Discurso durante a 163ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Agradecimento aos eleitores do Distrito Federal pela reeleição de S.Exa., no dia 3 de outubro último. Ênfase à necessidade de combate à desigualdade no acesso à educação e à saúde.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • Agradecimento aos eleitores do Distrito Federal pela reeleição de S.Exa., no dia 3 de outubro último. Ênfase à necessidade de combate à desigualdade no acesso à educação e à saúde.
Aparteantes
Augusto Botelho.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/2010 - Página 46955
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • AGRADECIMENTO, ELEITOR, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), REELEIÇÃO, ORADOR, SENADO, REGISTRO, CONTINUAÇÃO, COMPROMISSO, GARANTIA, IGUALDADE, ACESSO, MELHORIA, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, SAUDE PUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Augusto Botelho, Presidente desta sessão, Srªs e Srs. Senadores, apesar de as pesquisas indicarem ao longo de todo o período eleitoral que eu teria número de votos para voltar a esta Casa, acostumado aos riscos das pesquisas - já me indicaram vitorioso uma vez e eu perdi; já indicaram que eu perdia e eu ganhei -, preparei-me até o domingo para dois discursos que eu faria aqui e que tentei fazer na segunda-feira, dia 4, mas não foi possível.

            O primeiro, Senador Mão Santa, que agora preside a sessão, eu começaria dizendo que não fugi, não desisti e não parei. Eu queria deixar claro que eu tinha tentado uma eleição mesmo diante de qualquer risco. Não desisti, não corri, não fugi. Isso no caso de perder a eleição. Quis o destino, quiseram os eleitores de Brasília, que eu fosse um dos dois Senadores escolhidos. No meu caso, para continuar; no caso do Deputado Rodrigo Rollemberg, para vir para esta Casa a partir do próximo ano. O meu discurso, portanto, tem que começar com as palavras “muito obrigado”. Tem que começar com essas duas palavras dirigidas a esses eleitores que me deram um voto de confiança.

            Na primeira eleição para Senador, há oito anos, eu não podia dizer que era um voto de confiança, mas sim um voto de esperança. Mas a reeleição é um voto de confiança, é um voto de reconhecimento, é um voto para dizer que quer que continue. Por isso, é mais forte ainda o sentimento de gratidão que tenho hoje do que há oito anos. Por isso, começo com um “muito obrigado”. Mas o “muito obrigado” não é apenas pelo fato de eu ter tido o número de votos para me colocar aqui por mais oito anos; é, sobretudo, pela maneira como o eleitor de Brasília me escolheu, apesar de eu ter feito, ao longo de toda a campanha, um discurso sem oferecer nada corporativamente e dirigido apenas a Brasília. Fiz um discurso, ao longo de todo o tempo, para o Brasil. Eu pedi ao povo brasiliense que me elegesse para ser o representante de Brasília aqui dentro, no cenário nacional. Eu falei o tempo todo que eu seria candidato para ser outra vez o Senador da educação de todos os brasileiros e não necessariamente dos brasilienses apenas.

            Foi uma campanha em que não fiquei preso ao que nós aqui chamamos de quadrilátero do nosso mapa. Falei em representar bem Brasília, falei em ser o Senador da educação, Senador da responsabilidade fiscal, como eu sempre defendi, Senador do desenvolvimento sustentável. E disse - e me alegra que dois médicos aí estejam - que neste novo mandato eu quero colocar a saúde como uma meta tão importante quanto a educação.

            Do ponto de vista da transformação, do avanço, é a educação de um povo que faz, mas, do ponto de vista da decência, da justiça, a saúde é igualmente importante.

            Duas coisas, Senador Mão Santa, não podem ser desiguais no acesso: educação e saúde. Eu não vejo problema, como até algumas décadas atrás muitos de nós achavam, de algumas pessoas terem uma conta bancária maior de que outros; alguns terem carros bonitos e grandes e outros terem carros pequenos, ou nem terem carro, terem um bom sistema de transporte público; eu não vejo problema na desigualdade da qualidade da roupa, desde que todos se vistam; nem mesmo no refinamento gastronômico da alimentação, desde que todos comam. A desigualdade pode ser tolerada na maior parte dos aspectos da vida, mas duas desigualdades são insultantes à ética e à inteligência: a desigualdade no acesso à educação e a desigualdade no acesso à saúde.

            Eu não disse desigualdade na saúde e na educação, porque a saúde não depende só do acesso ao serviço de saúde, depende de fatores imensos, até da vontade divina. Então, não é a desigualdade na saúde que é um problema; é a desigualdade no acesso à saúde. Mesma coisa para a educação. Ninguém pode garantir educação para todos, porque alguns têm mais talento para os aspectos educacionais, alguns têm mais persistência, e educação exige persistência. A desigualdade é no acesso. E que aí alguns tenham mais do que outros pelo esforço próprio. Como na própria saúde também depende da pessoa. A gente sabe que quem fuma tem menos chance de ter uma boa saúde do que quem não fuma. Aí é uma questão de opção.

           Pois bem, eu quero acrescentar: a partir de agora, a ideia da necessidade de uma sociedade decente ter saúde igual para todos no acesso, como ter educação igual para todos no acesso, como ter também a garantia de que a natureza será respeitada para que a próximas gerações também tenham a mesma igualdade.

            Eu quero, por isso - e fico triste que os dois Senadores que aqui estão, os dois médicos, não estarão aqui -, dizer que vou tentar termos uma bancada, Senador Augusto Botelho, da Igualdade de Oportunidades. Aqui havia a bancada socialista, não é mais o caso. Agora, uma bancada da igualdade de oportunidades, uma bancada que diga: “Eu vou dedicar minha vida no exercício da política para assegurar igualdade de oportunidade a cada pessoa comparada com a outra”. Igualdade de oportunidade na educação, igualdade de oportunidade na saúde, igualdade de oportunidade nos recursos da vida, que são aqueles do meio ambiente.

            E fiz um discurso nesse sentido, Senador Mão Santa. E, por incrível que pareça, às vezes, a população de Brasília me honrou, votando por um discurso que vai além da nossa área, que vai além da nossa população, que chega ao conjunto de todo o País e que luta menos pelo atendimento das reivindicações específicas da população que votou em mim e mais por uma revolução que atingiria ou atingirá - se Deus quiser! - todo o País e até as gerações futuras. Por isso este “muito obrigado” é tão importante.

            Muito obrigado pelo reconhecimento do meu passado, muito obrigado pela confiança no futuro e muito obrigado por terem aceito um discurso não corporativo, não específico, não voltado para dentro merecer o voto da maioria. Isso me deixa agradecido e orgulhoso do eleitor do Distrito Federal, que foi capaz deste gesto de dizer: “Vamos votar numa pessoa que não está oferecendo nada especificamente para nós, salvo o esforço de representar bem este povo”, como tenho feito ao longo destes oito anos.

            Era isso, Senador Mão Santa, que eu tinha a dizer, mas quero contar com o aparte que muito me honra do Senador Augusto Botelho.

            O Sr. Augusto Botelho (S/PARTIDO - RR) - Senador Cristovam, faço este aparte a V. Exª também para agradecer, em nome dos brasileiros, ao povo de Brasília por tê-lo reconduzido a este cargo. Trabalhei com V. Exª nas Comissões de Educação e de Saúde durante todo o período em que aqui estive. E eu também parabenizo V. Exª porque, quando cheguei aqui, quando conversava com as pessoas sobre quais eram suas prioridades, nos primeiros anos em que eu estava aqui, era trabalho e saúde. Alguns falavam segurança. Depois daquela época em que V. Exª começou a bater na tecla da educação - na eleição de 2006 bateu, bateu, bateu -, as pessoas começaram a falar sobre outra prioridade. Qual é a prioridade? Qual era a prioridade? O que vocês querem e precisam mais? Converso com as pessoas do meu Estado, sempre conversei. E falavam: saúde, educação, emprego, emprego e educação, não tinha uma ordem certa, mas esses três. E educação passou a ser citada pelas pessoas mais humildes, por agricultores familiares, por indígenas, por pessoas simples. Incluíram a educação na sua pauta de preocupação. O Brasil deve a V. Exª esse fato. V. Exª colocou na consciência das pessoas a importância da educação, de forma a reivindicarem de seus governantes, de seus representantes. V. Exª tem esse mérito. E eu sou testemunha disso, porque acompanhei a linha de ação de V. Exª. Parabéns por isso. Espero que V. Exª também se dedique à saúde, que é a nossa área, minha e do Mão Santa, com o mesmo empenho com que se dedicou à educação, para que continuemos a trabalhar e melhorar. Com relação à saúde é preciso que se aprove logo a regulamentação da Emenda nº 29, que está na Câmara dos Deputados, que destina um percentual do PIB à saúde. A saúde carece de recursos. Setenta bilhões é um orçamento minguado para a saúde área. É preciso aumentar esse orçamento, como também é preciso que haja processos de gestão para que se economize mais no trabalho da saúde. Eu sou apaixonado pelo SUS e sinto bem essa diferença. Quando comecei a trabalhar como médico em Roraima, em 1975/1976, era o Inamps, que tinha aquela carteirinha. V. Exª pegou o tempo da carteirinha.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Peguei.

            O Sr. Augusto Botelho (S/PARTIDO - RR) - E me doía muito quando chegava uma pessoa... Porque o Inamps sempre deu esse tratamento para os que estavam fora de seu domicílio... Aqui em Brasília ninguém fala muito nisso, mas nas cidades pequenas o tratamento fora de domicílio é um recurso que o SUS dá para a pessoa ir se tratar em um lugar onde haja recursos. O Inamps dava isso. Então, as pessoas tinham câncer e não havia como mandá-las para fora porque não tinham a carteirinha do Inamps. Por isso, lutei pelo SUS, participei da elaboração, das conferências de saúde e tudo. Fico satisfeito e feliz de V. Exª dizer que, além da bandeira da educação, vai pegar a bandeira da saúde também. Tenho certeza de que V. Exª desempenhará bem e com afinco o papel de não deixar que a saúde fique para trás, que, juntamente com a educação, consigamos melhorar a qualidade de vida e o acesso das pessoas à saúde. Muito obrigado pela oportunidade do aparte.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu que agradeço, Senador Augusto Botelho.

            V. Exª sabe que na imprensa se destaca uma frase do discurso. De tudo isto aqui de hoje, gostaria de destacar uma frase sua e de colocar em meu currículo. Quando o senhor diz que, como brasileiro, agradece ao povo do Distrito Federal por ter votado em mim. É uma coisa que eu destacaria de tudo o que foi falado nesse tempo aqui.

            Quero dizer que vou colocar, sim, a saúde. Mas cheguei a isso não pela saúde em si e pelo interesse específico da pessoa doente, mas por uma questão de dignidade nacional, por aquilo que tenho chamado de insulto, que é uma pessoa rica viver mais do que uma pessoa pobre porque tem mais dinheiro. Que seja porque Deus lhe deu mais oportunidades, que seja porque está na sua herança genética, como a gente sabe, tudo bem. Agora, porque tem mais dinheiro uma pessoa ter mais atendimento de saúde do que outra é insultuoso à moral, isso é indigno para a sociedade e uma burrice para o povo porque se perdem recursos.

            O mesmo vale para a educação. Que uma pessoa seja mais instruída do que outra não é problema. Agora, é um insulto que uma pessoa seja mais instruída que outra, porque tem mais dinheiro. Uma tem dinheiro ao nascer, consegue ter escola; uma não tem dinheiro, não consegue ter escola. Com esse insulto é que a gente tem de acabar.

            Eu cheguei, então, aí, a essa importância à saúde por um lado ideológico, por um lado de justiça, daí a ideia. Cheguei à ideia de saúde, educação e meio ambiente - embora em meio ambiente já houvesse muita gente falando - pelo lado da igualdade de oportunidades como objetivo central da sociedade.

            Hoje, o Mão Santa citou, aqui, Nabuco e Rui Barbosa. Eles fizeram a razão de ser do mandato deles a luta contra o insulto da escravidão. Mas foram mais de 300 anos até se descobrir que a escravidão era um insulto. Ninguém imaginava isso. A escravidão era tida como algo absolutamente natural, por mais de 300 anos. Ou seja, quantas gerações não passaram, e a gente aceitando a escravidão como algo natural. É a partir da metade do século XIX, um pouco antes, na Europa, que a escravidão passa a ser considerada uma coisa insultuosa, vergonhosa, inaceitável. Daqui a 100 anos, vão dizer de nós que tolerávamos, sem percebermos o insulto que é, uma pessoa ter escola boa ou de ter escola ruim por causa do dinheiro; de uma pessoa sobreviver e de outra não sobreviver por causa do dinheiro.

            É para lutar contra esses dois insultos que o povo do Distrito Federal me elegeu. Foi falando nisso que fiz a minha campanha, obviamente mostrando também que fui Governador, lembrando - e muita gente se lembrou; talvez a parte mais gratificante da campanha tenha sido a lembrança do meu Governo - que fiz com que a educação não fosse, pelo menos, tão desigual, nem a saúde, com programas como Saúde em Casa, Bolsa Escola, com a melhoria da educação. Isso serviu também, ajudou, mas sobretudo o discurso de que vamos ter, representando Brasília no Senado, uma pessoa que vai tentar lutar pela revolução que assegure igualdade de oportunidades a todos. Não é a ideia de igualdade para todos, mas de igualdade de oportunidades para todos. Alguns vão ser mais, outros menos, pelo seu comportamento, pelo seu talento, pelos seus cuidados pessoais.

            É isso, Senador Mão Santa, Senador Augusto Botelho, que tenho para deixar aqui, com os meus profundos agradecimentos, em vez do discurso que tinha imaginado fazer, se perdesse, dizendo que não fugi, não corri, não desisti. Disputei! E disputar não é derrota; derrota é fugir; derrota é correr; derrota é se omitir. O outro é perder. Perder não é sinônimo de derrota, senão não haveria as duas palavras no dicionário. Então, não precisei começar meu discurso dizendo que não fugi, não corri, não desisti. Eu o comecei, dizendo “muito obrigado” ao povo do Distrito Federal.

            Meu compromisso com o Distrito Federal e com o Brasil inteiro é o de continuar aqui a luta por um Brasil que assegure igualdade de oportunidades a todos, e a base disso são a saúde e a educação, nas mesmas condições, para todo brasileiro, independentemente de onde vive e de quanto tem de dinheiro no bolso.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/2010 - Página 46955