Discurso durante a 131ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações a respeito do Estatuto da Igualdade Racial, que será sancionado amanhã pelo Presidente Lula. Registro do novo ritmo de desenvolvimento econômico do Estado do Rio Grande do Sul.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Considerações a respeito do Estatuto da Igualdade Racial, que será sancionado amanhã pelo Presidente Lula. Registro do novo ritmo de desenvolvimento econômico do Estado do Rio Grande do Sul.
Publicação
Publicação no DSF de 20/07/2010 - Página 37580
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, ANUNCIO, SANÇÃO PRESIDENCIAL, ESTATUTO, IGUALDADE, RAÇA, ORIGEM, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, COMENTARIO, INFLUENCIA, ELABORAÇÃO, MATERIA, ANTERIORIDADE, VISITA, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA DO SUL, PERIODO, LUTA, LIBERDADE, LIDER, COMBATE, APARTHEID, AGRADECIMENTO, APOIO, CONGRESSISTA, REPRESENTAÇÃO, SINDICATO, ASSOCIAÇÃO DE CLASSE.
  • LEITURA, TRECHO, OBRA LITERARIA, CASTRO ALVES (BA), POETA, REGISTRO, HISTORIA, SITUAÇÃO, ESCRAVO, NAVIO, TRANSPORTE, NEGRO.
  • LEITURA, TRECHO, CARTA, LIBERDADE, DOCUMENTO, COMBATE, APARTHEID, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA DO SUL.
  • ANALISE, EVOLUÇÃO, LEGISLAÇÃO, BRASIL, COMBATE, CRIME, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, VALORIZAÇÃO, CULTURA AFRO-BRASILEIRA, VITORIA, AMPLIAÇÃO, DEBATE, RECONHECIMENTO, PROBLEMA, COMPROMISSO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR, DEPOIMENTO, BIOGRAFIA, QUALIDADE, NEGRO, OPORTUNIDADE, ENSINO PROFISSIONALIZANTE.
  • IMPORTANCIA, ESTATUTO, IGUALDADE, RAÇA, CONTRIBUIÇÃO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, INCLUSÃO, NEGRO, SOCIEDADE, NECESSIDADE, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, DESCRIÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROPOSIÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ACORDO, LUTA, LOBBY, CRITICA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, SUPRESSÃO, ARTIGO, POLITICA, COMPENSAÇÃO, REFERENCIA, SAUDE, MERCADO DE TRABALHO, CANDIDATURA.
  • LEITURA, TEXTO, MUSICA, ASSUNTO, HISTORIA, SITUAÇÃO, NEGRO, SAUDAÇÃO, ORADOR, VULTO HISTORICO, LUTA.
  • REGISTRO, EDITORIAL, JORNAL, ZERO HORA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ELOGIO, ESTATUTO, IGUALDADE, RAÇA, NECESSIDADE, COMPROMISSO, LEGISLATIVO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Cristovam Buarque, que preside a sessão, Senadores e Senadoras, fiz questão de falar no dia de hoje, última sessão antes do recesso parlamentar de julho, porque amanhã o Presidente Luís Inácio Lula da Silva vai sancionar o Estatuto da Igualdade Racial, projeto de nossa autoria, mas que teve uma ajuda fundamental de todos os Senadores, Senadoras, Deputados, Deputadas, e, eu diria, com um olhar carinhoso especialmente de V. Exª, Senador Cristovam.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou falar do Estatuto da Igualdade Racial, a dor da esperança. Vinte anos de sangue, suor e lágrimas.

            Agradeço a todos que ajudaram na elaboração desse Estatuto, Deputados Federais, Deputados Estaduais, Prefeitos, Vices, Secretários, Vereadores, Líderes Sindicais, representantes de partidos políticos, representantes dos movimentos sociais, representantes do movimento negro, índios, ciganos, judeus, palestinos, estudantes, aposentados, pensionistas, pessoas com deficiência, idosos, aqueles que lutam pela liberdade de orientação sexual, pela liberdade religiosa, a todos os militantes das causas populares, enfim, faço uma saudação especial a todos que, de uma forma ou de outra, mesmo contestando, fazendo o bom combate, o bom debate, ajudaram a construir o Estatuto da Igualdade Racial. Lembro-me aqui inclusive de Governadores que participaram desse debate.

            Sr. Presidente, não são nas palavras nem nas ações, a maior dor da discriminação é sentida no olhar. É algo, eu diria, inexplicável. Mas dói, e dói muito! Chega a atravessar o nosso peito, cutuca o nosso coração e atinge a alma.

            Não pensem que foi fácil. Não pensem que é fácil ver o Estatuto da Igualdade Racial ser aprovado após dez anos de debate sem, infelizmente, grande parte das reivindicações que acreditávamos que era possível estar contemplada no Estatuto. Mas ele é um passo à frente; ele é uma conquista; ele é nosso. Possui uma representatividade jurídica, histórica, legal e moral.

            Nós sabemos que não é porque a Abolição da Escravidão, com a famosa Lei Áurea, não contemplou as políticas públicas para o povo negro que os ex-escravos, protestando, voltaram para as senzalas. Não! Eles não voltaram para as senzalas. A resistência é nossa marca. Nós seguimos lutando. Esse é o Estatuto que temos para atingir - mas para avançar na linha - o que queremos.

            Após 300 anos de escravidão e 122 anos de pós-abolição, o Estado brasileiro abre os olhos e começa a encarar a dura realidade do processo de exclusão vivenciado pelos descendentes de escravos, iniciado desde a travessia, como retrata Castro Alves no poema “Navio Negreiro”, do qual apresento alguns trechos.

            Mas que vejo eu aí... Que quadro d’amarguras!

            É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...

            Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!

            (...)

            São os filhos do deserto,

            Onde a terra esposa a luz,

            Onde vive em campo aberto

            A tribo dos homem nus...

            São os guerreiros ousados,

            Que, com os tigres mosqueados,

            Combatem na solidão.

            Ontem simples, fortes, bravos,

            Hoje míseros escravos,

            Sem luz, sem ar, sem razão...

            No porão dos navios negreiros.

            Sr. Presidente, eu tenho claro, este não é o momento de ficarmos a lamentar ou procurar culpados. Mas a história, a verdadeira história está aí, não será apagada. E, a partir de agora, pode ser escrita com novos contornos.

            Temos que olhar para o futuro sem esquecer o passado. O Estatuto da Igualdade Racial não é o fim nem o começo. Ele faz parte de um novo patamar. De um novo patamar de formulação das políticas públicas no nosso País.

            Foi na África do Sul, em 1990, com Benedita da Silva, Carlos Alberto Caó, Edmilson Valentim, Domingos Leonelli e João Herrmann, já falecido, que, em nome do povo brasileiro, exigimos a liberdade de Nelson Mandela.

            Foi lá que recebi das mãos de Winnie Mandela a famosa Carta da Liberdade, que continha um programa fundamental pela luta contra o antiapartheid. Ela foi divulgada em 1955 pelo Congresso do Povo, de que Mandela fazia parte. O Preâmbulo dizia:

Nós, Povo da África do Sul, para declarar a todo o nosso país e ao mundo a saber: a África do Sul pertence a todos os que nela vivem, negros e brancos, e que nenhum governo pode afirmar a autoridade a menos que seja baseado na vontade de todas as pessoas e que nosso povo tem sido roubado do seu patrimônio, que é a terra, a liberdade e a paz, por uma forma de governo baseada na injustiça e desigualdade, que o nosso País nunca será próspero ou livre até que todos os nossos povos vivam em fraternidade.

(...)

Queremos uma Pátria onde todos tenham os mesmos direitos sem distinção de cor, raça, sexo ou credo.

            Sr. Presidente, li só parte da Carta da Liberdade que recebi de Winnie Mandela. Foi inspirado nessa Carta da Liberdade que apresentei, no Brasil, a proposta do Estatuto da Igualdade Racial.

            Essa viagem mexeu - claro - com o sentimento de todos nós, porque diziam, por exemplo, que, quando chegássemos à África do Sul - o avião levava quatro negros: eu, Edmilson, Bené e Caó; João Herrmann, branco, Domingos Leonelli, branco -, o avião não desceria e que seria bombardeado. Não aconteceu nem uma coisa nem outra. Descemos e exigimos a liberdade de Nelson Mandela. Um dos momentos mais bonitos de que participei na África do Sul, depois de ser recebido por Winnie Mandela com essa comissão que levava um documento do povo brasileiro exigindo a liberdade de Mandela, foi quando visitamos, Presidente, uma igreja - o porão da igreja. Eu pensava comigo que lá só haveria negros para conversar comigo sobre a luta de Mandela e o fim do apartheid. Mas lá estava metade negros e metade brancos, unidos e exigindo o fim do apartheid e a liberdade de Mandela. Foi um momento mágico.

            Depois, caminhamos pelas ruas de Soweto, outro momento mágico. Lá, vi em passeata crianças, jovens, idosos e adultos sob a batida do tambor, de lança na mão, gritando numa só voz: “Amandla, amandla, amandla” - ou seja, liberdade, liberdade para Mandela e o fim do apartheid.

            Retornando ao Brasil, não éramos mais os mesmos. Estava eu ao lado - repito - de Edmilson, Benedita, Caó, João Herrmann e Domingos Leonelli. Tínhamos claro que havíamos feito nosso trabalho na Assembleia Nacional Constituinte, principalmente quando ali cravamos que o crime de racismo não prescreve e é inafiançável; ali cravamos, a título de terras quilombolas, no art. 68 do Ato das Disposições Transitórias. E, ainda, ali discutimos e avançamos. Aí, eu fui Relator da Lei Cão, que regulamentou esse direito.

            Sr. Presidente, fico feliz em lembrar que, no ano em que estivemos na África do Sul, no mesmo ano, Nelson Mandela foi liberto, enfim, saiu do cárcere e chegou à Presidência daquele País tão importante.

            Sr. Presidente, quero dizer que, com o apoio do Movimento Negro, apresentei projetos que tipificam a injúria racial, história da África e dos afro-brasileiros nas escolas, temas relacionados à saúde da população negra, indenização para as vítimas da escravidão, feriado em Zumbi dos Palmares, a questão das cotas da mídia nas peças publicitárias. Enfim, desde 1990 até 2000, apresentei mais de 20 projetos todos combatendo o preconceito.

            Nem todos foram aprovados como esse, o Estatuto, que vai ser sancionado amanhã. Mas, como diz o grande líder Abdias do Nascimento: “o debate, somente o debate no combate aos preconceitos, já é uma vitória”.

            Sr. Presidente, tenho muito orgulho de ter feito essa cruzada nacional e internacional contra o preconceito. Foram dez anos de ideias e projetos apresentados até a formulação do Estatuto em 2000.

            Defender as causas sociais, em especial a igualdade racial, é um tema que me é muito caro, aqui no Congresso Nacional.

            A correlação de força, claro, é desigual: não chega a 10% o número de Parlamentares negros na Câmara dos Deputados. No Senado, atualmente, negro só existe este Senador. Mas temos aqui aliados, como V. Exª, Senador Cristovam, um dos maiores defensores da causa de todos os oprimidos - negros, brancos, índios, ciganos, enfim, todos os discriminados.

            Sr. Presidente, nestes 24 anos de vida pública, tenho a enorme satisfação de nunca ter me escondido, seja nos momentos bons ou ruins da luta, seja nos momentos de erros e acertos, nos meus projetos ou naqueles que fui chamado a relatar e a votar, na defesa daqueles que são discriminados. Nessa caminhada, eu tenho um lado: o dos trabalhadores, o lado dos discriminados.

            Eu gostaria de dizer ainda para os pessimistas, aqueles que são contra tudo e contra todos, que eu sei, eu tenho muita consciência de que, daqueles que defendem, aqui no Congresso Nacional, principalmente os negros, os índios, os ciganos, os idosos, os deficientes, a livre orientação sexual, a liberdade religiosa, muitos, muitos não voltam. Não voltam. Mas não importa, isso não nos intimida: essa luta está no meu sangue, está no meu coração.

            Aos 60 anos, completados agora em 2010, minha vida, Senador Cristovam, é um misto de flores e de espinhos, de semeaduras e de colheitas, e também de tempestades. Mas eu posso afirmar, sem dúvida, que, ao percorrer essa estrada, encontrei muito, muito mais alegrias do que tristezas, muito mais abraços e beijos do nosso povo, do que reclamações.

            Ao olhar para trás, vejo-me ainda quando era um menino negro - hoje sou um Senador negro -, mas, naquele tempo de calça curta, nós, uma família de dez, morávamos em Caxias do Sul. Fui vendedor de quadro, fui marceneiro, enfim, até que passei no Senai, onde fiz um curso técnico. Jamais vou esquecer: eu vendia frutas com 12 anos na feira livre, lá em Porto Alegre, quando meu pai chegou e disse: “Renato, você passou no Senai. Você vai poder voltar para casa!” Recebi um abraço forte dele e me lembro de cada palavra: “Filho, você foi chamado para a vaga que disputou no concurso do Senai, em Caxias do Sul. Você vai voltar para junto de mim, da sua mãe e de seus irmãos”. E, dessa forma, eu voltei para casa. Fazia, diariamente, 40 quilômetros, a pé ou de bicicleta, para chegar ao Senai.

            Foi-se fazendo estrada da vida, de muito estudo e aprendizado, de consciência, e fui vendo a disputa no mundo dos adultos. Esta foi a porta da minha oportunidade, a minha experiência: o ensino técnico. Foi o ensino técnico que permitiu que eu me tornasse, mais tarde, um matrizeiro.

            Sei que não existe fórmula carimbada, decidida. Cada um vai ter de escrever o seu caminho, mas, demonstra que a idéia do Estatuto da Igualdade Racial tem um objetivo, um olhar específico para uma parcela da população para quem as portas, as grandes portas, estão, na maioria das vezes, fechadas.

            Sr. Presidente, permita-me porque hoje para mim é um dia histórico. Amanhã vamos sancionar o Estatuto da Igualdade Racial.

            Senador Cristovam Buarque, quando me formei no Senai, recebi meu primeiro diploma - estou aqui segurando um pouco as emoções porque a recordação me faz viajar no tempo, Senador; de coração, eu lhe digo isso. Recebemos o diploma, eu e meus colegas do Senai, todos brancos, e tínhamos que ir a um clube onde haveria o baile de formatura. Era um baile, uma festa nossa, e fui barrado na porta porque era negro. E eu me lembro, com alegria, que ninguém entrou. Todos. Este é o problema da idade: quando a idade avança, nós nos lembramos do passado. Mas todos foram para a praça, era uma noite fria, uma lua forte e estava nevando. Era como se os flocos de neve fossem a orquestra naquele momento.

            O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. PDT - DF) - Senador Paulo Paim, só para dizer que não é a idade; é o sentimento.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Obrigado, Senador Cristovam, obrigado.

            Sr. Presidente, os flocos de neve caiam como que dizendo: “Deus não tem cor”.

            Tenho certeza de que milhares de jovens enfrentam desafios maiores que os meus, não só negros, mas também brancos, os excluídos, aqueles que, de uma forma ou de outra, são discriminados.

            Entendo que esse Estatuto é o reconhecimento do Estado a um tema tão importante para buscarmos a inclusão quantitativa e qualitativa de todo nosso povo. Nós estamos buscando um desafio maior, mais que uma vaga na universidade no mercado de trabalho; nós queremos mesmo, sim, é o ingresso, mas, acima de tudo, uma mudança brusca de consciência.

            A caminhada do projeto do Estatuto da Igualdade foi um verdadeiro aprendizado, foram anos de encontros em praticamente todos os Estados do País, ouvindo a comunidade negra e branca, sindicalistas, professores, advogados, promotores de justiça, parlamentares, intelectuais, enfim, profissionais de todas as áreas, pessoas de todas as classes sociais, etnias e idade.

            Como Deputado Federal, apresentei, no ano de 2000, o projeto, ele levou o número 3.198, lá, eu já queria instituir o Estatuto. No período em que esteve na Câmara, foram 23 audiências públicas, 9 reuniões ordinárias, 8 seminários, 5 audiências públicas em outros Estados. Isso foi feito através de uma comissão especial da Câmara dos Deputados que tinha como Relator o Deputado Reginaldo Germano. S. Exª apresentou um substitutivo ao projeto - não voltou, não se reelegeu -, o qual foi aprovado por unanimidade, mas o projeto ficou engavetado na Câmara.

            Em 2003, a primeira coisa que fiz quando fui eleito Senador: reapresentei o projeto aqui. Iniciamos uma nova jornada. O projeto de 2000 ficou para trás, mas não esquecemos os debates. Assim, sob o nº 213, de 2003, a matéria passou a tramitar no Senado, passou por quatro comissões, inúmeras audiências públicas no Rio, São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul.

            Enfim, vejam bem os nomes que eu vou dizer aqui, porque eu não omito os fatos. O substitutivo ao projeto do Estatuto foi elaborado pelo Senador Rodolpho Tourinho, que também não voltou. Eu digo isso porque muita gente fica dizendo que o Estatuto da Igualdade Racial é eleitoreiro. Pois bem. Os que mais trabalharam não voltaram. E eu tenho orgulho de dizer que trabalhei, estou aqui, na tribuna, vou para uma outra disputa e continuarei combatendo, dia e noite, todo tipo de preconceito. Foi um belo trabalho realizado, sim, pelo Senador Rodolpho Tourinho. Foi aprovado por unanimidade. E não esqueço que o Senador Antonio Carlos Magalhães ajudou muito. S. Exª rompeu todos os prazos na CCJ para que o projeto viesse diretamente para o plenário, onde teve a relatoria da Senadora Roseana Sarney e do Senador César Borges.

            Sr. Presidente, naquele momento, a principal modificação que tivemos que fazer foi a retirada do Fundo de Promoção da Igualdade Racial, que foi considerado inconstitucional pelos Senadores, mas apresentei uma PEC com o mesmo objetivo, a qual está tramitando aqui, na Casa.

            Sr. Presidente, o Estatuto da Igualdade Racial foi para a Câmara dos Deputados em 29 de novembro de 2005. Apenas após dois anos, com a pressão popular, quando milhares de assinaturas foram encaminhadas àquela Casa, foi instituída no dia 10 de março de 2008 a Comissão Especial para debater o tema, sob a presidência do Deputado Carlos Santana, grande lutador, PT do Rio de Janeiro, e o Relator da matéria, Deputado Antônio Roberto, outro grande lutador, PV de Minas Gerais. Roberto apresentou o seu substitutivo, que foi aprovado no mês de novembro de 2009. O texto sofreu inúmeras alterações!

            Após quatro anos vendo o projeto parado na Câmara, fui obrigado a reconhecer o esforço dos Deputados dessa Comissão, que, depois de uma ampla batalha, aprovaram-no por unanimidade.

            Sr. Presidente, deixo nos Anais da Casa o nome de todos os Deputados, de todos os Partidos, que ajudaram na elaboração. A Comissão teve como Presidente do Deputado Carlos Santana; 1º Vice-Presidente, Damião Feliciano, do PDT; 3ª Vice-Presidente, Janete Rocha, do PT, e Relator, Deputado Antônio Roberto.

            Mas aqui ficam todos os membros da Comissão.

            Sr. Presidente, já no Senado Federal, para revisão final, antes de ir para a sanção do Presidente Lula, o Estatuto da Igualdade sofreu mais um duro golpe na chamada Comissão de Constituição e Justiça. O Relator suprimiu mais artigos relativos à saúde da população negra, ao mercado de trabalho, às candidaturas negras e ainda os artigos que tratavam do conceito sociológico de raça, que foi substituído por etnia.

            Aí, eu digo. O parecer do Senador Demóstenes Torres foi duro. Nós viemos à tribuna do Senado em dezembro de 2009. Solicitei que o projeto não fosse aprovado sem que fossem ouvidas as lideranças do Movimento Negro. As lideranças se mobilizaram em âmbito nacional, mas não o necessário para reintroduzir alguns artigos que haviam sido retirados.

            Mas, Sr. Presidente, sei que estamos lutando diariamente pela igualdade em nossos bairros, nas comunidades, nas universidades, nos colégios, no trabalho. Mas, no Congresso Nacional, as coisas só ocorrem conforme a pressão das ruas, ou seja - voltando à África do Sul -, somente com a batida forte dos tambores, como fizemos em 1988, em 1995, em 2005, com duas marchas sobre Brasília.

            Nós não estamos procurando culpados. Não queremos fazer caça às bruxas, mas sim refletir; fazer uma reflexão, cada um, cada uma. É importante para o amanhã e para o futuro. Estou aqui, na tribuna do Senado, fazendo a minha.

            Enfim, no dia 16 de julho, o Estatuto foi aprovado no Senado por unanimidade. Eu, certamente, carregava um ar de resistência a votar o texto ainda este ano. Mas a Seppir e Lideranças do Movimento Negro, cerca de vinte líderes, eu diria exceto o MNU, analisavam e avalizavam o acordo; a Casa Civil me ligou e disse que o parecer era duro, mas que as mudanças viriam. Foi a seguinte a frase: “Paim, deixa votar. Na regulamentação do texto, avançaremos, e serão grandes os benefícios para a comunidade negra”.

            Sr. Presidente, eu sei que não sou o senhor da verdade. Não quero fazer do Estatuto uma luta eterna. Mesmo com este texto, jamais desistirei de pontos que julgo fundamentais para debater e avançar num futuro próximo. Assim vai ser o caso do PL nº 180, que institui o debate das cotas.

            Sei, Sr. Presidente, que o Senador Demóstenes Torres, do DEM, como eu, tivemos de romper os limites das nossas convicções para votar o Estatuto da Igualdade Racial, principalmente este ano. Sei que ele foi pressionado pela elite conservadora para que o projeto não fosse aprovado, mesmo com as alterações incluídas. Também eu, ou seja, também nós fomos pressionados para que não fosse votado o novo texto, porque alguns entendiam que devíamos voltar ao texto original.

            Eu aqui assumo a minha responsabilidade. Acordo é acordo, e em acordo feito no Congresso Nacional, não voltamos atrás. Manifestações tardias reforçam a angústia e a necessidade que tem o nosso povo. Mas, como diz o poeta, um grande poeta espanhol, “o caminho, a gente faz caminhando”. Novas picadas, novas estradas, nós vamos abrindo para que o nosso povo tenha passagem.

            Percorrendo, Sr. Presidente, esta longa estrada da vida, foram muitas as noites em que fiquei sem dormir, mas o que me acalentava e o que embalava o meu sonho, muitas vezes, era a canção chamada “Negro de 35”, escrita pelo gaúcho Francis Beheregary e cantada pelo nosso inesquecível gaudério, naturalmente gaúcho César Passarinho, que nos deixou muito cedo, morreu jovem. Se estivesse vivo hoje teria a minha idade.

            Diz a letra cantada como ninguém por César Passarinho:

            Negro de 35 (Francis Beheregary)

            A negritude trazia a marca da escravidão

            Quem tinha a pele polianga vivia na escuridão

            Desgarrado e acorrentado, sem ter direto a razão

            Castrado de seus direitos não tinha casta nem grei

            Nos idos de trinta e cinco, quando o caudilho era o rei

            E o branco determinava, fazia e ditava a lei

            Apesar de racional, vivia o negro na encerra

            E adagas furavam palas, ensangüentando esta terra

            Da solidão das senzalas tiraram o negro pra guerra

            (Peleia, negro, peleia pela tua independência

            Semeia, negro, semeia teus direitos na querência)

            Deixar o trabalho escravo, seguir destino campeiro

            As promessas de igualdade aos filhos no cativeiro

            E buscando liberdade o negro se fez guerreiro

            O tempo nas suas andanças viajou nas asas do vento

            Fez-se a paz, voltou a confiança, renovaram pensamentos

            A razão venceu a lança e apagou ressentimentos

            Veio a lei Afonso Arinos cultivando outras verdades

            Trouxe a semente do amor para uma safra de igualdade

            Porque o amor não tem cor, sem cor é a fraternidade

            (Peleia, negro, peleia com as armas da inteligência,

            Semeia negro, semeia, teus direitos na querência.)

            Essa última parte da letra, Sr. Presidente, dizia-me que estávamos no caminho certo. Fizemos muito, mas com certeza temos muito, muito, por fazer.

            Sr. Presidente, não posso deixar de cumprimentar os Ministro Eloy Araújo e o ex-Ministro Edson Santos pela determinação em aprovar o estatuto da igualdade racial. Eu jamais vi tamanha peregrinação, tamanha cruzada, eu diria, nacional desses dois ministros pela aprovação no Congresso Nacional dessa matéria.

            Eu senti no olhar de ambos, nas palavras de ambos a convicção da importância de aprovar o texto agora e continuar o debate para avançarmos muito mais. Assim com estamos fazendo com a própria Constituição, com o Estatuto do Idoso, que é também de nossa autoria, com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, também de nossa autoria, com também com o estatuto do motorista, também de nossa autoria.

            O texto do estatuto aprovado no Senado, que vai ser sancionado amanhã, no Itamaraty, Senador Cristovam - seria muito bom se V. Exª pudesse estar lá, V. Exª que me ensinou muito quando cravou aqui nesta Casa uma frase que jamais esquecerei. V. Exª me disse assim: “Paim a revolução para negros, brancos, índios e ciganos passa pela Educação.” Isso eu guardei e levo comigo como uma mensagem de vida de V. Exª, Senador Cristovam.

            Sr. Presidente, eu não vou ler os artigos do Estatuto, em que eu explico - e ele vai ficar nos Anais da Casa - cada um, cada avanço, mostrando o quanto é importante termos este Estatuto, que significa um passo à frente na luta contra os preconceitos. Eu ainda farei somente uma reflexão sobre a última parte do Estatuto. Se eu fosse lê-lo todo aqui, passaríamos a tarde toda conversando sobre este tema, tão importante.

            Quero dizer, Sr. Presidente, que o Estatuto da Igualdade Racial reconhece a importância de um olhar específico para as mulheres, para as religiões de matiz africana, para a juventude negra, para o trabalho, para a saúde, para a educação, para todos aqueles que são discriminados. Ele também avança na formulação da história do povo negro na sala de aula não só na preparação dos professores, mas também nos livros didáticos.

            Quero também dizer, Sr. Presidente, que o Estatuto é uma peça que aqueles que conseguirem lê-la com tempo vão perceber que ela avança e muito. Muitos que criticam o Estatuto, Sr. Presidente, não o leram. É importante dizer: “leiam”, pois ele reconhece a existência das políticas afirmativas na sua amplitude. Com certeza, ele é o reconhecimento do movimento de negros e brancos que lutam pela liberdade e combatem os preconceitos, aqueles que estão na vanguarda das transformações sociais das nossas ações, como, por exemplo, os lanceiros negros lá no meu Rio Grande, mas é claro, Sr. Presidente, que ninguém aqui vai enganar-se; no centro dessa discussão, desse debate, existe um componente ideológico.

            Precisamos alcançar, com o Estatuto da Igualdade Racial, uma consciência pública de que, de fato, é necessário tratar desigualmente os desiguais. Para atingirmos a verdadeira igualdade, temos que trabalhar o desprendimento de algumas de nossas ações, um desprendimento com amor similar ao de um pai ou de uma mãe, que perde a sua noite de sono para embalar o filho, que deixa seus desejos para depois, porque querem melhorar a vida do seu filho, do seu neto e do seu bisneto. Isso é pensar numa nova sociedade.

            Vejo por mim mesmo, Sr. Presidente. Quantas vezes eu gostaria de comprar um terno novo, gostaria de comprar um carrinho melhor, mas deixei isso de lado, porque queria dar aos meus filhos, aos netos e aos bisnetos aquilo que gostariam de ter, principalmente na linha principalmente da educação, seguindo a recomendação histórica de V. Exª.

            Sr. Presidente, a mudança de consciência não é espontânea. O editorial do jornal Zero Hora, do meu Rio Grande, no dia 20 de junho, exatamente há um mês do dia da sanção, fez o editorial, com o título O Estatuto da Igualdade Racial: Espírito de Conciliação. Aqui há uma frase: “A busca da igualdade e o combate a qualquer forma de preconceito e discriminação precisam ser objetivo permanente dos nossos legisladores, pois essa é a vontade inequívoca da nossa população”.

            Faz aqui um elogio ao nosso trabalho em relação ao Estatuto. Por isso nós, que trabalhamos tanto nessa área, Senador Cristovam, junto com V. Exª, podemos dizer hoje, sim, com alegria, produzimos o Estatuto do Idoso, da Pessoa com Deficiência, lutamos arduamente na construção do Estatuto da Criança e do Adolescente, articulamos e aprovamos aqui a PEC da Juventude, vamos aprovar, com certeza, o Estatuto da Juventude e também o Plano Nacional de Políticas Públicas para a Juventude, ainda - quem sabe? - neste ano ou, o mais tardar, no ano que vem. Defendemos, sim, os direitos da mulheres, dos indígenas, de brancos e negros, ciganos, judeus, palestinos, enfim, de todos os discriminados.

            Termino dizendo àqueles que são contra à criação das ações afirmativas, do Estatuto da Igualdade, faço um convite: andem pelas ruas, vejam as diferenças que existem no rosto das pessoas ao caminhar pelas ruas dos grandes centros do País; em seguida, vamos às lojas, aos shoppings, aos consultórios médicos, aos escritório de advocacia, dos diretores das empresas, nas universidades, vejam os gerentes dos bancos, olhem ao seu redor, parem dez minutos, olhem os telejornais, novelas e comerciais para verificarem se não existem dois brasis.

            O mês de julho, Sr. Presidente, é símbolo, pois representa o mês do aniversário daquele que é o maior líder vivo em matéria de direitos humanos, que é Nelson Mandela. É o mês da leitura em frente ao Teatro Municipal de São Paulo da carta aberta à Nação contra o racismo. É o mês em que foi inaugurado o Movimento Negro Unificado contra o preconceito. É o mês do nascimento do poeta Solano Trindade. É o mês da cidadania. É o mês do voluntariado. É o mês da caridade. É o mês da amizade. É o mês do combate à tortura, da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. É o mês do protetor das florestas. É o mês da liberdade de pensamento. É o mês da mulher negra, afro-latina-americana e caribenha. É o mês da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. Enfim, de momentos marcantes que unificam o sentimento, a importância do Estatuto da Igualdade, que, Sr. Presidente, com certeza, não é um abandono ao inconformismo, um abandono à indignação, nem vem para acabar com a dor de todo um povo; ao contrário, o momento é o de expor as feridas, aplicar o remédio e descobrir os passos para a cura definitiva.

            Quero dizer para vocês que as causas dos movimentos sociais, do Movimento Negro, para mim, estão acima das próprias siglas partidárias e de nomes. Para mim, vocês, negros, brancos, índios, ciganos, sem teto, sem terra, vocês são os verdadeiros sujeitos, os heróis dessa história. Mas jamais vamos esquecer os que tombaram para chegarmos aqui. Jamais vou esquecer aquele de que me falaram no colégio, quando criança, que era alguém que ia atormentar o meu sono e que, depois, na caminhada, eu descobri que era o meu herói.

            Eu tenho orgulho de dizer: sou descendente de Zumbi, sou descendente da nação quilombola. Digo com orgulho, lembro da figura de homens como Malcolm X, Martin Luther King, Oliveira Silveira, José Alves Bittencourt, o Lua, Dandara, Luiza Mahim, Rosa Parkinson, entre tantos outros que deram a sua vida para que esse momento acontecesse.

            Parabéns a todos que lutam por direitos, àqueles que fazem da sua vida a chama sempre acesa da liberdade. Não importa o que aconteça, nós nunca, nunca, jamais vamos deixar de pelear, de lutar com força e com coragem para seguir em frente, para defender os interesses do povo gaúcho e do povo brasileiro.

            O horizonte que se agiganta a nossa frente é uma estrada que espera ser trilhada com firmeza, com corações iluminados, com boa vontade, com fé, com muita fé em Deus, fé em todas as possibilidades que o criador colocou para cada um de nós, fé na união, que nos levará a seguir adiante com esse projeto que é a razão de nossas vidas.

            Lutaremos sim e lutaremos eternamente pela igualdade, pela justiça e para que brancos e negros tenham os mesmos direitos e deveres.

            Por tudo isso, Senador Cristovam, eu gostaria de dizer: houve homens que marcaram a vida de nossas gerações, e há alguns, do passado e do presente, que pude ler e jamais esquecerei. Por isso, digo quase mentalmente: vida longa às idéias de Gandhi, o homem que salvou a Índia do Império Britânico!.Vida longa a Nelson Mandela, que libertou a África do Sul e continua vivo! Gandhi já faleceu. Vida longa às ideias, sim, de Gandhi e Mandela! Vida longa a todo o povo brasileiro! Vida longa às ideias de Zumbi! Vida longa às ideias de Abdias Nascimento! Vida longa às ideias de Luiz Inácio Lula da Silva! Vida longa, Sr. Presidente, a todos os homens livres, que dão sua vida pela liberdade e pela igualdade entre todos os povos.

            Era isso, Sr. Presidente.

            Peço a V. Exª que considere na íntegra meu pronunciamento. Na verdade, são 55 páginas que tentei traduzir, lendo a metade do que escrevi.

            Obrigado, Presidente.

 

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SEGUEM, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTOS DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

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            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não há quem negue que o Rio Grande do Sul participa do pacto federativo de modo historicamente dinâmico e inovador. Seguindo o modelo, na última década, com uma política nacional mais favorável à produção e ao investimento, a economia do Estado aproveitou os bons ventos e imprimiu um novo ritmo em seu desenvolvimento.

            Isso se refletiu numa inserção diferenciada do Estado no novo ciclo de crescimento brasileiro.

            Inspirado nesses bons ventos, quero falar um pouco sobre as excepcionais condições econômicas experimentadas pelo Brasil nos últimos anos, a partir das quais o Sul pôde delinear novo ciclo de expansão produtiva.

            Com esse dinamismo, o País tornou-se um país respeitado e cobiçado mundialmente. Em resumo, cai o mito de que somos uma “Nação de segunda”. 

            Antes de tudo, temos que assinalar que, graças à explosão de desenvolvimento recente, o País resgatou a auto-estima em grau suficientemente determinante para injetar na população ânimo na produção e no consumo. Vale a pena concentrarmos um pouco mais nossa atenção nas políticas econômicas adotadas pelo Governo Lula nos últimos anos, com base nas quais o Brasil pôde deslanchar um projeto formidável de crescimento e progresso.

            Nessa linha, o estudo do Secretário do Tesouro Nacional, professor Arno Augustin demonstra que o Brasil tem respeitado a cartilha mais tradicional no âmbito da política macroeconômica, acatando as recomendações da economia de mercado.

            Com isso, angariou a confiança dos investidores estrangeiros, reanimando os espíritos mais céticos e desconfiados. Os fundamentos fiscais e monetários foram seguidos religiosamente, colhendo simpatia e confiança entre governos, investidores, consumidores e agentes financiadores no mundo inteiro.

            Não por acaso, a queda no nível de vulnerabilidade externa de nossa economia constitui prova de que a fórmula adotada nos fundamentos macroeconômicos funcionou bastante a contento, seja no ambiente do mercado, seja no âmbito da sociedade brasileira.

            Nossa dívida externa líquida é hoje negativa, totalizando um valor de aproximadamente 60 bilhões de dólares. Sua percentagem no PIB é de menos 1,8%. 

            Nesse quadro, a evolução das reservas internacionais tem apresentado um desempenho formidável, consolidando um perfil da dívida externa bem mais saudável do que aquele desenhado durante o período do milagre econômico nos anos 70.

            Em termos comparativos, naquela ocasião, a vulnerabilidade das contas nacionais diante da forte vinculação ao financiamento externo fragilizava muito nossa margem interna de ajustes às intempéries econômicas. Ao final daquele processo de expansão, o valor de nossa dívida externa chegava a ocupar, em 1975, quase 16% do PIB.

            Na verdade, nossas reservas internacionais merecem um capítulo à parte. A contabilidade do Banco Central revela que, de março de 2006 a março de 2009, o fortalecimento de nosso estoque fez simplesmente quintuplicar seu valor.

            De aproximadamente 50 milhões de dólares, chegou-se ao valor atual de quase 250 milhões! Como explicar taxa tão considerável, se não for pelo reconhecimento das acertadas medidas adotadas pelo Governo Lula no trato das questões fiscais e monetárias de nossa economia?

            Sem dúvida, com a adoção de uma adequada política de metas para o controle inflacionário, engessaram-se os canais dos rebates de preços na economia brasileira.

            Embora a política de metas tenha sido introduzida no Brasil desde 1999, somente a partir de 2003 os resultados conquistados corresponderam, de fato, às expectativas estimadas.

            Ainda sob a influência das administrações anteriores, a taxa de inflação no primeiro ano do Governo Lula preservava ainda os resultados de descontrole orgânico, estampando percentagem próxima dos 10%, considerada alta para os padrões de uma economia pretensamente estável.

            Contudo, já no segundo ano, em função dos efeitos de uma política econômica austera nos fundamentos monetários e fiscais, o potencial do dragão inflacionário foi reduzido em dois pontos percentuais, repetindo nos anos seguintes a mesma disposição de queda.

            Quase um milagre, ao final do quarto ano de governo, a alta anual de preços no Brasil sequer chegava perto dos 4%. Em 2009, em virtude da instabilidade gerada pela crise hipotecária global, as estimativas inflacionárias tiveram que ser recalculadas, de modo que, em dezembro do ano passado, o País acusava um IPCA anual de 4,31%, taxa essa ligeiramente abaixo daquela registrada em 2008, 5,9%.

            De todo modo, para 2010, projeta-se uma taxa circulando em torno dos 5%, diante de um crescimento anual que deve ultrapassar 6%.

            Do ponto de vista da política monetária, deve-se ressaltar que, no curso das duas gestões do Presidente Lula, o Banco Central não hesitou em derrubar drasticamente os dois dígitos da taxa Selic.

            Com isso, rompeu com sentenciosas noções de controle monetário, sinalizando para o mercado uma sensibilidade muito aguçada em favor do consumidor mais humilde, bem como em benefício do empresariado em geral.

            Para se ter idéia do desafio encarado, o Brasil convivia, em janeiro de 2003, com taxas médias da Selic rondando a casa dos 22%! Ora, como inaugurar uma nova administração federal, deparando-se com uma política de juros tão agressivamente contraproducente? Tal era o dilema da gestão petista ao ingressar na Presidência. Todavia, na contramão do que era conservador, nossas autoridades econômicas experimentaram medidas as mais ousadas com o objetivo maior de baixar as taxas de juros, sem pôr em risco a estabilidade do mercado e de nossas instituições econômicas.

            O resultado não poderia ser outro senão a acertada e paulatina queda da taxa Selic ao longo da década, culminando na histórica marca de 8,75% em fevereiro de 2010.

            Sem abalar a confiança dos investidores internacionais, o novo patamar dos juros brasileiros tem exercido papel crucial na tarefa de bem distinguir a qualidade dos recursos que ingressam no País, privilegiando o investidor de longo prazo, em detrimento daqueles mais afoitos e imediatistas.

            Vale acrescentar que, para o consumidor brasileiro de média e baixa renda, os efeitos de uma política monetária mais frouxa se traduzem, hoje, em crediários e compras a prazo com taxas bem próximas de 5%.

            Não é à toa, portanto, que, associado a uma política social expressamente determinada a combater a miséria nacional, a administração petista conquistou enorme êxito em beneficiar uma massa significativa de trabalhadores antes excluídos do acesso democrático ao consumo de bens básicos.

            Dispondo de um mercado de consumidores ávidos por abastecimento, os comerciantes e banqueiros nacionais entenderam o recado do Governo Lula e logo passaram a oferecer taxas de juros bem mais módicas àquela parcela esquecida da economia brasileira.

            Por outro lado, segundo avaliação do Secretário Augustin, de setembro de 2008 a janeiro de 2010, o saldo das operações de crédito dos bancos públicos cresceu 50%, muito acima dos bancos privados nacionais (12%) e estrangeiros (4%).

            Coincidência ou não, o período avaliado corresponde com certa exatidão ao intervalo mais crítico da crise financeira e administrativa que abalou o sistema bancário no mundo todo.

            Em larga medida, a prosperidade do sistema bancário público pode ser atribuída à sua capacidade inerente de contrabalançar interesses lucrativos da firma diante das necessidades prementes da coletividade nacional.

            Não de forma acidental, o índice de crescimento das operações de crédito refletiu um deslocamento ascendente bastante razoável das instituições financeiras públicas no cômputo geral.

            A participação dos bancos públicos no saldo total de créditos do Sistema Financeiro Nacional atingiu 41,6% em janeiro de 2010, patamar esse superior àqueles verificados junto aos bancos privados, 40,4%, e bancos estrangeiros, 18%.

            Sob o ângulo estrito da política fiscal, cabe exaltar a competência do Governo Lula e de nossas autoridades econômicas na condução de uma política austera e socialmente justa, sem comprometer gastos imprescindíveis para as transformações exigidas pela modernização do País.

            Nesse quadro, o fortalecimento da posição fiscal do setor público refletiu um minucioso cuidado com as contas nacionais, respeitando um índice de despesas públicas bem de acordo com o recomendado pela cartilha econômica mais prudente.

            Na versão oficial do Banco Central, o setor público brasileiro acusou, em 2009, um índice de gastos bem responsável em relação ao Produto Interno Bruto registrado para aquele ano. Segundo os dados, a variação dos gastos não avançou além de 2,1% do PIB, acompanhando muito de perto o desenho da curva delineada nos anos anteriores do Governo Lula.

            Mais precisamente, a dívida pública do setor público - excluída a Petrobrás do cálculo - registrou, em 2008, por exemplo, o seu ponto mais baixo da série na década em termos de percentagem do PIB.

            Naquele ano, o Banco Central anotou a correspondência da dívida pública em 38% do PIB, contrastando com 51,3% verificado no último ano do Governo FHC. Para os próximos anos, a taxa projetada pelos técnicos do Ministério da Fazenda gira em torno dos 37%, uma estimativa, aliás, muito atenciosa às reclamações dos mais críticos à postura dos gastos públicos do atual governo.

            Para 2010, segundo os estudos do Secretário Augustin, os mesmos técnicos projetam um percentual do resultado nominal dos gastos públicos em relação ao PIB numa faixa bem mais tranqüila do que aquelas projetadas pelos Estados Unidos e pela Grã-Bretanha.

            Por último, o Brasil aprendeu a difícil lição macroeconômica graças, também, à iniciativa governamental de traduzir as flutuações do ciclo econômico em políticas defensivas anticíclicas, capaz de estocar parte de nossa riqueza em fundos de emergência.

            Em 2008, no auge da crise internacional, a necessidade de amenização da escassez aguda de crédito gerou a criação do Fundo Soberano do Brasil (FSB). Trata-se de um fundo composto por parte do superávit primário, para o qual o Tesouro se comprometeria a fazer transferência obrigatória num percentual de 0,5% do PIB.

            Diante do exposto, é importante reiterar que a atual retomada da explosão econômica do sul brasileiro não se deu por acaso, tampouco por força da natureza.

            É preciso reconhecer que a atuação do Governo Federal no processo de pavimentação dessa nova via de desenvolvimento tem sido condição relevante, senão determinante, no horizonte mais amplo de explicações.

            Enfim, com base nesse pano de fundo, podemos com mais visão compreender as vigas nas quais se ancora a potencialidade futura da nova era de expansão do Rio Grande.

            Muito obrigado.

            Era o que tinha a dizer.

 

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Estatuto da Igualdade Racial: a dor da esperança!

            Vinte anos anos de sangue, suor e lágrimas.

            Deputados Federais, Deputados Estaduais, Prefeitos, Vices e Secretários, Vereadores, Líderes Sindicais, Representantes dos Partidos, Representantes dos Movimentos Sociais, Representantes dos movimentos dos negros, índios, ciganos, judeus, palestinos, estudantes, aposentados e pensionistas, pessoas com deficiência, idosos, mulheres, da juventude, lutadores pela liberdade de orientação sexual e religiosa, militantes das causas populares, enfim, faço uma saudação especial a todos para falar do ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL.

            Não são as palavras, nem as ações, a maior dor da discriminação é sentida no olhar, é algo inexplicável, mas dói, dói muito, chega a atravessar o nosso peito e atingir a nossa alma.

            Não pensem que foi fácil, não pensem que é fácil ver o Estatuto da Igualdade Racial sendo aprovado após dez anos de debate no Congresso Nacional sem grande parte das reivindicações dos defensores dos direitos humanos, do movimento negro e de não negros.

            Mas ele é nosso! Possui uma representatividade jurídica, história, legal e moral. Nós sabemos, que não é porque com a abolição da escravidão, não vieram às políticas públicas para o povo negro, que o ex-escravos voltaram para as senzalas. A resistência é nossa marca. Nos seguimos lutando. Este é o Estatuto que temos para atingir o que queremos.

            Após trezentos anos de escravidão e cento e vinte e dois anos do pós-abolição, o estado brasileiro abre os olhos e começa encarar a dura realidade do processo de exclusão vivenciado pelos descendentes de escravos no país. Iniciado desde a travessia, como retrata Castro Alves no poema Navio Negreiro, o qual apresento alguns trechos.

            Navio Negreiro - Castro Alves

            Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!

            Desce mais ... ainda mais... não pode olhar humano

            Como o teu mergulhar no brigue voador!

            Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras!

            É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...

            Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus!

            Que horror!

            (...)

            Quem são? Se a estrela se cala,

            Se a vaga à pressa resvala

            Como um cúmplice fugaz,

            Perante a noite confusa...

            Dize-o tu, severa Musa,

            Musa libérrima, audaz!...

            São os filhos do deserto,

            Onde a terra esposa a luz.

            Onde vive em campo aberto

            A tribo dos homens nus...

            São os guerreiros ousados

            Que com os tigres mosqueados

            Combatem na solidão.

            Ontem simples, fortes, bravos.

            Hoje míseros escravos,

            Sem luz, sem ar, sem razão...

            Este não é um momento de ficarmos chorando ou procurando culpados, mas a história está aí, não pode ser apagada, mas a partir de agora pode ser escrita com novos contornos.

            Temos que olhar para o futuro, sem esquecer o passado.

            O Estatuto da Igualdade Racial não é o fim, nem o começo!

            Ele faz parte de um novo patamar da formulação das políticas públicas do país. Foi na África do Sul, em 1990, com Benedita da Silva, Carlos Albeto Caó, Edmilson Valentim, Domingos Leoneli e João Hermann, exigindo, em nome do povo brasileiro, a liberdade de Nelson Mandela que recebi das mãos de Winnie Mandela, a “Carta da Liberdade”, que continha um programa fundamental para a causa anti apartheid. Ela foi divulgada em 1955, pelo Congresso do Povo, a qual Mandela fazia parte, o preâmbulo dizia:.

            “Nós, o Povo da África do Sul para declarar todo o nosso país e do mundo a saber: que a África do Sul pertence a todos os que nela vivem, negros e brancos, e que nenhum governo pode afirmar autoridade a menos que seja baseado na vontade de todas as pessoas, que nosso povo tem roubado de seu patrimônio à terra, à liberdade e à paz por uma forma de governo baseado na injustiça e desigualdade, que o nosso país nunca será próspero ou livre até que todos os nossos povos vivem em fraternidade, a equiparação dos direitos e oportunidades, que só um estado democrático, baseado na vontade de todas as pessoas, pode garantir o seu direito de primogenitura a todos sem distinção de cor, raça, sexo ou credo;”

            A viagem mexeu com nossos sentimentos, desde o momento que diziam que o avião da Varig, com os deputados negros, não posaria na África do Sul.

            Mas o momento mais marcante, que mexeu muito comigo, foi quando participamos de uma reunião, quase secreta, em uma igreja, para debater as táticas e estratégias contra o apartheid, achei que encontraria somente negros, mas o espaço estava dividido, praticamente meio a meio, negros e brancos com um só objetivo: a busca de caminhos para a igualdade.

            Outro momento que jamais esquecerei foi quando caminhávamos pelas ruas de Johannesburg e assistimos em passeata crianças, jovens e idosos sobre a batida do tambor, de lança na mão, numa só voz gritando: Amandla, Amandla, Amandla, ou seja, liberdade, liberdade, liberdade. Naquele, mesmo ano, Mandela foi libertado.

            Retornando ao Brasil, já não era mais o mesmo, após trabalhar e apreender com Edmilson, Bendita e Caó, os textos contra a discriminação racial na Constituinte quando, juntos, inserimos o crime de racismo como imprescritível e inafiançável e a titulação de terras quilombolas no artigo 68 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição. Em seguida, relando da lei Caó, que regulamentou o crime de racismo, senti que poderia ir além.

            E eu fui..., com o apoio do movimento negro, apresentei projetos que tipificam a injuria racial, historia da áfrica e dos afrobrasileiros nas escolas, temas relacionados à saúde da população negra, indenização as vitimas da escravidão, feriado de zumbi dos palmares, reserva de vagas nas peças publicitárias e na mídia, enfim, desde 1990 até 2000 foram mais de vinte projetos sobre o tema. Nós debatemos ostensivamente estes projetos, alguns eu aprovei, outros não.

            Mas, como diz Abidias do Nascimento: “o debate já é uma vitória!” E disso, tenho muito orgulho de ter feito! Vejam, foram 10 anos de idéias e projetos apresentados até a formulação do Estatuto da Igualdade Racial, em 2000.

            Defender as causas sociais, em especial a igualdade racial é um tema muito caro no Congresso Nacional, a correlação de forças é desigual, não chega a 10% o numero de parlamentares negros na Câmara dos Deputados, no Senado atualmente, estou só, um único negro, dentre oitenta e um Senadores, mas este nunca foi motivo para eu me esconder, nestes 24 anos de vida pública, eu tenho orgulho de nunca ter me escondido, seja nos momentos bons ou ruins, da luta, dos erros e acertos, nos meus projetos ou nós que fui chamado a relatar e votar. 

            Nesta caminhada, eu tenho lado! O dos trabalhadores e dos discriminados.

            Gostaria de dizer para os pessimistas, aqueles que são contra tudo e contra todos, que eu sei que os que o defendem no Congresso Nacional, negros, índios, ciganos, idosos e deficientes, a livre orientação sexual e a liberdade religiosa, não voltam, mas isso nunca me intimidou, esta luta está no meu sangue, no meu coração.

            Aos 60 anos, minha vida é um misto de flores e espinhos, de semeaduras e de colheitas e também de tempestades, mas eu posso afirmar, sem dúvida, que, ao percorrer esta estrada encontrei muito mais alegrias do que tristezas.

            Ao olhar para trás, vejo um menino negro de calças curtas, com meus nove irmãos, que aos oito anos amassava barro numa fábrica de vasos na cidade onde nasci em Caxias do Sul.

            Mais tarde esse menino passou a vender quadros e foi também marceneiro e aos dez anos foi fazer voz de gente grande na feira livre da capital, Porto Alegre, longe dos meus pais.

            Então um dia, quando contava 12 anos, vi meu pai apontar ao longe na feira e corri para os braços dele. Eu sabia que corria para o futuro que me esperava, sabia que era o início de uma vida nova. Abri os braços como se estivesse a voar.

            E foi assim, minha gente, que segui em direção ao meu pai, que o abracei, apertei com força e ouvi as palavras que tanto desejava: - “Filho, você foi chamado para a vaga que disputou no concurso para o SENAI, em Caxias do Sul. Você agora vai voltar para junto de mim, de sua mãe e de seus irmãos”... E desta forma eu voltei para casa e a estrada de 40 Km que percorria a pé ou de bicicleta diariamente para chegar ao SENAI foi se fazendo estrada da vida, de muito estudo e aprendizado, de consciência do mundo dos adultos.

            Está foi à porta da minha oportunidade, a minha experiência, mas sei que não existe formula, cada um deve escrever o seu caminho, mas demonstra que a idéia do Estatuto da Igualdade Racial é direcionar um olhar especifico para uma parcela da população, onde as portas, em grande parte, estão fechadas.

            Lembro-me também, quando no dia da minha formatura, fui barrado em um clube porque era negro, os meus amigos brancos, também se recusaram a entrar e fizemos uma grande festa no meio da praça sobre a luz do luar, os flocos de neve caiam como se abençoando aquele momento, Deus não tem cor.

            Tenho certeza, que milhares de jovens, enfrentam desafios maiores que os meus, não só negros, mas brancos, mas a exclusão, o preconceito a discriminação estão enraizadas contra os negros, por isso, o reconhecimento do ESTADO é tão importante para atingirmos a inclusão quantitativa e qualitativa. Nós estamos buscando um desafio maior do que uma vaga na universidade ou no mercado de trabalho, nós queremos sim o ingresso, mas acima de tudo uma mudança brusca de consciência.

            A caminhada do projeto do Estatuto da Igualdade Racial foi um verdadeiro aprendizado, foram anos de encontros em praticamente todos os estados do Brasil, ouvindo a comunidade negra e branca, sindicalistas, professores, advogados, promotores de justiça, parlamentares, enfim, profissionais de todas as áreas, pessoas de todas as classes sociais, etnias e idades. Enquanto Deputado Federal apresentei, no ano de 2000, o Projeto de Lei (PL) nº 3198, que para instituir o Estatuto da Igualdade Racial.

            No período em que esteve na Câmara, pela primeira vez, foram realizados 23 debates sobre o assunto (9 reuniões ordinárias, 8 seminários, 5 audiências públicas, dentre outras). Isso foi feito através da criação de uma Comissão Especial na Câmara dos Deputados destinada a apreciar a proposta. Ao fim o Deputado Reginaldo Germano apresentou um substitutivo ao projeto, o qual foi aprovado por unanimidade, mas ficou paralisado no Plenário da Câmara dos Deputados.

            Em 2003, quando fui eleito Senador da República, reapresentei o projeto, iniciamos uma nova tramitação, o projeto de 2000 ficou para trás, mas não esquecemos os debates, assim, sob a designação PLS nº 213/2003, a matéria passou a tramitar no Senado, passou por quatro comissões, foram realizadas diversas audiências entre internas e externas, como no Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia e Minas Gerais.

            O substitutivo ao projeto do Estatuto elaborado pelo Senador Rodolpho Tourinho foi aprovado, jamais irei me esquecer da contribuição dada por ele e pelos Senadores Roseana Sarney e Cesar Borges e Antônio Carlos Magalhães. 

            Naquele momento, a principal modificação feita pelo Senado foi a retirada da criação do Fundo de Promoção da Igualdade Racial, o qual havia sido incluído na Câmara. Criou-se uma polêmica durante a tramitação no Senado Federal devido à inconstitucionalidade de origem.

            Para resolver essa questão, retirei o assunto do Estatuto e apresentei a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 02 de 2006. Essa PEC pretende alterar os artigos 159 e 239 da Constituição Federal e acrescentar o art. 227-A a seu texto, para dispor sobre o tema.

            O Estatuto da Igualdade Racial foi enviado à Câmara dos Deputados em 29 de novembro de 2005. Apenas após dois anos, com a pressão popular (destaque-se que o movimento negro enviou cem mil assinaturas em favor do projeto) foi instituída, dia 10 de março de 2008, a Comissão Especial para debater o tema, sob a presidência do Deputado Carlos Santana (PT/RJ) e o Relator da matéria o Deputado Antonio Roberto (PV/MG). Roberto apresentou substitutivo que foi aprovado no mês de novembro de 2009.

            O texto sofreu novas alterações, foram suprimidas as cotas nas universidades, no mercado de trabalho, na mídia, reduziu o percentual para as candidaturas negras na política, do capitulo especifico para as mulheres negras, dos procedimentos para a titulação das terras de quilombo, dentre outras, além da mudança das disposições dos artigos.

            Após quatro anos vendo o projeto parado na Câmara dos Deputados, fui obrigado a reconhecer, o esforço dos deputados da Comissão Especial, eu agradeço a todos, porque afinal, abrir mãos de convicções, não é facial, mas faz parte do processo democrático. Podem ter certeza, é melhor assim.

            Deixo aqui registrado para os Anais do Congresso Nacional o nome de todos os parlamentares que fizeram parte da Comissão Especial que aprovou o Estatuto da Igualdade Racial lá na Câmara dos Deputados. Meus cumprimentos a todos, titulares e suplentes.

                         
CÂMARA DOS DEPUTADOS
            
            COMISSÃO ESPECIAL DESTINADA A PROFERIR PARECER AO PROJETO DE LEI Nº 6264, DE 2005, DO SENADO FEDERAL, QUE "INSTITUI O ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL". (ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL)
PRESIDENTE: Deputado CARLOS SANTANA (PT/RJ)
1º VICE-PRESIDENTE: Deputado DAMIÃO FELICIANO (PDT/PB)
2º VICE-PRESIDENTE: Deputado
3º VICE-PRESIDENTE: Deputada JANETE ROCHA PIETÁ (PT/SP)
RELATOR: Deputado ANTÔNIO ROBERTO (PV-MG)
TITULARES SUPLENTES
PMDB/PT/PP/PR/PTB/PSC/PTC/PTdoB
CARLOS SANTANA (PT/RJ) - 55286 CARLOS BEZERRA (PMDB/MT) - 55815
JANETE ROCHA PIETÁ (PT/SP) - 55578 DALVA FIGUEIREDO (PT/AP) - 55704
LEONARDO QUINTÃO (PMDB/MG) - 55914 DR. ROSINHA (PT/PR) - 55474
LUIS CARLOS HEINZE (PP/RS) - 5-5526 GILMAR MACHADO (PT/MG) - 55262
PASTOR MANOEL FERREIRA (PR/RJ) - 55226 LUIZ ALBERTO (PT/BA) - 55954
PAULO HENRIQUE LUSTOSA (PMDB/CE) - 55945 MOACIR MICHELETTO (PMDB/PR) - 55478
VELOSO (PMDB/BA) - 55622 PAULO ROBERTO PEREIRA (PTB/RS) - 55635
VICENTINHO (PT/SP) - 55740 VALDIR COLATTO (PMDB/SC) - 55610
DEP. DO PRB OCUPA VAGA 1 VAGA
   
PSDB/DEM/PPS
ABELARDO LUPION (DEM/PR) - 55515 ANDREIA ZITO (PSDB/RJ) - 55636
JOÃO ALMEIDA (PSDB/BA) - 55652 GERVÁSIO SILVA (PSDB/SC) - 55418
MÁRCIO JUNQUEIRA (DEM/RR) - 55645 GUILHERME CAMPOS (DEM/SP) - 55367
ONYX LORENZONI (DEM/RS) - 55828 INDIO DA COSTA (DEM/RJ) - 5-5441
RAUL JUNGMANN (PPS/PE) - 55637 JOÃO CAMPOS (PSDB/GO) - 55315 - vaga do PHS
  Paulo Bornhausen (DEM/SC) 55708
   
PSB/PDT/PCdoB/PMN/PRB
DAMIÃO FELICIANO (PDT/PB) - 55938 EDMILSON VALENTIM (PCdoB/RJ) - 55546
EVANDRO MILHOMEN (PCdoB/AP) - 55419 PAULO RUBEM SANTIAGO (PDT/PE) - 55229
MÁRCIO MARINHO (PR/BA) - 55326 (VAGA DO PR)  
   
PV
ANTÔNIO ROBERTO (PV/MG) - 55712 1 VAGA
   
PHS
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            Já no Senado Federal, para revisão final antes de ir para a Sanção presidencial, o Estatuto da Igualdade sofreu um duro golpe na Comissão de Constituição e Justiça, o relator suprimiu mais artigos, relativos à saúde da população negra, ao mercado de trabalho, ao percentual de candidaturas negras e em alguns artigos, o conceito sociológico de raça foi substituído por etnia. 

            O parecer do Senador Demóstenes Torres foi duro, nós fomos à tribuna do Senado em dezembro de 2009, solicitar que não aprovássemos o Estatuto da Igualdade Racial sem ouvir as lideranças do movimento negro, mas não tivemos forças.

            Sei que estamos lutando diariamente pela igualdade racial, em nossos bairros, comunidades, universidade, no trabalho e etc. Mas no Congresso Nacional, as coisas só ocorrem conforme o rufar dos tambores, como fizemos e 1988, 1995 e 2005 com duas marchas para Promoção da Igualdade Racial.

            Não precisamos procurar culpados, não queremos fazer caça as bruxas, mas a reflexão de cada um, de cada uma é importante. Eu estou fazendo a minha.

            Enfim, no dia 16 de julho, o Estatuto foi aprovado no Senado Federal, por unanimidade, eu, certamente carregava um ar de resistência em votar o texto este ano, mas a Seppir e lideranças do movimento negro, cerca de 20, exceto o MNU, analisavam o acordo, a Casa Civil me ligou e disse que o parecer era mais duro que as mudanças, em si. “Paim, deixa votar, na regulamentação do texto proporcionaremos grandes benéficos para a comunidade negra”.

            Sei que não sou o senhor da verdade, não quero fazer do Estatuto uma luta eterna, mesmo com este texto, jamais desistirei de pontos que julgo fundamentais, para debater em um próximo momento.

            Assim é o caso do PLC 180/2008 que institui reserva de vagas nas universidades públicas para alunos das escolas públicas, negros, indígenas e pessoas com deficiência.

            O Senador Demóstenes Torres-DEM, como eu tivemos que romper os limites das nossas convicções para votar o Estatuto da Igualdade Racial, principalmente este ano. Sabemos que ele foi pressionado pela elite conservadora para que o projeto não fosse aprovado mesmo com as alterações incluídas. Como também nós fomos pressionados para que não fosse votado o novo texto, pois queriam o projeto original.

            Mas acordo é acordo no Congresso Nacional, manifestações tardias reforçam a angustia e as necessidades do povo negro, mas como diz o poeta: O caminho se faz caminhando.

            Percorrendo essa longa estrada da vida foram muitas as noites em que fiquei sem dormir e o que me acalentava, o que embalava meu sonho era a canção Negro de 35, escrita pelo gaúcho Francis Beheregary e cantada pelo nosso inesquecível gaudério César Passarinho que nos deixou cedo. Se vivo tivesse hoje teria a minha idade.

            Negro de 35

            (Francis Beheregary)

            A negritude trazia a marca da escravidão

            Quem tinha a pele polianga vivia na escuridão

            Desgarrado e acorrentado, sem ter direto a razão

            Castrado de seus direitos não tinha casta nem grei

            Nos idos de trinta e cinco, quando o caudilho era o rei

            E o branco determinava, fazia e ditava a lei

            Apesar de racional, vivia o negro na encerra

            E adagas furavam palas, ensangüentando esta terra

            Da solidão das senzalas tiraram o negro pra guerra

            (Peleia, negro, peleia pela tua independência

            Semeia, negro, semeia teus direitos na querência)

            Deixar o trabalho escravo, seguir destino campeiro

            As promessas de igualdade aos filhos no cativeiro

            E buscando liberdade o negro se fez guerreiro

            O tempo nas suas andanças viajou nas asas do vento

            Fez-se a paz, voltou a confiança, renovaram pensamentos

            A razão venceu a lança e apagou ressentimentos

            Veio a lei Afonso Arinos cultivando outras verdades

            Trouxe a semente do amor para uma safra de igualdade

            Porque o amor não tem cor, sem cor é a fraternidade

            (Peleia, negro, peleia com as armas da inteligência

            Semeia, negro, semeia teus direitos na querência)

            Essa última parte da letra me dizia que estávamos no caminho certo. Fizemos muito, mas com certeza temos muito ainda por fazer.

            Meus amigos, Senadores e Senadoras,

            Não posso deixar de parabenizar o Ministro Eloi Araujo e o ex-ministro Edson Santos pela determinação em aprovar o Estatuto da Igualdade Racial, eu, jamais vi tamanha peregrinação de Ministro no congresso Nacional para aprovar uma matéria. 

            Eu senti a convicção de ambos, na importância de aprovar o texto agora e continuar o debate para melhorá-lo, assim como estamos fazendo com a Constituição Federal, com o Estatuto do Idosos e as mais diversas leis.

            O texto do Estatuto da Igualdade Racial aprovado no Senado Federal, que irá para a sanção do Presidente Lula, dia 20 de julho é um convite a reflexão, aponta caminhos, resguardam direitos, legitima as ações afirmativas, por isso, deve ser lido e relido pela militância, pelo poder público, pela iniciativa privada e nas universidades, ele embora não seja o ideal, mantém pontos estruturantes e um conjunto de ações.

            O Estatuto da igualdade racial no seu TITULO I - manifesta nos seus ARTIGOS INICIAIS, DO PRIMEIRO AO TERCEIRO a posição contraria do ESTATUTO a todo e qualquer tipo de discriminação e preconceito e estabelece as diretrizes para implementação de políticas públicas de promoção da igualdade de direitos e de oportunidades;

            No ARTIGO QUARTO, indica os caminhos para que os poderes públicos e a iniciativa privada promovam medidas de inclusão social, com um olhar especifico para a população negra;

            Consagra expressamente a legalidade do principio das ações afirmativas NO ARTIGO QUARTO INCISOS II e VII, bem como no ARTIGO DECIMO QUINTO que estabelece que as ações afirmativas não devem ser mera liberalidade, mas uma imposição, uma postura do Estado brasileiro, afirmando que “ O poder público adotará, vejam, adotará, programas de ações afirmativas”. Assim, a política de cotas, se enquadra perfeitamente, bem como os bônus ou pontuação adicional em provas e concursos. Fortalecendo assim, a defesa jurídica das mais de cem instituições de ensino superior publicas que adoram ações afirmativas, bem como o Prouni.

            O conceito de REPARAÇÃO, ARTIGO QUARTO parágrafo único, a confirmação da adoção de programas de ações afirmativas destinadas a reparar as distorções e desigualdades sociais e demais práticas discriminatórias adotadas nas esferas públicas e privadas durante o processo de formação social do País;

            No TITULO II- CAPITULO I, DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS, O CAPITULO DA SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA vem em primeiro e apresenta nos ARTIGOS SEXTO E SÉTIMO diretrizes na lei ordinária da política nacional de saúde integral da população negra. Estabelece a participação negra nos conselhos de saúde, a coleta de dados por gênero, etnia, e cor, o fomento a pesquisas as doenças da população negra e o acesso universal e igualitário ao Sistema Único de Saúde para promoção, proteção e recuperação da saúde da população negra.

            O TITULO II - CAPITULO II - DO DIREITO A EDUCAÇÃO, A CULTURA , AO ESPORTE E AO LAZER é subdividido em quatro seções, seção I - disposições gerais, seção II- da educação; seção III - da cultura; seção IV - do esporte e lazer.

            Assim, no campo da EDUCAÇÃO, o Estatuto vem reafirmar a importância do multiculturalismo na educação com a obrigação do ensino da Historia Geral da África e da População negra no Brasil, mas vai além, ao elencar os passos essenciais para que a lei seja cumprida, como formação inicial e continuada de professores e a elaboração de material especifico, a valorização de datas cívicas da comunidade negra com a participação do movimento negro e um incentivo especial nas áreas da pesquisa e integração acadêmica, apoio aos núcleos e centros de pesquisas dos diversos programas de pós-graduação e extensão universitária.

            O reconhecimento cultural, da contribuição negra na sociedade aparece nos ARTIGOS DECIMO SÉTIMO AO VIGESIMO SEGUNDO, onde sociedades negras e clubes negros são reconhecidos como patrimônio histórico e cultural, a valorização da capoeira como bem de natureza imaterial, o ensino nas instituições publicas e privadas por mestres, públicos e formalmente reconhecidos.

            Além de reconhecer o incentivo à prática de esporte como ferramenta socialização e integração étnica.

            Em um Estado Laico, a liberdade de consciência e crença e ao livre exercício dos cultos religiosos deve ser assegurada, por isso o TITULO II - CAPITULO III, nos ARTIGOS VIGESSIMO TERCEIRO AO VIGESSIMO SEXTO garantem a liberdade para a prática de religiões de matrizes africanas, além disso, assegura assistência religiosa aos praticantes internados nos hospitais ou em outras instituições de internação coletiva, inclusive aos submetidos à pena de privação de liberdade, a proteção aos sítios religiosos e a participação dos membros das religiões de matrizes africanas .

            No TITULO II - CAPITULO IV, DO ACESSO A TERRA E A MORADIA ADEQUADA, os nossos quilombolas, são reconhecidos pela contribuição a nação brasileira, existe um olhar especifico que se inicia no ARTIGO DEZOITO e segue pelos ARTIGOS TRIGESSIMO PRIMEIRO, TRIGESSIMO TERCEIRO E TRIGESSIMO QUARTO, aonde os moradores das comunidades de remanescentes de quilombolas serão beneficiários de incentivos específicos para a garantia do direito a saúde, incluindo melhorias nas condições ambientais, no saneamento básico, na segurança alimentar e nutricional e na atenção integral a saúde.

            Será assegurado à população negra o acesso a terra, a assistência técnica rural, a simplificação do acesso ao crédito agrícola e o fortalecimento da infra-estrutura logística para a comercialização da produção, os remanescentes das comunidades dos quilombos receberão dos órgãos competentes tratamento especial e diferenciado, assistência técnica e linhas de especiais de financiamento público, destinados a realização de suas atividades produtivas e de infra-estrutura, e por fim, aos remanescentes das comunidades quilombolas que esteja ocupando as suas terras é reconhecido a propriedade definitiva devendo o estado emitir os títulos respectivos, para os fins de política agrícola, este ultimo item, para os que não entenderam, ajuda a combater a ADIN contra os quilombolas que está no STF.

            Lá o debate diz que o artigo 68 do ATO DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS que assegura a titulação de terras aos quilombolas, não pode ser auto-aplicável, ou seja, o governo não poderia por um decreto conceder a titulação das terras, assim, precisaria uma lei, tal qual o artigo TRIGESSIMO PRIMEIRO do Estatuto para que o governo instituísse os decretos. Ainda não temos a posição final do STF, mas a lei já está ai.

            Dos ARTIGOS TRIGESSIMO QUINTO AO TRIGESSIMO SÉTIMO, são exemplos concretos que o ESTATUTO DA IGUALDADE irá beneficiar a todos, ao tratar de um problema crucial dos grandes centros urbanos, que é a questão da moradia, assim o poder público garantirá a implementação de políticas públicas para assegurar o direito à moradia adequada da população negra que vive nas favelas, cortiços, áreas urbanas subutilizadas, degradadas ou em processo de degradação, a fim de reintegrá-las à dinâmica urbana e promover melhorias no ambiente e qualidade de vida. Negros, brancos e indígenas que vivem em áreas alta vulnerabilidade serão beneficiados, porque as melhorias beneficiarão ao coletivo.

            Com infra-estrutura urbana e dos equipamentos comunitários associados à função habitacional, bem como a assistência técnica e jurídica para a construção, a reforma ou a regularização fundiária da habitação em área urbana.

            O TITULO II - CAPITULO V- DO TRABALHO, aborda diretrizes para implementação de políticas especificas nas áreas do Trabalho dos ARTIGOS TRIGÉSSIMO OITAVO AO QUADRAGESSIMO SEGUNDO, estabelecendo que o poder publico promoverá ações que assegurem igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra, inclusive mediante a implementação de medidas visando a promoção da igualdade racial, nas contratações do setor publico e o incentivo a adoção de medidas similares nas empresas e organizações privadas.

            Neste momento, as cotas não foram contempladas como queríamos, porém, o principio estabelecido dará liberdade às empresas privadas e ao poder público de qual caminho seguir, de acordo com a realidade local. O FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR terá um papel especial para elaborar programas e projetos voltados para a inclusão da população negra no mercado de trabalho e orientará a destinação de recursos para o seu financiamento.

            O estímulo ao empreendedorismo negro também está contemplado com o estimulo ao turismo étnico, e aos micro e pequenos empresários.

            O TITULO II CAPITULO VI - DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO e um dos mais importantes, que precisaremos trabalhar muito, afinal as cotas na mídia não foram contempladas, para a auto estima da população negra, e importante que possamos nos enxergar, cada vez mais, principalmente em um veiculo que esta em todas as casas, mas enfim, os ARTIGOS que vão do QUADRAGESSIMO TERCEIRO AO QUADRAGÉSIMO SEXTO demonstram o principio da igualdade de participação dos negros nos filmes, peças publicitárias, sempre respeitando as produções publicitárias quando abordarem especificidades de grupos étnicos não negros.

            O capitulo escancara para toda a sociedade que nos negros não estamos representados na mídia e que mesmo sem as cotas, nos queremos respostas.

            Além disso, os órgãos e entidades da administração pública federal e direta, autárquicas ou fundacional, as empresas públicas e de sociedades de economias mistas federais deverão incluir clausulas de participação de artistas negros nos contratos de realização de filmes, programas ou quaisquer outras peças de caráter publicitário. Respeitando as ações/filmes com identidades étnicas especificas.

            O acompanhamento e monitoramento das ações de promoção da igualdade racial aparecem no texto com a criação do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, no TITULO III - CAPITULO I, II e III que vai DOS ARTIGOS QUADRAGÉSSIMO SETIMO QÜINQUAGÉSIMO, como forma organizativa e de articulação para implementação das políticas públicas destinadas a corrigir e superar as desigualdades étnicas existentes no país.

            Institui ainda em âmbito do poder executivo federal o plano nacional para implementação da política nacional de promoção da igualdade racial atribuindo a Secretaria Especial de Políticas para Promoção da Igualdade Racial a responsabilidade para articular, elaborar e monitorar tais políticas;

            O TITULO III - CAPITULO IV - DA JUSTICA E SEGURANCA DOS ARTIGOS QUINQUAGESIMO PRIMEIRO AO QUINQUAGESIMO QUINTO trata da criação no âmbito dos poderes legislativos e executivo de ouvidorias permanentes em defesa da igualdade racial. Trata de cursos de formação para as policias em relação a igualdade racial e estabelece que o Ministério Público reforce a suas estruturas para atuar na defesa e promoção da igualdade racial.

            O TITULO III - CAPITULO IV - trata do FINANCIAMENTO DAS INICAITIVAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL - previstos nos ARTIGOS QÜINQUAGÉSIMO SEXTO E QÜINQUAGÉSIMO SÉTIMO do Estatuto prevê fonte de financiamento para programas e ações que visem a promoção da igualdade racial, os orçamentos anuais da união, por exemplo, deverão contemplar as políticas de ações afirmativas destinadas ao enfrentamento das desigualdades raciais nas áreas da educação, cultura, esporte e lazer, saúde, trabalho, meios de comunicação de massa, moradia, acesso a terra, segurança, acesso a justiça, financiamentos públicos e outros.

            Vale destacar que o poder público priorizara o repasse dos recursos referentes aos programas e atividades previstos no Estatuto aos Estados, Distrito Federal e municípios que tenham criado conselho da igualdade racial.

            Por fim, o TITULO III - CAPITULO V - apresenta as disposições finais, dos ARTIGOS QUINQUAGESSIMO OITAVO ao SEXAGÉSIMO QUINTO os quais apresentam alterações legislativas para a punição do crime de racismo na internet, violência contra a saúde das mulheres negras, discriminação no mercado de trabalho e a destinação das condenações de racismo a um fundo especifico, além de respeitar as normas já existentes e garantir o monitoramento das ações do Estatuto.

            Vale destacar, que o Estatuto da Igualdade Racial e uma das primeiras leis que reconhece as assimetrias entre as mulheres negras no âmbito da sociedade, acentuando que existe distancia social entre elas e os demais segmentos da sociedade. O que deve ser aplicado em um todo, conforme os ARTIGOS PRIMEIRO, INCISO III, ARTIGO OITAVO, INCISO II, ARTIGO DECIMO TERCEIRO, INCISO III, ARTIGO 39 e os PARÁGRAFO QUARTO, QUINTO E SEXTO, ARTIGO CINQUENTA E DOIS PARAGRAFO ÚNICO

            O Estatuto da Igualdade Racial reconhece a importância de um olhar especifico para a juventude negra com campanhas educativas, inclusive nas escolas para que a solidariedade aos membros da população negra faça parte da cultura de toda a sociedade, da implementação de políticas publicas para o fortalecimento da juventude negra brasileira, alem de ações de ressocializaçao da juventude negra com a lei expostas a experiências de exclusão social. Conforme o CAPITULO DA EDUCAÇÃO E OS ARTIGOS DECIMO, INCISO QUARTO e ARTIGO QUINQUAGESSIMO TERCEIRO, PARAGRAFO ÚNICO.

            Bem, este é o Estatuto da Igualdade Racial, aos que não leram, leiam, pois ele reconhece a existência do movimento negro que tem sido vanguarda das transformações sociais, das nossas ações como lanceiros negros.

            Mas é obvio, não se enganem, no centro da discussão deste debate existe um componente ideológico; precisamos alcançar com o Estatuto da Igualdade uma consciência pública que de fato é necessário tratar desigualmente os desiguais para atingirmos a verdadeira igualdade, temos que trabalhar o desprendimento de algumas de nossas ações; um desprendimento com amor similar ao de um pai ou de uma mãe que perde a sua noite de sono para embalar a criança, que deixa os seus desejos para depois, porque quer o melhor para seu filho, para o seu neto e para seu bisneto. Isso é pensar na sociedade.

            Mas a mudança de consciência não é espontânea, o editorial do jornal Zero Hora do Rio Grande do Sul, de 20 de junho de 2010, intitulado ““ESPIRITO DE CONCILIAÇÃO” retrata bem isso,

            ... A busca da igualdade e o combate a qualquer forma de preconceito e discriminação têm que ser objetivos permanentes dos nossos legisladores, pois esta é a vontade inequívoca da população”.

            Por isso, nós somos autores dos Estatutos do Idoso e da Pessoa com Deficiência, lutamos arduamente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, articulamos e aprovamos aqui no Senado Federal a PEC da Juventude. Vamos aprovar, com certeza, o Estatuto da Juventude e o Plano Nacional de Políticas Públicas para a Juventude.

            Defendemos os direitos das mulheres, dos indígenas, de brancos, negros, ciganos, judeus, palestinos, enfim, dos excluídos e discriminados.

            Aos que são contra a criação do Estatuto da Igualdade Racial, faço um convite para andar pelas ruas, ver as diferenças que existem no rosto das pessoas ao caminhar pelas ruas dos grandes centros do país, em seguida, vamos as lojas de shopping Center, aos consultórios médicos, de advogados, dos diretores das empresas, nas universidades, olhem ao redor, parem dez minutos enfrente aos telejornais, novelas e comerciais para verificarem se não existem dois brasis.

            O mês de julho é simbólico, pois representa o mês aniversário de Nelson Mandela; da Leitura, em frente ao Teatro Municipal de São Paulo, da carta aberta à nação contra o racismo, inaugurando o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial; do Nascimento do poeta Solano Trindade; da cidadania; do voluntariado; da caridade; da amizade; combate a tortura; da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente; do protetor das florestas; da liberdade de pensamento; da mulher negra Afro-latino-americana e Caribenha; do mês Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, enfim, de momentos marcantes que unificam o sentimento e a importância do Estatuto da Igualdade Racial que é não um abandono ao inconformismo, que não vem para acabar com a dor de um povo, pelo contrário, o momento é de expor as feridas, aplicar o remédio e descobrir a cura.

            Quero dizer para vocês que as causas dos movimentos sociais, do movimento negro estão acima de siglas partidárias e dos nomes. Para mim vocês são os sujeitos da história. Vocês são os meus heróis. Não nos esqueçamos dos que tombaram para chegarmos até aqui, como Zumbi, Malcolm X, de Martin Luther King, de Oliveira Silveira, do José Alves Bittencourt (o Lua), Dandara, Luiza Mahin, Rosa Parkson, dentre, tantos outros que deram a sua vida para que esse momento acontecesse.

            Parabéns a todos que lutam por direitos. A chama está viva! Não importa o que aconteça, não vamos poupar força e nem coragem, para seguir em frente.

            O horizonte que se agiganta a nossa frente é uma estrada que espera ser trilhada com firmeza, por corações iluminados, com boa vontade e com fé. Fé em Deus, fé em todas as possibilidades que o Criador colocou em cada um de nós, fé na união que nos levará a seguir adiante com esse projeto que é a razão de nossas vidas.

            Lutaremos eternamente pela igualdade, pela justiça e para que brancos e negros tenham os mesmos direitos e deveres.

            Por tudo isso, é que eu:

            “sou Gandhi,

            ...sou Mandela,

            ...sou Brasil;

            ...sou Zumbi;

            ...sou Abdis Nascimento;

            ...e sou Luis Inácio Lula da Silva!”

            Muito obrigado! 

            Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/07/2010 - Página 37580