Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise dos impactos do Programa Bolsa Família na sociedade brasileira.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Análise dos impactos do Programa Bolsa Família na sociedade brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 02/06/2010 - Página 25419
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, EFEITO, BOLSA FAMILIA, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, APRESENTAÇÃO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), REGISTRO, INFORMAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, SECRETARIO, SECRETARIA, RENDA, CIDADANIA, RECONHECIMENTO, INSUFICIENCIA, VALOR, BENEFICIO, ERRADICAÇÃO, POBREZA, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, DIFICULDADE, POPULAÇÃO, ACESSO, SANEAMENTO BASICO, ENERGIA ELETRICA, SUPERIORIDADE, INDICE, ANALFABETISMO.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INICIATIVA, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, AMPLIAÇÃO, BOLSA FAMILIA, CIDADÃO, HABITANTE, VIA PUBLICA.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), OCORRENCIA, REDUÇÃO, ATIVIDADE RURAL, REGIÃO NORDESTE, MOTIVO, PREFERENCIA, CIDADÃO, RECEBIMENTO, BENEFICIO, BOLSA FAMILIA, REGISTRO, REALIZAÇÃO, CONGRESSO INTERNACIONAL, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), DEBATE, SOLUÇÃO, PROBLEMA, DEPENDENCIA, POPULAÇÃO, RECURSOS, RENDA MINIMA, COMPROVAÇÃO, EFICIENCIA, PROJETO, CIDADANIA, ERRADICAÇÃO, POBREZA, PROMOÇÃO, JUSTIÇA SOCIAL.
  • COMENTARIO, EFICACIA, EXPERIENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, NAMIBIA, REDUÇÃO, CRIME, MORTALIDADE INFANTIL, CRESCIMENTO, ATIVIDADE ECONOMICA, DESENVOLVIMENTO, FRUTICULTURA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, CRIANÇA, EDUCAÇÃO.
  • REGISTRO, PRESENÇA, PLENARIO, SENADO, ESTUDANTE, ENSINO MEDIO, ESCOLA PARTICULAR, DISTRITO FEDERAL (DF), SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, LEITURA, PEÇA TEATRAL, REFERENCIA, RENDA MINIMA, CIDADANIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, hoje, foram divulgadas diversas notícias a respeito da evolução do programa Bolsa Família, que tem contribuído significativamente para erradicar progressivamente a pobreza absoluta em nosso País, assim como também para diminuir a desigualdade socioeconômica.

            Desde o ano 2002, para 03, para 04, para 05, para 06, para 07, para 08, ano a ano, as Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios do IBGE têm demonstrado que o coeficiente de Gini, de desigualdade, que estava próximo de 0,60, nos colocando entre os países com maior desigualdade no mundo, vem diminuindo, até que, em 2008, último dado disponível, tivemos um coeficiente de Gini da ordem de 0,54.

            Ainda ontem, a Ministra do Desenvolvimento Social, que substituiu o Ministro Patrus Ananias - por sete anos aproximadamente foi Ministro do Desenvolvimento Social - juntamente com a Secretária responsável pela área de renda de cidadania, que administra o Bolsa Família, Srª Lúcia Modesto, deram algumas informações importantes como, por exemplo, o fato de que os beneficiários do Bolsa Família das Regiões Norte e Nordeste ainda não superaram, na média, a condição de pobreza extrema segundo a qual os membros da família recebem até R$70,00 por mês, cada um, segundo o recente perfil do Programa de Transferência de Renda do Governo, ontem divulgado.

O estudo mostra que cerca de 7,5 milhões de famílias beneficiárias do Nordeste e do Norte têm renda média de R$65,29 e R$66,21, respectivamente, após o pagamento do [benefício, o Bolsa-Família], sendo que este varia de um mínimo de R$22,00 a um máximo de R$200,00,dependendo do grau de pobreza e do número de filhos da família.

            O valor do benefício, de R$95,00, em média, é pequeno, insuficiente para superar a pobreza”, avalia Lúcia Modesto, Secretária da Renda de Cidadania.

            Chama-se Secretaria da Renda de Cidadania exatamente porque, quando criada esta Secretaria, já se pensava na Lei nº 10.853, que institui a Renda Básica de Cidadania, que será o desenvolvimento da renda básica de cidadania.

Ela insiste em que o programa não tem por objetivo substituir outras fontes de renda das famílias.

O peso do benefício foi relevante no aumento da renda em todas as Regiões do País, sobretudo no Norte e Nordeste, mostra o estudo. Em média, o benefício aumentou em quase a metade (48,74%) a renda por pessoa da família.

A Ministra do Desenvolvimento, Márcia Lopes, estima que mais de dois milhões das 12,4 milhões de famílias que recebem o benefício ainda sejam consideradas extremamente pobres.

O mais recente levantamento sobre pobreza no País indica que, apesar da redução do potencial da pobreza registrada nos últimos anos, mais de um a cada quatro brasileiros (28,8%) ainda está nessa condição.

A cruzar dados do cadastro de beneficiários, o Ministério do Desenvolvimento Social identificou uma família “típica” do programa.

Essa família é chefiada por uma mulher, de 37 anos de idade, que estudou apenas até a quarta série do ensino fundamental. Tem quatro pessoas e renda mensal de R$48,82 por pessoa. Vive em casa de tijolo e dispõe de serviço de água e esgoto.

O acesso ao saneamento básico, no entanto, mostrou-se ainda um problema na mais recente edição do perfil do beneficiário do Bolsa-Família [feito a cada dois anos]. Em setembro de 2009, mais de 20% dos beneficiários ainda não contavam com tratamento de água e apenas 54,2% dispunham de escoamento sanitário. Além disso, 10% ainda não tinham acesso à rede de iluminação e dependiam de velas e lampiões.

Embora tenha melhorado um pouco, ainda continua elevado o percentual de pais analfabetos no programa: mais da metade não completou o ensino fundamental. “O acesso aos serviços públicos e à educação avança lentamente”, declarou a Secretária Lúcia Modesto, com base nos números sobre as outras dimensões da pobreza, que não se limita à renda das famílias.

Com base no número atualizado de integrantes das famílias beneficiárias, o Ministério do Desenvolvimento Social calcula que mais de 49 milhões de pessoas façam parte do Programa de Transferência de Renda - mais da metade é de crianças e adolescentes.

Estão previstas mais duas ampliações o Bolsa Família ainda neste ano. No mês de junho, deverão ser pagos benefícios a 12,7 milhões de famílias. E, até dezembro, a meta é alcançar 12,9 milhões de famílias.

“O alcance dessa meta vai depender do trabalho em bolsões de pobreza e do cadastramento da população de rua”, disse a Ministra Márcia Lopes.

Cabe aos Municípios identificar os pobres que ainda não recebem o benefício, [conforme registra hoje a jornalista Marta Salomão, na reportagem de O Estado S. Paulo].

            Também o jornal O Globo destaca, em sua primeira página: “Governo vai dar Bolsa Família para 46 mil moradores de rua.”

O Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome vai começar a distribuir o Bolsa Família para 46.078 moradores de rua identificados nas cidades brasileiras com mais de 300 mil habitantes. Com base em levantamento feito pelo IBGE, cerca de 300 mil bolsas serão destinadas a eles e a quilombolas, ribeirinhos e indígenas. O Ministério do Desenvolvimento Social à Fome já atende a população de rua em um programa piloto em Belo Horizonte. A ideia do Governo é atacar esses “bolsões de pobreza”, agora de forma mais consistente. Hoje, 14,3 milhões de famílias (49 milhões de pessoas) recebem o Bolsa Família.

O Governo admite que é mais difícil cadastrar e acompanhar essas populações porque todos os beneficiários têm que ter um endereço fixo para referência.

            E aí prossegue a reportagem de Catarina Alencastro, em O Globo, a respeito de como se avançará na direção de beneficiar a toda a população de rua.

            O Bolsa Família aproxima-se da meta anual e deve atingir 12,7 milhões de famílias em junho” Assim destaca a Folha de S.Paulo, na matéria de Camila Campanerut, tendo em conta a entrevista dada ontem por Márcia Lopes e Lúcia Modesto.

            Eu gostaria de aqui comentar, Sr. Presidente, que, no dia 16 de maio, a Folha de S.Paulo publicou relevante reportagem, assinada pelo jornalista Fernando Canzian, sobre como é que os benefícios sociais, especialmente do Programa Bolsa Família, estão provocando a redução da atividade rural no Nordeste brasileiro. Sob o título: “Benefício social reduz a atividade rural no Nordeste”, Fernando Canzian esteve em Brejões, na Bahia, para constatar o problema que ele próprio já havia observado em reportagem realizada em 2007.

            Hoje, o jornal Folha de S.Paulo publica artigo de minha autoria, intitulado “Como superar a dependência”, que passo a ler:

[Segundo Fernando Canzian], “muitos trabalhadores estão optando por não ter registro em carteira a fim de manter benefícios sociais, como o Bolsa Família e a aposentadoria especial antecipada”. O fenômeno levou grandes fazendas a abandonar a produção de café nos últimos anos, passando à criação de gado. A dependência tem sido analisada pelos estudiosos dos programas de transferências de renda em muitos países.Eles estarão presentes no 13º Congresso Internacional da Bien (Basic Income Earth Network ou Rede Mundial da Renda Básica), entre 30 de junho e 2 de julho, na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo. A solução para superar o problema está na instituição da Renda Básica de Cidadania (RBC). É o direito de todas as pessoas, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou mesmo sócio-econômica, de receber uma renda suficiente para atender às suas necessidades vitais, como um direito de todas participarem da riqueza da Nação. O fenômeno da dependência acontece quando se tem um programa que diz: quem não recebe um certo patamar ou até certo nível de renda passa a ter o direito de receber um complemento de renda até aquele patamar, muitas vezes acompanhado de condicionalidades, como no caso do programa Bolsa Família. A pessoa está por decidir: “Vou ou não realizar essa atividade econômica. Mas, se o fizer, e com isso receber uma remuneração além daquele patamar definido em lei, vem o governo e me tira o que eu ganhava naquele programa; então, poderei optar por não realizar a atividade e entrar nas chamadas armadilhas do desemprego ou da pobreza.” Tais armadilhas são analisadas, por exemplo, em Renda Básica de Cidadania - Fundamentos Éticos e Econômicos, dos Professores Philippe Van Parijs e Yannick T. Vanderborght, da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica.

Quando instituída a Renda Básica de Cidadania, conforme prevê a Lei nº 10.835, de 2004 - repito, a Lei nº 10.835, de 2004, e não 10.853, que falei erradamente -, aprovada por todos os partidos no Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente Lula, a pessoa e todos os membros de sua família a receberão incondicionalmente. Portanto, caso a pessoa aceite trabalhar na fazenda de café ou em qualquer outra atividade ela não perderá a Renda Básica de Cidadania. Poderá se registrar e a remuneração que tiver significará progresso. Há outras vantagens: a eliminação de toda e qualquer burocracia para saber quanto cada pessoa ganha no mercado formal ou informal; o fim do sentimento de vergonha de a pessoa precisar declarar “eu só recebo tanto, por isso mereço tal complemento”.

Do ponto de vista da dignidade e da liberdade do ser humano, será muito melhor para qualquer pessoa saber que daqui em diante, dada a existência da Renda Básica de Cidadania, ela ganhará o direito de dizer “não” a uma atividade que porventura lhe surja, pois a sua sobrevivência estará assegurada.

Se a alternativa for a de vender o próprio corpo, integrar a família de narcotráfico ou a de se submeter a condição análoga à de escravo, a pessoa poderá recusar oferta que coloque a sua saúde e vida em risco ou que afronte a sua dignidade.

Graças à Renda Básica de Cidadania, para si e para os seus, a pessoa poderá fazer um curso e aguardar uma oportunidade mais adequada à sua vocação.

            Gostaria, então, de informar - e assim concluo o artigo - que o Congresso Internacional da Basic Income Earth Network, que se realizará em São Paulo, tem abertas as suas inscrições e qualquer pessoa pode se inscrever através do site e obter ali todas as informações: www.bien2010brasil.com. E este Congresso da Bien, Rede Mundial da Renda Básica, vai mostrar que a renda básica de cidadania contribuirá de forma eficiente para erradicar a pobreza absoluta, construir a sociedade justa e prover dignidade e liberdade para todos os seres humanos.

            Dentre aqueles que apresentaram contribuições para o Congresso Internacional da Renda Básica estão Asdrúbal Serrano, que é um discípulo de todos aqueles que tanto têm contribuído para o Teatro do Oprimido, como Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri, José Celso Martinez Corrêa e tantos outros dramaturgos.

            E aqui eu gostaria de ilustrar uma peça curta de Asdrúbal Serrano a respeito de qual seria a transformação para os trabalhadores rurais, como os que trabalham na colheita do café, diante, primeiro, da existência do Programa Bolsa Família e, depois, da existência da Renda Básica de Cidadania.

            Eu gostaria, Sr. Presidente, Senador Mão Santa, de registrar que estão presentes na galeria e na tribuna de honra diversos estudantes do Colégio Galois, de Brasília. São alunos do 3º ano do ensino médio. Entre eles, está Ana Beatriz Queiroz, que é filha do nosso Senador Gilberto Goellner. Eles vieram aqui dialogar conosco, Senadores, e ver como funciona o Senado.

            Se quiserem participar, eu vou fazer uma pequena peça. Quer ser um personagem, Senador Paulo Paim? Venha aqui. Quer vir? (Pausa.) Então, vou fazer os diversos personagens. Em outro dia, fazemos juntos.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - O Paulo Paim dá para representar o Barack Obama, pela liderança dele. Qual é o personagem? O Barack Obama, eu deixo.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Nesta peça, está o Sr. Oscar, que é o dono de uma mercearia, e aproximam-se o Quinho, que é um trabalhador rural, e sua esposa, Rosa. Então, se o Senador Paulo Paim quiser ser o Quinho ou o Oscar...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Não, ele é o Barack Obama nosso.

            O SR EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Então eu vou ser os três personagens aqui, Senador.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Bill Clinton, só se for.

            O SR EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Tá bom. É curtinho.

            Chega o Quinho, trabalhador rural, à venda:

Quinho - Seu Oscar... Precisamos de mais um punhado de feijão e farinha.

Oscar - Mas vocês não pagaram nem a última compra... Por acaso está escrito bocó na minha testa?

Rosa - [a esposa]...

            (Interrupção do som.)

            O SR EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Preciso de três minutos, por favor. Assim, eu concluo para valer.

Rosa - Temos nos esforçado o máximo, mas estamos sem trabalho há algum tempo... As coisas vão melhorar assim que vier a resposta sobre o nosso pedido para o Bolsa-Família.

Oscar - Bolsa-família? Por que não saem dessa vadiagem e vão catar latinha de alumínio na rua?

Rosa - Seu Oscar, o Bolsa-família tá para sair... Já entregamos um montão de documentos... Estamos na precisão dos mantimentos... Assim que sair prometemos que pagamos todas as nossas contas da mercearia!

Oscar - Por que não procuram um trabalho? Quem quer arregaça as mangas e vai à luta!

Quinho - O café tá na entressafra, vai demorar ainda alguns meses para o pau-de-arara contratar a gente.

Rosa - Estamos desesperados... Ainda teve a estiagem da última safra, né, Quinho, que deixou todo mundo numa pior!

Oscar - Leva a mau não, dona! Faz um tempo que tomo prejuízo aqui na mercearia. Anotei no caderninho... Vocês devem para mais de cem reais... Deste jeito me levam à falência...

Rosa - Mais tarde eu e o Quinho vamos debulhar milho no sítio do Seu Chico, o dono da farmácia. Ele prometeu pagar duas sacas de milho... Se o senhor aceitar, podemos trocar as sacarias pela nossa dívida.

Quinho - É seu Jereba, vamos pagar o que devemos e ainda trocar por outros mantimentos para dar um bom sossego...

Rosa - Quinho é esperto e ligeiro... Rapidinho ele debulha mais de mil espigas... Milho é fácil debulhar e com a esperteza do Quinho, então..

Oscar - Quero saber de porcaria de milho nenhum. Tá vendo aquela sacaria toda ali? É tudo milho! Tem para mais de quarenta sacos...

Quinho - Então tentaremos vender o milho que vamos receber! Final da tarde o dinheiro está na sua mão...

Oscar - Quinho, cada vez mais você está se afundando...

Quinho - Precisamos de comida, seu Oscar!

Rosa - Garantimos, seu Oscar. Se não conseguirmos vender o milho poderei até fazer uma faxina na mercearia para pagar pelo menos o feijão...

Oscar - Nada de faxina, quero dinheiro. Quem gosta de faxina é madame... (entrega um pacote de farinha para o casal) - Só mais este... Quero o pagamento às sete da noite, senão vou até o barraco de vocês e pego a porcaria desta farinha de volta...

Rosa - Pode deixar, seu Oscar... Antes das sete pagamos pela farinha...

Rosa e Quinho conferem o pacote. Entra Flávia.

Oscar - Bom dia dona Flávia...

Flávia - Vim com pressa! Só vou acertar o que devo... (entrega um punhado de dinheiro para o Oscar)

Oscar (contando o dinheiro) - Cem, duzentos, trezentos, quatrocentos e trinta e dois. Depois de muito tempo, até que pagou direitinho... (coloca o dinheiro no bolso)

Flávia - Já coloquei os juros que você me cobrou. Está tudo aí... Juntei dois meses, mas agora não te devo mais nada.

Oscar - Parabéns... Muita muamba?

Flávia - Deixei as viagens pra São Paulo, você sabe disto Oscar. Agora, temos a RBC.

Oscar - RBC? Que porcaria é essa?

Flávia - Renda Básica de Cidadania. Em casa somos seis, todos nós temos recebido cerca de quarenta reais cada um. Agora temos a oportunidade de descobrir novos caminhos.

Rosa - Como funciona isso?

Flávia - A partir de agora todos nós brasileiros temos o direito de receber um percentual de todas as riquezas produzidas no país.

Oscar - Lá vem este papo de distribuição de renda... Isso o Bolsa-família já faz. Estes pobres diabos aí... (aponta para Quinho e Rosa) ...estão passando fome esperando por esta porcaria de assistencialismo governamental... E a minha mercearia está cada vez mais no fundo do poço, por causa de preguiçosos como estes dois aí... (aponta novamente para Quinho e Rosa)

Flávia - Mas o RBC é diferente. Além de ser permanente não é necessário comprovar que alguém necessita de uma renda básica. Todos os brasileiros, do rico ao pobre terão direito a uma renda permanente [até o Senador Mão Santa], inclusive você, seu Oscar.

Rosa - Isto acabaria com a fome no Brasil!

Oscar - Que perda de tempo... Isso ia fazer aumentar a vadiagem destes dois que adoram ficar de papo pro ar esperando uma ajudazinha do governo...

Flávia - Não se trata de “ajudazinha” do governo. Trata-se de futuro! Agora todos nós poderemos fazer as nossas escolhas. Juntando o RBC da minha família, conseguimos fazer um bom supermercado. Logo a nossa cidade vai ser movimentada por esta nova renda. Surgirão novas oportunidades de trabalho; o comércio vai ser beneficiado, a agricultura vai receber uma nova dose de injeção de ânimo... A nossa pequena cidade vai ser uma nova potência.

Oscar - Mixaria! Você está sonhando alto por causa de uma mixaria...

Flávia - O RBC está sendo o início da realização dos meus sonhos. Agora tenho uma renda garantida e isto vai me ajudar a correr atrás das coisas que eu acredito e, o melhor, agora sim tenho várias possibilidades de escolha, inclusive de comprar na outra mercearia do nosso bairro, que não aceita fiado, mas também não...”

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Estou terminando, Sr. Presidente:

...não cobra os preços abusivos que o senhor cobra. Estou indo embora, pois paguei tudo o que devia. Não te devo mais nada!

Oscar - É só mudar o governo que esta tal de RBC vai por água abaixo... Aí quero ver você se humilhar e pedir fiado novamente aqui no meu cafofo...”

Flávia - Agora eu tenho alternativa e posso escolher.

Flávia retira-se. Rosa e Quinho a seguem. Oscar fica sozinho inconsolado.

Rosa - Explica melhor a Renda Básica de Cidadania?

Quinho - Aonde preenchemos estes papéis para termos direito?

            A Senadora Patrícia Saboya vai explicar muito bem lá no Ceará, quando instituírem o Renda Básica de Cidadania, como se preenche. Para se ter esse direito, será tão simples, Senador! Não haverá praticamente burocracia. Todos os 192 milhões de brasileiros terão esse direito. E daí poderemos dizer algo como disse o Bispo Zephaniah Kameeta, da Namíbia, quando, perante mil pessoas na Universidade de Munique, há duas semanas, falou sobre a experiência que aconteceu em uma pequena vila.

            Senadora Patrícia e Senador César Borges, só quero contar essa experiência, assim como para o Senador Mão Santa, que muitas vezes tem colocado dúvidas. Disse o Bispo Zephaniah Kameeta como a experiência que aconteceu lá na Namíbia, onde havia tanta fome aguda em meio a extraordinária riqueza, porque lá o Coeficiente de Gini é o maior do mundo, 0,74, aconteceu...

(Interrupção do som.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ...uma nova compreensão para mim de como houve o milagre de Jesus com a multiplicação dos peixes e dos pães e saciou cinco mil pessoas. Eis quem quando Jesus distribuiu os peixes e os pães, Ele não disse: “Você sim, Senador César Borges; você não, Senadora Patrícia. Você merece, Senado Flávio Arns; você não merece, Senador Paulo Paim. Você fica na fila, Senador Acir; você não fica na fila, Senador Mão Santa”. Ele disse: todos vão ter o direito ao pão e ao peixe. E, quando Jesus distribuiu igualmente para todos, aconteceu como que uma modificação: cada pessoa se abriu e passou a partilhar com os demais o que tinha. Houve um senso de comunidade tal e todas as pessoas passaram a se dar mais.

           E em dois anos e pouco de distribuição de uma pequena renda básica para as mil pessoas que vivem naquela vila - de apenas o equivalente a US$12.00 mensais norte-americanos, US$100.00 da Namíbia -, eis que aumentou significativamente a atividade econômica, a presença das crianças na escola, a criminalidade diminuiu 42%, a subnutrição infantil diminuiu significativamente, aumentou o número de atividades econômicas, porque algumas pessoas começaram a produzir frutas, outras legumes, outras o pão, outras o tijolo, outras vestidos, e como que um milagre aconteceu. E aí sim, o Bispo Kameeta compreendeu melhor como é que, em se repartindo igualmente o pão, houve a multiplicação para que todos pudessem ser saciados.

            Muito obrigado, Presidente Mão Santa.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/06/2010 - Página 25419