Discurso durante a 139ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Cumprimentos ao novo presidente do Parlamento do Mercosul, Senador Aloizio Mercadante. Leitura de carta encaminhada por S.Exa. ao Presidente da Fundação Padre Anchieta, João Sayad. Análise da situação política entre Venezuela e Colômbia.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. POLITICA CULTURAL. POLITICA INTERNACIONAL. ESPORTE.:
  • Cumprimentos ao novo presidente do Parlamento do Mercosul, Senador Aloizio Mercadante. Leitura de carta encaminhada por S.Exa. ao Presidente da Fundação Padre Anchieta, João Sayad. Análise da situação política entre Venezuela e Colômbia.
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/2010 - Página 40832
Assunto
Outros > SENADO. POLITICA CULTURAL. POLITICA INTERNACIONAL. ESPORTE.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, PRESENÇA, SENADO, SACERDOTE, REPRESENTANTE, MOVIMENTAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, SOLIDARIEDADE, BUSCA, AGILIZAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ASSENTAMENTO RURAL, REGIÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • LEITURA, CORRESPONDENCIA, TROCA, ORADOR, JOÃO SAYAD, PRESIDENTE, FUNDAÇÃO, EMPRESA DE RADIO E TELEVISÃO, APREENSÃO, NOTICIARIO, CORTE, PROGRAMA, PIONEIRO, DIVULGAÇÃO, MUSICA, JUVENTUDE, PERIFERIA URBANA, OPINIÃO, MANUTENÇÃO, ABERTURA, OPORTUNIDADE, MANIFESTAÇÃO, CULTURA.
  • SAUDAÇÃO, REUNIÃO, CHEFE DE ESTADO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, COLOMBIA, SOLUÇÃO, CONFLITO, MOTIVO, ACUSAÇÃO, APOIO, GUERRILHA, ELOGIO, RETOMADA, RELAÇÕES DIPLOMATICAS, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, AVALIAÇÃO, IMPORTANCIA, BUSCA, PAZ, LUTA, AUSENCIA, VIOLENCIA.
  • LEITURA, DOCUMENTO, APROVAÇÃO, PARLAMENTO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), DEFESA, DIREITOS HUMANOS, OPOSIÇÃO, DECISÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, IRÃ, TORTURA, PENA DE MORTE, MULHER, ACUSAÇÃO, TRAIÇÃO, MARIDO, DECLARAÇÃO, REPUDIO, SOLICITAÇÃO, REVISÃO, SENTENÇA ESTRANGEIRA, OFERTA, ASILO, ESTADOS MEMBROS.
  • LEITURA, TRECHO, DISCURSO, AUTORIA, ALOIZIO MERCADANTE, SENADOR, OPORTUNIDADE, POSSE, PRESIDENCIA, PARLAMENTO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), CONFIANÇA, PROJETO, INTEGRAÇÃO SOCIAL, REFORÇO, UNIÃO, ESTADOS MEMBROS, AUSENCIA, CRITERIOS, POLITICA PARTIDARIA, JUSTIFICAÇÃO, OPOSIÇÃO, FLEXIBILIDADE, APRESENTAÇÃO, DADOS, RESULTADO, MELHORIA, COMERCIO EXTERIOR, ALTERAÇÃO, CONJUNTURA ECONOMICA, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, CRITICA, LOBBY, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA), RECUSA, PAIS ESTRANGEIRO, RETIRADA, SUBSIDIO, PRODUTO AGRICOLA, EXPECTATIVA, AGILIZAÇÃO, PROCESSO, DEMOCRACIA, ELEIÇÃO DIRETA, CUMPRIMENTO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, DEFESA, IMPLEMENTAÇÃO, PROPORCIONALIDADE, REPRESENTAÇÃO, CIDADÃO, REALIZAÇÃO, CONCURSO PUBLICO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, APLICAÇÃO DE RECURSOS.
  • ESCLARECIMENTOS, ANTERIORIDADE, DISCURSO, ORADOR, CONCLAMAÇÃO, PODER PUBLICO, SOCIEDADE CIVIL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), MOBILIZAÇÃO, SEDE, ABERTURA, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, EXPECTATIVA, ENTENDIMENTO, GOVERNO ESTADUAL, CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL (CBF), DIRIGENTE, TIME, JUSTIFICAÇÃO, SUPERIORIDADE, BENEFICIO, INVESTIMENTO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito boa tarde, Senadora Níura, que aqui representa Santa Catarina. Quero saudá-la na Presidência do Senado.

            Gostaria de dar as boas-vindas àqueles que estão hoje na tribuna do Senado, o Padre Severino e diversos representantes dos movimentos de trabalhadores rurais, que estão empenhados para que, ali, na região de Promissão, no Estado de São Paulo, possa haver a decisão, por parte do Incra, do Ministério de Desenvolvimento Agrário, e também do Governo do Presidente Lula, no sentido de agilizar a possibilidade de haver o assentamento dos trabalhadores rurais, e que possam ser liberados os recursos para essa finalidade. Eu, depois, inclusive, irei com eles conversar.

            Quero, nesta tarde, Presidente, aqui saudar a eleição do novo Presidente do Parlamento do Mercosul, eleito ontem à tarde. O nosso Líder Aloizio Mercadante foi eleito Presidente do Parlamento do Mercosul e ali tomou uma iniciativa muito importante. Eu, inclusive, fui um dos que sugeriram que ele tomasse essa iniciativa, aprovada por unanimidade, com respeito a Srª Sakineh Ashtianti, e vou mencionar logo mais isso.

            Também vou falar do Mercosul e cumprimentar a reunião que, nesta tarde, está havendo entre o novo Presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, e o Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, o que significa que ambos restabeleceram as relações diplomáticas, com uma conversa muito produtiva do ponto de vista do melhor entendimento entre as nações latino-americanas. E eu quero mencionar isso.

            Mas, antes, quero aqui ler uma carta que encaminhei ontem ao Presidente João Sayad, da Fundação Padre Anchieta, nos seguintes termos:

Gostaria de lhe fazer uma visita para conversar um pouco sobre a Fundação Padre Anchieta e a Rádio e Televisão Cultura. Preocupou-me, na última semana, a notícia de que a TV Cultura iria cortar um grande número de programas e de funcionários. Posteriormente, li as suas entrevistas no ”Estado” e na “Folha” e percebi que é a sua determinação enxugar o que não está bem e dar maior racionalidade à administração com o intuito de melhorar o conteúdo da TV e da Rádio, sempre tendo em conta os objetivos principais desta emissora de contribuir para o desenvolvimento cultural e educacional de nosso povo. Tenho a convicção de que vai conseguir realizar os seus melhores propósitos.

Envio-lhe, anexo, o pronunciamento que fiz na última semana sobre a RTC da Tribuna do Senado.

Dentre os assuntos que gostaria de conversar está o referente ao programa “Manos & Minas”, o qual abriu um espaço inovador para a música “hip-hop” e “rap”, de grande relevância.” Para compreendermos hoje as aspirações dos jovens das periferias de nossas grandes cidades é muito importante que possamos ouvir o que dizem as suas canções. Se nos anos cinquenta e sessenta era importante ouvir as canções do Patativa do Assaré, cantadas por Luiz Gonzaga [o sertanejo], para poder saber como as pessoas que saíam do Nordeste para São Paulo sentiam qual era o seu grau de liberdade, como expresso em [bonita canção] “Triste Partida”, hoje é relevante ouvirmos, por exemplo, “O Homem na Estrada”, de Mano Brown, cantada pelos Racionais MCs, para saber o sentimento dos adolescentes.

Envio-lhe, por isso, em anexo, a carta de inúmeros representantes dos movimentos de hip-hop, Kamau, Emicida, Per Raps, Central Hip-hop, Site Noiz, Coletivo e outros que fazem um apelo para que permaneça no ar o programa “Manos & Minas” que, ao longo dos últimos três anos, vinha alcançando relevante e positiva repercussão.

O abraço amigo,

Senador Eduardo Matarazzo Suplicy.

            Então, aqui menciono a manifestação desses representantes do movimento do hip-hop, em que dizem:

O programa Manos & Minas entra em seu terceiro ano e seu papel sempre foi bem amplo socialmente. Ele foi o primeiro em rede aberta de televisão a tratar todos os elementos do hip-hop (rap, dj, grafitti e bboys) com respeito, dignidade e fazer com que artistas desse meio ganhassem visibilidade.”

Em 2009, com a projeção de tantos artistas por meio do programa, levando-se em conta a importância da televisão, o meio mais poderoso de comunicação no Brasil, muitos deles, como Emicida, Kamau, DJ Erick Jay, entre outros, ganharam páginas de jornais. Levamos esse fato em consideração porque foi a audiência do programa, talvez considerada baixa pelo [Presidente] senhor João Sayad, que pautou a grande imprensa: Folha de S. Paulo, o Estado de S. Paulo, Revista Bravo, Rolling Stone, justamente por ser o único programa especializado em hip-hop.

O programa Manos & Minas também se pautou pela grande mídia, convidou os artistas consagrados no rap nacional, Thaíde e Max BO, para apresentar o programa. A TV Cultura transmitiu o programa a milhares de jovens, contribuindo para sua formação cultural, reportagens sem preconceitos sobre a cultura de rua, que deve ser considerada parte fundamental da cultura brasileira, abrangendo jovens de classe média ou das periferias, e recebeu esses jovens em um auditório incrível, onde eram gravados os programas. Também recebeu atrações internacionais que nem a Rede Globo conseguiu levar, como a dupla People under the Stairs e o rapper Talib Kweli.

Em 2010, pela primeira vez um livro de português do ensino fundamental terá entre seus textos um rap, escrito por um de nossos artistas. Coincidentemente, a publicação é da Fundação Padre Anchieta, e provavelmente o senhor [o Presidente João Sayad] desconhece a importância do rap na educação de muitos jovens de São Paulo, mas o rapper Kamau conhece e autorizou sem qualquer custo, e com orgulho, a reprodução de sua obra.

O senhor pode não conhecer esses artistas, mas explicamos que eles representam uma geração do hip-hop intelectualizada, e que não aceita perder um espaço importante para artistas, para o público, para a própria mídia e para os funcionários que fizeram um trabalho de excelência e souberam proporcionar momentos mágicos que ficaram eternizados na mente de todos os amantes do hip-hop.

Deixamos [assim] nosso protesto com o apoio do Senador Eduardo Suplicy, e, com todo o respeito, pedimos a reavaliação sobre a extinção do programa Manos & Minas da grade de programação de uma emissora que representantes do hip-hop que acreditam ser séria e desprovida de preconceitos.

            Li, hoje, na imprensa que o Presidente João Sayad ontem conversou com os membros do Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta, e certamente esse tema veio à tona. Mas eu aqui reitero, inclusive aos membros do Conselho da Fundação Padre Anchieta, que a Televisão Cultura havia aberto um canal de comunicação de maneira pioneira e diferente de outras emissoras. Há, de quando em quando... Eu, por exemplo, já vi, no Altas Horas, do Serginho Groisman, e em outros programas também... Meus filhos mesmo, no programa Brothers, na Rede TV, o Supla e o João Suplicy, por diversas vezes, receberem ali artistas do hip-hop e do rap. Inclusive havia um personagem, o Repórter MC, que, com tamanha qualidade, foi convidado e saiu do programa Brothers para ir ao Programa Manos & Minas. Ele estava sendo como que o âncora do programa, com grande criatividade e qualidade. Eu aqui externo, embora ele tenha saído do Brothers... Mas foi por causa dos méritos desse Repórter MC que ele foi convidado, e estava tendo audiência, com muito positiva repercussão, entre os jovens.

            Eu, que no início dos anos 90 comecei a assistir aos Racionais MCs e a outros, como também ao Ferréz, um escritor do Capão Redondo, que escreveu inúmeros livros sobre como vivem os jovens na periferia e que também é um compositor de rap, no contato com o Thaíde e com o Júnior, lá do Rio de Janeiro, também da música rap e do hip-hop, passei a perceber que, se quisermos realmente estar em sintonia com o que pensam os jovens das mais diversas áreas periféricas, precisamos ouvir as suas canções, o que eles pensam. E é exatamente por causa disso...

            Por exemplo, em meu livro Renda de cidadania: a saída é pela porta, além de colocar os versos de Patativa do Assaré, em “Triste Partida”, também coloquei inteira a música “O homem na estrada”, do Mano Brown, exatamente para ilustrar o sentimento desses jovens. Muitas vezes, em palestras, para ilustrar as dificuldades que hoje têm os jovens, canto essa música, e as plateias de estudantes consideram isso muito relevante. Inclusive, aqui, no Senado, certa vez tive a oportunidade de fazê-lo.

            Portanto, aqui reitero a minha ponderação ao meu amigo João Sayad. Quem sabe a TV Cultura possa reconsiderar a decisão de terminar com o programa Manos & Minas e dar uma oportunidade, até porque esse programa, que eu saiba, não tinha um orçamento tão grande! Em termos de custo e benefício, certamente, pelo benefício para o desenvolvimento cultural, para a interação da TV Cultura e para os objetivos expressos da Fundação Padre Anchieta, parece-me que essa é uma decisão que merece, efetivamente, ser reconsiderada. Quem sabe, o programa possa voltar de uma outra forma. Se há uma avaliação crítica sobre o programa Manos & Minas, então, quem sabe se possa melhorá-lo, mas não extingui-lo, porque se trata de uma oportunidade muito importante para um segmento hoje extraordinário da população brasileira.

            Os jovens ali em Promissão também escutam, por vezes, o rap, o hip-hop, além da música sertaneja, sem dúvida. Também lá, no meio rural brasileiro, hoje o hip-hop e o rap também estão presentes. Claro, eles gostam da música sertaneja, de todos os grandes compositores e cantores da música sertaneja, mas o hip-hop hoje tem uma presença importante, que merece ser considerada!

            Muito bem! Quero, agora, passar para o tema internacional, prezado Presidente Acir.

            Está havendo, na tarde de hoje, uma reunião muito importante ali na Colômbia, porque, depois da posse do novo Presidente daquele país, Juan Manuel Santos, e depois de ter havido o rompimento de relações diplomáticas da Colômbia com a Venezuela, em função daquela denúncia... O Presidente Álvaro Uribe, numa reunião, há poucos meses, fez a denúncia de que, na Venezuela, estaria havendo acampamentos de membros das Farc - Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - e que isso certamente era uma intromissão indevida na Colômbia, ainda mais por abrigar forças armadas guerrilheiras, que estavam, de alguma forma, envolvidas também com o narcotráfico.

            Então, houve declarações da parte do Presidente Hugo Chávez bastante positivas, e eis que o Presidente da Venezuela, no domingo, fez declarações, propondo uma nova relação diplomática, inclusive aconselhando as guerrilhas colombianas a libertarem todos os reféns.

Chávez rompeu relações diplomáticas com o governo colombiano, ainda sob Alvaro Uribe, em 22 de julho passado, ao ser acusado perante a OEA (Organização dos Estados Americanos) de abrigar ao menos 1.500 guerrilheiros das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e do Exército de Libertação Nacional (ELN) em território venezuelano.

Neste sábado, horas após a posse de Santos em Bogotá, Chávez deu uma série de declarações de que está disposto a retomar os laços diplomáticos e convidou o novo colega para um encontro cara a cara.

“Essa guerrilha deveria se manifestar pela paz, mas com manifestações contundentes. Por exemplo, poderiam libertar todos os reféns. Por que uma guerrilha vai ter reféns?”, questionou Chávez em seu programa de rádio e TV “Alô, Presidente”.

“Creio que estamos em um novo momento de busca da paz. Digo a vocês que, assim como o governo da Colômbia propõe o caminho da paz, a guerrilha também (...) deve fazê-lo”, acrescentou o presidente.

A guerrilha colombiana das Farc [que] completou 46 anos em maio último está no seu pior momento militar, obrigada a recorrer a uma estratégia de pequenos golpes, emboscadas, atentados para manter vivo o que chama de “a guerra negada pelo governo para não reconhecer o caráter político da insurgência”.

Enfraquecida após a morte, em 2008, de três dos sete membros de seu comando central - o chamado Secretariado, as Farc, que surgiram em 1964 de um movimento de resistência na região de Marquetalia para reivindicar o direito dos camponeses à terra, estão [na verdade] longe de desaparecer.

            Com um contingente armado, estima-se, de seis mil a sete mil homens. Há oito anos, era de 20 mil homens.

[...] as Farc mantêm presença em zonas de plantação de coca, da qual obtêm [estima-se] entre US$400 e US$600 milhões por ano, segundo o Ministério colombiano da Defesa do governo anterior.

Disse Hugo Chávez:

“Esperamos que eles comecem a reconstruir o que o governo cessante da Colômbia destruiu [...]: a confiança [...].

            Mas o que foi interessante é que, na sua posse, o Presidente Juan Manuel Santos, eleito inclusive com o apoio do Presidente Álvaro Uribe, entre outros pontos, disse:

Assim como não tenho inimigos em nível nacional, tampouco quero tê-los em nível internacional. Um de meus propósitos fundamentais será reconstruir as relações com a Venezuela e com o Equador, restabelecer a confiança e privilegiar a diplomacia e a prudência. A palavra guerra não está em meu dicionário. Quem diz que quer a guerra é quem nunca enviou soldados a uma guerra de verdade. Eu o fiz, e sei o que é enfrentar mortes e consolar os familiares.

Agradeço ao bom serviço prestado e às muitíssimas pessoas de boa vontade que se aproximaram, mas prefiro o diálogo franco e direto, e oxalá seja o mais rápido possível. As boas relações beneficiam a todos. Quando os governos são os que disputam, os povos sofrem.

            Ora, quero saudar essa declaração do novo Presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. Quero dizer que isso está muito de acordo com aquilo que nós... Inclusive, Senador Acir, quando houve o sequestro da Senadora da Colômbia, que ficou por alguns anos detida... V. Exª lembra o nome da Senadora seqüestrada? Por favor, se puder me relembrar o nome da Senadora da Colômbia sequestrada há três anos... Por muitas vezes, nós aqui nos empenhamos para que ela pudesse inclusive visitar o Senado Federal. Peço ao meu gabinete, que está me ouvindo, para logo mandar a informação. Eu já vou lembrar. Se a senhora lembrar... Mais alto.

(Intervenção fora do microfone.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senadora Ingrid Betancourt. Muito obrigado. Ela ficou acho que três anos sequestrada, e, durante todo esse tempo, muitos de nós, Senadores, inclusive eu, aqui fizemos o apelo para que ela fosse libertada. E, finalmente, ela foi.

            Entretanto, não foi possível fazer com que todos os que estavam sequestrados efetivamente fossem libertados. Eu quero aqui também saudar o apelo do Presidente Hugo Chavez às Farc para que acabem com esse procedimento: que deixem suas armas de lado, acabem com o procedimento de sequestrar pessoas, libertem todos os que estão ainda prisioneiros por obra do sequestro.

            Nós precisamos, mais e mais, seguir as recomendações de pessoas como Martin Luther King Jr. e Mahatma Gandhi, que sempre propuseram que, contra a força física, é preciso sempre utilizar a força da alma, as palavras, as formas persuasivas. É importante que os movimentos sociais possam estar ali realizando as suas manifestações, mas a minha recomendação é que sempre estejam agindo de forma a não ferir pessoas, a não realizar violências de qualquer natureza.

            Inclusive, relativamente a abusos de violência, é preciso também que, no planeta Terra, nós terminemos com aqueles castigos que são completamente inadequados e que ferem o sentimento da civilização, o sentimento dos seres humanos quando se tornam exagerados, como é agora o caso dessa iraniana que foi condenada à morte por pedradas, por ter cometido adultério após a morte de seu marido. Não conheço todos os detalhes, mas há um movimento em praticamente todos os países do mundo para que haja a reconsideração.

            E quero cumprimentar o Senador Aloizio Mercadante pela proposta que fez, ao ser eleito, ontem, Presidente do Mercosul, em Montevidéu. Eu me sinto como uma das pessoas que estaria propondo essa declaração que foi aprovada por unanimidade pelos membros do Mercosul, inclusive por nós, Senadores que ali estávamos, como a Senadora Marisa Serrano, como o Senador Inácio Arruda e outros que ali estavam.

            Eis a proposta de declaração que foi aprovada, por unanimidade, na tarde de ontem pelo Parlamento do Mercosul:

Considerando que o Mercosul e seu Parlamento têm compromisso inalienável com a democracia, inscrito no Protocolo de Ushuaia, bem como com a proteção e a promoção dos direitos humanos fundamentais;

Preocupado com a situação da cidadã iraniana, Sakineh Ashtianti, condenada à morte por apedrejamento por haver cometido adultério e, supostamente, por ter também participado do assassinato do de seu marido [Será que realmente foi isso? Ainda não se sabe inteiramente];

Considerando que a morte por apedrejamento, embora conste da lei islâmica milenar, a sharia, já foi abolida pela grande maioria dos países muçulmanos, por ser considerada uma forma extremamente cruel e bárbara de execução.

            Quero lembrar aqui famosa a passagem da Bíblia Sagrada. Quando estavam as pessoas para apedrejar uma mulher por vender o seu corpo, eis que Jesus então disse: Atire a primeira pedra quem não tiver qualquer culpa. Esse gesto sustou e foi também um grande ensinamento da História da Humanidade que de alguma maneira se relaciona aqui.

Enfatizando que a lei islâmica iraniana determina que as pedras a serem usadas na execução não sejam demasiadamente grandes, de forma a provocar dor e sofrimento no condenado por algumas horas, o que configura um modo bárbaro, desumano e inaceitável de tortura terminal;

Lembrando que o Art. V da Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada pelo Irã, estabelece:

“Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.”

Constatando, ademais, que a condenação à morte por adultério, geralmente aplicada apenas às mulheres, se constitui numa afronta descabida e anacrônica contra o gênero e num insulto à consciência de todos aqueles que lutam pela afirmação dos direitos das mulheres;

Considerando que o governo do Brasil, na figura do seu presidente da República, assim como os governos da Grã-Bretanha e da França, entre outros, já manifestaram o seu pedido para que a justiça iraniana reveja o caso de Sakineh Ashtianti e comute a sua pena;

Assinalando que o caso de Sakineh Ashtianti vem causando imensa comoção pública internacional; e, por último,

Desejoso de que a República Islâmica do Irã se integre à comunidade internacional, o que implica a aceitação dos valores universais relativos à democracia e à promoção e proteção dos direitos humanos, que não podem ser relativizados pelas culturas de quaisquer nações; 

O Parlamento do Mercosul declara:

Sua indignação com a sentença à morte por apedrejamento da iraniana Sakineh Ashtianti, fato que afronta, de modo absolutamente inaceitável, os direitos humanos fundamentais, particularmente os relativos às mulheres.

Sua firme condenação da morte por apedrejamento, forma bárbara, cruel, desumana e degradante de execução, inteiramente incompatível com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, notadamente com o seu art. V.

Sua exortação à justiça iraniana para que reveja essa sentença cruel, a qual não contribui para que a República Islâmica do Irã, importante país do Oriente Médio, se integre à comunidade internacional.

Seu entendimento de que Sakineh Ashtianti, se assim o desejar e se for assim permitido pelas autoridades iranianas, poderá encontrar refúgio humanitário nos Estados Partes do Mercosul [tendo em conta inclusive que o Presidente Lula transmitiu ao governo iraniano a disposição de ela poder ser recebida e poder viver aqui no Brasil].

            Então, quero cumprimentar o Parlamento do Mercosul por ter aprovado por unanimidade a declaração proposta pelo Senador Aloizio Mercadante.

            Se V. Exª ainda tiver paciência de me ouvir um pouco mais, mas é porque ontem o Senador Aloizio Mercadante, ao tomar posse como Presidente do Mercosul, fez um pronunciamento de muita relevância sobre o Mercosul. Então, se me permite, eu leria alguns trechos aqui do discurso de Aloizio Mercadante, nosso Senador.

Vim à bela e acolhedora Montevidéu para assumir, com muito orgulho e esperança, a tarefa de dirigir esta que considero a instituição mais importante do processo de integração regional: o Parlamento do Mercosul.

Deixei de lado, provisoriamente, uma campanha eleitoral difícil, de grande relevância política, porque acredito firmemente no caráter estratégico do Mercosul e de seu Parlamento para os interesses maiores de todos os Estados signatários do Tratado de Assunção. Estratégico, é bom que se frise, não apenas para todos os países, mas também para todos os segmentos sociais e políticos existentes em nossas nações.

            O Senador Aloizio Mercadante está se referindo ao fato de ele ser hoje o candidato ao Governo de São Paulo pelo Partido dos Trabalhadores. Ressalto, a propósito, que, na próxima quinta-feira, a Rede Bandeirantes de Televisão proporcionará mais um debate. O de quinta-feira, no qual estive presente, foi de excepcional qualidade - foi entre José Serra, Dilma Rousseff, Marina Silva e Plínio de Arruda Sampaio. Cumprimento a TV Bandeirantes, porque, para mim, nada melhor do que o debate, frente a frente, entre os candidatos.

            Agora, nesta quinta-feira, participarão de debate Geraldo Alckmin, Aloizio Mercadante, Fábio Feldman, Celso Russomano e outros - acho que são onze candidatos. Que todos possam estar frente a frente ou, pelo menos, esses quatro que têm maior relevância nas pesquisas de opinião. Que eles possam dar à opinião pública elementos para melhor comparar. Acho formidável essa oportunidade e desejo boa sorte a todos. Quem vai ganhar com isso somos nós, brasileiros - os paulistas, no caso -, por termos hoje a possibilidade de eleger por formas democráticas quem será o nosso Governador, o nosso Presidente ou a nossa Presidente. 

            Prossegue Mercadante:

Com efeito, o Mercosul tem de ser assumido como um projeto suprapartidário, um processo que paira acima, bem acima, de quaisquer interesses políticos ou eleitorais menores e de quaisquer diferenças ideológicas que posam existir nos países que o compõem.

Afinal, o Mercosul, a exemplo da União Europeia, nasceu da busca incessante da convergência e da identificação de interesses comuns. Assim como a União Europeia surgiu graças à superação das diferenças entre Alemanha e França, países que haviam se digladiado na Primeira e na Segunda Guerras Mundiais, o Mercosul tem a sua origem última na superação da antiga rivalidade entre Brasil e Argentina sobre o domínio da Bacia do Prata. Entretanto, o ressurgimento da democracia no Cone Sul permitiu que Argentina e Brasil, passando ao largo de suas divergências históricas, firmassem os acordos Alfonsín-Sarney, ainda na década de 80.

Já naquela época, tais acordos tinham uma estratégia implícita. Tratava-se de dar aos Estados Partes condições de enfrentar juntos os problemas criados pela crise da dívida, do aumento da vulnerabilidade externa e da recessão com inflação. Os países pretendiam fortalecer sua posição ante um cenário internacional mais competitivo e hostil, mediante a ativação de complementaridades econômicas.

O Mercado Comum do Sul surge, portanto, da necessidade dos países do subcontinente superarem em conjunto suas fragilidades e construírem, com sua união, um destino comum de soberania, desenvolvimento e justiça social, como a Europa, também muito fragilizada ao término da Segunda Guerra Mundial, havia feito com inegável sucesso.

Para usar uma expressão bastante popular no Brasil, o Mercosul tem em seu DNA a marca indelével da estratégica afirmação conjunta, no cenário mundial, dos interesses comuns dos Estados Partes.

Contudo, observo com espanto que ressurgem com alguma estridência, especialmente no Brasil, as antigas vozes do “mercoceticismo”, que apregoam a volta da desagregação regional e a necessidade de nossos países investirem apenas no livre comércio com as nações mais desenvolvidas.

Evidentemente, nada disso é novo. Na época do Tratado de Assunção, em 1991, não faltaram ironias sobre a união dos “rotos com os esfarrapados” e críticas ácidas em relação à suposta inviabilidade de um bloco fadado a ser absorvido em processos de integração mais amplos com os países desenvolvidos. Ao longo dos anos, também não faltaram aqueles que defenderam reiteradamente, em nossas nações, que o Mercosul renunciasse a sua união aduaneira e se transformasse numa mera área de livre comércio, de modo a permitir uma integração supostamente mais dinâmica com as nações industrializadas e com o comércio globalizado. Consideravam o Mercosul um arcaísmo “terceiro-mundista” e sonhavam com a miragem neoliberal da Alca. Tais vozes, com frequência, tentavam demonstrar que o Mercosul estava moribundo.

Não posso deixar de lembrar aqui do caso do escritor norte-americano Mark Twain, que teve a ingrata tarefa de desmentir notícias de sua morte. Twain estava em Londres quando surgiram boatos sobre o seu falecimento. Convocou a imprensa e, com a sua habitual ironia, afirmou: “Os rumores sobre a minha morte foram grosseiramente exagerados”. Com o Mercosul se passa algo semelhante. Desde o nascimento, vaticinam o seu iminente falecimento, mas ele sempre desmente os críticos.

Pois bem, na condição de Presidente do Parlamento do Mercosul, faço questão de afirmar aqui que o Mercado Comum do Sul está, apesar de suas fragilidades e problemas, mais vivo do que nunca, como ficou bem demonstrado na recente cúpula de San Juan. Os boatos sobre a sua irrelevância e seu suposto peso negativo para os interesses dos Estados Partes não só são grosseiramente exagerados, mais também inteiramente falsos.

Digo também, com inteira convicção, que, quaisquer que sejam os desdobramentos políticos internos em meu país, o processo de integração do Mercosul será mantido em sua integralidade. Não haverá retrocessos! Pois esse bloco não é uma aspiração de governos eventuais, mas sim um compromisso de longo prazo em nossos Estados, com sólida fundamentação nas aspirações de suas populações. O Mercosul não pertence a candidatos ou a partidos. Seu futuro está inscrito no granito dos interesses nacionais de cada um dos países que formam o bloco.

Há, nesses críticos, um surpreendente desconhecimento sobre a natureza do processo de integração e, acima de tudo, das consequências que inexoravelmente adviriam caso haja uma “flexibilização” do Mercosul.

O bloco que nasceu com o sugestivo nome de Mercado Comum do Sul, claramente inspirado na experiência da União Europeia, foi concebido, desde o início, para ser um verdadeiro mercado comum, o que implica, necessariamente, a constituição da união aduaneira, mediante a tarifa externa comum (TEC). Por isso mesmo, o Tratado de Assunção estabelece, logo no seu artigo 1º, que o estabelecimento da tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum em relação a terceiros Estados são dimensões essenciais e constitutivas do processo de integração. Sobre tal base estão assentados outros vetores importantes desse processo, como a livre circulação de pessoas, a harmonização das legislações, a constituição de instituições supranacionais e, sobretudo, a formação de uma cidadania comum.

            Presidente Acir, precisamos sempre ter em mente a importância da integração das Américas, mas não apenas do ponto de vista dos proprietários do capital, que querem ver a livre circulação do capital financeiro ou a livre circulação de bens e serviços. O mais importante é, justamente, um dia termos a livre circulação dos seres humanos.

            Isso vai ocorrer na medida em que pudermos uniformizar os direitos à cidadania do Alasca à Patagônia. Por isso, às vezes falo que será muito positivo que um dia tenhamos a renda básica de cidadania do Alasca, onde já existe uma experiência há 27 anos, até a Patagônia, passando por todos os países do Mercosul. Isso viabilizará que todas as pessoas possam circular, que não haja mais a necessidade de muros que separem os Estados Unidos do México e da América Latina, que haja livre circulação, inclusive dos cubanos, para que possam visitar qualquer país, inclusive o Brasil. Que possa a blogueira Yoani Sánchez visitar o Brasil e voltar a Cuba. Que possam os americanos visitar Cuba, ir e voltar, como fazem os canadenses, por exemplo, ou os mexicanos. Por que não todos nas Américas? Vamos estimular a verdadeira integração no sentido amplo.

            Prossegue Aloizio Mercadante:

Além da união aduaneira, ainda que imperfeita e incompleta, e da política de representação conjunta frente a terceiros Estados, mesmo que eventualmente pouco coordenada, hoje o Mercosul já tem também em funcionamento instituições típicas de um mercado comum, como o Focem, destinado a financiar projetos de desenvolvimento nas regiões pobres e recentemente robustecido, e este Parlamento do Mercosul, que já conta com alguns parlamentares eleitos em pleito direto elabora projeto e anteprojetos de norma. Está em estudo a constituição de um Tribunal de Justiça e a livre circulação de pessoas avança, embora ainda de forma tímida.

Evidentemente, os mercocéticos têm todo o direito de defender a ideia de que o Mercosul tem que ser flexibilizado e deve ser apenas uma área de livre comércio. Mas é preciso que fique claro que, neste caso, o Mercosul deixará de ser Mercosul. Será uma espécie de área de livre comércio - a Alcasul. O Tratado de Assunção terá que ser renegociado e todas as negociações, acordos, protocolos e processos construídos até agora terão que ser revistos. Áreas de Livre Comércio, além de terem de prescindir da TEC - Tarifa Externa Comum e das negociações conjuntas, também têm de renunciar às instituições supranacionais e à livre circulação de pessoas. Essa seria uma flexibilização sem volta.

Este Parlamento, concebido à semelhança do Parlamento europeu e destinado a representar e construir uma cidadania comum, perderia inteiramente a sua razão de ser. É preciso que todos os parlamentares tenham clareza quanto a essa questão! A Alcasul prescindiria de um verdadeiro legislativo. Afinal, as áreas de livre comércio não constroem cidadanias, constroem muros.

É necessário que fiquem claros também quais os motivos que recomendariam a redução do Mercosul a uma mera área de livre comércio ou a uma união aduaneira muito flexibilizada. O principal argumento utilizado até agora é o de que o Mercosul é uma “farsa”, um “fardo” que impede o Brasil e outros Estados-Partes de alçar vôos mais altos no comércio exterior, por exigir negociações conjuntas com terceiros Estados. Ora, tal afirmação é tão bombástica quanto vazia.

Qual foi o grande acordo comercial que os nossos Estados-Partes deixaram de fazer devido ao Mercosul? A Alca?

A área de livre comércio com a União Européia? Ora, qualquer pessoa com um mínimo conhecimento sobre questões internacionais sabe muito bem que não foi esse o caso. Em relação à Alca “ampla” norte-americana, as negociações não prosperaram devido essencialmente à recusa dos Estados Unidos em colocar na mesa os seus temas sensíveis, como os subsídios agrícolas e antidumping, ao mesmo tempo em que insistiam em concessões em propriedade intelectual, investimentos e serviços, com todas as consequências sobre a capacidade de nossos Estados de promover políticas industriais e de desenvolvimento que tais concessões acarretariam.

Além disso, a oferta norte-americana em tarifas, apresentada em 2003, discriminava nitidamente o Mercosul. Note-se que o Brasil e o Mercosul fizeram, naquele mesmo ano, proposta de criação de uma Alca pragmática e realista, restrita à desoneração tarifária estrito senso, o que evitava o obstáculo de sistemas sensíveis, objeto de negociação na OMC. Os Estados Unidos recusaram. Já no que tange à União Européia, é de conhecimento até do reino mineral que o grande entrave às negociações reside no escandaloso protecionismo agrícola europeu.

Os adeptos da Alcasul também parecem desconhecer que o Mercosul se expandiu bastante em seu entorno regional. Hoje em dia, quase todos os países da América do Sul participam na área de livre comércio do Mercosul. As únicas exceções são o Suriname e a Guiana. E a Venezuela só não conseguiu ainda a sua adesão como membro pleno devido a resistências políticas que passam ao largo dos interesses de longo prazo dos países da região. Temos que logo superá-las logo! Temos de pensar e agir estrategicamente.

Ademais, já ratificamos um acordo de livre comércio com Israel e outro com o Egito. Outros seguirão em breve, pois há muito interesse no Mercosul.

Graças a essa grande expansão, a Aladi, que inclui o Mercosul, já absorve cerca de 42% das exportações brasileiras de manufaturados, o que beneficia muito São Paulo, Estado que Aloizio Mercadante pretende governar a partir de 2011. Observe-se que as exportações brasileiras para o Mercosul são, em 92%, de bens industrializados. São Paulo obteve, em 2009 (em plena crise!), ao redor de US$4 bilhões de superávit com a “farsa” do Mercosul.

Quanto ao Mercosul como um todo, as exportações extrazona, isto é, as exportações para terceiros Estados, aumentaram em 200% entre 2002 e 2008, ficando bem acima do crescimento do comércio mundial, que foi de 147%. No mesmo período, as exportações intrazona aumentaram espantosos 300%. No que tange aos investimentos diretos, eles subiram cerca de US$15 bilhões, em 2003, para US$57 bilhões, em 2008. Saliente-se que esse aumento ocorreu num período no qual se verificaram privatizações de monta, como no passado. Nada mal para um “fardo”. Antes todos os fardos fossem assim.

Esses números sobre desempenho recente do Mercosul, obtidos já numa conjuntura de revisão das políticas neoliberais, hoje questionadas no mundo inteiro, demonstram cabalmente o quanto os adeptos da Alcasul estão equivocados.

Na realidade, o Mercosul e a integração regional tornam-se cada vez mais importantes para todos os Estados-Partes. Atualmente, a Argentina exporta duas vezes mais para o Mercosul, sem incluir seus membros associados, do que para todo o bloco do Nafta. Cerca de metade das exportações paraguaias estão concentradas no Mercosul. Já o Uruguai exporta cerca de quatro vezes mais para o Mercosul do que para o Nafta.

Tais cifras não aconteceram por acaso. Elas são frutos, em primeiro lugar, de uma decisão política que nossos países tomaram no sentido de aprofundar e consolidar a integração regional, que no passado não havia merecido a atenção necessária. Mas elas são consequência também de algumas profundas mudanças geopolíticas e geoeconômicas em curso no cenário mundial.

De fato [prossegue Aloizio Mercadante], houve uma mudança considerável da geoeconomia internacional nos últimos 15 anos. A crescente desterritorialização da economia norte-americana e também, em menor escala, das economias europeia e japonesa vêm conferindo grande dinamismo a alguns países em desenvolvimento, como a China, no campo industrial, e a Índia, no setor de serviços. O Mercosul, grande exportador de commodities e bens intermediários, beneficiou-se muito nos últimos anos do surgimento desses novos polos dinâmicos da economia internacional. O Brasil, em particular, caso que conheço bem, soube aproveitar esse novo dinamismo econômico dos emergentes para promover considerável diversificação de suas parcerias comerciais e econômicas, investindo bastante na cooperação Sul-Sul e na integração regional. Ao mesmo tempo, o Mercosul vem se constituindo em um importantíssimo polo de desenvolvimento regional.

Pois bem, a crise internacional, a maior desde 1930, está acelerando tais mudanças. Com efeito, a crise afetou bem mais a chamada tríade (Estados Unidos, União Europeia e Japão) do que a maior parte dos países em desenvolvimento. Ao contrário do que acontecia nas crises periféricas do passado recente, dessa vez os países mais atingidos são justamente aqueles que estão no cerne do sistema capitalista mundial. Boa parte dos países emergentes vem superando bem a crise global.

O Brasil, por exemplo, graças a uma política bem-sucedida de superação de sua vulnerabilidade externa, entrou por último e saiu primeiro da crise. Neste ano, deveremos crescer ao redor de 6%. Por outro lado, os Estados Unidos, a União Europeia e o Japão, nações que comprometeram seus orçamentos com as imprescindíveis medidas anticíclicas para evitar o mal maior da Depressão, enfrentam uma penosa e longa repercussão.

Assim, tais mudanças no cenário econômico internacional recomendam, de forma inteiramente racional e pragmática, que os Estados Partes do Mercosul insistam na bem-sucedida aposta estratégica na cooperação Sul-Sul e na integração regional. Isso não significa, é claro, ignorar as oportunidades que podem ser abertas com as negociações de acordos comerciais com as nações mais desenvolvidas. Devemos nos esforçar, por exemplo, para alcançar um acordo equilibrado com a União Europeia e fechar a Rodada Doha com um acordo que corrija as graves assimetrias do comércio mundial, particularmente as relativas à agricultura.

Mas não são só as assimetrias do comércio mundial que têm que ser corrigidas. A principal fragilidade do Mercosul reside justamente em suas assimetrias internas. Tais assimetrias dividem e geram inevitáveis tensões. Não se pode construir um mercado comum e, sobretudo, uma cidadania comum sem o decidido enfrentamento das desigualdades intrabloco. O Mercosul pode incluir países pequenos, mas, se quiser ter êxito, jamais poderá ter sócios minoritários. Todos os Estados têm que ter os seus interesses contemplados e se beneficiar da integração. Todos, sem exceção, devem ser grandes dentro do Mercosul.

Pois bem, o papel primordial na superação das assimetrias e na consolidação do processo de integração cabe a este Parlamento[(enfatizou o novo Presidente do Mercosul, Aloizio Mercadante].

Ao longo dos anos, durante os quais o bloco esteve concentrado apenas na liberalização comercial, acumulou-se um considerável déficit democrático no Mercado Comum do Sul que precisa ser resgatado com urgência. Tal situação é obviamente incompatível com a consolidação do bloco, já que processos consistentes de integração de países em verdadeiros mercados comuns não podem existir em espaços políticos vazios de cidadania. Portanto, o Parlamento do bloco tem como desafio principal aprofundar o compromisso democrático do Mercosul e construir uma cidadania comum que sedimente, em definitivo, o processo de integração.

Contudo, devo constatar, com preocupação, que, nos seus primeiros três anos de existência, ainda em fase de afirmação institucional, o Parlamento do Mercosul não explorou a contento suas novas funções e não discutiu, com a intensidade necessária, junto com a sociedade civil do bloco, temas de grande interesse para a cidadania dos Estados Partes.

Precisamos ultrapassar, com urgência, essa fase inicial do Parlamento, sob pena de desperdiçarmos o potencial desse órgão legislativo e convertê-lo em instituição de pouca relevância. Com esse propósito, é necessário construir uma agenda de temas importantes, a ser discutida em profundidade com as sociedades do bloco e transformada em propostas concretas de normas e de harmonização de legislações para os Estados Partes. De fato, temos de começar a fazer aquilo para o qual os parlamentos são criados: legislar, ou, no caso deste parlamento específico, propor legislações e harmonizá-las.

Perdemos muito tempo na discussão da questão da proporcionalidade da representação cidadã, ainda não implementada. Ela é fundamental para que o Parlamento do Mercosul seja, de fato e de direito, autêntico porta-voz dos habitantes e de todos os seus membros.

O Parlamento do Mercosul já poderia estar realizando eleições diretas e exclusivas em todos os Estados Partes, tal como previa, inicialmente, seu Protocolo Constitutivo. Com isso, a sua consolidação já seria definitiva. Todos os Estados partes são prejudicados por essa indefinição, que fragiliza este Parlamento. Pretendo empenhar-me para que essa questão seja resolvida de uma vez por todas.

Além de resolver essa relevante questão política, temos de solucionar os graves problemas administrativos do Parlamento. Precisamos de um corpo técnico estável, escolhido por meio de concurso público. Funcionários concursados e com dedicação exclusiva são fundamentais para fazer o Parlamento operar de forma eficiente. Temos de investir, da mesma forma, na transparência dos recursos públicos utilizados por esta instituição. É preciso que se compreenda que o Parlamento do Mercosul é uma espécie de vitrine das nossas democracias. Dessa forma, ter uma instituição ágil, eficiente e transparente, regida por princípios republicanos, é de vital importância.

As tarefas são imensas, mas os que me conhecem sabem que tenho determinação para enfrentá-las.

Srªs e Srs. Parlamentares, o grande sociólogo brasileiro Gilberto Freyre, que foi parlamentar por um breve período, dizia que os congressistas são os únicos que podem discursar em seus próprio enterro. Enterros parlamentares, é óbvio. É o que, de certo modo, estou fazendo.

Ao tempo em que assumo esta presidência, começo a me despedir da vida parlamentar. Quaisquer que sejam os resultados da disputa eleitoral que decidi enfrentar, terei de me ausentar do Legislativo. Até lá, entretanto, me esforçarei ao máximo por este incipiente, mas rico, Parlamento.

Não me despedirei, contudo do Mercosul. Aonde quer que eu vá, levarei comigo o ideal da integração dos nossos povos. O Mercosul é, para mim, bem mais do que um projeto econômico, social e político de óbvia relevância estratégica, ele é um projeto de civilização.

Trata-se de criar na América do Sul, um subcontinente antes tão dividido e dependente, e ainda tão desigual, uma civilização próspera, inclusiva e generosa, baseada em nossos melhores valores. Os mesmos valores que nos deram Borges, Augusto Roa Bastos, Mário Benedetti, Machado de Assis, Rômulo Gallegos e tantos outros, bem como nos fizeram superar o ciclo histórico dos regimes autoritários e construir dinâmicas democracias, podem inspirar essas civilização. Uma civilização que se anteponha à barbárie desagregadora da globalização assimétrica e das políticas que a acolheram acriticamente. Uma civilização que nos faça nos enxergarmos mutuamente como concidadãos e como amigos, e não como rivais que têm de competir por um lugar no banquete, cada vez mais ralo, das nações mais desenvolvidas.

Por isso, ao terminar este pronunciamento, digo de forma singela: “Amigas e amigos, até breve!

            E assim concluiu o Senador Aloizio Mercadante seu discurso de posse no Parlamento do Mercosul, ontem.

            V. Exª há de compreender que eu me estendi além do tempo normal para registrar um pronunciamento que me pareceu muito significativo daquele que nos representa no Mercosul e que é nosso colega. E eu achei que...

            O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT - RO) - Se V. Exª me permite.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com muito prazer.

            O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT - RO) - É muito oportuno e importante. V. Exª colocou um tema da mais alta importância: um brasileiro, o Senador Aloizio Mercadante, presidindo o Mercosul. Gostaria que V. Exª transmitisse ao Senador Aloizio Mercadante, em nome do PDT aqui do Senado, sucesso. Não temos nenhuma dúvida de que fará um grande trabalho à frente do Mercosul. Mas transmita a ele um abraço forte dos pedetistas, aqui do Senado, e desejamos realmente que ele tenha sucesso nessa nova missão.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Eu agradeço muito e vou transmitir ao Senador Aloizio Mercadante o cumprimento não apenas por ter sido eleito Presidente do Mercosul, mas por um pronunciamento de grande profundidade e mérito sobre as aspirações de todos nós, que queremos a real integração de todos os países do Mercosul e, em verdade, um dia, das três Américas.

            Se me permite ainda uma referência àquilo que é a nossa paixão. V. Exª sabe que ainda hoje o Brasil vai enfrentar os Estados Unidos. Estou muito contente de ver que, desta vez, estarão Ganso, Robinho e Neymar juntos com o Pato. Então, os Estados Unidos vão passar por grande dificuldade, mas será um grande jogo.

            Na semana passada, eu fiz um pronunciamento aqui, mas não sei se fui compreendido de forma adequada. Eu quis falar em nome de todas as torcidas, e houve protesto por parte de algumas torcidas. Sou torcedor do Santos. Uma das torcidas do Palmeiras protestou dizendo que eu fiz um pronunciamento em favor do Estádio do Morumbi. Mas é um pouco mais amplo. E eu gostaria de ler uma breve nota para esclarecer:

            Na quinta-feira passada, dia 5 de agosto, eu defendi, em discurso da tribuna do Senado, que o poder político de São Paulo e a sociedade civil do nosso Estado devem se conservar unidos na aspiração de que a cidade de São Paulo seja a sede do jogo de abertura da Copa do Mundo de 2014. Dizia eu que, independentemente da vitória de qualquer que fosse o candidato a Governador, bem como se nós, paulistas, fôssemos torcedores do Santos, do Corinthians, do Palmeiras, da Portuguesa, do São Paulo, ou dos demais times, todos deveríamos juntar esforços para manter a abertura do mundial para a nossa cidade.

            Considero ser esse desejo muito legítimo pela importância que a cidade de São Paulo tem para o nosso País e para América Latina. Avalio também que o evento de abertura da Copa do Mundo pode atrair, em certa medida, e aumentar, noutro tanto, o nível dos investimentos financeiros para a cidade, pela divulgação mundial que um acontecimento dessa natureza produz. Entendo que, como Senadores do Estado de São Paulo, Aloizio Mercadante, Romeu Tuma e eu próprio, é nosso genuíno papel lutar, de forma clara e transparente, para que a capital paulista tenha o reconhecimento que lhe cabe no seio de nossa Nação.

            Não obstante ter recebido várias mensagens de apoio, outras tantas foram contrárias à minha fala, as quais acolho com bastante atenção, pois elas apresentam críticas sobre a mudança de prioridades de políticas públicas que a alocação dos recursos para a realização da abertura da Copa do Mundo, na nossa cidade, poderia causar.

            Ao agradecer as manifestações, que considero muito oportunas, reafirmo que a minha única intenção, como Senador de São Paulo, é, isto sim, lutar para que a partida de abertura da Copa do Mundo de 2014 e as solenidades e espetáculos que circundam esse evento ocorram na cidade de São Paulo.

            Que possa, logo, o Governador Alberto Goldman, o Prefeito Gilberto Kassab, a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), a Federação Paulista de Futebol e os dirigentes do São Paulo, do Santos, do Palmeiras, do Corinthians, da Portuguesa e de todos demais times, chegarem a um entendimento.

            A Copa do Mundo em São Paulo e no Brasil trará benéficos simplesmente extraordinários que mais do que compensarão os investimentos que tanto o setor público quanto o setor privado realizarão para viabilizar a Copa de 1914.

            Muito obrigado, Sr. Presidente e Srs. Senadores.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/2010 - Página 40832