Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a questão da segurança pública no Brasil. Leitura de editorial do jornal Valor Econômico, do dia 27 de julho passado.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO DE PROCESSO CIVIL. SEGURANÇA PUBLICA. ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), GOVERNO FEDERAL.:
  • Considerações sobre a questão da segurança pública no Brasil. Leitura de editorial do jornal Valor Econômico, do dia 27 de julho passado.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/2010 - Página 39920
Assunto
Outros > CODIGO DE PROCESSO CIVIL. SEGURANÇA PUBLICA. ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), GOVERNO FEDERAL.
Indexação
  • REGISTRO, FORMAÇÃO, COMISSÃO ESPECIAL, EXAME, PROJETO DE LEI, REFORMULAÇÃO, CODIGO DE PROCESSO CIVIL, COMPOSIÇÃO, DEMOSTENES TORRES, ANTONIO CARLOS VALADARES, SENADOR, PRESIDENTE, VICE-PRESIDENTE, RELATOR, ORADOR.
  • APREENSÃO, PRECARIEDADE, SEGURANÇA PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, PROBLEMA, CORRUPÇÃO, POLICIA, IMPUNIDADE, CRIME, TRANSITO, PROPINA.
  • LEITURA, EDITORIAL, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, DECISÃO, DELEGADO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), NEGAÇÃO, REGISTRO, BOLETIM, OCORRENCIA, CIDADÃO, VITIMA, AGRESSÃO, GOVERNADOR, CANDIDATO, REELEIÇÃO, REPUDIO, UTILIZAÇÃO, CARGO PUBLICO, BENEFICIO, PESSOAL, PROMOÇÃO, IMPUNIDADE, INJUSTIÇA.
  • CRITICA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), PRECARIEDADE, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, SEGURANÇA PUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Serys Slhessarenko, Srs. Senadores, inicialmente gostaria de fazer um importante registro a esta Casa. A Comissão Especial, instituída nos termos do art. 374 do Regimento Interno desta Casa para examinar o PLS nº 166, 2010, que propõe ampla reforma no Código de Processo Civil, foi instalada na manhã de hoje. Foram escolhidos, para Presidente, o Senador Demóstenes Torres; para Vice-Presidente, o Senador Antonio Carlos Valadares; e eu fui distinguido para ser o Relator dessa importante lei instrumental.

            Ao fazer esta comunicação, não poderia deixar de agradecer a confiança de todos os componentes do colegiado, já que a nossa escolha se deu por unanimidade. E aqui se encontram alguns dos membros dessa Comissão: Senador Romeu Tuma, Senador Antonio Carlos e outros tantos que participaram dessa reunião.

            No entanto, Sr. Presidente, o que me traz à tribuna nesta tarde é um assunto que tem sido recorrente em meus pronunciamentos e que é uma inquietação da sociedade brasileira: a questão da segurança pública.

            Tenho falado com insistência sobre esse tema, porque ele tem produzido seguidas críticas de desatenção às demandas da sociedade. Em muitos casos, a negligência com os dramas de quem recorre a tais serviços é ditada simplesmente pelo despreparo do servidor. Noutros tantos, são interesses escusos que orientam suas decisões. Esse foi o caso do acidente que vitimou, poucos dias atrás, o jovem Rafael Mascarenhas, filho da atriz Cissa Guimarães.

            A imprensa fez ampla divulgação do desvio policial e das vantagens que o motivaram. No mínimo, três infrações estavam sendo ocultadas pelas autoridades policiais: direção perigosa, excesso de velocidade e a invasão de área proibida. E a impunidade, todos nós sabemos, estava ameaçando proteger aqueles que protagonizaram esse episódio. E a impunidade, para a família, para os seus amigos, é mais um drama. Saber, por exemplo, que o ente querido perdeu a vida e que o crime não produziu o devido reparo não deixa de ser uma dor a mais para esses entes queridos, para a família, para os amigos.

            Felizmente, as manobras do atropelador e dos policiais foram desmascaradas, e tudo indica que não haverá impunidade, que os responsáveis serão exemplarmente punidos.

            O Programa Fantástico do dia 25 de julho exibiu imagens de outro episódio igualmente deplorável. Um jovem motorista profissional, cheio de hematomas e edemas na face, tinha sido vitimado por uma retaliação de policiais, que tinha como causa a recusa de pagar propina a essas autoridades.

            Todavia, não é só a polícia do Rio de Janeiro ou do Ceará que mostra as suas fraquezas. A propina não é a única deficiência das organizações policiais. Falhas operacionais têm causado danos também.

            Esse foi o caso de um adolescente de 14 anos que perdeu a vida estupidamente, em Fortaleza, depois de uma desastrada abordagem policial.

            Na minha Campo Grande, dois episódios exibiram, recentemente, as vísceras da segurança pública. O primeiro deles foi a interdição dos serviços do Cepol - Centro Especializado da Polícia Civil. O estabelecimento interrompeu os seus serviços porque ficou quase duas semanas sem água potável. Imaginem os senhores: uma simples falta de manutenção de instalações hidráulicas obrigando a paralisação de serviços essenciais e gerando transtornos para quem deles precisa!

            Isso é consequência de um governo de viés puramente contabilista. Em Mato Grosso do Sul, impõem-se cotas de combustível para viaturas policiais e centralizam-se as despesas mais comezinhas, como diárias, por exemplo, nas mãos de um único homem: o governador. E note-se que as diárias pagas aos policiais em operações lá no Estado não passam de R$65,00!

            Para o Governador, mais importante do que garantir a segurança da sociedade é fazer poupança e encher as burras do tesouro estadual.

            No entanto, o outro fato é uma pérola do ponto de vista da arrogância. Vou falar de um procedimento que pode ser isolado e, se assim o for, terá efeito menos perverso. O assunto ganhou editorial no conceituado jornal Valor Econômico do dia 27 de julho passado. Essa matéria ironiza a notícia sobre um jovem eleitor que tentou registrar uma ocorrência policial contra o cidadão André Puccinelli em razão de um entrevero de rua com o Governador, que se encontra em campanha eleitoral.

            Eis o que diz o articulista, Sr. Presidente e Srs. Senadores:

Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, jornalista e cronista do absurdo - autor do ”Festival de Besteiras que Assola o País” (Febeapá) -, em uma de sua crônicas, imagina um militar tentando dar uma “carteirada” no médico.

Quando aquele cavalheiro nervoso entrou no hospital dizendo “eu sou coronel, eu sou coronel”, o médico tirou o estetoscópio do ouvido e quis saber: “Fora esse, qual o outro mal do qual o senhor se queixa?

            Prossegue o editorial do Valor Econômico:

O memorável escritor falecido teria resvalado pelo humor negro se visse o Brasil de hoje.

Estão em falta doutores como o imaginado pelo “Lalau”, daqueles que se contrapõem ao poder da “carteirada”. Ela corre solta, e parece que se prolifera na política.

“Carteirada” [diz o articulista] é como se diz, na gíria, quando uma autoridade ou celebridade diz o “você sabe com quem está falando?” para livrar-se de culpas ou responsabilidades, ou para obter privilégios.

A “carteirada” [prossegue o autor] do governador Andrá Puccinelli (PMDB), candidato à reeleição ao governo do Mato Grosso do Sul, mereceria a atenção da pena de Sérgio Porto, se ela ainda existisse.

Não terminaria, todavia, com a frase dita pelo médico.

            O mesmo articulista assim comenta o episódio que deu causa a esse comentário:

Na quarta-feira, Puccinelli saiu para uma caminhada pela periferia de Campo Grande, num lugar chamado Aero Rancho, para pedir votos.

É candidato a reeleição.

Lá pelas tantas, virou para um eleitor, Rodrigo de Campo Roque, de 23 anos - que, certamente, se algum dia votou nele, não votará jamais -, e perguntou:

“Você lê jornais? Você viu o quanto fiz por Campo Grande?”.

O rapaz respondeu: “Vi também que o senhor é um ladrão” [isso é o que está no editorial].

Segundo relato de Rodrigo, Puccinelli, famoso por ataques de fúria, apertou forte o seu ombro direito.

“Senti uma dor forte, tentei afastar-me e o governador Puccinelli me deu um tapa na cara”.

Rodrigo confessa que empurrou o governador.

“Eu reagi instintivamente para me desvencilhar da agressão que estava sofrendo.”

Daí veio a “carteirada”: Rodrigo foi levado para a delegacia, chegou lá às 20 horas de quarta e na madrugada de quinta saiu, depois de fazer “um acordo” para ser solto: saiu como o agressor.

O delegado lavrou o boletim de ocorrência como “injúria real contra o governador”.

E deu um conselho ao rapaz: se quisesse dar queixa contra Puccinelli, que fosse para Goiás.

Em Mato Grosso do Sul não conseguiria. E completou, dizendo que não queria “confusão para a delegacia dele”, conforme relato do agredido que virou agressor.

Puccinelli está conseguindo projeção nacional graças à sua intemperança.”

(Interrupção do som.)

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Prossigo na leitura do artigo:

No ano passado, numa reunião com empresários do Estado, disse que o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, era “veado” e “fumador de maconha”, e que ele, o governador, o estupraria “em praça pública” caso fosse ao Mato Grosso do Sul.

            Depois de outros comentários menos relevantes para a análise que decidi fazer, o articulista formula juízo de valor que também merece reflexão. Assim o autor pontifica suas convicções, com as quais só posso concordar:

O abuso do poder, em questões que envolvem a política, não é apenas o que se convencionou, na Justiça Eleitoral, como tal - compra de voto e uso da máquina pública em benefício do candidato.

Na política em geral, perto ou longe das eleições, prevalece a ideia de que a eleição é uma permissão que o eleitor dá ao político para se apropriar da máquina pública em seu proveito, de seus amigos e familiares.

É o que os clássicos das ciências sociais chamam de “patrimonialismo” - a incorporação de um poder que é público como poder privado.

Nessas situações, a impessoalidade da lei inexiste, já que a autoridade se apropria do poder público para fins particulares.

Isso não apenas gera corrupção, mas cria injustiça. Os homens não são iguais: há os que têm e os que não têm poder.

Dessa apropriação patrimonialista do poder, a lei é relativizada.

Como as instituições são apropriadas pelo poderoso de plantão, as leis, mesmo que nas letras se dirijam a todos os cidadãos indistintamente, são usadas para a proteção de poucos.

Puccinelli, como governador, não se acha obrigado sequer a ter compostura. Não precisa. Ele usa da rede de proteção da “carteirada”.

            O editorial que acabo de ler e que foi publicado no jornal Valor Econômico  reporta-se a um acontecimento lamentável ocorrido em nosso Estado.

            O jovem com quem o Governador entreverou-se na feira livre do Aero Rancho em Campo Grande sustentou sua denúncia ao Centro de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos Marçal de Souza Tupã - I.

Lá, em certo trecho, ele declarou:

O Governador André Puccineli me deu um tapa na cara. E reagi institivamente para me desvencilhar da agressão que estava sofrendo, dando um chute nas pernas do Governador.

Em seguida fui imobilizado e algemado pelos seguranças do governador(...)

            E assim vai o depoimento. Se o evento ocorreu da forma como o jovem trabalhador denunciou, ou de maneira diferente, Srª Presidente, só uma investigação isenta e justa pode esclarecer. Versões conflitantes é o que não falta. No entanto, quem faz investigação e procura esclarecer quaisquer transgressões é a polícia. Disso sabe muito bem, aqui, o nosso eminente Senador Romeu Tuma, delegado de grande conceito em nosso País. E essa função é dever de oficio da autoridade policial, cuja omissão configura um ilícito denominado prevaricação. Recusar a lavratura de uma ocorrência policial para não contrariar, para não melindrar o Governador, é colocá-lo acima da lei. E, na democracia, o que tem que prevalecer sobre todos os governantes e governados é a lei.

            Em minhas atividades parlamentares, tenho recebido recorrentes delegações de policiais de todo o País que aqui vêm para defender os seus direitos, e eu e o Senador Romeu Tuma temos sido parceiros nesses pleitos. Os discursos mais fortes que eu tenho ouvido da esmagadora maioria deles é que a função policial é típica da carreira de estado - não é isso, Senador Romeu Tuma?

            De minha parte, não tenho manifestado opinião divergente porque essa é a minha convicção. No entanto, quando a autoridade policial age como guarda pretoriana de eventuais governantes, acaba negando a impessoalidade de suas ações, um dos pilares das carreiras de estado. Prefiro acreditar que a atitude do delegado de polícia seja um fato isolado; ou, de outra forma, que ele seja também objeto das pressões que hoje ocorrem em meu Estado sobre os servidores públicos para proteger o Governador.

            Encerro, Srª Presidente, a minha intervenção. Não poderia deixar de fazer esse registro, já que hoje estamos diante de uma campanha que deve ser a orientadora de toda a cidadania.

            Muito obrigado, Srª Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/2010 - Página 39920