Discurso durante a 149ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões, por ocasião da passagem do Dia do Soldado, acerca de relações entre a Educação e as Forças Armadas, com propostas de novas diretrizes para o seu aprimoramento. Reconhecimento histórico a Getúlio Vargas, por ensejo do transcurso, ontem, do quinquagésimo sexto aniversário de sua morte. (como Líder)

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. FORÇAS ARMADAS. EDUCAÇÃO. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Reflexões, por ocasião da passagem do Dia do Soldado, acerca de relações entre a Educação e as Forças Armadas, com propostas de novas diretrizes para o seu aprimoramento. Reconhecimento histórico a Getúlio Vargas, por ensejo do transcurso, ontem, do quinquagésimo sexto aniversário de sua morte. (como Líder)
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti, Roberto Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 26/08/2010 - Página 43174
Assunto
Outros > HOMENAGEM. FORÇAS ARMADAS. EDUCAÇÃO. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, SOLDADO, EXPECTATIVA, REALIZAÇÃO, SESSÃO SOLENE, SENADO, POSTERIORIDADE, ELEIÇÕES.
  • NECESSIDADE, ATENÇÃO, PODER PUBLICO, ATENDIMENTO, ORÇAMENTO, FORÇAS ARMADAS, COMENTARIO, CONTRIBUIÇÃO, SERVIÇO MILITAR, FORMAÇÃO, PROTEÇÃO, JUVENTUDE, PRESERVAÇÃO, TERRITORIO NACIONAL, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO PUBLICO, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, MILITAR, EFEITO, PROGRESSO, MODERNIZAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA.
  • NECESSIDADE, PRIORIDADE, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, REDUÇÃO, IMPORTAÇÃO, TECNOLOGIA, PRODUÇÃO, EQUIPAMENTOS, DEFESA NACIONAL.
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, GETULIO VARGAS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, MODERNIZAÇÃO, BRASIL, CRIAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT), AMPLIAÇÃO, DIREITOS, VOTO, MULHER, PROCESSO, INDUSTRIALIZAÇÃO, IMPORTANCIA, ANALISE, SITUAÇÃO, ATUALIDADE, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, MODELO, BUSCA, DIRETRIZ, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Acir, Srªs e Srs. Senadores, ouvindo o discurso do Senador Mozarildo, eu fico feliz que tenhamos hoje tido oportunidade de falar no dia dos soldados brasileiros. Em geral, nesta data, costumamos fazer aqui uma sessão solene em homenagem às Forças Armadas e aos soldados. Eu creio que, por causa das eleições e do natural compromisso de cada um de nós com o que acontece lá, nas nossas bases eleitorais, ficou impossível, Senador Roberto, fazer essa solenidade. Eu até desejo que façamos um requerimento para que comemoremos o Dia do Soldado depois das eleições, mesmo não sendo mais no dia 25 de agosto.

            Mas eu quero falar hoje, também, sobre um discurso que o Senador Roberto fez, que tocou numa data importante, que foi o aniversário da morte de Getúlio Vargas. Duas datas que coincidem e que merecem uma reflexão de cada um de nós.

            No caso do Dia do Soldado, pelo que tenho repetido aqui, em cada ano, quando nós fazemos esse evento, dá ideia de que um país é construído e protegido por cada pessoa, cada profissional.

            As duas profissões, a meu ver, têm um papel fundamental: os professores são os que constroem um país e os soldados são os que defendem um país. Sem a combinação desses dois nós não temos como levar adiante uma nação.

            Alguém pode dizer: mas são dos médicos, eles vêm da educação: são dos empresários, eles também vêm da educação, e a defesa vem de muitos profissionais, mas vem sobretudo daqueles que compõem as Forças Armadas.

            Por isso, o Brasil precisa descobrir que no tamanho que nós temos, com a presença que hoje temos internacionalmente, em grande parte graças ao Governo do Presidente Lula - e não vamos esquecer que o Presidente Fernando Henrique Cardoso também teve um papel importante nisso durante os seus 8 anos, e os 25 anos de democracia que nós temos também tem papel nisso -, o fato é que, com a presença do Brasil no cenário internacional, com o tamanho do território brasileiro, com o tamanho do espaço aéreo, com o litoral imenso que nós temos, é preciso que cuidemos bem das Forças Armadas brasileiras.

            Cuidar bem das Forças Armadas significa pensar alguns aspectos. Um deles são os recursos necessários. O Brasil não tem o direito de deixar as Forças Armadas recebendo migalhas do Orçamento. Não temos esse direito. É uma traição ao projeto de nação que nós temos, especialmente um Exército que hoje dá provas de profissionalismo. E a gente vê situações trágicas, como não faz muito, quando se dizia que soldados no Centro-Oeste saíam para matar, caçando pássaros, para que pudessem comer; as Forças Armadas tendo que liberar os soldados no dia a dia por falta de alimentação. A gente não tinha o direito de fazer isso com o Brasil; não tínhamos o direito. Ao contrário, eu defendo que as Forças Armadas Brasileiras ampliem muito o contingente, dividindo-o em dois tipos de contingentes: o contingente realmente profissional de defesa da Nação e o contingente de recuperação e de proteção da juventude brasileira.

            Visitei muito cadeias quando fui Governador do Distrito Federal e perguntava sempre o que cada um fazia. Senador Mozarildo, é raro a gente encontrar entre os presos quem tenha feito o serviço militar. Pode-se dizer que, no Brasil, é tão raro quem faz o serviço militar que, de fato, a probabilidade é de não encontrar quem tenha feito o serviço militar em nenhuma área, inclusive nas cadeias. Mas há outra maneira de raciocinar: o serviço militar, Senador Acyr, traz algumas das coisas que reduzem a perdição, chamemos assim, dos jovens. Uma é que eles encontram amizades, companheirismo; outra é que eles saem das ruas, outra é que eles adquirem disciplina, outra é que eles adquirem amor ao coletivo nacional, fica faltando um quinto: que eles adquiram um ofício e, mesmo assim, alguns adquirem um ofício, alguns aprendem a ler nas Forças Armadas. Mas, a gente poderia ter um serviço militar específico - e eu pratiquei isso no meu governo do Distrito Federal com a Polícia Militar.

            Se a gente colocar dentro do serviço militar um setor não militarizado em que os jovens entrariam e aí, durante seis meses - as contas que eu sempre fiz de quanto custaria é para seis meses -, esses jovens teriam a vida de disciplina - e esqueci de falar outro ponto -, de exercícios físicos, adquirindo amigos, entendendo e gostando dos símbolos pátrios e adquirindo um ofício. As Forças Armadas prestariam um grande serviço ao País. Como elas estão hoje não é possível.

            Eu já ouvi alguém dizer, e defendo essa idéia há mais de dez anos e coloquei no livro, que eu estava querendo transformar as Forças Armadas em babá de pobres. Eu disse não é babá de pobres, é educador de jovens. E deveríamos colocar não somente os pobres nisso, mas todos os jovens.

            Nós temos de voltar a discutir, Senador Arruda, e o senhor é um dos grandes defensores das Forças Armadas e da Defesa Nacional. Eu nunca discuti a sua posição, mas gostaria de discutir essa idéia de o serviço militar ser voluntário ou não. Eu gostaria. Eu acho que passar pelo serviço militar, e eu passei, agrega muito ao jovem, agrega muito. A gente precisa rediscutir, sem preconceito, sem este liberalismo falso em que cada um tem direito de só fazer o que quiser. Se devemos ou não fazer com que nossos jovens passem por um período em que eles adquiram... Não estou aqui defendendo, porque isso exige uma reflexão mais cuidadosa.

            O Dia do Soldado deve ser analisado como as Forças Armadas que um País do nosso tamanho precisa. E o primeiro ponto é o seu contingente; o segundo, são os recursos, por isso, estou falando que seriam necessários mais recursos; o terceiro, o papel educador das Forças Armadas. Agora, tem o quarto, sem o que elas não funcionam hoje: a modernização tecnológica e científica. Aí, mais uma vez eu caio na velha nota única do meu discurso: só com a educação é que a gente vai conseguir isso.

            Houve um tempo que para o bom soldado bastava ter coragem, um olho bom e um dedo indicador bom, para puxar o gatilho. Bastava a pontaria e era um bom soldado se tivesse coragem. Não é mais assim. As armas ficaram inteligentes. As armas de hoje não se disparam puxando o gatilho, mas apertando botão de computador. As armas de hoje não são guiadas pelo olho, são guiadas pelo GPS.

            Para ter GPS e pra ter todas essas armas, nós precisamos de duas coisas: uma, que os nossos soldados saibam usá-las. Para isso, eles precisam de educação. Cada um deles. Mas tem outra: o Brasil precisa produzir essas armas. O país que não tem acesso a essas armas é um país em risco de sobrevivência.

            O Iraque comprou armas com o dinheiro do petróleo; comprou radares dos mais perfeitos que existiam. Começou a guerra dos Estados Unidos, e eles desligaram os radares porque o Iraque não sabia produzir aquilo.

            O Brasil tem que desenvolver um potencial científico e tecnológico do ponto de vista da sua defesa e não vai fazer isso se contarmos com um número tão pequeno de cientistas. E não vai ter um número grande de cientistas se não tivermos muitos jovens na universidade. E não vai ter muitos jovens em universidades com competência para seguir os cursos se não tivermos um ensino médio de alta qualidade para todos. E não vai ter um ensino médio de alta qualidade para todos se não tiver um ensino fundamental para todos. Então, tudo cai, no final, na educação. Chamem de nota só quantas vezes quiserem, mas deságua ali. É ali que está o problema. Um povo deseducado é um povo desarmado. E o Brasil, hoje, é um país desarmado. O Dia do Soldado é um dia para refletirmos sobre este aspecto: um país deseducado é um país desarmado.

            Não dá mais para tocar a corneta e colocar os soldados com suas espingardas ou mesmo metralhadoras. Não dá mais! Acabou esse tempo. Hoje exige-se muito mais formação não dos soldados, mas de toda a população, para poder escolher os que têm boa formação para serem soldados, escolher os que têm boa formação entre todos para serem bons professores; escolher os melhores dentre os que têm boa formação para serem médicos. Hoje nós escolhemos todos os nossos profissionais, não entre todos, mas entre aquele pedacinho de nada que conseguiu terminar o ensino médio de qualidade mediana.

            Por isso, a nota é só da educação. Por isso, no Dia do Soldado, eu termino caindo na educação. Mas não posso deixar de prestar minha homenagem a esses que são os verdadeiros defensores de um país e, portanto, construtores também, que são os nossos soldados no dia deles, deixando a proposta de que prestemos esta homenagem passadas as eleições, já que neste período é impossível.

            Antes de passar para o assunto seguinte, que são os 56 anos da morte de Getúlio, eu, com muito prazer, passo a palavra aos Senadores que pediram aparte. Por favor, Senador.

            O Sr. Roberto Cavalcanti (Bloco/PRB - PB) - Eu gostaria de abordar dois tópicos neste aparte. Tentarei ser bastante breve, bastante sintético. Um, por questão de justiça, fazer referência a V. Exª no sentido de que, na tarde de ontem, dois Senadores trataram do tema, exatamente do dia 24 de agosto, da morte do Estadista Getúlio Vargas: um fui eu, e o outro foi, até por direito, por questões partidárias, o nosso grande companheiro Mozarildo Cavalcanti. Então, V. Exª fez a referência de que toquei no tema, e eu faço este registro, por uma questão de justiça, no tocante à abordagem do mesmo tema pelo companheiro Mozarildo Cavalcanti, até por nós três sermos Cavalcanti, somos a bancada dos Cavalcanti: Cristovam, Roberto e Mozarildo. Então, é muita honra. O segundo ponto, na verdade, parabenizo a abordagem do tema de V. Exª no tocante ao Dia do Soldado, a homenagem ao Dia do Soldado. Vou pegar carona nesta oportunidade e fazer a minha homenagem ao Senador Cristovam, que é a seguinte: conheço o Cristovam há mais de 40 anos; fomos colegas na universidade, ele como meu professor, eu como aluno, na Faculdade de Economia em Pernambuco, porque, na origem, lá no nosso DNA, da mesma forma que Mozarildo registrou que é paraibano no seu DNA, nós dois somos pernambucanos. Então, desde aquele momento, desde aqueles primeiros contatos, se percebia um diferencial em Cristovam. Eu, aqui no Senado, meses atrás, sentado ao seu lado, perguntava: Senador Cristovam, o amigo vai ser candidato? Ele refletiu e disse: Roberto, já trabalhei tanto, já fiz tanto por este País, já contribuí, eu acho que estou num momento em que eu merecia um certo descanso. Sabe qual é a única coisa que me constrange, a única coisa por que talvez eu hesite em permanecer na política é porque, dificilmente, me sentirei tranqüilo em ter meu espaço aqui ocupado por outro senador que não trate dos assuntos da forma como eu trato. “Então, eu sinto como se fosse uma não-responsabilidade social, uma não-responsabilidade como cidadão abrir mão dessa minha presença aqui no Senado Federal”. Sou testemunha da história de vida de V. Exª no sentido de que nós somos aqui 81 membros como Senadores e, dificilmente, nós teríamos um Senador que pudesse representá-lo aqui no Senado Federal da forma como V. Exª atua, com a seriedade, com a precisão, com o desinteresse por assuntos paralelos, assuntos que não sejam os interesses exatamente da coisa pública. V. Exª, em nenhum momento, ao dizer que tem o desejo de continuar na Casa abordou temas como posição econômica, mordomia que o Senado supostamente oferece. Nada. V. Exª fez o registro de que a responsabilidade que V. Exª tinha, para com o País, de retornar a esta Casa era exatamente porque V. Exª se sentia com essa co-responsabilidade. Sou testemunha de que, dificilmente no País, nós encontraríamos um Senador que abordasse os temas que V. Exª aborda. Educação, por exemplo, virou uma marca registrada. Na campanha passada à Presidência da República, V. Exª foi carimbado até pelas más línguas como o Senador que maciçamente tratava da educação. O que não seria de nós se todos os Parlamentares deste Pais maciçamente tratassem da educação? Está aí o exemplo da Coréia. Eu era menino na guerra da Coréia, e eu me alimentava na casa de uma tia e eu era menino que tinha fastio, não gostava de comida, e minha tia dizia: “Você não pode deixar nada no prato porque os meninos da Coréia estão lá na guerra, sofrendo e pobres.” Hoje o Brasil se espelha na Coréia. E a grande mola propulsora do desenvolvimento da Coréia foi exatamente a educação. Então, eu parabenizo V. Exª pela abordagem, parabenizo V. Exª pelo tema “Educação” e “Forças Armadas”, que é uma correlação com visão de futuro. E, fundamentalmente, parabenizo V. Exª pela cidadania de estar disputando as eleições ao Senado Federal, porque o Brasil e o Senado Federal precisam de V. Exª nesta Casa. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador Roberto Cavalcanti. Fico preocupado se não vou ferir as normas dizendo: “Que pena que o senhor não vota aqui”. Agradeço muito a sua fala.

            De fato, eu tive uma dúvida. Não para descansar. Mas para fazer outras coisas, como, em vez de dar apenas uma aula por semana, como dou na Universidade toda semana, dar todas as aulas, porque eu gosto. E eu poderia escrever mais.

            O Sr. Roberto Cavalcanti (Bloco/PRB - PB) - E até ganhar mais.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - E ganhar mais, certamente, não apenas porque sou Titular, ex-Reitor, mas também porque, fora daqui, eu ganhava por palestras e por outras consultorias, as quais me nego a fazer estando aqui. É verdade!

            Mas a gente não tem direito a isso, a não ser quando acha que pode ser substituído, como é o seu caso. O senhor achou que poderia ser substituído e está lutando na Paraíba para ser bem substituído. Eu cheguei à conclusão de que, depois da crise por que o Distrito Federal atravessou, se eu não fosse candidato, eu não ia ter como me explicar. Então, agradeço-lhe muito.

            Mesmo assim, vou continuar disputando sem ter medo de falar sobre temas polêmicos, como esse das Forças Armadas, como esse que questiona se o serviço militar deve ou não ser obrigatório e sobre Getúlio Vargas, que também é um tema polêmico. Mas eu não vou deixar de falar, depois de ouvir o Senador Mozarildo.

            Quero pedir desculpas, Senador Mozarildo, mas ontem eu não o escutei. Desculpe! Eu não estava presente na hora e fico muito feliz que o Senador Roberto tenha feito esse gesto, o que prova que ele é um bom pernambucano.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Agradeço a V. Exª o aparte e ao Senador Roberto Cavalcanti a menção. Realmente, eu não poderia deixar, no dia de ontem, de registrar o aniversário de morte - se é que podemos dizer assim - do nosso saudoso Presidente Getúlio Vargas, patrono e fundador do nosso Partido, o PTB. Ontem, completaram-se 56 anos de sua morte. Falei até para que os jovens que não tomaram conhecimento da existência de Vargas o tomem, mas também para os mais velhos, que já estão se esquecendo do excelente trabalho feito por ele principalmente quanto à área social e à do trabalho - CLT, Carteira de Trabalho, Ministério do Trabalho -, ao voto estendido a todos, inclusive às mulheres, que não votavam antes, à própria Justiça Eleitoral, criada na época dele, à Petrobras, à Vale do Rio Doce, à Companhia Siderúrgica Nacional. Ele foi um homem que realmente marcou o início de um novo Brasil. Mas eu gostaria de ater-me ao pronunciamento de V. Exª quanto às Forças Armadas. V. Exª tem muita razão quando faz a análise de que precisamos modernizar nossas Forças Armadas. Um país que se preza não pode, como disse V. Exª, permitir que nossas Forças Armadas fiquem ultrapassadas, sucateadas. Isso infelizmente vinha sendo feito, e espero que a gente mude essa postura e possa realmente valorizar as Forças Armadas, inclusive dando - como até já estão sendo dadas hoje - algumas atribuições para que elas, além daquelas de defesa da soberania, da integridade territorial do País e da própria defesa geral do País, já previstas na Constituição, tenham também algumas atribuições que podem perfeitamente ser complementadas.

            Hoje elas já desenvolvem um trabalho muito importante nas ações cívico-sociais, chamadas “acisos”, atendendo na Amazônia, notadamente, na área da saúde. E, falando em área da saúde, eu estou inclusive relator de dois projetos. Veja V. Exª quanto há desmotivação para ser militar neste País. Existe a possibilidade de a pessoa formada na área da saúde servir as Forças Armadas durante o período de dois anos e, portanto, contribuir com este País nos diversos pontos, principalmente esses pontos mais difíceis da Amazônia, do Centro-Oeste, do Nordeste. E o que acontece? Ano a ano, as pessoas que se formam na área da saúde, em medicina, enfermagem, odontologia, não se apresentam, não querem servir. Então, esses projetos, na verdade, disciplinam e estimulam que os profissionais na área da saúde possam prestar esse serviço temporário ao Exército e, ao mesmo tempo, que esse serviço conte inclusive ponto para sua pós-graduação, para sua especialização. Acho que é importante que possamos meditar até mesmo sobre se o serviço militar deve ser voluntário ou não. Eu, quando fui constituinte, apresentei uma proposta para que fosse voluntário. Depois, fui convencido de que, de fato, poderia haver uma grande distorção. E eu acho que é um tema que pode ser discutido a qualquer momento. Mas o importante, agora, é pensar na modernização das nossas Forças Armadas e também nessa questão de que eles sentem carência de profissionais de várias áreas, mas, notadamente, na área da saúde. E eu tive muita honra de relatar os dois projetos que estão prontos para serem apreciados na Comissão de Assuntos Sociais do Senado. 

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador Mozarildo.

            Quero falar agora, continuando os discursos de ontem dos Senadores Mozarildo e Roberto Cavalcanti, sobre essa data notável na história do Brasil, que foi o 24 de agosto, por causa da morte de Getúlio.

            Eu posso dizer, Senador Acir, que nasci para política naquele dia, com dez anos de idade. Nasci ali, porque lembro quando no colégio terminaram as aulas e fui para casa - eu morava perto e fui andando - e minha mãe estava na calçada me esperando chorando. Minha mãe era uma ex-tecelã - depois do casamento, parou de trabalhar. E estava chorando.

            E já no dia seguinte, vi e cresci com a carta-testamento de Getúlio e a sua foto na sala, onde eu almoçava, jantava e tomava café da manhã. Graças à minha mãe e ao meu pai.

            Posso dizer que talvez, sem ter percebido, ali já nasceu um sentimento de militância. Eu cresci ouvindo isso. E não posso negar a influência que tenho, tanto que o nosso Partido, Senador Acir, é um Partido de origem Getúlio. Mas coloquei ontem no twitter uma nota dizendo que faz 56 anos que morreu Getúlio, o último Presidente que deu uma inflexão na história do Brasil, passando da agricultura rural para a indústria urbana. E recebi uma resposta de um seguidor, perguntando simplesmente: você é getulista? Essa pergunta merece uma reflexão.

            Do ponto de vista da história, do ponto de vista do papel que ele teve, eu não tenho dúvida de que sou getulista e que sou dom pedrista, como sou izabelista, pela abolição da escravatura, mas nem Dom Pedro completou a independência, nem a Princesa Izabel completou a abolição.

            Também não vou desculpar certos gestos do primeiro governo de Getúlio com o qual eu não compactuo. Agora ninguém pode negar que o Brasil era um e passou a ser outro a partir do Governo Getúlio. Ninguém pode negar que este País, acostumado a apenas exportar café e viver no campo, graças a Getúlio, passou a produzir bens industriais e os cidadãos passaram a morar nas cidades. Claro que foi um marco. E foi o último grande marco. De lá para cá, a gente tem crescido, a gente tem mudado os produtos, mas não fez ainda uma nova inflexão. Aí paro de ser getulista no sentido de que chegou a hora de uma nova inflexão.

            Uma nova inflexão que traga duas coisas. Uma, a ideia de que o desenvolvimento industrial tem que ser sustentável com a natureza, o que não estava na cabeça de ninguém nos anos 1930, nem nos anos 1940. E aí não é culpa de Getúlio Vargas. Não era o tema! Hoje é. Hoje a gente precisa fazer uma inflexão de tal maneira de que conviva a produção com a natureza. Não é questão de parar a produção para proteger a natureza. Não. É para conviver os dois.

            E a segunda coisa é que, da mesma maneira que ele fez o Brasil sair da agricultura para a indústria mecânica, a gente hoje precisa dar um salto para a indústria baseada no conhecimento. Não é mais um país moderno aquele que produz automóveis em quantidade, que produz móveis. Aqueles bens a que nós chamávamos de secundários - primários são agricultura e mineração; secundários são os bens industriais - já não são mais secundários. Já são primários. Hoje a economia primária é a economia do minério, da agricultura e dos bens tradicionais da indústria. Os verdadeiros bens novos são aqueles que têm dentro dele alto conteúdo de ciência e tecnologia, e nisso o Brasil é muito fraco, nisso o Brasil não está dando o salto de que a gente precisa.

            Apesar de todo o aumento no número de universitários que a gente conseguiu neste País - e é uma das grandes coisas das últimas décadas -, nós não estamos conseguindo nos transformar em um País de produção de bens de alta tecnologia. Até no caso de um produto tão sofisticado que nós produzimos como os aviões da Embraer, a maior parte do conteúdo de alta tecnologia é importado ali dentro, a parte de navegação, de aviação, os chips são importados. Se a gente olhar este microfone, a parte aqui dentro de alto conhecimento é importada. Nós estamos importando primários. Eu estava vendo que nós estamos exportando muito jovens, com menos de dezoito anos, para serem jogadores de futebol. Então, veja, Senador, até jogador de futebol a gente está exportando em forma primária: eles vão para lá meninos, quando viram craques e começam a ter seus valores acrescidos aí são exportados - e o capital fica lá nos países europeus. Nem jogador de futebol a gente está mais exportando depois de pronto.

            Nós exportamos minério; a China exporta aço. Nós precisamos dar o salto para uma economia do conhecimento e nós precisamos dar um salto para uma economia casada, convivendo solidária com a natureza.

            Aí não dá para reclamar de Getúlio. Faz 56 anos que ele morreu. Nesses 56 anos é que surgiram, ao mesmo tempo, a consciência da crise ecológica e a revolução científica e tecnológica das últimas décadas. Nós estamos precisando dessa inflexão e não vemos isso no discurso do dia a dia. Nem mesmo nos discursos dos candidatos à Presidência, estamos vendo com clareza essa necessidade de inflexão, de mudança de rumo, de dobrar uma esquina, como dobramos graças a Getúlio naquela época, ainda que sob o autoritarismo que nós não defendemos.

            Por isso acho que na hora de lembrar a morte de Getúlio e a grandeza de como ele morreu - é importante lembrar isto: a grandeza de como ele morreu - é preciso fazer uma reflexão sobre a necessidade de uma nova mudança de rumo, de uma nova inflexão. Ele nos tirou da agricultura rural para a indústria mecânica urbana. Está na hora de sairmos da indústria mecânica e urbana para uma indústria baseada no conhecimento e convivendo com a natureza, o que vai implicar também a redução do tamanho das cidades, pois a ciência e tecnologia já permitem a gente morar numa cidade e trabalhar em outra através dos meios de comunicação.

            Nós estamos pensando muito em como resolver os problemas das cidades mantendo-as do tamanho em que elas estão. É preciso criar incentivos para que as cidades diminuam. É possível um programa de “desmigração” das grandes cidades para as cidades de porte médio. Não estou falando das pequenas, nem de ir outra vez para o campo, mas para as cidades de porte médio.

            A morte de Getúlio permite reflexões. A reflexão de como um País, quando descobre o seu potencial, consegue dar um salto - e o Brasil deu um salto a partir de 30, obviamente graças a 55, quando tivemos Juscelino. Graças - não podemos negar, apesar de todos os aspectos negativos do autoritarismo - mas graças ao regime militar, nós demos um salto do ponto de vista da infraestrutura econômica, um grande salto. Graças a esses últimos dois governos, o do Lula, mas também o do Presidente Fernando Henrique Cardoso, apesar de uma recessão no tamanho do produto, nós conseguimos ter um crescimento e ter uma posição maior no cenário internacional, mas ainda com uma economia tradicional, depredadora da natureza e baseada em produtos tradicionais.

            E aí, mais uma vez, eu caio na nota só do meu discurso. Essa inflexão só virá com uma revolução, a revolução getulista - e aí respondendo a essa pessoa que me perguntou se eu era ou não getulista. A revolução getulista foi uma revolução ao nível da economia. A revolução daqui para frente, dessa nova modernidade, essa revolução educacionista vai ser garantindo escola igual para todos.

            Getúlio deu um salto imenso quando fez a Consolidação das Leis Trabalhistas. E não devemos ter medo de ajustá-la, porque a realidade de hoje é outra. Eu mesmo tenho um projeto que amplia quando garante que, além da licença-maternidade, além das férias, além de tudo isso, há o direito de três meses a cada cinco anos para a reciclagem do funcionário, porque o trabalhador que não se reciclar fica desempregado, e permanente.

            Então não temos que ter medo de ajustar. Mas a verdadeira revolução que a gente precisa fazer daqui para frente não está na Consolidação das Leis Trabalhistas, está na garantia de uma formação tão grande do trabalhador que ele não consegue ficar desempregado, que ele nem precisa brigar por salários altos, porque os patrões vão brigar por ele; que ele nem precisa ter muita proteção estatal, porque ele vai ter a proteção de ser o dono do capital, que é o conhecimento. Capital não é estar mais nas máquinas, que pertencem a alguém. Capital está no conhecimento que alguém tem.

            Então, respondendo a essa pessoa, que eu não sei se é jovem ou não - um dos problemas do twitter é que a gente não sabe quem é quem, não sabe onde mora, não sabe nem se é homem ou mulher; em alguns casos, não sabe se é jovem ou velho, embora eu imagine que a grande maioria seja de jovem -, é de que EU SOU ao reconhecer o papel histórico de Getúlio e ao lamentar certos gestos políticos do tempo de Getúlio. E EU NÃO SOU quando eu percebo que o País de hoje precisa de outra revolução. No meu caso, eu defendo uma revolução doce, uma revolução que não precisa de violência, não precisa de fuzil; precisa de lápis. A gente precisa de fuzil para defender o Brasil, não para mudar o Brasil. Aliás, para mudar o Brasil, é melhor que não tenha fuzil. A gente precisa de fuzil para defender, fuzil no sentido metafórico, porque as armas de hoje não têm nada a ver com fuzil. Aliás, uma das provas da tragédia das Forças Armadas é que até hoje eu sei que alguns quartéis usam o mesmo canhão que eu usei no meu serviço militar, o chamado 105. É uma coisa absurda. Lá fora eu acho que isso nem existe mais. Aqui ainda tem lugares que usam.

            Então, Sr. Presidente, fica aqui o meu registro das duas datas e uma reflexão sobre o Dia do Soldado, do que a gente precisa no País do nosso tamanho, com a nossa presença internacional, na modernização. E quero dizer ao Senador Mozarildo que a modernização das Forças Armadas não basta somente em se comprar armas, mas, sim, está na capacidade de criar as armas.

            Nós vamos, agora, ter um gesto de certa modernização comprando caças e submarinos. Mas é uma modernização primária. A verdadeira modernização já fez a China, que fabrica os submarinos e os caças. Israel, um país pequeniníssimo, fabrica seus caças. A Suécia, um país neutro, está tentando exportar para o Brasil seus caças. A gente compra... Isto é, a nossa modernização é primária, a nossa industrialização é primária. Nós não estamos dando o salto para os tempos de hoje de sermos donos não das armas apenas, mas donos do saber que produz as armas. Temos de ser donos não apenas das máquinas, mas donos do saber de fazer as máquinas e de saber usar as máquinas, que é outro saber fundamental que o nosso povo não está tendo. Ser donos do saber: este é o grande desafio.

            Tem um livro clássico, Senadora, que todos costumam ler e de que falam muito, chamado As Veias Abertas da América Latina. É um clássico de que a juventude adora. Eu confesso que é um bom livro, mas o problema do Brasil não foi o saqueio dos recursos naturais. Não, o grande problema que fez aqui o colonialismo foi impedir que a gente estudasse.

            Eu costumo dizer, Senador, que o problema não foram as veias abertas, mas os neurônios tapados que o colonialismo nos impôs até certa data; depois fomos nós. Não foram mais lá de fora. Ao contrário, se a gente for olhar bem, grande parte da elite brasileira foi formada nos Estados Unidos, foi formada pelos países que nós chamamos de colonialistas. Nós é que somos os culpados.

            Está na hora de olhar o que Getúlio fez, analisar criticamente o que estava errado, elogiar o que foi certo, o salto que o Brasil deu, mas também de dizer que está na hora de outro salto, outro salto que espero, sinceramente, que seja feito democraticamente, sem necessidade de um presidente ficar 15 anos, como ele ficou no primeiro mandato, e, obviamente, também sem necessidade do gesto trágico, embora heróico, que ele cometeu há 56 anos.


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