Discurso durante a 104ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação sobre o projeto de novo Código Florestal, em tramitação na Câmara dos Deputados.

Autor
Kátia Abreu (DEM - Democratas/TO)
Nome completo: Kátia Regina de Abreu
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA FUNDIARIA.:
  • Manifestação sobre o projeto de novo Código Florestal, em tramitação na Câmara dos Deputados.
Aparteantes
Eduardo Azeredo.
Publicação
Publicação no DSF de 23/06/2010 - Página 30722
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, REFORMULAÇÃO, CODIGO FLORESTAL, CRITICA, INEFICACIA, PROIBIÇÃO, PRODUÇÃO, AREA, RESERVA FLORESTAL, LOCALIZAÇÃO, TERRAS, PRODUTOR RURAL, EFEITO, PREJUIZO, PEQUENO PRODUTOR RURAL.
  • REGISTRO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), DEMONSTRAÇÃO, INFERIORIDADE, PERCENTAGEM, TERRITORIO, BRASIL, PRODUTOR RURAL, INFORMAÇÃO, SUPERIORIDADE, PRESERVAÇÃO, CERRADO, PANTANAL MATO-GROSSENSE, FLORESTA AMAZONICA, MATA ATLANTICA, VEGETAÇÃO, REGIÃO SUL, REGIÃO NORDESTE, COMENTARIO, NUMERO, DEMARCAÇÃO, PARQUE NACIONAL, RESERVA INDIGENA, UNIDADE, CONSERVAÇÃO.
  • CRITICA, ECOLOGISTA, MANIPULAÇÃO, INFORMAÇÃO, SITUAÇÃO, MEIO AMBIENTE, QUESTIONAMENTO, ORADOR, OBJETIVO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), PAIS ESTRANGEIRO, ALEGAÇÕES, DEFESA, MANUTENÇÃO, SUPERIORIDADE, PERCENTAGEM, AREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL, INTERESSE, REDUÇÃO, PRODUÇÃO, PRODUTOR RURAL, AUMENTO, IMPORTAÇÃO, ALIMENTOS, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, DEBATE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Senador Mão Santa.

            Eu gostaria hoje, Sr. Presidente, de conversar com os colegas Senadores e Senadoras e com aqueles brasileiros que nos dão a honra de acompanhar a TV Senado e o trabalho que estamos fazendo no Senado Federal a respeito da questão ambiental, a respeito do Código Florestal, essa grande polêmica nacional, e a respeito das possíveis mudanças, dos possíveis avanços e dos cuidados que nós precisamos ter diante de uma questão tão importante para o Brasil.

            Eu não quero aqui, Sr. Presidente, entrar nos detalhes das mudanças ou não do Código, do relatório do Deputado federal do PCdoB Aldo Rebelo, mas eu gostaria de iniciar falando sobre uma questão fundiária, e não específica e diretamente ambiental.

            Sr. Presidente, os brasileiros têm muita razão em se preocupar com a questão ambiental. O medo das crianças, dos jovens, dos idosos, dos pais e mães de família com relação à questão ambiental é verdadeiro, é preocupante. O meio ambiente precisa de cuidados, mas nós não podemos deixar que um assunto importante, que precisa ser tratado com racionalidade e principalmente com o apoio da ciência se transforme numa religião, se transforme num dogma, sendo proibido tocar nesse assunto, como se a questão ambiental, assim como questões da saúde, questões da educação, questões da violência também não pudessem ser discutidas por esta Casa ou por qualquer brasileiro que assim entender fazê-lo. Um pequeno grupo de pessoas, Sr. Presidente, estabeleceu uma norma: apenas eles podem discutir meio ambiente, apenas eles podem discutir Código Florestal, como se fossem os únicos interessados e os únicos guardiões da questão ambiental no País.

            A nossa preocupação é resolver a questão do Código Florestal sem exageros, sem transformar isso num dogma, numa religião e numa reserva de mercado.

            Portanto, eu gostaria de tentar aqui, com todo esforço e empenho, esclarecer aos meus colegas e àqueles que nos ouvem alguns detalhes importantes que aqueles que se dizem os únicos defensores do meio ambiente não dizem em hora nenhuma. Não dizem e não sei por que não dizem, mas eu gostaria que pudessem vir à público debater comigo, contraditar nas comissões do Senado, ponto por ponto, calmamente, tranquilamente, porque, Sr. Presidente, quem cavalga a razão não precisa usar esporas. E nós procuramos todos os dias cavalgar a razão. Nós não somos donos da verdade. Humildemente, os produtores rurais do País estão procurando aprender sobre meio ambiente, o que é importante de verdade fazer. Porque nós queremos produzir, sim, continuar ajudando o País, mas com a consciência tranquila de que não estamos destruindo o bem natural, aquele que nos favorece.

            E é importante entender que, se para todos a questão ambiental é fundamental, para os produtores rurais do Brasil e de todo o planeta há um componente a mais: os produtores não conseguem produzir satisfatoriamente sem água, os produtores não conseguem produzir satisfatoriamente sem o equilíbrio da biodiversidade, porque, se não, as pragas e as doenças tomarão conta da nossa produção. Nós não podemos produzir em áreas degradadas, porque isso diminui a nossa produtividade e dá prejuízo ao nosso bolso. Então, os produtores rurais são também verdadeiros interessados no equilíbrio ambiental para que a sua produção continue de forma equilibrada e sustentada.

            Portanto, Sr. Presidente, na condição de Senadora, também produtora rural e Presidente da CNA, eu gostaria de aqui dar alguns dados importante, embora os dados, os números às vezes cansam as pessoas, mas são dois dados da maior importância que nós coletamos no Censo Agropecuário do IBGE, que é feito a cada dez anos no País. O último censo foi feito em 2006. Infelizmente, ele só foi publicado neste ano, com quatro anos de atraso. A normalidade são dois anos até que todos os dados possam ser contabilizados, possam ser tabulados. É natural esperar dois anos, mas esperar quatro anos, Sr. Presidente, foi uma perda terrível para o Brasil, mas, de qualquer sorte, nós, com quatro anos de atraso, estamos aqui com o Censo Agropecuário 2006, feito pelo IBGE. E é de lá que nós tiramos estes números que eu quero apresentar ao Brasil e aos nossos colegas Senadores.

            O Brasil inteiro, Sr. Presidente, todo o território nacional tem 850 milhões de hectares. O Brasil é um dos maiores países do mundo. Quando falamos de Código Florestal, da mudança do Código, do avanço e da modernização do Código, não estamos tratando dos 850 milhões de hectares. Por quê? Porque, na verdade, apenas 330 milhões de hectares estão nas mãos dos produtores rurais, nas mãos da iniciativa privada. Portanto, apenas 38,8% - podemos arredondar para 40%, não faz mal -, apenas 40% estão nas mãos dos produtores do Brasil. Mas, se são 40% nas mãos dos produtores rurais do Brasil, o que está sendo feito dentro da propriedade privada no Brasil? Mas e o restante? O restante do Brasil é formado de quê? Por quem? Quem é o dono? Quem está cuidando do restante do Brasil?

            Eu posso dizer a todos que aqui estão: se, dos 851 milhões, 330 milhões, arredondando para mais, são dos produtores rurais, temos 122 milhões de hectares de parques nacionais, de unidades de conservação, criadas pelos órgãos ambientais, municipais, estaduais e federais.

            Mas ainda temos, Sr. Presidente,

            107 milhões de hectares que são reservas indígenas. É só ir somando: 330 milhões dos produtores; 122 milhões de parques nacionais; 107 milhões de reservas indígenas, em que também não se pode produzir nem desmatar.

            Nós ainda temos 2 milhões e 100 que são destinadas às cidades, à infraestrutura das cidades. E ainda temos 150 milhões de hectares de terras devolutas, do Incra, do Governo Federal do nosso País. E 138 milhões de hectares são destinados a “outros usos”. Aí estão incluídos áreas da Marinha, áreas do Exército, ilhas, enfim, uma infinidade de espaços que ainda não está definida pelo IBGE nacional. Mas é fato que, dos 850 milhões de hectares, apenas 330 são dos produtores rurais. Ponto.

            Do que estamos tratando no Código Florestal Brasileiro que mais tem trazido polêmica para a sua mudança? Uma instituição que se chama reserva legal. O que significa reserva legal? Aumenta, diminui, extingue. O que fazer com a reserva legal? Em primeiro lugar, eu gostaria de dizer aos brasileiros, aos Senadores, às Senadoras, que a reserva legal só existe no Brasil. Considerando todo o Planeta, não existe reserva legal em nenhum lugar do mundo.

            Portanto, se um pequeno produtor assentado da reforma agrária ou um pequeno produtor de uma associação que não seja da reforma agrária, se ele tiver dez hectares, 20%, se ele não estiver na Amazônia, é reserva legal, onde ele não pode produzir nada. Se for um produtor de cinco hectares, 20% disso - dois vezes cinco dez - um hectare, e ele não pode produzir nada. Se ele estiver lá na nossa Amazônia e tiver 10 hectares, em 8 hectares ele não pode produzir nada. Só sobram 2 hectares. Se ele estiver lá no cerrado do meu Estado do Tocantins - e ninguém sabe por que a reserva legal do cerrado do Tocantins é maior do que os demais cerrados do Brasil, sendo a mesma vegetação - se esse pequeno produtor de 10 hectares estiver lá no meu Tocantins, ele tem que deixar de reserva legal 35%; portanto, em 3 hectares e meio ele não pode produzir nada. É pouco? É muito? Nós temos que perguntar a esses produtores e também perguntar ao Governo brasileiro com relação à quantidade de produção de alimentos deste País.

            Mas, Sr. Presidente, essa reserva legal surgiu do quê? Surgiu de onde? Quem inventou a reserva legal? Em 1934, o mundo era tocado por carvão à lenha, e o Brasil não era diferente. Portanto, a reserva legal, por incrível que pareça, foi criada para guardar uma reserva para que a madeira, que era matéria prima do carvão, que gerava energia, não acabasse. Essa reserva legal tão decantada foi criada para preservar a queima que viraria carvão; carvão energia. E, hoje, essa reserva legal é tão defendida pelos ambientalistas - alguns deles se julgam os donos da verdade. Eu todo dia procuro ler e estudar, para aprender com humildade, Presidente. Mas esses ambientalistas que se julgam donos da verdade não sabem que essa reserva legal que era para preservar a madeira para queimar, para não faltar energia, foi transformada do dia para a noite numa reserva florestal, numa reserva ambiental.

            O que tem de mais ou de menos nessa transformação, Senador Cristovam Buarque? Eu vou lhe dizer. O que tem de mais ou de menos nessa transformação, Senador Cristovam Buarque? Eu vou lhe dizer.

            As reservas ou os maciços de preservação têm sentido quando garantem os fluxos gênicos, ou seja, o cruzamento dos animais e também a multiplicação das plantas. Portanto, se eu tenho um pedacinho de reserva legal aqui e hectares e hectares de soja, mais um pedacinho de reserva legal de lá, como os animais vão fazer para terem fluxo gênico, para se encontrarem e para fazerem a sua reprodução? Portanto, a reserva legal hoje escrita no Código Florestal Brasileiro, que veio de um outro conceito, não tem sentido científico nenhum. Nenhum!

            Agora, se criarmos os parques nacionais, as unidades de conservação que a lei prevê, se o Governo vai lá, desapropria - mas paga, cumpre a Constituição direito, não faz parque de papel, como está cheio o Brasil e daqui a pouco vamos ver escândalos saindo por aí - e paga o produtor que era o dono, para ele procurar o caminho dele e para ele comprar um outro pedacinho de chão em outro lugar, aí, sim, com um grande maciço de preservação de muitos hectares reunidos, estaremos preservando a biodiversidade e a multiplicação das plantas e dos animais.

            Agora, pergunto a todos, aqui, neste momento: será que é justo um produtor brasileiro que está produzindo arroz e feijão ser penalizado porque não tem reserva legal sendo proibido de produzir nessa área e o Brasil comprar arroz das Filipinas, da China, da Índia, onde nunca ouviram falar sobre reserva legal, onde nunca houve uma legislação ambiental decente?

            Sr. Presidente, na China, aquele tal glifosato, do qual todos reclamam, que é para matar as pragas, as ervas daninhas das lavouras lá na China, aquilo que resta, aquilo que sobra - porque aqui no Brasil é tratado, fiscalizado e aí sim, depois de tratado, jogado no mar ou nos rios - lá vira adubo de novo e é jogado de novo nas plantações, preservando apenas 10% da sua eficácia, sendo 90% de sujeira e impurezas.

            É esse arroz que esses ambientalistas querem que os brasileiros comam?

            Esse arroz nós não vamos comer, Senador Jayme Campos. Vamos comer arroz produzido no Brasil, com toda garantia. Não é justo que eu pegue um produtor rural lá do sul de Minas, que está lá há mais de 200 anos, passando a propriedade e a tradição de pai para filho, dos seus avós e bisavós plantando café, produzindo leite, produzindo frutas em Santa Catarina (maçã), produzindo cana no Nordeste, produzindo arroz no meu Tocantins e assim sucessivamente, e exija que esse produtor brasileiro corte da própria carne, reduzindo sua produção.

            Vamos reduzir? É uma decisão nacional? Se o Brasil quiser que reduza a produção de alimentos, nós só temos que baixar a cabeça e obedecer, mas primeiro os brasileiros precisam saber da verdade, que nós vamos diminuir a produção aqui e que vamos ter de comprar de outro país. Não tem importância. Só que aquele outro país não tem reserva legal, não tem APP em margem de rios, não tem nada. Então, é de uma hipocrisia que nós estamos tratando. Chega de ter medo de tratar essas coisas com transparência.

            Sr. Presidente, quero lembrar ainda mais uma verdade que não é minha, mas está no site do Ministério do Meio Ambiente: o Brasil, de todos os 850 milhões de hectares, como eu citei no início, tem 56% com cobertura original, nativa, que ninguém nunca tirou.

            “É pouco ou é muito, Kátia?” Não sei, mas posso dizer uma coisa: àqueles que estão nos criticando, às ONGs lá da Europa, às ONGs lá do Japão que estão aqui nos criticando eu vou dizer quanto é que têm de área florestal nos seus países. Na Europa inteira não tem 1% de cobertura original, nativa. Aqui tem 56%.

            Lá, Sr. Presidente, as ONGs, aquelas mais duras e críticas com relação à produção do Brasil, que vêm lá da Europa, por que não exigem reserva legal dos europeus? Quer dizer que nós vamos diminuir a área de produção de leite aqui e comprar leite dos franceses, comprar leite da Itália, comprar leite e carne da Inglaterra, que não têm reserva legal e têm menos de 1% de cobertura original para prejudicar os brasileiros?! A que interesse isso serve, Sr. Presidente?

            Quero aqui mencionar os biomas do Brasil e suas preservações. O Bioma Pantanal, lá no seu Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul, Senador Jayme Campos. Lá tem 86% preservados.

            O bioma pampa, lá no Rio Grande do Sul, do Senador Pedro Simon, do Deputado Onix Lorenzoni, do Deputado Heinze, tem 41% preservados. O bioma caatinga, no Nordeste brasileiro, tem 63% preservados. O bioma cerrado tem 51% preservados, a metade. O bioma amazônico está com 85% preservados. E a floresta Atlântica, que tem a menor parte, 27% preservados. Por que, Sr. Presidente, que a Mata Atlântica tem menos espaço preservado e mais áreas abertas com alimentos?

            Eu quero lembrar que o Brasil do interior não existia. O Brasil do interior só veio existir depois de Brasília, em 1960, com Juscelino Kubitschek. Até então o Brasil só existia na Mata Atlântica, o Brasil só existia até a Serra do Mar e era natural que as pessoas se desenvolvessem naquelas áreas onde estavam morando. Portanto, é por isso que hoje o desmatamento lá é proibido. Existem centenas de ações para aumentar e recompor um pouco mais da Mata Atlântica do nosso País.

            O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senadora...

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Senador Azeredo, Minas Gerais, PSDB, pois não.

            O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senadora, nós sentimos sua falta ontem lá em Uberaba. Eu estive lá acompanhando o Governador José Serra, no debate na ABCZ Zebu. E uma das coisas que foi colocada lá - e acho muito importante - é a questão de que as matas ciliares, aquelas matas que seguem os rios não são contadas como reserva, e deveriam ser contadas como reserva. E é um ponto que me pareceu muito sensato. Aquilo ali que poderia eventualmente ser utilizada também como área agriculturável, como área de pastagem. E, na verdade, quando o produtor protege o rio, fazendo a mata ciliar, ele está fazendo reserva, e isso não é utilizado como reserva.

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Exatamente, Senador. Infelizmente, não pude estar presente a esse importante debate com a presença do candidato José Serra, em Uberaba, apesar de ter recebido o convite, mas não faltará oportunidade.

            Dia 1º de julho, às 9h da manhã, na CNA, nós receberemos os candidatos e transmitiremos ao vivo o encontro. Estarão lá José Serra e Marina Silva. Infelizmente, a Ministra Dilma não encontrou possibilidade de participação na agenda, mas, em outra oportunidade, nós também abriremos para ouvir a Ministra Dilma na CNA.

            Essa questão também é importantíssima. Além da reserva legal, as propriedades do Brasil têm a obrigatoriedade de deixar tantos metros à margem dos rios. E isso é importante. As margens dos rios, que se chamam matas ciliares, são da maior importância para a preservação da água. Essa é a grande discussão. As margens dos rios e as matas ciliares são os verdadeiros espaços, os corredores ecológicos que o Brasil pode ter, até chegando ao mar.

            Sr. Presidente, quero aqui lembrar o que significa, na realidade, essa reserva legal. Do que estamos falando quando exigimos, lá do Rio Grande do Sul, que, de repente, recomponha os 20% da sua reserva legal?

            Eu recomendo a leitura de um livro lançado há pouco do grande escritor Jorge Caldeira, que conta a história do Brasil pelos empreendedores. Sem falar de questão ambiental absolutamente, ele demonstra a grandeza e o crescimento da produção brasileira em mil oitocentos e tantos anos. Em 1800, a área de trigo plantada no Rio Grande passou de sete mil hectares para 212. Portanto, naquela época, não existia reserva legal.

            E temos uma Constituição que garante às pessoas a não retroatividade da lei principalmente sem indenização.

            Agora, quero ainda lembrar que, desses 320 milhões de hectares, Senador Jayme Campos e Senador Delcídio Amaral, de dois Estados extremamente produtores - 38% do Brasil na mão dos produtores -, o Censo IBGE 2006 já constatou que 93% já estão compostos com cobertura original. Há dez anos, no penúltimo censo, eram 56 milhões de hectares nas propriedades privadas. Hoje, já temos 93 milhões de hectares, quase o dobro em dez anos, de aumento de vegetação original.

            Alguém poderia perguntar com muita razão: “Então, o Código Florestal é muito bom. Ele está aumentando a área de vegetação original nas fazendas desses produtores.” Sr. Presidente, a conta é muito simples. Qualquer criança em qualquer colégio pode fazer. Se já temos 330 milhões na mão de produtores, tirem 13 milhões - que são a parte dos rios, das construções, das estradas e aquelas áreas que só com milagre de Deus para produzir, pois não servem para produção - e já se passa para 317. Retirem os 98 milhões de hectares de cobertura original nas fazendas, já caímos para 219. O Brasil tem 851! Mas vamos esperar mais dez anos pelo próximo censo, Senador Jayme Campos, para também mais 98 a 100 milhões de hectares serem retirados de 219 e ficarmos apenas com 100 milhões de hectares para produzir?

            Sou legalista. Se a lei determinar que é para o Brasil virar uma grande reserva legal do mundo, nós, produtores rurais, queremos cumprir. Mas a sociedade, os brasileiros têm que conhecer a verdade nos detalhes para nos ajudar a decidir. Como é que a sociedade decide e nos ajuda a decidir? Através dos seus parlamentares, através dos seus Deputados e Senadores, na base, ela pode se manifestar, sim.

            Então, com 850 milhões de hectares de um Brasil extraordinário, um Brasil plano, com terras férteis, com água abundante, com seis biomas extraordinários, uma riqueza infinita, nós temos o direito de decidir que este Brasil inteiro vai virar reserva legal lá dos franceses, dos ingleses, dos alemães, dos japoneses, que solaparam toda a sua reserva?

            Eu pergunto aos ambientalistas, aos presidentes e representantes das ONGs: o que estão fazendo em seus países para que eles possam recompor a sua reserva legal?

            O Brasil é o segundo país do mundo em cobertura original, mas devia ser o primeiro. Por quê? Porque o primeiro é a Rússia e o terceiro é o Canadá. Adivinhem por quê. Porque só têm gelo. Então, de verdade, quem está abrindo mão de áreas produtivas férteis em favor do meio ambiente somos nós.

            E por que os ambientalistas xiitas, radicais, extremistas não falam isso para o mundo e para o Brasil? Por que também não fazer elogios ao que nós estamos fazendo?

            Nós somos a maior e melhor agricultura deste planeta, porque nós somos campeões em produção e produtividade e ainda mantivemos 56% da nossa cobertura original. E a senhora Europa nem 1% tem; a África hoje tem 7,5%; a Ásia tem 5,6%. E nós temos 56%.

            Que dia o Sr. Greenpeace já disse isso? Que dia que todas elas já disseram isso? Está no site do Ministério do Meio Ambiente...

(Interrupção do som.)

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Não está no site da CNA, não, Sr. Presidente. Está no site do Governo Federal.

            E, quando se fala, Senadores, em competência concorrente, eles querem ser melhores e maiores do que a Constituição Federal, aprovada nesta Casa em 1988, a nossa Constituinte reformada. Ou seja, em 1988, o Congresso Nacional votou o seguinte: “Matéria de meio ambiente não é mais de competência exclusiva da União. Matéria de meio ambiente é de competência concorrente.” Significa que esta Casa e a Câmara só podem legislar as normas gerais, e os detalhes são enviados para os Estados para que cada um cuide das suas características, dos seus biomas e das suas peculiaridades.

            Ah, mas os Governadores são todos uns irresponsáveis, vão destruir o meio ambiente, vão deixar que tudo se acabe...

(Interrupção do som.)

(Fora do microfone.)

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Engraçado, Sr. Presidente, eu nunca vi ninguém reclamando que a saúde, que a educação foram para os Estados e segurança pública também. Eu nunca vi ninguém reclamando disso! Tudo bem que essas áreas não vão bem, mas os Estados e os Municípios, de dez anos para cá, aumentaram, com exorbitância, os seus gastos com saúde e educação, e a União diminuiu os seus gastos com saúde. Portanto, não é bem assim, não. E eu poderia citar aqui o nome de uma infinidade de Governadores que têm espírito público, que são responsáveis, que são políticos com idoneidade e que sabem cuidar dos seus Estados.

            Fora isso, para aqueles que não têm tanta responsabilidade, nós temos uma instituição que é chamada Ministério Público Federal, nós temos as ONGs, aquelas de boa-fé que podem fiscalizar os Estados. Agora, sabem por que não querem a competência concorrente, Senador Delcídio? Eu imagino, tenho algumas suposições...

(Interrupção do som.)

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Não querem perder o poder político e nem o poder financeiro com a descentralização extremamente democrática da questão ambiental. Querem ficar concentrados em Brasília, dentro do Congresso Nacional, com os recursos do Ministério, querendo indicar ministro, querendo indicar políticas públicas etc. Quero ver essas ONGs fazerem política lá em Dourados, lá no Axixá do Tocantins, lá em Campo Grande; quero ver elas irem lá para o Pantanal. Eu quero ver elas rodarem o Brasil inteiro, lá na Amazônia, onde tem malária, onde tem dificuldades, não tem luz, não tem estradas... Vão fazer manifestação de ONG no interior do Brasil, como nós políticos vamos para o nosso interior e o conhecemos como a palma da mão. Não querem sair de Brasília. Querem ter o controle político e financeiro das ações de meio ambiente. Por isso não querem a competência concorrente. Não existe argumento. Está na Constituição Federal. E nós precisamos ter a coragem, e nós temos, de votar para que os Estados, com suas Assembleias, e confiando nas instituições estaduais,...

(Interrupção do som.)

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - ...no Ministério Público, no nosso Judiciário, nas instituições civis, para que elas possam fiscalizar.

            E aqui no Senado e na Câmara não vamos deixar ir de qualquer jeito para os Estados, não. Nós vamos votar aqui as regras gerais, vamos amarrar tudo aqui direitinho, para não deixar ninguém solapar o Brasil.

            Estamos propondo uma moratória de cinco anos, enquanto não fizer o zoneamento econômico e ecológico, que tem quase vinte anos e não teve dinheiro. Não teve dinheiro do Orçamento para poder fazer zoneamento no Brasil inteiro. Essa é a importância que se dá ao meio ambiente.

            Aqui, no Brasil, Sr. Presidente, Ministro de Meio Ambiente está fazendo gincana, competição, para o seu currículo, de quem saiu do Ministério com o maior número de hectares desapropriados para Unidade de Conservação, de forma irresponsável.

            O jornal O Globo vai soltar matéria esses dias: nós precisamos de R$30 bilhões para pagar aos produtores que tiveram suas terras desapropriadas para se tornarem áreas de conservação...

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Conclua, Senadora.

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - ...e não foram indenizados.

            Só na Serra da Bodoquena, no Mato Grosso do Sul, há 42 anos, uma área foi desapropriada e os produtores jamais foram indenizados. Agora, há pouco, no Paraná, um juiz federal deu ganho de causa a uma associação de pescadores que, há 13 anos, teve sua área decretada como Unidade de Conservação e os pobres pescadores nunca foram indenizadas, pessoas humildes, pobres, que não receberam indenização. O juiz mandou devolver à associação essa unidade de papel, como ele diz em sua decisão. Irresponsabilidade total.

            Mas são craques, Sr. Presidente, são craques para entrar na rede, na Internet, e ficar o dia todo plantado, batendo papo na rede e enganando pessoas.

            Basta, Sr. Presidente!

            A juventude brasileira, essa que está na rede da Internet, que está procurando se atualizar com as informações, que ela possa estar atenta e ouvir todas as versões e não só uma mentira, uma farsa que pretendem contar no Brasil.

            Eu agora quero ver o que vão dizer...

(Interrupção do som.)

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Último minuto, Sr. Presidente.

            Eu aqui quero ver o que vão dizer de Aldo Rebelo, porque, enquanto os ruralistas eram os relatores das matérias de meio ambiente, é porque eram parciais, queriam destruir o mundo todo, iriam desmatar tudo. E agora? E agora? Aldo Rebelo é do PCdoB, do Partido Comunista, não é produtor rural, um homem da maior dignidade, da maior integridade, de uma folha corrida exemplar e está lá relatando o Código Florestal com maestria, com brilhantismo, ouvindo todas as pessoas, mas principalmente ouvindo a ciência e ouvindo o bom senso de um nordestino que tem sangue nas veias e que conhece as dificuldades dos pequenos produtores do Nordeste. Das cinco milhões de propriedades rurais deste Brasil, 49% estão no Nordeste: são pequenas propriedades, de pessoas pobres, humildes.

            Encerro, Sr. Presidente, dizendo que, dos cinco milhões de produtores rurais deste País, 2,7 milhões, mais da metade, segundo o IBGE, Censo Agropecuário 2006, produzem apenas 8% do VBP nacional. Toda a agropecuária brasileira produz em torno de R$243 bilhões. Portanto, 2.785.000 produtores, dos R$243 bilhões, produzem apenas R$3 bilhões. O senhor acha que isso é motivo de comemoração? Não é, Sr. Presidente. Digo isto com muita tristeza. Oito por cento do Valor Bruto da Produção significa, Senador Arthur Virgílio, que essas famílias recebem, por ano, R$6.900,00. Se dividirmos por doze, essas famílias recebem R$580,00 por mês, famílias de quatro, cinco ou seis pessoas. Isto significa que estão abaixo da linha da pobreza se nós dividirmos esse salário pelos quatro componentes da família. É desse pessoal que nós vamos exigir reserva legal num País de 850 milhões de hectares, que só tem 330 na mão dos produtores com menos 98 de reserva já em pé, com menos 12 em que não se produz nada? Um País de 850, que, na verdade, hoje, tem menos de 250 à disposição da produção, nós podemos exigir o quê dessas pessoas? São pobres, são pessoas pobres. E não estou aqui usando da pobreza deles, da sua fragilidade para convencer ninguém. Nós temos os outros 2.100.000 produtores que produzem 91% do VBP.

            Engano daqueles que querem mentir para o Brasil e dizer que esse Código era para proteger os grandes produtores.

(Interrupção do som.)

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Para proteger grande produtor, Senador Mão Santa, os grandes produtores têm dinheiro para fazer a sua reserva legal. A tristeza é que os pequenos e os médios não têm R$10 mil por hectare para recompor floresta nativa.

            Ligue para dez, vinte, trinta empresas de reflorestamento e pergunte quanto custa. Agora, ligue para a Embrapa também e pergunte se tem muda e se tem semente. Ligue e pergunte. Então, nós estamos aqui defendendo o quê? Uma farsa? É esse o Brasil que nós queremos?

            Encerro dizendo que um industrial, em São Paulo, há alguns poucos dias, me disse: “Eu não entendo vocês, Kátia, produtores rurais. Sinceramente, não entendo vocês. Vocês pensam que são Presidente da República, vocês pensam que são Ministros?!” Eu levei um choque. “O que o senhor está querendo com isso?” “Não, porque vocês ficam brigando para aumentar a área de produção. Aumenta a área de produção, aumenta a comida. Se aumenta muito a comida, o preço cai e vocês é que perdem. Quer dizer, vocês estão fazendo o papel do Governo e o Governo fazendo o papel de vocês. Na realidade, vocês é que tinham que estar torcendo para diminuir a área, para produzir menos e o preço de vocês subir e vocês saírem dessa pobreza em que estão e dessas dívidas que vocês não dão conta de pagar nunca”.

            Eu, sinceramente, Sr. Presidente, levei um choque. Levei um choque de realidade. Nós estamos desempenhando um papel que não é nosso. Nós queremos que o Governo brasileiro abra a boca e diga o que quer de nós. É para reduzir a área de plantio? Vamos reduzir área de plantio. Se a Base do Governo quer isso, vamos votar, mas que arque com as consequências. Há quarenta anos, a família brasileira pobre e da classe média gastava 50% da sua renda com comida; hoje gasta 18%. Que arquem com essa responsabilidade. Com a diferença dos 18% para os 50% que gastavam no passado, compraram televisão, geladeira, carro, puseram seus filhos na universidade, o Brasil cresceu, a indústria se implementou... Quer dizer, a agricultura faz bem a todos, só não faz bem a ela própria.

            Concedo um aparte, para encerrar, ao Senador Cristovam.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Ele está inscrito e é o próximo. Aparte não. Aí V. Exª terá cassada a inscrição. Ele é o próximo orador. Ele comenta.

            Eu chamo para a tribuna o próximo orador, Cristovam Buarque.

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Obrigada, Sr. Presidente.


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