Discurso durante a 129ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Indagação à Mesa sobre a leitura da solicitação de prorrogação da CPMI do MST.

Autor
Antonio Carlos Júnior (DEM - Democratas/BA)
Nome completo: Antonio Carlos Peixoto de Magalhães Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO.:
  • Indagação à Mesa sobre a leitura da solicitação de prorrogação da CPMI do MST.
Publicação
Publicação no DSF de 15/07/2010 - Página 35746
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, INFORMAÇÃO, SITUAÇÃO, PRORROGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, MOVIMENTAÇÃO, SEM-TERRA, PEDIDO, LEITURA, DOCUMENTO.

            O SR. ANTONIO CARLOS JÚNIOR (DEM - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essa recente decisão do Governo Lula de criar mais uma estatal, desta feita a “Segurobrás” - que é o apelido que vamos colocar nessa empresa -, parece ter o mesmo DNA das diretrizes programáticas da candidata governista. Tem pelo menos uma de suas características: desde que foi anunciado o nascimento de mais esse mastodonte burocrático, há dois ou três dias, já vimos surgir nos jornais confirmações, desmentidos e redefinições do escopo e das atividades que ele exercerá. Uma coisa é certa: qualquer que seja o tamanho do elefante, ele não deixará de ser um elefante.

            Senhores, já são doze as estatais criadas no Governo Lula. Segundo estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a participação das estatais na economia brasileira não para de crescer neste Governo. No fim do Governo Fernando Henrique Cardoso, graças às privatizações, as estatais representavam 31,8% do patrimônio líquido dos 350 maiores grupos econômicos do País. No fim do primeiro mandato do Presidente Lula, esse índice já alcançava 34,4% e, é claro, não parou de aumentar nesses oito anos.

            Senhoras e senhores, pode-se concordar, pode-se discordar sobre qual tamanho ideal deve ter o Estado. Estou certo de que a máquina pública deve ter o tamanho mínimo necessário e suficiente para que cumpra, com eficiência, as atividades típicas de Estado e para que possa emular, regular e dar condições favoráveis para que as demais atividades se desenvolvam e para que as demandas possam ser supridas sob a gestão da sociedade e de seus agentes econômicos.

            Já o Governo do Presidente Lula, esse jamais escondeu sua predileção pelo Estado interventor, concorrente da atividade privada e, se possível, monopolista. Jamais escondeu isso e, nos últimos meses, praticamente passou a alardear, tamanho o número de medidas que vem tomando de criação, de recriação (caso, por exemplo, da Telebrás) e de fortalecimento do Estado, em prejuízo direto e indireto do mercado, da iniciativa privada e da sociedade consumidora de bens e serviços.

            Sob o ponto de vista estritamente econômico, como eu disse, a melhor alternativa não é a escolhida pelo Governo, que limita a competitividade, inibe a produtividade, desincentiva a inovação, para dizer o mínimo. Os maiores problemas, talvez, sejam os demais efeitos colaterais, do ponto de vista da moralidade administrativa, em que, percebe-se claramente, a opção atual tem sido desastrosa para o País.

            Chamo a atenção para o que afirma o Professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Reinaldo Gonçalves, em matéria da Jornalista Geralda Doca, em O Globo de hoje, para quem não é ruim apenas o Governo aumentar o número de estatais, mas pior é a ingerência política desencadeada nessas empresas, tendo à frente os partidos governistas.

            Outro pesquisador, neste caso o Professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP) Fabio Kanczuk, também considera o avanço das estatais um retrocesso, um peso desnecessário para o Estado e para a sociedade, um atraso para o País.

            Veja, Sr. Presidente, que não se trata de críticas gratuitas ou vindas de políticos da Oposição. São estudiosos independentes, acadêmicos, professores ligados a prestigiosas universidades brasileiras. Os exemplos de aparelhamento político no Governo Lula se sucedem e estão aí, à vista de todos, para corroborar as teses daqueles que criticam a estatização desenfreada. Os Correios, de empresa exemplar, tem se transformado em exemplo de ineficiência e afunda vagarosamente, vítima do loteamento político de seus cargos. A Receita Federal, nos últimos tempos, ao quebrar ilegalmente sigilo de contribuintes, tem dado mostras de ter se tornado um anexo de comitês eleitorais. Até mesmo o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal já deram o sinal, com casos como o dos aloprados e do caseiro Francenildo, de que estão a postos não apenas para servir de partilha de cargos entre aliados, mas também para colaborar no que for preciso para tentar destruir a reputação daqueles que não rezem a cartilha do poder atual.

            Mas voltemos à questão do intervencionismo estatal e à criação da “Segurobrás”. O que dizer da atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como agente indutor paralelo e substituto do Orçamento Geral da União? Com recursos subsidiados pelo Tesouro, o BNDES desembolsa mais que o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, BID e BIRD juntos, e se tornou o verdadeiro orçamento paralelo do Governo Lula.

            Não há dúvida de que a crise financeira internacional de 2008 obrigou governos mundo afora a interferir na economia de seus países. No Brasil, não foi diferente. Contudo, o Governo Lula tomou gosto pelo instrumento e resolveu, a partir daí, utilizar o BNDES como seu braço sobre a economia, fazendo com que atualmente, como ressaltam os jornalistas Adriana Fernandes e Fabio Graner, em artigo em O Estado de S.Paulo de hoje, todas as principais políticas econômicas adotadas pelo Governo tenham um pé no banco estatal.

            O dinheiro oferecido pelo BNDES, subsidiado pelo Tesouro, tem viabilizado financiamentos com taxas de juros muito inferiores às dos mercado.

            O Governo, segundo o Governo Lula, modificou a política industrial, que passa a ter como foco o fomento a qualquer setor industrial e faz uso de recursos que têm levado a um aumento substancial das operações de empréstimo do Tesouro Nacional para o BNDES. Mas essa nova política não cabe dentro do BNDES, o que exigiu aporte de novos recursos para o BNDES por meio de operações de empréstimos crescentes do Tesouro Nacional para esse Banco. Essas operações cuja fonte de recursos é o maior endividamento do Tesouro Nacional não afetam a dívida líquida. Por quê? Faz-se dívida com um crédito em relação ao BNDES, mas ela tem um impacto fiscal ao longo do tempo, representado pelo diferencial de juros que o Governo paga ao mercado para se endividar e aquela que o Tesouro Nacional cobra do BNDES.

            O Governo paga ao mercado pelo menos 10,25% de Taxa de Juro de Longo Prazo (TJLP), mas cobra do BNDES a taxa Selic, que é pelo menos de 10,25%, e a TJLP, que é de 6%. Na 1ª Tranche, de R$100 bilhões, o índice é de até 2%; na 2ª Tranche, de R$80 bilhões, incide somente a TJLP. Ora, o Tesouro subsidia o BNDES, que subsidia o empresário, a um custo fiscal cujo cálculo é difícil, porque é controverso. Há um resultado fiscal brutal para o Tesouro nessa diferença de juros. E, ainda mais, a dívida bruta do setor público é aumentada, aumentando os juros que o Governo tem para pagar. Os juros do Governo subiram não só pelo aumento da taxa, porque o aumento da taxa é recente; os juros subiram muito neste ano por causa exatamente do endividamento bruto, que aumentou.

            Pode-se dizer que faltam recursos hoje para o que se espera do BNDES: política industrial, política de financiamento à infraestrutura, política de subsídio a alguns setores industriais, empréstimos para a Petrobras. Isso é o que o BNDES está fazendo hoje à custa dos recursos do Tesouro.

            As operações do empréstimo do Tesouro Nacional ao BNDES têm embutidas, além do impacto fiscal decorrente do diferencial de taxa de juros, o risco de descasamento entre as operações ativas; quer dizer, os prazos do empréstimo para o BNDES, que são de trinta anos, valem para as operações passivas do Tesouro Nacional, cujo prazo é o da emissão de títulos públicos, que é muito mais curto. Ora, o Governo vai ter de rolar várias vezes a sua dívida para sustentar esse financiamento para o BNDES.

            Infelizmente, nenhum desses problemas está sendo adequadamente explicitado pelo Tesouro Nacional, a quem caberia por direito fazer essas contas.

            Então, é preciso estar atento a essa situação. Há de se perguntar: a que custo futuro e com que critérios esse dinheiro tem sido posto no mercado? Não são poucos, dentro e fora do Governo, aqueles que fazem questionamentos e temem pelo custo, no futuro, para os cofres do Tesouro. Digo isso, sem mencionar a falta de transparência na concessão desses financiamentos, concedidos, na maioria dos casos, a grandes conglomerados empresariais com critérios absolutamente não transparentes.

            E quanto à “Segurobrás”, Srªs e Srs. Senadores?

            O Ministro da Fazenda, Guido Mantega, diz que um dos motivos para a criação da estatal seria o fato de “o setor privado não ter uma estrutura eficiente no Brasil”, insuficiente, segundo ele, para “garantir os grandes projetos previstos para os próximos anos”.

            Penso que, se Ministro se refere aos PAC-1 e PAC-2, ele, talvez, não tivesse de se preocupar, pois grande parte das obras não consegue sequer sair do papel. São obras de ficção, de mentirinha. É um book de projetos que, na verdade, do orçamento tem muito pouca participação.

            De outro lado, causa perplexidade ouvir do Ministro da Fazenda, um economista respeitado, a tese de que, para tornar um setor da economia eficiente, capaz de suprir as demandas do mercado, a fórmula seja a de criar estatais. A regra tem sido: vamos explorar o pré-sal? Criemos uma estatal! Vamos segurar nossas obras? Criemos a “Segurobrás”! Queremos universalizar o acesso à banda larga no País? Ressuscitemos a Telebrás!

            Ora, se as empresas seguradoras, no Brasil, não têm acumulado experiência recente em garantir grandes obras, como afirma o Ministro, talvez seja porque o Governo de Sua Excelência não tem dado condições efetivas para que essas grandes obras aconteçam de fato.

            Há outra coisa: acabamos de quebrar o monopólio do IRB e de privatizá-lo. Com pouco mais de um ano, vamos criar uma seguradora estatal? Pelo amor de Deus! Cadê a coerência do Governo? É impossível entender isto: privatiza e, um ano e meio depois, cria nova estatal.

            O Ministro diz também que não se trata de competir com o setor privado na área de seguros ou de estatizar o segmento, mas, sim, de promover consórcios, parcerias. Não parece estranho ao Ministro que apenas o Estado pense em celebrar parcerias dessa ordem? O outro lado, digamos assim, ao que se vê no noticiário, dispensa a sociedade que lhe está sendo imposta.

            Um governo eleito democraticamente pode muito, Srªs e Srs. Senadores, mas não pode tudo, e algumas leis, como as da economia, por exemplo, costumam ser muito cruéis com quem as ignora.

            Não é justo que este Governo recrudesça seu furor estatizante justamente a poucos meses de se encerrar. A sociedade não merece esse legado, digo, esse fardo.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/07/2010 - Página 35746