Discurso durante a 127ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre o artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, de autoria do empresário Emílio Odebrecht, intitulado "As Novelas e a Educação", em que se mostra que as novelas podem ser mais do que entretenimento e se tornarem instrumentos de apoio à formação das pessoas.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. TELECOMUNICAÇÃO.:
  • Reflexão sobre o artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, de autoria do empresário Emílio Odebrecht, intitulado "As Novelas e a Educação", em que se mostra que as novelas podem ser mais do que entretenimento e se tornarem instrumentos de apoio à formação das pessoas.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2010 - Página 35455
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), SUGESTÃO, UTILIZAÇÃO, INFLUENCIA, PROGRAMA, TELEVISÃO, COMPORTAMENTO, SOCIEDADE, INCENTIVO, VALORIZAÇÃO, EDUCAÇÃO, ENRIQUECIMENTO, CULTURA, CONTRIBUIÇÃO, EDUCAÇÃO MORAL E CIVICA, JUVENTUDE.
  • CRITICA, DIRETRIZ, PROGRAMA, TELEVISÃO, FALTA, CONSCIENTIZAÇÃO, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, PROMOÇÃO, NATUREZA SOCIAL, VALORIZAÇÃO, CONHECIMENTO, APREENSÃO, ORADOR, RISCOS, FUTURO, BRASIL, EFEITO, NEGLIGENCIA, SISTEMA DE EDUCAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, INFERIORIDADE, QUALIDADE, CIENCIA E TECNOLOGIA, EXPECTATIVA, MELHORIA, SITUAÇÃO, EFETIVAÇÃO, IGUALDADE, ACESSO, ENSINO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte pronunciamento. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, em geral, o nosso papel aqui, Senador Geraldo Mesquita, é apresentar as nossas ideias, através dos nossos discursos.

            O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti. PTB - RR) - Senador Cristovam Buarque, depois V. Exª pode assumir a Presidência?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Com o maior prazer, presidirei depois.

            Como eu dizia, em geral, o nosso papel aqui é trazer as nossas ideias, apresentar as nossas propostas, através dos nossos discursos. Mas, de vez em quando, Senador Mozarildo, lendo um jornal, lendo uma revista, a gente se surpreende com o fato de que não precisa trazer nossas ideias; basta usar a tribuna que nós conquistamos pelo voto para lermos o que outras pessoas disseram e pensaram.

            Ontem, lendo a Folha de S.Paulo, tive a oportunidade de ver um artigo do Sr. Emílio Odebrecht que dispensa qualquer discurso pessoal, basta lê-lo. Obviamente, não me furtarei a fazer alguns comentários. O artigo do Dr. Emílio Odebrecht, que é um empresário, não é um professor, tem como título: “As Novelas e a Educação”. Ele diz no seu artigo de ontem na Folha de S.Paulo: “Provavelmente não há outro país, onde as novelas, esta atração televisiva de presença mundial, tenham caído tanto no gosto popular como no Brasil”.

            E eu comento: e é verdade. Não há outro país. Não é uma invenção brasileira. Já havia novelas antes de termos autores de novela no Brasil. Eu era menino e assistia a novelas cubanas traduzidas. Mas, de repente, as novelas viraram sinônimo do Brasil. Não faz dois, três dias, vendo um filme francês, no meio do filme aparecia uma televisão ligada e as pessoas estavam assistindo a uma novela brasileira, com atores brasileiros.

            Ele diz mais no artigo:

Do ponto de vista da influência nos costumes, ouso dizer que esse tipo de programa foi, entre nós, mais benéfico que maléfico [também estou de acordo. O Brasil seria pior sem as novelas]. Se analisarmos os efeitos sobre a visão de mundo do brasileiro médio que as novelas já exerceram, concluiremos que hoje somos (até certo ponto, ao menos) um país melhor também graças a elas [elas criaram uma linguagem nacional; elas integraram o País].

Ideias como a da emancipação feminina se disseminaram no Brasil com a ajuda das novelas. Em anos recentes, abordaram outras questões importantes, como o combate ao racismo e o respeito aos deficientes físicos. E até a demografia do país parece ter sofrido alguma influência.

As famílias nas novelas são, quase sempre, pequenas e foi por meio delas que muita gente teve, pela primeira vez, contato com noções de planejamento familiar.

Mas [diz o Dr. Emílio Odebrecht] é inescapável reconhecer que também há os efeitos nocivos, em especial sobre os jovens [e eu estou de acordo com ele]. A contínua irradiação de modismos tolos e a tendência (talvez inerente ao gênero) de exploração nos enredos de algumas das piores fraquezas humanas, como a traição e a ganância, conferem certa razão àqueles que as apontam [as novelas] como algo pouco educativo.

O fato é que, com o potencial de influência que têm, as novelas podem ser mais do que mero entretenimento e se tornar instrumentos eficazes de apoio à formação das pessoas.

            Eu vou repetir:

O fato é que, com o potencial de influência que têm, as novelas podem ser mais do que mero entretenimento e se tornar instrumentos eficazes de apoio à formação das pessoas.

Ao falar em formação, penso no incentivo à agregação familiar, na disseminação de valores, enriquecimento cultural e motivação aos jovens para que estudem, se desenvolvam e empreendam.

Nossos autores [das novelas], tão talentosos [sem dúvida alguma], poderiam usar o meio para inserir (ou reforçar) no ideário do país a crença no trabalho duro e honesto como forma de ascensão social e nos benefícios que isso representa para o indivíduo e para a coletividade.

Tais programas também poderiam servir para orientar a escolha profissional de rapazes e moças. Para tanto, bastaria que mostrassem, de modo consistente, a realidade das várias ocupações do mundo do trabalho - o que seria de enorme valia para muitos jovens brasileiros.

            E conclui o último parágrafo do artigo o Dr. Emílio Odebrecht, ontem na Folha:

O incentivo a comportamentos éticos e os conteúdos que formam a cultura dos indivíduos não devem ficar restritos aos canais educativos, às escolas ou às famílias [e eu acrescentaria: nem apenas às igrejas].

As novelas, forma de arte na qual somos mestres, podem contribuir e muito para elevar os brasileiros a mais altos padrões de princípios morais e cívicos, conhecimento e desenvolvimento pessoal.

            Esse é o artigo, Senador Mozarildo, que eu li ontem na Folha de S.Paulo e que me tocou muito, porque vem de um empresário que eu considero um dos educacionistas brasileiros, porque tem uma longa trajetória de preocupação com educação, mas, sobretudo, porque é um assunto que eu venho defendendo e com que venho me preocupando há algum tempo.

            Eu, quando Ministro, cheguei a procurar autores de novelas, pedindo que eles incluíssem no enredo das novelas formas de incentivar jovens a buscarem a educação. E aí quero fazer algumas confissões.

            O que eu dizia para eles é que o jovem de sucesso nas novelas é sempre o jovem sarado, o jovem bronzeado, é sempre o jovem com feições bonitas. Jamais o jovem culto. Em novela, nenhum menino arranja namorada porque lê Machado de Assis; nenhuma menina arranja namorado porque lê Balzac. Ele ganha namorada ou ela ganha namorado pela cara ou pelo carro, pela piscina da casa, pelas badalações aonde vão, nunca pela cultura. Eu nunca vi um menino virar herói porque tirava boas notas nas novelas brasileiras.

            Já pensaram como seria bom se as novelas brasileiras colocassem jovens heróis bem-sucedidos, com sucesso no seu grupo, por causa das notas? Mas nas novelas raramente eles vão à escola! E as escolas são centros de diversão quase sempre nas novelas.

            Eu nunca vi um jovem ser convidado para uma festa em uma novela e ele dizer: “Não posso porque tenho de estudar”. Alguém já viu isso? Nunca se viu. Eu nunca vi, salvo em uma novela - eu me lembro - que se passava em uma livraria, eu nunca vi, nas casas dos ricos personagens das novelas, bibliotecas particulares. Não há livros nas casas que aparecem nas novelas. Raramente vão ao teatro ou entram nas livrarias.

            Nós temos nas novelas um instrumento formidável de mobilização, e não é utilizado.

            Eu lembro que, mais ou menos 25 ou 30 anos atrás, um admirável livro da Yourcenar, essa escritora belga, chamado Memórias de Adriano, passou a ser best-seller no Brasil porque um personagem lia esse livro. E não é um livro fácil, não é um livro tanto para os adolescentes. Mas, por que a gente não põe nas novelas formas naturais de promover a importância da educação?

            Fazemos merchandising, essa palavra bonita, de carro, de roupa. Não fazemos merchandising da educação, da cultura, de livros. Merchandising não no sentido da mercantilização, mas no sentido do convencimento, da conversão deste País a levar em conta a cultura como valor importante e símbolo da riqueza. Raramente entra a cultura, a educação, mas, quando entra, é meio para a riqueza material, da renda, nunca como ela em si uma riqueza.

            E aí, Senador Mozarildo, vou dizer o que é mais preocupante: mais preocupante é a conclusão a que cheguei ao tentar colocar educação nas novelas, e de uma maneira agradável e de entretenimento, não para ficar chato. E a razão que encontrei para que isso não seja feito, Senador Mozarildo, isso sim é preocupante. A razão que encontrei é que os jovens brasileiros que assistem a novelas, a maioria da população, que é de classes média e baixa, porque essa é a maioria da nossa população, eles são capazes de se sentirem iguais a um rico bonito, mas não a um rico culto. Isso é que é triste! Não se põe um herói pela cultura, porque dizem que os que assistem não se identificarão com ele, pois acharão que esse cara é um pedante, um pernóstico, um chato, já que é culto.

            A identidade pela beleza física é mais aceita entre classes no Brasil, até porque não há diferença de beleza entre pobres e ricos. Por isso, identificam-se mais. Qualquer pessoa se identifica com um personagem ou com uma personagem de feições bonitas, mas não se identifica com aquilo que está dentro da cabeça de caracteres cultos. Aí é que vêm a vergonha e a tragédia. Isso significa que a imensa maioria da população, que é quem assiste às novelas, não se identifica com as pessoas educadas; elas não se identificam com as pessoas cultas e não acham que são capazes de chegar lá. Elas são capazes de chegar lá no shopping e comprar o mais caro sapato. Aí, elas se identificam, mesmo sabendo que não podem ainda, mas elas não se identificam com aquele jovem que está na biblioteca, lendo. Nós extirpamos, retiramos da capacidade, do sonho das populações majoritárias brasileiras, do sonho das populações pobres brasileiras a ideia de que elas podem ser tão cultas quanto os mais cultos brasileiros. Por isso, não colocam na novela.

            Dito de outra maneira, que pode chocar: a sensação que eu tive é que os autores de novelas que inventam tantas fantasias consideram que colocar um herói pela cultura é tão fantasioso que ninguém acreditaria! Isso é triste, até porque pode ser verdade esse sentimento. Ou seja, a novela tem que ter muita fantasia, mas dentro de limites; não pode ser uma ficção científica. E dizer que todos podem ser cultos, no caso do Brasil, com a educação degradada que temos, isso vai parecer maluquice, isso vai parecer demagogia. Dizer que uma pessoa pobre é capaz de comprar um automóvel bonito não parece demagogia no Brasil, mas dizer que uma pessoa pobre, que não estudou, vai ser culta, no Brasil parece demagogia. Aí não se faz o incentivo, e aí a gente cria um círculo vicioso, um círculo vicioso da tragédia educacional brasileira.

            Ontem, já que eu falei de um jornal, o programa Fantástico, da Globo, mostrou - a pessoa ao meu lado, que estava assistindo, chegou a chorar - a falta de professores de Ciências nas escolas brasileiras. E não foi um programa orientado para prejudicar nenhum Governador. Saiu de Estado em Estado, Estado em Estado, e não encontrou nenhuma situação satisfatória. Jovens que, no final do ano, não tinham tido nenhuma aula de Química no ensino médio; jovens que não tinham tido aulas de Física; jovens cujo professor de Física chegou na última semana do semestre dizendo: “Vou tentar recuperar esta semana o que vocês não tiveram ao longo de todo o semestre”.

            Este é um País em risco! Este é um País em risco! O futuro está arriscado, porque o futuro é feito pela educação, que leva à ciência e à tecnologia.

            Senador Mozarildo, V. Exª é um dos Senadores que defende muito a ideia de soberania, pois eu lhe digo: se algum país estrangeiro quisesse invadir o Brasil, quisesse ameaçar o Brasil, ele faria o que o Brasil está fazendo com o Brasil: não dava educação à população.

            Antigamente, para se fazer um país inseguro, destruíam-se as estradas; hoje, destroem-se as escolas. Não estamos precisando que ninguém venha destruí-las, pois nós estamos destruindo nossas escolas. Antigamente, bombardeavam-se as hidrelétricas; agora, bombardeiam-se as escolas. É aí que está o futuro. Assisti aqui a um pronunciamento do Ministro da Defesa em que ele mostrava todo o cenário de pontos vulneráveis brasileiros que tinham de ser protegidos e que eles estavam protegendo: Brasília, como Capital; as hidrelétricas, os aeroportos. E eu disse: Ministro, o senhor não está colocando nenhuma universidade como centro a ser protegido em caso de guerra. E não estava. Deu uma desculpa lá e depois vi que, rapidamente, mudaram em algumas semanas.

            Eu garanto que no quadro de defesa, da estratégia de defesa dos Estados Unidos, entra Harvard, entra MIT, entra Yale, entra a Universidade da Califórnia, entram os centros de pesquisa das instituições privadas, porque é ali que se gera a defesa de um país. No Brasil, não entra. No Brasil, o mais que a gente se preocupa é com as hidrelétricas, com os aeroportos, que são necessários, sim, de preocupação, mas não são suficientes para a proteção. Somos um País vulnerável, somos um País em risco, e esse título, Senador, não é criação minha. A ideia de país em risco tirei de um documento feito durante o governo Clinton, nos Estados Unidos, sobre a situação da educação americana no final dos anos 80, em que, depois de estudar toda a situação - e olha que os Estados Unidos estão muitos séculos à frente da gente em educação -, mesmo assim, o documento final se chama Uma Nação em risco. E estão dando uma virada, o Presidente Obama está dando uma virada.

            O Brasil, que nem se compara com o que é a educação norte-americana, não se dá conta do risco. Eu garanto que, como depois do programa Fantástico de ontem, o Presidente Lula não convocou uma reunião de emergência com Ministros para discutir o que está acontecendo no ensino médio brasileiro. Eu garanto que não convocou. Se ele convocasse, já era um gesto, como são os gestos que a gente poderia fazer pelas novelas.

            As novelas formam a cultura brasileira. Nós pensamos conforme as novelas determinam. Se a gente coloca ali dentro a ideia de que educação é importante, de maneira agradável, bonita, simpática e não tão fantasiosa, a gente poderia dar um salto, trazer para dentro da cabeça dos nossos jovens a importância da educação que hoje eles não têm. Depois a gente reclama que eles caem na droga; depois a gente reclama que eles ficam violentos; depois a gente reclama que eles só pensam em lazer. Mas é lazer que promove um personagem de novela. O que promove um personagem de novela é ficar na praia, não é ficar na escola. Não é possível que a gente não possa inverter isso, deixando o fim de semana até para praia também.

            Daí eu ter vindo aqui ler esse artigo do Dr. Emílio Odebrecht, que é um empresário educacionista e que levanta um assunto que parece que não estão percebendo por aí. Nunca o Brasil teve tanta presença internacional quanto por meio das novelas. A gente acha que a presença brasileira no exterior é o futebol. Não é. Primeiro, porque o futebol a gente disputa com outros; segundo, porque o futebol é quase que a cada quatro anos. A televisão brasileira, através de suas telenovelas, está permanente, todos os dias, em dezenas de países do mundo, levando a imagem do Brasil.

            Aproveito até para contar, Senador Mozarildo Cavalcanti, um caso que se passou comigo e que mostra também como a novela brasileira é que passa a cara do Brasil.

            Uma vez fui fazer uma palestra no Senegal. Estava na capital do Senegal. É um pouco divertido e triste. Estava na capital do Senegal, Dakar, tomei um táxi - lembro-me de que era um carro muito velho - e sentei-me ao lado do motorista, como consigo fazer nos táxi. E, ao lado do motorista, comecei a conversar com ele. Dessa vez, Senador Mozarildo Cavalcanti, como é um país muçulmano, abri a conversa perguntando: “Quantas esposas você tem?” Eles podem ter quatro. E o motorista, um homem jovem ainda, olhou para mim e disse: “Eu só tenho uma. Para que ter mais de uma?” Eu disse: “Mas aqui não é permitido quatro?” Ele disse: “É, mas eu sou jovem, a minha mulher é jovem. Ela ainda pode ter filho. Para é que eu vou ter outra? Além disso, hoje em dia é caro. Meu pai é quem teve três. Não preciso mais disso.” Eu disse: “Pois, olha, eu fiquei até satisfeito, porque no meu País só podemos ter uma esposa.” E ele perguntou: “Qual é o seu o país?” E eu disse: “Eu sou brasileiro.” Ele disse: “Ah, é verdade! No Brasil, vocês só podem ter uma de cada vez. Quando ela fica velha e não pode ter filho, vocês trocam por uma jovem.” E eu disse: “Onde o senhor viu essa história?” Ele disse: “Nas telenovelas brasileiras!” E, se você olhar, nas telenovelas realmente acontece muito isso, só que não é porque não se pode ter filho que se troca por uma mais jovem, mas por outras razões.

            Então, veja, a imagem do Brasil é passada pelas telenovelas. Contei isso aos irmãos Marinho. Disse: “Olhem a imagem que se passa do Brasil.” Só que, claro, é verdade mesmo. No Brasil, isso está muito comum. Mas as telenovelas são fortes demais, estão influenciando lá fora para que se veja como é o Brasil. Como a gente não usa para influir aqui dentro como deve ser o Brasil e não apenas como ele é? Essa é a diferença!

            Esta é a diferença que está por trás da proposta embutida no artigo do Emílio Odebrecht: é a novela não ser apenas um retrato do que é, mas o retrato do que a gente deseja que seja. Aí não há outro jeito: é tentar incutir na cabeça dos nossos jovens que a educação é um instrumento de promoção social, é um instrumento de resgate do saber pelo saber porque faz você mais feliz e mais respeitado.

            Eu creio que ainda é tempo de as novelas brasileiras entenderem isso. Quem sabe um artigo vindo de um empresário, não de um professor, nem de um político, possa despertar os nossos autores para que valha à pena, sem parecer fantasioso demais, dentro dos limites do possível, mostrar que qualquer jovem neste Brasil pode se identificar com um jovem culto e que, ao se identificar com um jovem culto, ele se sinta superior do ponto de vista do respeito da comunidade, não superior do ponto de vista da arrogância, mas do ponto de vista do respeito.

            E há outra coisa grave: no Brasil, ter saber parece ser arrogante. Ter saber é quase sinônimo de chato. Os jovens, entre eles, consideram chatos os que estudam muito; consideram chatos, antipáticos, pernósticos os que sabem das coisas. É verdade que muitos que sabem são pernósticos, sim, porque ficam esnobando a sabedoria, que os outros nem dão valor. Além de esnobes, são burros nesse sentido.

            Mas as novelas poderiam aproveitar. Vamos usá-las para fazer não apenas o retrato do que é o Brasil - se é que o retrato é tão negativo como aparece nas novelas, com tantas traições e maldades. Mas vamos fazer com que, além do que o Brasil é, coloquemos um pouco do que o Brasil deverá ser se nós usarmos bem as telenovelas, colocando gosto pela cultura, gosto pela educação, a afirmação das pessoas pela educação. Façamos isso.

            E não estamos atendendo apenas à sugestão de um empresário brasileiro, educacionista como é o Emílio Odebrecht. Estaremos também ajudando a fazer um Brasil mais seguro, um Brasil com menos desigualdade e um Brasil mais eficiente, porque estas três coisas - igualdade, eficiência e segurança - só vêm por um caminho: educação de qualidade, igual para todos.

            Era isso, Sr. Presidente, que eu tinha para dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2010 - Página 35455