Discurso durante a 132ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às declarações do Presidente Lula diante de sentenças de pena de morte por apedrejamento impostas a mulheres em países estrangeiros.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. DIREITOS HUMANOS. ELEIÇÕES. LEGISLATIVO.:
  • Críticas às declarações do Presidente Lula diante de sentenças de pena de morte por apedrejamento impostas a mulheres em países estrangeiros.
Publicação
Publicação no DSF de 03/08/2010 - Página 38855
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. DIREITOS HUMANOS. ELEIÇÕES. LEGISLATIVO.
Indexação
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NEGAÇÃO, INTERVENÇÃO, CONDENAÇÃO, POLEMICA, PENA DE MORTE, MULHER, ACUSAÇÃO, TRAIÇÃO, MARIDO, PAIS ESTRANGEIRO, IRÃ, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, TEXTO, JORNALISTA, LEITURA, REPUDIO, CONDUTA, PRESIDENTE, DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DECLARAÇÃO, POSSIBILIDADE, CONCESSÃO, ASILO, MULHER, CONDENADO, PENA DE MORTE, PAIS ESTRANGEIRO, IRÃ, CRITICA, ORADOR, ANUNCIO, DECISÃO, ESTADO, OBJETIVO, PROMOÇÃO, CAMPANHA ELEITORAL, IMPUNIDADE, IRREGULARIDADE, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, EXPECTATIVA, FISCALIZAÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE).
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REJEIÇÃO, CONDUTA, SENADO, DEFESA, ORADOR, ATUAÇÃO, BANCADA, OPOSIÇÃO, LUTA, INDEPENDENCIA, LEGISLATIVO, ESPECIFICAÇÃO, EXTINÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), ATENDIMENTO, INTERESSE, POPULAÇÃO.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Augusto Botelho, Senador Marco Maciel, Srs. Senadores, nestes tempos de campanha eleitoral, há fatos relevantes que acabam caindo no esquecimento ou tendo a sua importância minimizada. Alguns desses fatos ocorreram nos últimos dias. Começo por um deles, Sr. Presidente, que tem conotação com esse debate sobre direitos humanos, que extrapola nossas fronteiras e chega, evidentemente, a nações longínquas de regimes diferentes.

            Na quarta-feira passada, o Presidente Lula lavou suas mãos diante de um fato da maior gravidade, anunciado internacionalmente. O Presidente negou socorro a uma mulher condenada à morte por apedrejamento no Irã. Eu faço referência a um fulminante artigo do jornalista Augusto Nunes, que alvejou com virulência a postura adotada pelo Presidente Lula. Ele disse no início seu artigo:

Até na morte por apedrejamento o Irã dos aiatolás consegue ser mais brutal com as mulheres. Os homens, enterrados na areia até a cintura, ficam com os braços livres para proteger o rosto. Nem isso será permitido a Sakineh Mohammadi Ashtiani, viúva de 43 anos, já punida com 99 chibatadas e agora à espera do ritual instituído em 1983. O Código Penal determina que as mulheres sejam enterradas até a altura do busto, com as mãos amaradas por cordas e o corpo enrolado num tecido branco. Não podem sequer defender-se das pedras atiradas a curta distância sob o olhar da multidão reunida na praça.

Agravante: as pedras são pedras pequenas para prolongar o sofrimento. Em média, durante uma hora, essas mulheres são apedrejadas até que morram por traumatismo craniano. É um modelo de perversidade ímpar. Nem mesmo na Idade da Pedra se admitiria tal perversidade com as mulheres.

Esse fato despertou o apelo mundial. Através da Internet especialmente, campanhas foram organizadas na tentativa de salvar esta mulher, e no Brasil lançaram a campanha “Liga Lula”. Imaginavam que o Presidente Lula, que se diz amigo do ditador do Irã, pudesse fazer um apelo pela salvação dessa mulher. E o Presidente negou-se. Disse o seguinte:

Um Presidente da República não pode ficar na Internet atendendo a tudo que alguém pede de outro país. Veja, eu pedi pela francesa e pelos americanos que estão lá, pedi para a Indonésia por um brasileiro, pedi para a Síria por quatro. É preciso cuidado, porque as pessoas que têm leis, as pessoas têm regras, as pessoas, sabe... Se começam a desobedecer às leis deles para atender a pedido de presidentes, vira uma avacalhação.

            Foi o que disse o Presidente para justificar a sua omissão em relação a esse caso.

            Peço a V. Exª, inclusive, que transcreva nos Anais o artigo de Augusto Nunes sobre essa posição do Presidente da República.

            Mas, ao final, depois de alguns dias, mais precisamente no sábado, o Presidente mudou de posição e anunciou uma decisão de Estado em cima do palanque eleitoral. É uma questão a ser discutida.

            O que se discute é que o Presidente não pode fazer campanha, a não ser nos horários de folga. Agora, nós temos que discutir se o Presidente pode adotar decisões de Estado no horário de folga em cima de um palanque eleitoral.

            Ele disse em Curitiba, no comício na Boca Maldita, o seguinte:

Eu tenho que respeitar a lei de um país, mas se vale a minha amizade e o carinho que tenho pelo presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, e pelo povo iraniano, se esta mulher está causando incômodo, nós a receberíamos no Brasil. Já que minha candidata é uma mulher, eu queria fazer um apelo a meu amigo Ahmadinejad, ao líder supremo do Irã, e ao governo do Irã.

            E o Presidente colocou o País à disposição para que essa mulher possa aqui viver.

            É claro que a mim causa espanto ver o Presidente tratando um ditador sanguinário com tanto carinho e apreço. Quando o Presidente diz: “Meu amigo, por quem tenho carinho”, isso é ofensivo, certamente uma agressão àqueles que condenam a prática do autoritarismo, sobretudo que condenam governos, que assassinam seus adversários e mandam apedrejar mulheres até a morte. Esse é o governo representado pelo amigo do Presidente Lula. Então, no mínimo, isso nos causa um espanto.

            Mas quero fazer a leitura, Sr. Presidente, porque imagino ser alguém que pode falar a respeito. Reinaldo Azevedo, no seu blog, diz o seguinte:

Na quarta-feira, Lula lavou as mãos na bacia de sangue da tirania iraniana e não quis se envolver com o caso da iraniana Sakineh Mohammadi, condenada à morte por apedrejamento.

No sábado, fez uma oferta a Ahmadinejad - por quem tem ‘carinho e amizade’: recebe a mulher no Brasil se ela é um ‘incômodo’ no Irã.

A censurada imprensa daquele país, que até então ignorava o caso, passou a tratar do assunto, dando destaque justamente à ‘oferta’ de Lula. Um dos filhos de Sakineh afirmou que há a possibilidade de o governo do Irã aceitar a proposta.

Está em curso uma operação casada para maquiar tanto a moral de Ahmadinejad como a de Lula. Sakineh se transformaria numa espécie de ‘bode exultório’ do suposto apreço que esses dois magníficos governantes teriam pelos direitos humanos.

O negador do Holocausto,que pendura em guindastes seus adversários, demonstraria a sua face compreensiva, enviando uma condenada para o Brasil. Lula, por sua vez, provaria ao mundo que a sua política de aproximação e diálogo com o Irã é proveitosa, resultando num fato positivo.

É próprio dos tiranos, dos ditadores, dos demagogos fazer a história girar pelo avesso, invertendo, se preciso, até mesmo o sentido das palavras - coisa de que George Orwell tratou como ninguém no livro 1984. Há, sim, a possibilidade de Sakineh ser enviada ao Brasil, como exemplo da humanidade e da sensibilidade de Lula e de... Ahmadinejad!

De certo modo, o financiador de terrorismo deve a seu colega esse ‘favor’. Afinal, o Babalorixá queimou boa parte da sua reputação internacional emprestando seu apoio incondicional ao governo iraniano. Não se espantem se a mulher for enviada diretamente do apedrejamento para o palanque de Dilma Rousseff..

Tal gesto teria repercussão mundial. Os antiamericanos e a esquerdalha mundo afora tratariam o evento como a absolvição do regime iraniano e da política externa destrambelhada do Brasil. Ahmadinejad continuaria a enforcar seus adversários - para os quais Lula não oferece asilo -, e o Babalorixá continuaria a alimentar sua ‘amizade’ e seu ‘carinho’ pelo terrorista nuclear. Lula se oferece para ‘salvar’ a vida de Sakineh para que Ahmadinejad continue a matar sem medo de ser feliz.

            Este é o artigo do jornalista que faço questão de reproduzir.

            É evidente que esse é um assunto da maior importância, em que pese o fato de alguns brasileiros certamente preferirem que se abordem outros temas. Nós já estamos acostumados a contemplar a passividade com que os democratas do nosso País aceitam as imposições do Presidente da República na adoção de comportamento que, lastimavelmente, afrontam os mais elementares valores que dizem respeito à democracia, a liberdades democráticas e direitos humanos.

            Estamos acostumados a ver o nosso Presidente passando a mão na cabeça de totalitários mundo afora. Esse fato ocorre em praça pública, diante da população do meu Estado, em Curitiba, na chamada Boca Maldita. E o questionamento que se faz é também esse. Esse é um questionamento que diz respeito à legislação eleitoral do País.

            O Presidente, como tal, não pode fazer campanha eleitoral - é o que se estabeleceu como norma legal - e, portanto, ao fazer a campanha eleitoral, deve se utilizar de momentos da sua folga. Mas isso se torna contraditório quando, em cima do palanque, o Presidente adota uma posição oficial e anuncia decisão de Estado. Essa é a questão que deve ser debatida, analisada e, certamente, avaliada pelos julgadores que integram o Tribunal Superior Eleitoral.

            Afinal, a impunidade não pode prevalecer sempre. Há que se colocar um paradeiro nesse itinerário de descumprimento da lei, de afronta aos julgadores do País.

            E, antes de concluir, Sr. Presidente, mais um tópico da fala do Presidente da República, no comício de Curitiba. Disse o Presidente: “Peço a Deus que essa companheira não tenha o Senado que eu tive. Um Senado que ofenda o Governo, como eu fui ofendido.”

            Ora, Sr. Presidente, faço oposição há sete anos e meio. No entanto, jamais ofendi o Presidente da República. Não creio que fazer oposição seja ofender. Defender convicções, exercitar na plenitude o mandato parlamentar com liberdade, exigir a interdependência entre os Poderes não é ofensa ao Presidente da República. O Presidente gostaria de ter um Senado submisso, um Senado acocorado diante da sua vontade autoritária. E o Presidente sempre se refere ao fato de ter o Senado Federal sepultado a CPMF. O Senado rejeitou a pretensão do Governo de prorrogar a CPMF. Não perdoou o Senado o Presidente, exatamente por este feito, que atendeu às expectativas do povo brasileiro.

            Qualquer consulta à opinião pública indicaria que o desejo de 80% ou mais do povo do País era que o Senado decretasse o fim da CPMF, mas o Presidente não se conforma. E ele agride o Senado, reiteradamente, fazendo referência à rejeição da CPMF - CPMF que não resolvia a questão da saúde pública brasileira. A saúde já era um caos quando o Senado Federal acabou com a CPMF, até porque os recursos oriundos da CPMF não estavam sendo aplicados em saúde pública no País. Não se compravam hospitais, não se compravam UTIs, não se pagavam condignamente enfermeiros e médicos, estimulando-os a essa atividade fundamental que é tratar da saúde do povo do País. Não! Os recursos oriundos da CPMF eram destinados a reduzir o déficit primário do Governo; era utilizado para atender a despesas correntes, atender a despesas de pessoal. Lamentavelmente, não eram recursos destinados a resolver os problemas do sistema de saúde pública do País.

            E o mais importante: comprovou-se que, com o fim da CPMF, não houve redução da receita; ao contrário, houve um incremento, o País passou a arrecadar mais e vem batendo recordes de receita. Não cabe ao Presidente justificar a sua ira contra o Senado Federal com o fato de ter esta Casa rejeitado a CPMF.

            Eu até poderia dizer, Sr. Presidente, que o Senado Federal falhou, e muito. Tivemos problemas graves que afetaram a credibilidade desta Instituição, da maior importância para a democracia. E poderia dizer, sem ironizar, que o Senado pecou, sim, gravemente, em agosto de 2005, quando deixou de avaliar a hipótese de se instaurar um processo de impeachment do Presidente da República, diante do escândalo monumental do mensalão, que sacudiu e indignou o povo brasileiro.

            Se tivermos que apontar as falhas desta Casa, temos falhas a apontar, mas que não seja esta de que o Senado ofendeu o Presidente da República. O Senado ofende a Nação quando não agride os problemas cruciais, quando não aponta as falcatruas que ocorrem e os desvios monumentais e históricos que vivencia o poder público no País. Nesse caso e nessa circunstância, o Senado agride a sociedade brasileira.

            O Presidente da República usa um linguajar oportunista quando agride esta Instituição. Medidas que deveria o Presidente adotar para resguardar o conceito e a credibilidade desta Instituição não foram adotadas. Ao contrário, o que faz o Presidente é abortar comissões parlamentares de inquérito para impedir investigação.

            Usa do seu poder e da sua força para impor o rolo compressor que esmaga o direito da Minoria de investigar supostas irregularidades no seu Governo. Isso, sim, agride a instituição parlamentar, e não o contrário. Ou quando, diante do impasse que vivemos aqui, relativamente à Presidência do Senado, o Presidente da República atuou, pessoal e diretamente, para impedir que o Conselho de Ética pudesse julgar.

            Enfim, são questões precedentes, são fatos do conhecimento público que demonstram ser a relação do Presidente da República com o Senado Federal agressiva, em relação ao conceito, à imagem e à credibilidade desta Instituição. São atitudes do Presidente que menosprezam, que amesquinham, são atitudes que desgastam, que achincalham uma instituição sagrada, que é a instituição parlamentar.

            Por isso, Sr. Presidente, lamentamos que, em nome no desejo de conquistar votos para os seus candidatos e influir na composição do Senado a partir de janeiro do próximo ano, o Presidente da República adote esse comportamento que agride a instituição Parlamentar.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ALVARO DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

Artigo de Augusto Nunes;

Blog do Reinaldo Azevedo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/08/2010 - Página 38855