Discurso durante a 90ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Associação às homenagens prestadas pelo Senador Pedro Simon pelo centenário da cidade de Caxias do Sul/RS. Manifestação em defesa do Mercado Comum do Sul - Mercosul. Solicitação ao Presidente Lula e aos candidatos à Presidência da República no sentido de que continuem defendendo e apoiando o Mercosul.

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA EXTERNA.:
  • Associação às homenagens prestadas pelo Senador Pedro Simon pelo centenário da cidade de Caxias do Sul/RS. Manifestação em defesa do Mercado Comum do Sul - Mercosul. Solicitação ao Presidente Lula e aos candidatos à Presidência da República no sentido de que continuem defendendo e apoiando o Mercosul.
Aparteantes
Edison Lobão, Eduardo Suplicy, Marcelo Crivella, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 03/06/2010 - Página 25940
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, MUNICIPIO, CAXIAS DO SUL (RS), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • OPORTUNIDADE, DEBATE, CAMPANHA ELEITORAL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, IMPORTANCIA, DEFESA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), VALORIZAÇÃO, EFEITO, ECONOMIA NACIONAL, INTEGRAÇÃO, AMERICA LATINA, GARANTIA, CANDIDATO, COMPROMISSO, CONTINUAÇÃO, ESFORÇO.
  • QUALIDADE, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, FUNDADOR, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), REGISTRO, HISTORIA, CONFLITO, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, REGIÃO, RIO DA PRATA, ELOGIO, ATUAÇÃO, PERSONAGEM ILUSTRE, BRASIL, DIRETRIZ, PACIFICAÇÃO.
  • REGISTRO, POLITICA EXTERNA, PERIODO, GOVERNO, ORADOR, PROCESSO, SUPLANTAÇÃO, DIVERGENCIA, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, VALORIZAÇÃO, APROXIMAÇÃO, ENTENDIMENTO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PROJETO, ORGANISMO INTERNACIONAL, MODELO, MERCADO COMUM EUROPEU, PRE REQUISITO, DEMOCRACIA, PIONEIRO, ASSINATURA, ACORDO DE COOPERAÇÃO TECNICA, ENERGIA NUCLEAR, ELOGIO, SIMULTANEIDADE, DIVULGAÇÃO, USINA, URANIO ENRIQUECIDO, AUSENCIA, OCULTAÇÃO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, COMENTARIO, DIFERENÇA, SITUAÇÃO, ATUALIDADE, GOVERNO ESTRANGEIRO, IRÃ.
  • QUESTIONAMENTO, DECLARAÇÃO, JOSE SERRA, CANDIDATO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESVALORIZAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), MOTIVO, DESEQUILIBRIO, NIVEL, DESENVOLVIMENTO, BRASIL, ESTADOS MEMBROS, CONCLAMAÇÃO, PARTICIPANTE, CAMPANHA ELEITORAL, DEFESA, ORGANISMO INTERNACIONAL, COMBATE, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA), PREVISÃO, DOMINIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), AREA DE LIVRE COMERCIO, REGISTRO, DADOS, CRESCIMENTO, COMERCIO EXTERIOR, AMERICA LATINA.

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            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito obrigado a V. Exª pelas suas palavras com que me recebe nesta tribuna.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - O Pedro Simon, que representa Caxias, o Rio Grande do Sul, teve quase cem minutos, o senhor, que representa a democracia do mundo, pode falar com tranqüilidade o tempo que achar conveniente.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Vou procurar ser breve, Sr. Presidente.

            Quero me associar às homenagens prestadas pelo centenário de Caxias do Sul e às palavras aqui proferidas pelo Senador Pedro Simon.

            Até hoje tenho indelével na minha memória a manhã em que chegamos em Caxias e assistimos a um desfile extraordinário onde eu pude auferir a generosidade com que me recebeu o povo daquela terra.

            Venho hoje, Sr. Presidente, num dever de consciência e num dever político, que é da defesa do Mercosul. Estamos num período de efervescência eleitoral e algumas vezes tenho ouvido, de alguns dos candidatos palavras de total apoio ao Mercosul e de outros de uma certa descrença naquilo que é hoje um patrimônio histórico do Brasil e da América do Sul. Para isso, tenho que falar um pouco da história do Mercosul.

            Aqui estão dois representantes do Rio Grande do Sul: Senador Paim e Senador Pedro Simon, que sabem perfeitamente o que representou o Mercosul para aquela região, para o Brasil e o patrimônio que ele constitui para as populações, sobretudo do sul do País. Eu ouvi, depois que criamos o Mercosul, Sr. Presidente, do Presidente Sanguinetti uma expressão que jamais esquecerei: “Foi a coisa mais importante que aconteceu no nosso continente depois das nossas independências.”

            Realmente, Presidente, nós tínhamos, em relação à Argentina, algumas hipotecas históricas que não deixavam que nossas relações adquirissem um status maior e que, ao mesmo tempo, se ampliassem de maneira a uma integração perfeita e completa entre nossos dois países. Essas hipotecas históricas vinham das Guerras Cisplatinas, da Guerra do Paraguai, da questão da navegabilidade do Prata -- porque se criou a lenda, naquele tempo, de que quem dominasse o Prata dominaria o coração da América. E havia o sonho de que no coração da América existia um lago de ouro, e às vezes até se falava no reino de Prestes João. Isso, sem dúvida alguma, aguçava o direito de ter acesso a essas riquezas. E foi isso, sem dúvida, um dos motivos pelos quais se discutiu tanto a navegabilidade do Prata, criando-se muitas questões ao longo de nossas histórias.

            Durante esse período, Sr. Presidente, também, nós tivemos no princípio, a hipoteca que nos foi deixada por aquela ideia de Carlota Joaquina, que, filha de um rei de Espanha, achava que podia fazer o Reino do Prata, sendo ela a rainha daquela região. Isso, sem dúvida alguma, determinou intrigas diplomáticas e fez com que nossas relações, desde o princípio, fossem toldadas, sobretudo porque a aspiração deles era em benefício da república e nós éramos um reino, talvez o único reino existente na América, fora da tentativa fracassada, no México, de fazer Maximiliano seu rei.

            Tivemos, em determinados momentos, para evitar que as situações entre os nossos países aumentassem muito - havia naquele tempo também as províncias, a Argentina não tinha ainda sua unidade, tivemos a presença de dois homens ilustres do Brasil que trabalharam muito para que o País, naquela região, tivesse um solução sempre pacífica -- embora nunca tenha sido pacífica, porque havia atritos de toda natureza, quase sempre atritos de fronteira, atritos de pessoa, sobretudo com os famosos caudilhos daquela área dos Pampas. Tivemos as presenças de Saraiva e do Visconde do Rio Branco, o pai do Barão de Rio Branco.

            Confesso a V. Exª que, antes de ser Presidente da República, eu julgava o Visconde do Rio Branco maior do que o Barão do Rio Branco. Eu tinha lido os Anais do Parlamento brasileiro e tinha visto a atuação fantástica do Rio Branco, quando ele conduziu a questão da Lei do Ventre Livre e também quando ele discutia as leis da regência, sobre as quais ele teve a oportunidade de polemizar com o José de Alencar, que era deputado.

            E nos tempos modernos nós tivemos problemas permanentes com a Argentina, sobretudo um problema de natureza militar, que fez com que as nossas Forças Armadas se concentrassem em quase sua totalidade no Rio Grande do Sul, como fez com que também as nossas escolas militares tivessem como lição as hipóteses de guerra com a Argentina, o mesmo acontecendo na Argentina, com as hipóteses de guerra em relação ao Brasil e a concentração estratégica de forças sempre visando essas hostilidades, que, graças a Deus, nunca chegaram.

            E chegamos quase que à beira de um confronto nuclear. Hoje já se pode dizer com certa liberdade -- naquele tempo isso era uma coisa que guardávamos, nós, homens de Estado, não podíamos nem admitir essa possibilidade -- que na realmente existia uma corrida nuclear entre o Brasil e a Argentina, para ver quem primeiro chegaria a dominar a tecnologia da bomba atômica.

            Foi isso também, sem dúvida, Sr. Presidente, que gerou outra disputa dos tempos modernos entre o Brasil e a Argentina, que foi a disputa das águas do Paraná, a disputa sobre as hidrelétricas. Chegaram a dizer que Itaipu era uma bomba hidráulica feita para destruir a Argentina e também impossibilitá-la de fazer algumas hidrelétricas de grande porte, o que não ocorreu. Hoje a Argentina tem hidrelétricas de grande porte, bastando citar a Iaceretá.

            Quando assumi a Presidência da República, eu tinha, como intelectual, sempre consolidada na minha cabeça a palavra de Saenz Peña -- “tudo nos une, nada nos separa” -- e não entendia por que essa nossa divergência com a Argentina, que não tinha uma base sólida e que dificultava, sem dúvida alguma, as nossas relações, dificultava e muito.

            A primeira coisa que eu fiz, Sr. Presidente, já que a política externa nunca fez parte da política interna -- agora, um pouco a política externa começa a surgir como parte de grandes discussões e de algumas divergências que se expõem -- mas, naquele tempo -- e aqui estão o Senador Pedro Simon, o Senador Lobão, que era Parlamentar naquele tempo, o Senador Cafeteira --, não se discutia política externa no Parlamento. Muitos poucos Parlamentares discutiam política externa.

            Eu era um deles, já como Deputado e depois como Senador, relembro também o Deputado Renato Archer, que era muito interessado nas questões internacionais, e eu tive a oportunidade de, quando visitou o Brasil o Presidente Andrés Pérez, da Venezuela, em seguida visitava o Presidente Carter, eu então dizia que a visita do Presidente Andrés Pérez era mais importante do que a do Presidente Carter. Porque o que eu achava é que nós não devíamos ficar com os olhos sempre voltados para o Norte, e para a Europa, e para a America do Norte, vivendo de costas para os nossos vizinhos. Que teria de chegar o dia de nos aproximarmos aqui dentro do nosso continente.

            Porque tudo pode ser mudado na face da Terra, menos a geografia. A geografia ninguém muda e dentro da geografia nós estamos localizados aqui nessa região. Temos fronteiras com dez países, sem problemas -- graças a Deus o Brasil conseguiu isso e graças ao Rio Branco. E é por isso que eu acho que ele era maior do que o seu pai. Fiquei sabendo que ele era maior do que o seu pai. Aprendi por que ele era maior do que o seu pai. Então, com fronteiras todas com esses nossos países, nós devíamos construir aqui um espaço econômico para que nós pudéssemos construir a unidade, a integração latino-americana. E como não tinha interesse interno -- como eu disse, a política externa não fazia parte da política interna --, ninguém me contestou naquela época. O certo é que, logo ao assumir a Presidência da República, uma das primeiras coisas que eu fiz, foi mandar o Chanceler Olavo Setúbal à Argentina, para propor uma mudança das nossas relações. O Senador Pedro Simon era o Ministro da Agricultura naquele tempo. Havia muitas querelas a respeito de trocas de produtos agrícolas entre o Brasil e a Argentina, desde o trigo até a maçã de São Joaquim, em Santa Catarina.

            Pois bem. E quando ele voltava, eu, de certo modo, achava que íamos ter uma dificuldade grande em avançar neste ponto. Mas voltou o Chanceler Olavo Setúbal e me disse que os argentinos estavam preparados para esse passo à frente das relações entre Brasil e Argentina, porque tinha à frente do governo um homem cujas idéias eram idéias muito parecidas com as minhas. Esse homem chamava-se Raúl Alfonsín.

            Raúl Alfonsín, cujo nome eu pronuncio com grande emoção e, ao mesmo tempo, com reverência, porque foi um dos maiores estadistas das Américas. Ele não era só um estadista da Argentina. Era um homem excepcional. Eu vi o povo argentino, através do povo de Buenos Aires, a cidade inteira parada, as ruas cheias, para prestar-lhe a última homenagem, quando ele faleceu, no ano passado.

            Então, nós iniciamos o processo de integração com a Argentina. Esse processo teve como resultado que, no mês de agosto -- eu tinha assumido no dia 15 de março, com a morte do Tancredo, aquele momento terrível da nossa história -- já em agosto eu me encontrava com o Presidente Alfonsín, em Foz do Iguaçu e lá nós tínhamos a nossa primeira reunião. E nessa primeira reunião, eu coloquei para ele a seguinte questão: “Presidente, nós podemos mudar a história da América do Sul, desde que o senhor aceite, com o Brasil, nós dois juntos, fazermos um projeto de espaço econômico que ligue os nossos dois países. Depois, nós ampliaremos esse projeto para todos os outros países da América do Sul.” E, realmente, eu ouvi do Presidente argentino a sua concordância; e nós começamos, então, a estabelecer ali os primeiros passos.

            O primeiro passo que eu disse a ele que nós tínhamos que estabelecer era tirar toda e qualquer névoa sobre o problema nuclear entre o Brasil e a Argentina. E assinamos, então, coisa inédita no mundo, posso dizer, o primeiro acordo de cooperação nuclear entre o Brasil e a Argentina. Nós, que buscávamos como inimigos uma separação, cada um caminhando para o seu lado e procurando descobrir mais rapidamente armas nucleares para nos liquidarmos, juntávamos as mãos para construir a unidade latino-americana. Pois bem, assinamos esse acordo e logo em seguida assinamos muitos outros acordos.

            Eu quero, sobre o acordo nuclear, dizer uma coisa que é importante hoje, quando a gente vê o problema da Coréia do Norte, com o mundo inteiro mobilizado para ver se a Coréia do Norte não avança na produção de arma nuclear; quando vemos, por outro lado, o problema do Irã, nós vamos verificar que o Brasil e a Argentina resolveram esse problema sem a presença de ninguém, sem que o mundo se incomodasse, nem quase tomasse conhecimento, porque o Presidente Raúl Alfonsín me convidou para ir à usina nuclear de Pilcaniyeu na Argentina, aonde nunca tinha ido nenhum Presidente argentino, e ele foi acompanhado do Presidente do Brasil. E não fui só, Sr. Presidente. Ele me disse: “O senhor deve ir, Presidente, acompanhado de todos os técnicos de energia nuclear do Brasil para que eles saibam o que nós estamos fazendo, porque eu quero que não se esconda nada e que a nossa cooperação seja total.”

            E eu retribuí isso porque, naquela época também, com a capacidade que o Brasil demonstrou, nós tínhamos a nossa fábrica secreta de Aramar, onde a Marinha buscava o domínio do enriquecimento de urânio. Hoje nós vemos o que está custando a divergência do Irã com o mundo inteiro sobre o enriquecimento de urânio. Foi naquele tempo que o Brasil deu esse passo avante fantástico em matéria de energia, em matéria de ciência que foi a descoberta do enriquecimento de urânio. Pois, quando descobri que tinhamos nossas centrifugadoras, eu convidei o Presidente Raúl Alfonsín para inaugurar a fábrica de enriquecimento de urânio no Brasil, e pedi que ele trouxesse também todos os seus técnicos em energia nuclear para que nós, então, abríssemos e mostrássemos que nós não tínhamos nada a esconder, porque, se era segredo, a partir daí, não existia segredo nenhum nem para o Brasil, nem para a Argentina.

            Senador Lobão, ouço V. Exª com muita satisfação.

            O Sr. Edison Lobão (PMDB - MA) - Presidente Sarney, V. Exª observa, com toda razão, que o Brasil e países menores não têm muito gosto para a política internacional. Esse fato acontece com quase todos os países de menor porte. O Brasil já é um país de grande porte. Creio que apenas o Presidente Juscelino, quando criou a OPA - Operação Panamericana, fez uma tentativa de um grande voo internacional. Depois dele, veio V. Exª, que, de fato, tem um gosto agudo pelas relações externas. Os Estados Unidos, o Presidente americano, praticamente governa o país olhando para o exterior. A política interna dos Estados Unidos interessa pouco ao Chefe de Estado americano. É assim também na Europa. Não posso deixar de acentuar as relações que V. Exª sempre teve com a política externa brasileira. Foi para a ONU muito cedo, ainda como Deputado. Gostou da ONU como observador. Quase foi Embaixador em Cuba, em um momento em que o Presidente Jânio Quadros quase necessitava de uma espécie de Embaixador especial naquele país. Enfim, ao longo da carreira de V. Exª, vamos observando sempre uma atuação no que diz respeito ao plano externo. Hoje, já o Presidente Collor deu alguns passos. O Presidente Fernando Henrique Cardoso - reconheça-se - tinha muito gosto para a política externa, e o Presidente Lula manifesta isso todos os dias, entendendo que o Brasil já é uma grande Nação e que, portanto, a política externa precisa ser vista com outros olhos. Acho muito bom que V. Exª traga essa questão ao debate aqui no Senado da República, que tem a função constitucional de também participar da política externa na medida em que examina os embaixadores que são indicados para representar o Brasil no exterior. Cumprimentos, portanto, a V. Exª pela iniciativa do discurso bem costurado que pronuncia.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado, Senador Lobão.

            O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Senador Sarney, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Com muito prazer, Senador Crivella.

            O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Presidente Sarney, eu estava ouvindo atentamente o pronunciamento de V. Exª. São pronunciamentos que acrescentam muito, sobretudo a um Senador tão inexpressivo e anônimo como eu nesta Casa...

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Não apoiado. Todos nós temos a maior consideração e respeito por V. Exª, sabendo que é um dos melhores homens públicos da nossa Casa.

            O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Muito obrigado, Presidente. É a generosidade de V. Exª. Mas eu queria era deixar a minha palavra marcada neste momento histórico e solene do Senado Federal em que V. Exª extravasa detalhes da constituição do Mercosul. Não vejo nas relações externas do Brasil, passado o século XIX, no século XX, uma ação tão importante quanto essa do Mercosul. No século XIX, fixamos nossas fronteiras. Tivemos o caso do Acre em 1911, e o Barão foi muito importante naquilo. Mas vejo que o futuro do Mercosul pode trazer uma estabilidade extraordinária ao continente, aos nossos povos, e se impõe no dia a dia, porque os países andinos já estão aderindo e o próprio mundo vê que esse arranjo, que começou apenas com um acordo aduaneiro, tende a caminhar para algo muito maior. E saber que sou seu colega e que V. Exª foi o construtor, com o seu espírito humanitário, com essa capacidade de pensar o mundo e as pessoas do ponto de vista da intelectualidade, com essa imensa paciência de construir sobre todo tipo de armadilhas, muitas vezes traiçoeiras e venenosas da política, essa, vamos dizer assim, tenacidade de no dia a dia se interessar, com tanta devoção, às questões do homem, às questões da sociedade e do seu tempo e pensar o futuro, eu acho que essa contribuição é extraordinária. Bem disse o Presidente Lula certa vez, quando pronunciou uma frase: olha, nós não podemos deixar de considerar o trabalho prestado por um estadista que todas as veras da alma brasileira... E não há nenhum de nós que possa jogar pedra em ninguém, porque o homem é o homem e suas circunstâncias. Há um trabalho extraordinário que foi feito ao longo de muitas décadas. E eu, aqui neste momento, quero me solidarizar com o Senador Lobão e enaltecer isso. A constituição do Mercosul é a maior obra de política externa brasileira no século XX. Não há dúvida disso. Não foi tão bem cuidada, em certos Governos, mas com o Presidente Lula ela foi muito bem cuidada e está dando frutos extraordinários. Esses dias mesmo eu estava vendo a declaração do candidato Serra reclamando da quantidade de cocaína que vem para o Brasil. Ora, mas há uma disparidade imensa de desenvolvimento entre a Bolívia e o Brasil. Nossas fronteiras são desertos demográficos e qualquer obra de infraestrutura que o Brasil faça nas fronteiras aumenta nossa disparidade. Se não houver um arranjo importante entre nações, para que o nosso desenvolvimento seja conjunto, certamente, Presidente Sarney, nós continuaremos a ser aqui depósito de produtos importados ilegalmente e, desgraçadamente, destino de uma quantidade enorme de cocaína que atormenta nossas famílias. V. Exª apresentou solução para isso tudo quando idealizou o Mercosul, dizendo que o Brasil não pode se desenvolver com suas potencialidades, distante de seus irmãos. Como Saenz Peña disse e V. Exª repetiu, temos tudo que nos une e nada que nos separe. Parabéns a V. Exª! Parabéns por esse trabalho que fez. Se, hoje, não é reconhecido, certamente, no futuro, receberá o aplauso de todos os brasileiros. Hoje, V. Exª já o tem de seu companheiro aqui e da sua própria consciência, que é o mais importante.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado, Senador Crivella.

            Acho que, a essa altura, os Senadores e todos aqui já perguntam por que veio o Senador Sarney tratar do problema do Mercosul, que, há vinte anos, todos nós tratamos no Brasil e que, hoje, é quase uma unanimidade nacional. Fazendo esse relato histórico, quero justamente mostrar ao Senado o meu compromisso com essa causa. Enquanto eu viver, eu defenderei o Mercosul com todas as forças que eu puder ter. No momento da sucessão presidencial -- é isto, sobretudo, o objetivo do meu discurso --, o que quero é que o Mercosul seja um ponto de unidade e de união entre os candidatos e que, perante os sócios do Mercosul, não se possa criar qualquer dúvida sobre a continuidade e o esforço do Brasil em favor do Mercosul. Mas eu vou, já adiantando -- porque eu estou tratando desse assunto, neste instante -- eu vou continuar um pouco a dizer sobre as motivações que me levaram a me engajar nessa grande causa.

            O mundo passou, depois da globalização ou, antes mesmo, na época da interdependência -- porque a palavra antes da globalização era interdependência -- a criar espaços econômicos. O primeiro deles -- e o maior de todos -- foi, justamente, a União Européia que vinha, desde meados do século passado, quando a França e a Alemanha estabeleceram o Tratado do Aço, fazendo uma união onde eles se dividiam. A partir dali, então, veio a primeira idéia sobre a União Européia, embora, já Winston Churchill, depois da Guerra, em conferência nos Estados Unidos, tenha dito que era necessária que a Europa reunisse todos os países europeus para que eles pudessem, realmente, constituir um grande país -- mas ele falava, naquele tempo, um pouco marcado pela divisão entre o mundo comunista e o mundo ocidental.

            Pois bem. Esses espaços econômicos começaram a nascer. Quando se cria a União Européia, a União Soviética responde com o Pacto de Varsóvia, que reunia a União Soviética com todos os países que eram do Leste Europeu.

            Na Ásia, mais tarde se criava a chamada ASEAN, que é, de certo modo, um outro tipo de união de espaço econômico, procurando integrar forças para que tivesse maior competitividade mundial. Em torno da ASEAN já se unem Indonésia, Malásia, Filipinas, Singapura, Brunei, já entravam também Tailândia, Vietnã, Myanmar, que era a Birmânia naquele tempo, Laos e Camboja.

            Eu achava que devíamos partir para uma integração latino-americana criando um espaço econômico, e esse espaço econômico só podia ser iniciado através do Brasil e da Argentina, os dois maiores países do continente. Depois, então, nós iríamos integrar os outros países, como a Europa fez, quando eles já estivessem mais preparados para participar de um projeto dessa natureza.

            Escolhemos o Uruguai porque servia de um algodão entre vidros que eram sensíveis, o Brasil e a Argentina daquele tempo.

            O nosso Sanguinetti não era membro do Mercosul, mas o Uruguai era um aliado essencial naquele tempo, e nós o chamávamos “agregado” ao nosso projeto e todo o tempo convidávamos o Presidente Sanguinetti e o Uruguai para participar.

            E a primeira vantagem do Mercosul foi com o problema da democracia no Continente, porque nós estabelecemos, em primeiro lugar, que só podia fazer parte do Mercosul uma democracia. Nenhum país que tivesse governo totalitário poderia fazer parte do Mercosul. Por isso, não incluíamos o Paraguai, porque àquele tempo era governado pelo Sr. Stroessner; e não incluíamos o Chile, porque naquele tempo ele era governado pelo Sr. Pinochet; como também várias outras ditaduras, como a da Bolívia e de outros países. Não vou citá-las.

            Mas, então, nós iniciamos o nosso projeto. Qual era o nosso objetivo? Nosso objetivo não era estabelecer uma área de livre comércio, não era estabelecer uma união aduaneira. Visávamos fazer aquilo que a Europa havia feito: um mercado comum que seria constituído nesta região pelos nossos países, mercado comum igual ao modelo europeu, no qual integraríamos não somente a economia, mas faríamos a integração física, através da construção de obras que ligassem mais os dois países. E eu já inaugurava a ponte Tancredo Neves, ligando o Brasil, lá em Foz do Iguaçu, a Misiones. Fui inaugurar, junto com o Presidente Alfonsín. Enfim, a integração física, a integração econômica, a integração cultural e a integração política, na qual, nos fóruns mundiais, estivéssemos com posições iguais.

            Para quê? Porque nós nos fortificávamos, nós seríamos mais fortes no debate mundial. Nós seremos mais fortes se estivermos unidos. E, ao mesmo tempo, a complementaridade de nossas economias. Quer dizer, com a integração econômica, nós podemos complementar a economia argentina, e a Argentina pode, naquilo que for do nosso interesse, complementar também a economia brasileira.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite, Senador José Sarney?

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - É importante, quando V. Exª coloca esses objetivos e o exemplo do Mercado Comum Europeu, em especial aquilo em que foi transformado, o Mercado Comum Europeu em União Europeia, o objetivo de nos integrarmos não apenas do ponto de vista dos fatores que V. Exª mencionou, mas também da completa livre movimentação não apenas dos capitais, dos bens e serviços, mas sobretudo daquilo que é o principal: os seres humanos. Avalio que a União Europeia hoje dá um exemplo muito importante para todas as áreas que pensam em se integrar, pois, há trinta anos, os cidadãos de Portugal, da Grécia, da Espanha e de outros países que não podiam tão livremente escolher onde estudar, trabalhar, viver, enfim, hoje podem escolher, entre todas as nações da União Europeia, onde estar. E isso contribuiu muito significativamente também para o progresso e o bom entendimento. Então, avalio que toda vez em que pensarmos no Mercosul será importante que tenhamos essa perspectiva de mais e mais - isso está acontecendo - facilitarmos a liberdade de movimento, não apenas dos bens, serviços e capitais, mas dos seres humanos. Claro que isso será mais fácil na medida em que houver a homogeneização dos direitos sociais das pessoas em nosso Continente, se possível, na América Latina, quem sabe um dia, do Alasca à Patagônia, nas três Américas. Mas eu concordo com V. Exª de ressaltar que será bom que todos os candidatos à Presidência tenham no desenvolvimento do Mercosul uma meta muito importante.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado a V. Exª.

            Eu pulei um pouco, esqueci-me também de lembrar do Caricom, que é o Mercado Comum da América Central e do Caribe, que também existe.

            Estou dizendo essas coisas porque tenho alguns amigos argentinos. No mês passado, tive a oportunidade de receber o vice-Presidente da Província de Corrientes na minha casa e também o Dr. Ricardo Alfonsín, filho do Alfonsín. E eles tinham uma certa preocupação com algumas declarações que haviam saído nos nossos jornais a respeito do Mercosul. Evidentemente que o Mercosul, como todo projeto dessa natureza, tem problemas. Eu mesmo sou um crítico, vou dizer, do rumo que o Mercosul tomou a partir de determinado momento.

            Porque, quando eu e o Alfonsín concebíamos o Mercosul, juntamente com os técnicos que participavam, desejávamos que ele fosse feito como o modelo europeu, isto é, com integração por setores. Depois de integrarmos alguns setores, integraríamos outros, de modo a que não tivéssemos, através de um desnível, os problemas que passamos a ter entre economias desenvolvidas em alguns setores como temos hoje aqui e também na Argentina. Alguns setores industriais brasileiros, naquela época, foram resistentes ao Mercosul, e ainda continuam sendo resistentes, porque eles têm alguns interesses contrariados, interesses que são particulares.

            Mas quero dizer que, de nossa parte, como homens públicos, não temos que ver esses interesses, temos que ver o interesse coletivo do Continente, olhar para o futuro, para a história, para que realmente possamos construir obras duradoiras como essa que acho que é o Mercosul.

            Daí por que eu vejo a expressão de Sanguinetti naquele tempo: “Foi a coisa mais importante depois das nossas independências.” E eu quero agregar uma outra palavra: o Mercosul é o futuro da nossa independência aqui na América do Sul, inclusive porque ele já criou e foi o responsável pela democratização. A maior onda de democratização depois da Segunda Guerra Mundial existiu aqui na América do Sul. Quase todos os países que eram autoritários passaram a ser democracias.

            Então, eu acho que os candidatos nossos devem evitar declarações que, de certo modo, possam levar a interpretações dúbias.

            Por exemplo, outro dia, eu vi o candidato José Serra, que é um homem público de grande categoria e que tem grande experiência, dizer que o Mercosul era uma barreira. Depois, ele teve a oportunidade de dizer que não faz sentido o Brasil ficar carregando o Mercosul. Quer dizer, essas frases ditas assim, dessa maneira, isoladas, revelam uma posição contra o Mercosul, o que é inadmissível.

            Os Srs. Senadores podem ter absoluta certeza: eu não tenho aqui nenhuma observação de ordem política, mas, exclusivamente, na defesa dessa grande obra da qual participei. Eu quero que todos os candidatos estejam unidos em torno de afirmar o que é o Mercosul, o que deve ser o Mercosul, e não fiquem intimidados diante de problemas que estejamos a viver.

            Por exemplo, eu também quero concitar a candidata Marina Silva, eu quero pedir à candidata Dilma Rousseff a colocarem nos programas que estão difundindo em suas candidaturas a defesa do Mercosul.

            Nós, através do Mercosul, enfrentamos aqui aquilo que, no passado, há alguns anos, os Estados Unidos propuseram contra o Mercosul, que era a formação da Alca. Lembram-se todos disto, da Área de Livre Comércio do Alasca à Patagônia, pregada pelo Bush e depois pelo Clinton? E o candidato José Serra é a favor de áreas de livre comércio, censurando o Brasil por perder essa oportunidade.

            Ora, no dia em que abrirmos o nosso mercado, o mercado brasileiro ou o mercado de qualquer País da América Latina, a um grande país como os Estados Unidos, com uma área de livre comércio formada e na qual possam entrar será o domínio de sua economia, voltaremos a ser colônia. Concordo com o Senador Crivella que, no futuro, tenhamos essa oportunidade de ver uma América, toda ela, unida de norte a sul. Mas, no momento, é inteiramente impossível por conta dos desníveis. O Brasil já tem desníveis com relação a outros países da nossa área. O Brasil é um grande País, um País rico, e tem de arcar com a sua grandeza, tem de pagar pela sua grandeza. Nós temos de abrir mão, em muitos momentos, daquilo que pode parecer um interesse momentâneo em benefício dessa unidade continental.

            Outro dia, tivemos aqui a oportunidade de perdoar as dívidas da Bolívia. Está certo! Temos o dever de agir assim. Temos um dever para com o Paraguai, temos o dever de sermos compreensíveis diante das reivindicações que têm. Agora, o que nós não podemos perder de vista jamais é que esse projeto do Mercosul, de um mercado comum latino-americano formado por todos os nossos países, é um sonho. Amanhã, será uma realidade. Portanto, aproveitemos essa campanha eleitoral para que cada candidato, cada partido, possa reafirmar a certeza de que o Mercosul é a grande porta. Que nunca nenhum candidato seja contra o Mercosul ou que não apoie o Mercosul.

            E, por isso, são as minhas palavras. Eu acho que nós não podemos jamais… Sr. Presidente, eu já estou longo, eu não quero ser longo mais ainda. Eu quero aquilo que o Padre Vieira dizia, quer dizer: “Não tenho tempo de ser breve. Mas também que, se formos breves, agradaremos sempre.”

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - O Senador Pedro Simon quer participar.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Com muita honra, Senador Pedro Simon.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Eu felicito V. Exª pela importância de seu pronunciamento. E não há nenhuma dúvida de que V. Exª está se referindo, eu tenho dito isso várias vezes, a uma das matérias mais importantes da América Latina ao longo de muitos e muitos anos, eu diria que desde quando eu me conheço por gente. E, na verdade, foi V. Exª que teve a grandeza de fazer os trabalhos a que está se referindo. Eu me lembro. Eu me lembro que V. Exª, inclusive, iniciou com o Presidente uruguaio uma aproximação com o Presidente argentino. À primeira vista, o Alfonsín parecia - depois ele se revelou realmente uma pessoa fantástica - meio fechado, meio trancado, enquanto que o Presidente uruguaio era uma simpatia total. Lembro-me que V. Exª e o nosso Chanceler usaram o Uruguai para fazer a ligação da aproximação com o Brasil e com a Argentina. Lembro-me que o Uruguai teve a grandeza de entender que nada se podia fazer na América se não começasse com o Brasil e a Argentina, que era a tese de V. Exª. Não adiantava querer falar em unidade da América, Mercosul, qualquer outra coisa senão se esvaziasse aquilo que, sem razão, V. Exª disse existir ao longo do tempo. Com todo o respeito a V. Exª, entendo um pouco mais do que V. Exª a amargura desta questão, porque nós pagamos um preço muito caro no Rio Grande do Sul. A pretexto, não sei do quê, até hoje a metade sul do Rio Grande do Sul e a fronteira, que foi a região mais próspera do Rio Grande do Sul e talvez uma das mais prósperas do Brasil, hoje é uma região que paga um preço muito caro de retrocesso através do tempo. Durante 50 anos, metade do Exército brasileiro estava na fronteira do Brasil com Argentina: Alegrete tem quatro quartéis, Santiago tem quatro quartéis, Uruguaiana tem três quartéis...

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Santa Maria tem quatro.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Santa Maria tem quatro quartéis. Metade do Exército brasileiro, metade das tropas do Exército brasileiro estão ali na fronteira. A estrada de ferro Brasil-Rio Grande do Sul é bitola larga; as estradas de ferro Argentina-Uruguaiana é bitola larga; de Uruguaiana até o fim do Rio Grande do Sul é bitola estreita, para impedir que eles invadissem o Brasil. É isso que V. Exª enfrentou quando assumiu a Presidência. Leis, até hoje nós pagamos caro, até hoje. Uruguaiana é a maior produtora de lã do mundo, e, durante praticamente um século, pagava o frete para retirar a sujeira da lã em São Paulo, porque não podia ter nem lavatório em Uruguaiana. Não digo lanifício, mas nem lavar a lã podia ser feito. E ainda hoje indústrias são proibidas naquela região. Por isso, o trabalho de V. Exª foi um grande trabalho. Acho que a recepção foi muito positiva. Problemas estão sendo enfrentados, inclusive, cá entre nós, porque, a começar pelos Estados Unidos, muita gente não quer, muita gente não quer esse entendimento.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Não, os Estados Unidos não desejam de nenhuma maneira...

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Não quer.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - O Presidente Bush uma vez me perguntou: “Mas, Presidente Sarney, o que é isso?”

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - A pergunta é boa: “O que é isso? Vocês querem se meter a ser gente agora?” Então...

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Bush, o velho. O novo não foi do meu tempo.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - O moço era pior, o moço era pior. Então eu quero reconhecer que V. Exª realmente teve um papel muito importante. E vamos fazer justiça: foi com emoção que eu vi o Collor, que foi de uma deselegância total com V. Exª sempre, quando assumiu, o primeiro ato do Governo dele foi referendar. A gente ficou naquela expectativa, o Collor, oposição, ganhou aqui; o Menem, oposição, ganhou lá.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - É isso que eu desejo: que os Presidentes do Brasil, todos eles, tenham a mesma posição e os mesmos candidatos possam reafirmar…

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Não, mas eu digo que nós perdemos aqui, nós perdemos aqui, e o Governo perdeu na Argentina. No entanto, o primeiro ato do Governo do Collor, junto com o Menem, foi referendar o Mercosul, foi referendar o Mercosul. Eu vejo algumas dúvidas, inclusive um dos candidatos a Presidente tem algumas interrogações. Eu não me assusto com isso. Acho que ele está no direito dele. Mas eu, sinceramente, Presidente Sarney, jogo todas as minhas fichas na integração da América do Sul. Acho que não dá para pensar em outra saída. Não pode a América Latina - que tem todo o minério, a agricultura, a pecuária, tudo o que se pode imaginar - ser um povo quase tão atrasado ou mais do que a África. Temos de nos integrar e nos dar as mãos nesse sentido. Acho grande, a começar por V. Exª, o gesto. Quando a gente vê o que está acontecendo com o Irã, pareceu na verdade piada, mas foi um grande gesto V. Exª convidar o Presidente da Argentina para conhecer o poderio atômico brasileiro. Não é nada, mas era o que a gente tinha. Depois, conhecemos lá, que é menos do que nós, mas um exemplo para este mundo. Foi uma demonstração e - digamos assim - matou aquela interrogação que havia com relação ao Brasil e à Argentina. Felicito-o e acho que esse é um grande trabalho que o Brasil deve a V. Exª.

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP) - Muito obrigado, Senador Simon. V. Exª acompanhou de perto o início de todo aquele processo. Quero terminar minhas palavras, dizendo que o Ministro do Exterior argentino, Sr. Jorge Taiana, teve oportunidade de dizer que o acordo está vivo e que ele tem uma grande projeção no futuro.

            Acho que o Mercosul é o futuro da América Latina na busca de um mundo que futuramente será um mundo só. Esse sem dúvida é o destino do gênero humano.

            Quero dizer outra coisa que o Mercosul fez: ele aproximou o Brasil dos seus vizinhos. Estou falando do Brasil que vivia de costas para nossos vizinhos.

            Hoje, 90% de nossas exportações são destinadas à América Latina, ao Mercosul e aos outros países da América Latina. As nossas exportações cresceram 340%! Quer dizer, não é um projeto que seja somente um projeto de palavras, de retórica; ao contrário, é um projeto que tem bases sólidas.

            Temos problemas. A Europa está com quase 60 anos de Mercado Comum e continua com problemas.

            Então, nessa sucessão presidencial que temos aí, quero apenas pedir ao Presidente Lula que continue a defender o Mercosul; quero pedir aos candidatos que continuem a defender o Mercosul; e ao ex-Governador José Serra e candidato à Presidência que ele não combata e fique contra o Mercosul, que jamais vacile em relação ao Mercosul, não dê declarações que possam parecer que ele seja contra.

            Muito obrigado a V. Exª e a todos os meus colegas pela atenção com que me ouviram.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/06/2010 - Página 25940