado se atolava na crise. Lideranças das mais conceituadas, como os ex-Governadores Wilson Martins e Ramez Tebet, os Deputados Estaduais Roberto Orro e André Puccinelli haviam protagonizado grande debandada para se alojarem no ninho dos tucanos. Era a consequência daquela crise.

            Dois anos depois, na condição de presidente recém-eleito do Diretório Estadual, priorizei a pacificação e a reconstrução do partido. Eram requisitos que eu entendia indispensáveis para resgatar-lhe o espaço perdido no meu Estado, que era efetivamente muito grande e muito significativo.

            Com esse espírito, não apenas abri as portas a essas notáveis ovelhas desgarradas, como fui buscá-las de volta para os quadros do PMDB. Na verdade, Srª Presidente, eles se encontravam em desconforto no PSDB, mas precisavam de estímulo; estímulo que dei para que voltassem.

            Mais do que isso: em 1992, removi difíceis obstáculos para conquistar a Prefeitura de Campo Grande, quando elegemos Prefeito da capital Juvêncio César da Fonseca. Era o avant-première da eleição estadual que viria dois anos depois.

            O resultado, Srs. Senadores, se expressou em 1994 na eleição de Wilson Martins para o Governo do Estado, Ramez Tebet para o Senado e André Puccinelli para Deputado Federal. Além do coroamento da carreira política do ex-Governador, a eleição daquele ano foi determinante na ascensão de Ramez ao cenário nacional e na trajetória de Puccinelli, que se elegera Deputado Federal.

            Com a abertura que promovi, o PMDB reconquistou seu espaço. Campo Grande também. Todavia, a minha condição de presidente e condutor do processo me produziram sequelas daquela crise partidária.

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Srª Presidente, gostaria que V. Exª tivesse um pouquinho de tolerância porque o registro que hoje estou fazendo é muito relevante para minha carreira política.

            Paguei um alto preço: a longa interrupção de minha carreira parlamentar. E isso só terminou quando assumi a vaga de Senador deixada pelo inesquecível e saudoso companheiro Ramez Tebet. Mais de três anos de trabalhos nesta Casa, meu direito de disputar a reeleição é contestado.

            Dos apelos do Governador André Puccinelli para encontrar solução pacificadora resultou um critério, que à primeira vista parecia justo: a escolha do candidato mediante eleição prévia. O único compromisso que exigi do Governador, Senador Jarbas Vasconcelos, o único compromisso que ele apalavrou foi que a máquina pública não seria manejada para influir no resultado. Era também o mínimo que eu esperava, especialmente porque a disputa se daria entre dois companheiros de uma mesma agremiação.

            Sucedeu exatamente o contrário. A imparcialidade compromissada foi substituída por um “tratoraço” descomunal. Um jogo tão pesado que, em menos de três semanas, inverteu a tendência, e me venceu. Mais do que violação à legítima vontade do eleitor - no caso, o eleitor filiado -, a interferência do Governador foi um desrespeito a quem nunca faltou com o partido. Até por gratidão a quem o recebera de volta no PMDB, depois de sua arrependida hospedagem no ninho dos tucanos, o Governador teria que se manter com isenção, acima da disputa, acima da suspeita.

            Digo “por gratidão” porque, se ele encontrasse a porta do PMDB fechada quando quis voltar, seu projeto político esbarraria em obstáculos intransponíveis. Afinal, o PSDB, à época, não tinha capilaridade nem estrutura capazes de viabilizar a pretensão eleitoral dos dissidentes peemedebistas.

            Por tudo isso, o Governador não poderia jogar a máquina contra mim. Era a mínima conduta ética que deveria ter com um companheiro de partido, mesmo que não tivesse isso sido apalavrado.

            É bem verdade que, hoje, há generosas promessas para me compensar na viabilização de uma disputa para a Câmara Federal. Por dois motivos, não posso aceitá-las: por entender que a oferenda é incapaz de pagar a dignidade e o respeito a quem acumulou 44 anos de fidelidade partidária e pelo fato de que o mandato eletivo também não se destina à compensação de quem nele se investe, mas ao interesse público, que deve ficar acima de tais favores. O mandato é transitório, e dele o povo é o titular. Já a dignidade e o respeito são valores permanentes, para os quais o mandato chega a ser dispensável.

            Numa estrofe de um samba de Wilson Batista, imortalizado na voz de Paulinho da Viola, é provável que isso fique mais claro. Diz a estrofe: “Tenho pena daqueles que se agacham até o chão, enganando a si mesmos, por dinheiro ou posição. Nunca tomei parte desse enorme batalhão, pois sei que, além de flores, nada mais vai para o caixão”.

            No conflito entre valores éticos que sempre orientaram a minha vida pública e a rendição de minha personalidade a valores historicamente rejeitados, não alimento dúvida alguma. Não tendo sido vassalo da ditadura, não há de ser agora que aceitarei a submissão. Mesmo que a irreverência seja um risco político nos dias atuais, prefiro me expor a ele a abdicar de minhas convicções pessoais.

            Honra-me o Senador Jarbas Vasconcelos com seu aparte.

            O Sr. Jarbas Vasconcelos (PMDB - PE. Com revisão do aparteante.) - Meu caro Senador Valter Pereira, nós fomos fundadores do antigo MDB e, posteriormente, do seu sucedâneo, o PMDB, quando a ditadura extinguiu o bipartidarismo, e proibiu que a legenda tivesse o nome do movimento - obrigou que o partido colocasse uma letra “p” antes da sigla. Nós somos dessa época. Reencontrei V. Exª aqui, no Senado, e, nesta legislatura, nem sempre tivemos, dentro do PMDB, convergências, mas sempre nos respeitamos muito. Fui Deputado com V. Exª, combatemos juntos a ditadura, a violência, a censura, a perseguições, prisões e torturas. V. Exª sempre deu um exemplo de coerência e de dignidade dentro do Partido. Sempre foi uma pessoa que pautou a conduta, primeiro, como um bom Deputado e, agora, como um eficiente Senador, um Senador que honra o seu mandato. De forma que não poderia, nesta tarde, deixar de dar o meu depoimento em relação a V. Exª, sobre a figura do homem público, da sua correção, da sua lealdade. Lembro-me, certa feita, estive no Mato Grosso, em um ato partidário, e vi sua força, sua mobilização em torno das causas partidárias. Não posso, evidentemente, entrar no mérito do que aconteceu com V. Exª e o atual PMDB, mas gostaria de dizer que o uso discricionário da máquina, seja ela em que campo for, no governo ou na oposição, e sobretudo dentro de uma mesma legenda, não é um bom exemplo, não é eficaz, não é louvável. V. Exª sabe das minhas divergências com a direção nacional do Partido; de vez em quando, identifico atitudes direcionadas a mim -, o que eu quero mesmo da direção do Partido, e da presidência é distância, imensa distância entre mim, entre a minha secção regional de Pernambuco e a atual direção nacional do PMDB. Mas quero dar esse depoimento a V. Exª em atenção à sua luta dentro do Partido, quer na época do MDB, quer agora dentro do PMDB e da sua coerência. Nunca vi V. Exª ameaçar deixar o Partido, lutar contra o Partido, deixar de seguir diretrizes do Partido. V. Exª sempre foi um militante do MDB e depois do PMDB. De forma que eu quero me incorporar ao discurso de V. Exª e prestar minha solidariedade a V. Exª. Dizer que me causa estranheza esses fatos que lhe atingiram em seu Estado e dizer da minha admiração e respeito pela sua conduta como Parlamentar e como cidadão.

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Muito obrigado, Senador Jarbas Vasconcelos. A fala de V. Exª, rica de autoridade, só serve para engrandecer nosso pronunciamento e, sobretudo, para fortalecer a posição que estamos tomando.

            Confesso que, em dado momento, fiquei dividido entre romper esses meus laços políticos com o Governador e adotar outras medidas mais severas. E ouvi V. Exª, ouvi o Senador Pedro Simon, ouvi o Presidente da Casa, Senador José Sarney, e ouvi também o Líder nesta Casa. Debati também com companheiros que me foram leais durante a caminhada, com militantes antigos do PMDB. Depois de todas essas avaliações, fixei-me na decisão de rescindir meus compromissos políticos com o Governador, mas vou continuar lutando, como V. Exª, como o Senador Pedro Simon, como muitos outros estão fazendo, para que o PMDB seja o grande fórum democrático que a História demonstrou, que a História provou que sempre foi.

            Não posso fazer esse registro, Srª Presidente, sem agradecer a lealdade que me dedicaram valorosos companheiros que me premiaram com a gratidão e o respeito. Muitos deles estão, neste momento, ligados na TV Senado, premidos pela inquietação que essas atitudes geralmente acarretam. Nesse universo, pontificam Vereadores, Prefeitos e militantes do Partido. Afinal, o PMDB que construímos foi o Partido da participação, não da submissão; foi o Partido do respeito às liberdades, não da censura; foi o Partido da convivência fraterna, não do rancor; foi o Partido da relação amistosa, não da acintosa arrogância.

            A meus companheiros de Bancada, do Partido, nesta Casa, exemplos de convivência com as diferenças, só posso agradecer o prestígio à nossa atuação e a amizade que indistintamente sempre me distinguiram.

            Quero dizer aqui, Srª Presidente, encerrando, que o PMDB é maior que certos dirigentes, e é por isso que continuamos nossa luta.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/05/2010 - Página 24282