Discurso durante a 110ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a compra, por estrangeiros, de grandes extensões de terras agricultáveis brasileiras, anunciando que lutará pela aprovação de projeto que limite o tamanho das propriedades a serem registradas por pessoas ou empresas de outros países. Comentários sobre a não participação de S.ExA., nas próximas eleições, como candidata ao Senado Federal pelo Estado de Mato Grosso.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Preocupação com a compra, por estrangeiros, de grandes extensões de terras agricultáveis brasileiras, anunciando que lutará pela aprovação de projeto que limite o tamanho das propriedades a serem registradas por pessoas ou empresas de outros países. Comentários sobre a não participação de S.ExA., nas próximas eleições, como candidata ao Senado Federal pelo Estado de Mato Grosso.
Aparteantes
Cristovam Buarque, José Nery.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/2010 - Página 32378
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • APREENSÃO, AQUISIÇÃO, TERRAS, BRASIL, CIDADÃO, ESTRANGEIRO, REGISTRO, PERIGO, SOBERANIA, SEGURANÇA NACIONAL, IMPORTANCIA, DECISÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, IMPOSIÇÃO, OBRIGATORIEDADE, PROPRIETARIO, OBTENÇÃO, AUTORIZAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (AGU).
  • APOIO, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, PUBLICAÇÃO, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEFESA, ELABORAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, LIMITAÇÃO, EXTENSÃO, TERRAS, AQUISIÇÃO, ESTRANGEIRO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), SUPERIORIDADE, CONCENTRAÇÃO, TERRAS, EMPRESA INTERNACIONAL, REGIÃO CENTRO OESTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT).
  • CRITICA, DECISÃO, DIRETORIO ESTADUAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), IMPEDIMENTO, CANDIDATURA, ORADOR, REELEIÇÃO, SENADO, REGISTRO, FRUSTRAÇÃO, POPULAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), COMENTARIO, EMPENHO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Mão Santa.

            Senador Nery, essa discussão de haver sessão amanhã é muito complicada, muito difícil, porque só poderemos saber se haverá sessão ou não se houver quórum para a sua abertura.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Senadora Serys, o Presidente já determinou isso. Fiz a leitura do documento, como Secretário.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - É difícil de cancelá-la.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Eu queria ser o Presidente, mas não sou. O Presidente é S. Exª. Aliás, eu queria estar no lugar do Luiz Inácio, mas o povo ainda não quis assim.

            Continua com a palavra a Senadora Serys Slhessarenko.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Amanhã, o Brasil haverá de ganhar, não é? Isso é o que importa. O resto a gente discute depois.

            Sr. Presidente, hoje, eu gostaria de tratar de um assunto complexo, complicadíssimo, eu diria, que já é de conhecimento mundial: com suas terras agricultáveis, com aproximadamente trezentos milhões de hectares de terra agricultável, o Brasil é celeiro para alimentos e bioenergia. Nos quatorze países de maior aérea agrícola no mundo, 49% das terras agricultáveis ainda estão disponíveis para plantio. Poucos, contudo, têm potencial, como o Brasil, para expandir fortemente o cultivo de grãos, de forma que a oferta possa atender à simultânea e crescente demanda das áreas de alimentos e biocombustíveis. É esse aspecto único que torna nosso País tão atrativo.

            Um bom exemplo está no Piauí, na terra do Senador Mão Santa. O Piauí é um dos Estados que mais recebem capital externo. Lá, as terras tiveram uma valorização de 70% em três anos. Os números apresentados foram tão expressivos, que o Presidente Lula, preocupado com o ritmo desses investimentos, decidiu impor restrições à compra de terras por cidadãos estrangeiros. Há muito estrangeiro comprando terra no Brasil inteiro, inclusive no seu Estado. Já no lançamento do Plano Safra 2010-2011, nosso Presidente alertou que “uma coisa é comprar uma usina, comprar uma fábrica; outra coisa é comprar terra”. Estrangeiro pode comprar terra, sim, mas não vai querer comprar duzentos mil hectares, um milhão de hectares, não! Não podemos entregar nossa terra. Completou o Presidente: “Daqui a pouco, vamos ficar [brasileiros e brasileiras] com um território diminuto”.

            A preocupação do nosso Governo, do Ministério Público Federal (MPF) e da Advocacia-Geral da União (AGU) faz sentido. Não é possível admitir o absurdo, por exemplo, da compra de terras pelo norte-coreano Sun Myung Moon, o Reverendo Moon, em Mato Grosso e no Paraguai, o que criou uma espécie de zona neutra na fronteira. Não tenho dados do Paraguai, mas, na parte brasileira, são oitenta mil hectares. A meu ver, isso fere nossa soberania e fragiliza nossa segurança nacional.

            Outro exemplo preocupante são as terras adquiridas pelo sueco Johan Eliasch, que hoje é proprietário, Senador Mão Santa, de 160 mil hectares de terra na Amazônia. E, depois, alguns estrangeiros por aí querem dizer que o Brasil não está cuidando da Amazônia. Quando se está permitindo a venda de 150 mil hectares ou 200 mil hectares na Amazônia para estrangeiro, não se está cuidando mesmo! Mas quem está estragando aquela região não são os brasileiros. Então, devemos começar a cuidar, para que não se vendam extensões tão grandes de terra para estrangeiros.

            Queremos que para cá venham recursos, sim. Queremos estrangeiros participando conosco desse processo, trazendo desenvolvimento ao Brasil, gerando emprego. Queremos desenvolvimento econômico com sustentabilidade ambiental. Queremos tudo isso, mas não queremos que tomem posse de todas as nossas terras. Defendo que não devemos extinguir totalmente a aquisição de terras por estrangeiros, como acabo de dizer, mas deveremos disciplinar essa questão, limitando o tamanho dos módulos e também direcionando a produção de maneira a atender os interesses comerciais do Brasil.

            Segundo o jornalista Lúcio Vaz, do Correio, em matéria publicada no dia 13 de junho, portugueses, italianos e japoneses são os três principais responsáveis por empresas do exterior em solo brasileiro. Em Mato Grosso, a cidade com a mais alta concentração de terras com estrangeiros é Porto Alegre do Norte. Lá, três famílias italianas e uma empresa agropecuária, a Frenova, ocupam cerca de oitenta mil hectares, em um só Município.

            Fica evidente que precisamos restringir urgentemente a legislação que possibilita essas compras. Os números são muito expressivos. É muito preocupante. Vejam que pelo menos 1,1 milhão de hectares estão em poder de pessoas físicas e de empresas dessas três nacionalidades.

            Outra reportagem publicada pelo jornal Correio Braziliense mostrou que existem 4,3 milhões de hectares de terras brasileiras nas mãos de estrangeiros. Estão distribuídas em 3,6 mil Municípios - são aproximadamente 5,8 mil Municípios -, mas se concentram nos Estados do Centro-Oeste e do Sudeste, onde existem as terras mais férteis e apropriadas para a produção de grãos. Destaca-se Mato Grosso, com 844 mil hectares ocupados. A competição com os países mais desenvolvidos já elevou o preço das propriedades em cerca de 300% em algumas regiões nos últimos quatro anos. E isso, senhoras e senhores, é apenas uma amostragem, porque os técnicos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) avaliam que a quantidade de terras nas mãos dos estrangeiros deve ser muito maior.

            A solução parece estar a caminho, senhoras e senhores, e virá a partir de mudanças no parecer da AGU sobre o assunto. Para assumir o controle da ação das multinacionais, o Governo do Presidente Lula, o Governo Federal, anunciou a imposição da obrigatoriedade de que empresas brasileiras controladas por estrangeiros tenham de adquirir licença do Incra para a compra de fazendas. Podem comprar, devem comprar, mas têm de ter autorização para que esse excesso de terra passe para estrangeiros. Com essa mudança, uma pessoa jurídica, no Brasil, ainda que tenha o controle majoritário de estrangeiro, terá limites impostos pela licença do Incra e da AGU para adquirir terras no Brasil. O problema aí é que temos de fazer o Incra funcionar. Esse é um problema sério.

            O Procurador Federal Marco Antônio alerta que a China decidiu comprar terras na África e no Brasil. Já existe previsão de compra de mais de duzentos mil hectares em regiões como o Maranhão, o Tocantins e outras. O MPF destaca que fica evidente a intenção da China em adquirir terras no Brasil: “Eles querem toda a cadeia produtiva [é normal que queiram isso, que busquem isso, esse não é o problema; o problema é não se apropriarem de tão grandes extensões de terra]. Querem plantar em suas terras adquiridas no Brasil, colher e exportar para si e para outros países, e isso não é bom nem para o nosso País e muito menos para os nossos produtores [para os brasileiros e as brasileiras que aqui produzem]”.

            A terra é nossa. Não podemos deixar que tomem conta, daqui a pouco, da maior parte das terras do Brasil. A terra é nossa, mas não negamos que os estrangeiros podem comprá-las, mas em porções, em módulos limitados. Então, que se delimite isso, porque deixar que isso seja feito de forma ilimitada como é hoje não é bom para o Brasil e muito menos para os nossos produtores.

            Nosso Governo entende que a decisão de restringir a aquisição de terras brasileiras por estrangeiros tem como pano de fundo o aumento da demanda mundial por recursos naturais, como a escassez de água e a crise de alimentos, a elevação dos preços das terras e os impactos sobre populações pobres no acesso à terra. “Vamos fazer [vai ser feita, aliás] uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) para deixar claro aos investidores que podem investir [e devem investir] em qualquer campo, mas não em terras [na compra de grandes extensões de terra]”, informou o Ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, ao jornal Valor Econômico, num claro recado do que está por vir.

            A PEC, Senador Nery, realmente, terá de ter poder bem amplo, para que ponhamos um fim nessa história de estrangeiros comprarem 160 mil, 180 mil hectares de terra. “Terra não é um assunto qualquer. Tem de cumprir a função social. Como cobrar isso de um fundo estrangeiro que comprou metade do Norte do País?”, questiona nosso Ministro Cassel.

            Concedo um aparte ao Senador José Nery.

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Minha querida Senadora Serys Slhessarenko, V. Exª aborda um tema da mais alta importância para a soberania do nosso País e tem aqui a minha inteira e absoluta solidariedade com todos os esforços, para que possamos ter parâmetros, regras muito claras em relação à aquisição de terras por estrangeiros, porque isso está se transformando em algo inaceitável e que compromete a soberania do País. É essa a questão. Eu queria também dizer a V. Exª que, em debate realizado nos últimos dias com membros do Instituto de Terras do Pará (Iterpa), em especial com o Dr. José Heder Benatti, Presidente do Iterpa, tratamos de uma questão para a qual temos de dar absoluta importância e prioridade. Trata-se da limitação do tamanho da propriedade no Brasil. Hoje, não há regras sobre isso. Inclusive, estou propondo que a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa... E já aproveito para solicitar a participação de V. Exª em uma audiência pública que queremos realizar no segundo semestre, no âmbito da Comissão de Legislação Participativa, justamente abordando com especialistas, e inclusive tendo como referência alguns países que já estabelecem claramente um limite da propriedade como algo importante para a democratização do acesso, para a igualdade de condições na obtenção de áreas rurais ou urbanas. De modo que o tema que a senhora aborda tem alta relevância para o País e conta, sob todas as formas, com o nosso irrestrito apoio nessa limitação para estrangeiros, que muitas vezes se servem de “laranjas” brasileiros para adquirir extensas áreas de terra em nosso País, especialmente na Amazônia brasileira. Parabéns a V. Exª. Desculpe-me, não tive a informação final. Fizemos, há algum tempo, um movimento por Serys candidata. Não sei se surtiu algum efeito, mas, então, a senhora foi mesmo...

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Fui banida da política.

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - A senhora foi banida, eu diria, momentaneamente, mas eu soube que V. Exª recebeu apelos para ter alguma tarefa nas eleições de 2010 em seu Estado de Mato Grosso. Sei que foram muitos os apelos, mas, infelizmente, eu não tive condições de ter a informação. E por isso, aqui, de público,...

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Obrigada.

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Queria dizer, mais uma vez, que essa decisão de V. Exª, que sei que não é tomada por mágoa, é uma decisão que, com certeza, enfraquece a participação do povo de Mato Grosso, do povo que luta e acredita em dignidade e em justiça, que concedeu a V. Exª vários mandatos legislativos: na Assembleia Legislativa e aqui, no Senado Federal. Digo a V. Exª que esse é um prejuízo incalculável para a política do seu Estado e para a política brasileira, porque aqui V. Exª sempre esteve associada ao que há de melhor na luta política do povo brasileiro e do Parlamento brasileiro, do Senado Federal, para firmar conquistas do nosso povo. Então, queria dizer que é lamentável, acho lamentável que esse processo tenha conduzido V. Exª a uma decisão dessa magnitude. Mas, sem dúvida, tenho certeza de que, se não foi agora, o povo do Mato Grosso não perde por esperar, porque Serys é sinônimo de lealdade, de compromisso e de luta. E aqui V. Exª conseguiu, no seu mandato, com a sua luta, o respeito de todos. Com certeza, fará muita falta ao Parlamento brasileiro a sua contundência, a sua vontade, a sua energia, a sua inteligência e o seu compromisso. Portanto, não me canso de homenageá-la, porque sei do compromisso de V. Exª para com este país. Um grande abraço. Muito obrigado a V. Exª.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Obrigada, Senador. Realmente, o senhor complementou bem, muito bem, aliás, o meu discurso, o discurso que estou fazendo sobre essa questão das terras estrangeiras.

            E também agradeço a sua solidariedade com o que aconteceu comigo em Mato Grosso. Realmente, o senhor tem razão quando disse que há uma voz de conclamação pela nossa estada na política.

            Senador José Nery, é complicado. Realmente, a voz do povo está sendo muito forte. Há uma conclamação geral de todas as pontas do nosso Estado, de ponta a ponta do meu Estado de Mato Grosso. E eu diria que até de uma forma diferente, porque é independente, praticamente, da coloração partidária. Mas os políticos que se julgam - alguns - donos de partido, como o Presidente do meu partido em Mato Grosso, que se julga proprietário do partido, eles realmente decidiram que eu deveria ficar fora da política.

            Costumo dizer que eu, como mulher, até os nossos dias, em Mato Grosso, fui a única mulher que chegou ao patamar mais alto do poder em nosso País. Também sou a única mulher que fez política sem ter - e isto não em termos pejorativo - nenhum parente na política. Nenhum parente. Como diz a música, não tenho dinheiro no bolso nem parentes importantes vindo do interior. Não tenho. As outras mulheres que fazem política - isto não é menosprezo -, todas, o marido é político ou foi político, ou o pai, ou alguém. Eu não. Eu segui realmente um caminho de conquista do poder, em especial para a mulher.

            Pois não, Senador.

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Senadora Serys, permita-me, é até antirregimental, mas quero completar. Desculpe-me insistir: pense, ainda há tempo. Eu queria dizer isso a V. Exª porque sei que há aqueles que acreditam no tipo de política que V. Exª exerce no concreto, no dia a dia. Apesar de todos os aspectos negativos e de todas as manobras sórdidas que fizeram para impedir que V. Exª fosse candidata à reeleição ao Senado da República pelo Estado de Mato Grosso, V. Exª tem de pensar que, como V. Exª mesma diz, e tenho certeza disso, parcela significativa do povo de Mato Grosso ficará órfã de uma ação política da envergadura, do compromisso de V. Exª. Então, desculpe-me a insistência, mas estou aqui com o testemunho do Senador Cristovam Buarque, pois, logo que soubemos daqueles fatos em seu Estado em relação à sua não candidatura à reeleição, aqui dissemos a V. Exª: nós faremos o movimento “Serys candidata”, porque sabemos que o povo de Mato Grosso não pode ser privado do direito de ter um representante com a dignidade, com a seriedade, com a lealdade de V. Exª. Então, desculpe-me insistir, mas V. Exª ainda pode pensar. Qualquer gesto de V. Exª sempre será um gesto de grandeza, mas, eu diria - desculpe-me, sei que sua decisão está tomada - que, como ainda há tempo, pense, pois o povo de Mato Grosso quer ver V. Exª representando-o. Se não for no Senado, em qualquer outro espaço, pois V. Exª será sempre a Senadora Serys, a lutadora do povo de Mato Grosso e do povo brasileiro. Desculpe-me a insistência, mas acho que é o meu dever, porque conheço V. Exª e tenho admiração pelo seu trabalho e pela sua luta. Se não fosse isso, eu não insistiria tanto. Um abraço. Peço a V. Exª que pense, pois ainda há tempo. Muito obrigado.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Obrigada, obrigada mais uma vez, Senador José Nery. As suas palavras nos sensibilizam profundamente. Um Senador da República, com a respeitabilidade, o compromisso, a seriedade e a dignidade de V. Exª, dizer-nos isso é realmente profundo e mexe com a nossa pessoa em termos de ter de tomar uma decisão, como a que tivemos de tomar.

            Mas preciso deixar isso muito claro, especialmente para a população de Mato Grosso. Dezenas de prefeitos me ligaram no dia de hoje, muitos vereadores, e todos, absolutamente inconformados. Mas fazer o quê? Grupos, pessoas e principalmente o meu partido, em Mato Grosso, disseram “não” à possibilidade de os mato-grossenses e as mato-grossenses avaliarem meu mandato. Gostaria que tivessem deixado que os eleitores e as eleitoras de Mato Grosso avaliassem. Infelizmente, parte do meu partido disse “não”, mas a população está lá, está vendo e sabe. Eu pelo menos tenho muita clareza: não nasci política, mas nasci com dignidade; e pretendo não morrer política: pretendo morrer com dignidade.

            O Senador Cristovam está pedindo um aparte, se não estou equivocada?

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senadora Serys, duas coisas. E olha que estou aqui, fora da reunião que está decidindo quem será meu candidato a suplente na próxima eleição. Mas não posso deixar de falar duas coisas. Primeiro, quero manifestar a minha solidariedade à sua luta pela propriedade da terra em nome de brasileiros. É um abandono da soberania vender terras a estrangeiro. Em vender um terreno de uma casa não há problema, mas as grandes propriedades, como a gente tem visto, na fronteira é um perigo. Vendem-se alguns milhares de hectares, e ali vira um país daqui a alguns anos. É uma ponta de lança de países estrangeiros. Alguns podem comprar terra na fronteira com a Bolívia e amanhã passar isso para o Estado boliviano, que pode dizer: “É propriedade nossa”. A gente tem de cuidar da terra da gente, deixar que comprem a nossa terra é um perigo. Então, minha solidariedade.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Só para complementar, antes de o senhor continuar: só em Mato Grosso, na divisa com o Paraguai, só dentro de Mato Grosso, há um proprietário que tem 80 mil hectares e que depois pega outro tanto, não sei quantos mil, no Paraguai. É exatamente isso que o senhor está dizendo. São 80 mil hectares na divisa do Brasil com o Paraguai, em Mato Grosso.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Isso é uma coisa. Agora, a outra é sobre a sua carreira política. Quero dizer que qualquer um de nós que sair daqui - ou praticamente todos nós, quando sairmos - faz falta em um ou outro tema. Por exemplo, qualquer um de nós que sair daqui faz falta na defesa do seu Estado. Mas aí vem outro e substitui. Agora, há alguns que, quando saem, deixam a dificuldade de substituição por algum tempo, mas por um assunto. Eu, por exemplo, sem qualquer falsa modéstia, se saísse daqui agora, deixaria uma falta, por algum tempo, na defesa da educação. Logo, logo viria outro mais jovem e o faria. Mas a senhora vai deixar falta em alguns itens, não em um. Por exemplo, a senhora é uma das grandes defensoras aqui do assunto ecologia, com repetidos discursos e participação em congressos mundiais. Qualquer um que chegar aqui não vai receber esses convites. Esses convites não são para um Senador, são para o Senador fulano ou fulana. Vai fazer falta a sua defesa do meio ambiente aqui. Outro é a educação. A senhora tem-se pronunciado aqui, sobretudo em defesa dos professores, dos servidores administrativos das nossas escolas. Terceiro, as mulheres. Com seus repetidos discursos em defesa do papel das mulheres na soberania. Quarto, o Centro-Oeste, não apenas Mato Grosso, mas o Centro-Oeste como Região. Repetidas vezes a senhora vem aqui e defende o Centro-Oeste. Do Mato Grosso virá um que terá obrigação de falar, mas falar do Centro-Oeste já exige uma vocação. Eu poderia falar outros, mas, para não continuar, falaria da soberania, sobre o que V. Exª acaba de fazer um discurso. Para muitos desta Casa, soberania ficou uma palavra fora de moda.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT -MT) - É verdade.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Muita gente acredita que não existe mais soberania: tanto faz a terra pertencer a um brasileiro ou a um estrangeiro. Como na Copa do Mundo: agora, tanto faz ser nacional ou não ser nacional para jogar na Copa; daqui a pouco, tenho dito, não vai demorar muito, a Copa será por times de patrocinadores e não por camisas de nações. Há gente que acha isso natural. Confesso que talvez seja antiquado. Eu defendo a soberania, obviamente uma soberania integrada no mundo global - não dá mais para ser uma soberania isolada. A sua saída daqui vai deixar uma grande falta. Lamento que, ao tomar essa decisão, o PT do Mato Grosso não tenha consultado o Brasil inteiro, porque não poderia ser uma decisão, sem auscultar - usemos esse verbo, não tanto “consultar” - qual a repercussão da sua saída desta Casa. Do ponto de vista pessoal, falando francamente, a senhora vai ser mais feliz fora do Senado do que dentro do Senado. (Risos.) Pode sentir o que chamo de “frustralívio”. É uma frustração, porque vai deixar de dizer as coisas, de falar, de defender, de votar, de apresentar ideia, mas vai ser um alívio. Então, não é um problema pessoal. Não acho que a senhora está sendo sacrificada pessoalmente, ao sair daqui, mas vai sentir uma frustração e trazer uma falta muito grande pela abrangência das propostas que a senhora defende e pelas quais luta, que vão além do exercício específico da tarefa de Senadora representante do seu Estado. Representantes de Estado a gente tem 81. Mas, com bandeiras, nós somos poucos. A senhora é uma Senadora de bandeira. E diria mais: pelo menos cinco bandeiras, ao longo do tempo que estou aqui, escuto em seus discursos. Não somos nós, seus amigos Senadores, que vamos sentir falta. O Brasil vai sentir falta do seu discurso. Esses grupos de ecologistas, de educacionistas, de mulheres, de defensores da soberania vão sentir falta, porque a gente não substitui isso. Isso é algo que se constrói com a vida do próprio político ou política. Não é uma questão de fazer eleição, substituir e voltar. Não vem a mesma coisa. Então, vai fazer muita falta não diria só a nós - a gente se encontra, e a amizade vai continuar -: vai fazer falta no cenário da disputa por propostas que o Brasil precisa para o futuro; vai fazer falta no cenário das lutas para proteger algumas coisas que o Brasil precisa proteger. É uma pena que isso esteja acontecendo! Embora eu acho que, do seu ponto de vista, é muito mais tranquilo não ter que disputar uma eleição em outubro do que estar sofrendo como nós, que provavelmente vamos disputar. Era isso o que eu tinha para dizer.

            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Obrigada, Senador.

            Eu, realmente, estou com uma bela coletânea de falas dos meus colegas Senadores. Vários já se pronunciaram. E, mais uma vez, eu agradeço e peço que fique agregada à minha fala de hoje a fala do Senador José Nery e a fala do Senador Cristovam Buarque.

            Senador Cristovam Buarque, quando o senhor elenca essas bandeiras, realmente, essa é uma questão difícil, porque são oito anos de Senado, são oito anos de construção. O senhor disse muito bem: não é uma coisa que você chega hoje, aqui; no primeiro, no segundo, no terceiro ano, você vai construindo, construindo em nível do seu Estado, em nível do seu País, em nível internacional. Agora mesmo, estou indo, logo, logo, para uma viagem internacional para tratar da questão da mulher, em agosto. Tenho uma grande reunião também, para a qual estou sendo chamada, na China, sobre a questão do meio ambiente. São questões que são construídas. Eu digo sempre: eu viajo até de forma bastante frequente para o exterior, mas sempre a convite dos outros países, inclusive com as despesas pagas, sempre. É a questão da mulher, é a questão do meio ambiente, é a questão das terras, é a questão da justiça. São muitas as questões, vamos dizer assim, de projeção internacional, muito maior do que o próprio País.

            Mas, Senador Cristovam, o senhor falou uma coisa que hoje eu ouvi várias vezes. Por isso que eu comecei até a rir, aqui, na tribuna quando o senhor falou do “frustralívio”: sai frustrado, mas sai, assim, de repente, até mais leve, não é? Muitas pessoas, não das cúpulas políticas - algumas também; tem gente séria, com certeza, e muitas, não são poucas -, mas muitas pessoas do povo que falaram comigo, dos movimentos sociais, que estão extremamente frustradas, e prefeitos - muitos prefeitos me ligaram hoje - das mais variadas colorações partidárias, que já tinham inclusive declarado em outubro, novembro do ano passado, em reunião de vinte, trinta prefeitos, independente... Aliás, naquela reunião de outubro do ano passado, não tinha nenhum do PT, porque naquela região não tem prefeito do PT . Eles definiram que um voto do Senado, Senador Mão Santa, já seria da Senadora Serys, o outro eles iam resolver depois.

            Então, existe hoje essa frustração muito grande, mesmo em prefeitos de outros partidos, até de partidos de oposição a nós, do PT, que já tinham definido e já tinham declarado isso, Senador Cristovam. Houve reuniões de quinze, vinte prefeitos, dizendo, já em outubro, novembro do ano passado: “A gente está se reunindo para dizer para a senhora que um voto é seu; o outro, a gente vai resolver depois. Porque nós não somos do seu partido, vamos ter os candidatos ao Senado do nosso partido, mas um voto é seu”. Isso realmente nos deixava naquele ímpeto de “vamos que vamos; vamos fazer; vamos continuar lutando”.

            E, hoje, muitos me diziam: “Senadora, o medo que a gente tem de a senhora não participar dessa eleição é que a senhora saia da política e não queira mais voltar”. Porque eu falo para eles: “Não, eu estou aí; vem mais política pela frente, daqui a tanto tempo, em outros tempos. Não precisa ser nessa eleição. Calma!”. Porque as situações são quase desesperadoras. E eles dizem: “Não. O risco é a senhora sair dessa disputa agora, desta eleição, e não querer mais voltar para a política, Senadora”. E eu falei: “Não sei”. E, agora, V. Exª diz exatamente isso.

            A gente sabe que não é fácil. Obrigada, Srs. Senadores.

            Voltando aqui à nossa fala, quando dizíamos que terra não é um assunto qualquer e tem que cumprir a sua função social, nós sabemos que há estrangeiros aqui, no Brasil, que não têm 180 mil hectares, como alguns que já citei aqui, de terra, mas que têm menores quantidades de terra e que levam essa terra a ter um desempenho da função social. Tem. Tem gente séria, sim, eu conheço. Agora, há aqueles que têm grandes extensões, em divisa com outros países. E o Senador Cristovam Buarque colocou, com muita propriedade, esse risco contra a soberania do País. Não tenho nenhuma dúvida disso. O Senador José Nery aprofundou essa questão também.

            O nosso Governo identificou uma forte concentração do interesse do capital externo no Centro-Oeste do País - aqui, na nossa Região. Dados de um estúdio inédito mostram que 53% das áreas compradas por estrangeiros estão nessa Região. Desse total, cerca de 3,4 milhões de hectares, ou seja, 83%, estão vinculados a 5,6 mil propriedades médias e grandes. Os 100 maiores imóveis em mãos estrangeiras correspondem a quase 800 mil hectares. O maior deles - eu já anunciei aqui - tem 80 mil hectares, pelo menos dos que eu consegui identificar em dados reais, em dados publicados. A maior parte foi adquirida após 1980 - 84% foram registradas em médias e grandes propriedades.

            Para fechar o cerco ao “avanço indiscriminado” de fundos financiadores internacionais, os mais diversos, o Governo já tem um esboço de um “código de conduta” a ser seguido por estrangeiros. As regras incluem transparência nas negociações (“consentimento informado”), respeito pelo direito a terras existentes, partilha dos benefícios com comunidades locais, sustentabilidade ambiental e adesão a políticas nacionais de comércio e segurança alimentar.

            Para finalizar, Sr. Presidente, senhoras e senhores, repito o que disse o Presidente Lula: “Esse é um problema que nós precisamos começar a discutir. Porque uma coisa é o cidadão vir, comprar uma usina, comprar uma fábrica” e tantas outras coisas. Outra coisa é ele comprar as terras, as grandes extensões de terras, especialmente; é ele comprar a terra que ele planta em grande quantidade; é ele comprar a terra do minério.

            É uma questão extremamente séria essa da terra em grande extensão na posse de estrangeiro, como propriedade. Mas temos certeza de que, como muito bem disse o nosso Ministro Cassel, do Desenvolvimento Agrário, e o nosso Presidente Lula, essa questão está sendo realmente regulamentada, e acreditamos que vêm medidas do Governo a curto prazo para que realmente se tenha condição de regulamentar a compra de terras por estrangeiros em nosso País.

            Muito obrigada Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/2010 - Página 32378