Discurso durante a 161ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Repudia a tentativa de afastar o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto, do julgamento da vigência da Lei da Ficha Limpa por suspeitas envolvendo seu genro e candidato interessado na rejeição da lei.

Autor
Demóstenes Torres (DEM - Democratas/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • Repudia a tentativa de afastar o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto, do julgamento da vigência da Lei da Ficha Limpa por suspeitas envolvendo seu genro e candidato interessado na rejeição da lei.
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/2010 - Página 46410
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • REPUDIO, TENTATIVA, AFASTAMENTO, CARLOS AYRES BRITTO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), MOTIVO, SUSPEIÇÃO, RECEBIMENTO, PARENTE, DINHEIRO, CANDIDATO, INTERESSADO, JULGAMENTO, VIGENCIA, LEGISLAÇÃO, INELEGIBILIDADE, REU, CORRUPÇÃO.
  • ELOGIO, ETICA, CONDUTA, MINISTRO, EXPECTATIVA, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, PARENTE.

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, apenas para fazer um registro em relação ao Ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal.

            Na semana passada, apareceram algumas notícias de que o genro do Ministro Carlos Ayres Britto teria tentado extorquir um candidato usando-se da sua influência com o Ministro, ou tentado angariar o patrocínio de uma causa dando a entender que a sua proximidade com o Ministro poderia facilitar a causa, ou mais: que o Ministro, ético que é, se afastaria da causa e o candidato nominado ficha suja poderia, então, conseguir um beneplácito no Supremo Tribunal Federal e ver a sua pretensão deferida.

            Eu não duvido de que isso tenha acontecido em relação ao genro do Ministro. Nenhum de nós pode responder pelos parentes, tanto que a lei é claríssima: a pena não passa da figura do transgressor, do criminoso, do agressor, daquele que cometeu o ato ilícito. Todos nós sabemos disto.

            Eu conheço o Ministro Ayres Britto desde a época em que eu era membro do Ministério Público, depois, chefe do Ministério Público do meu Estado e Presidente do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de Justiça do Brasil, e o Ministro Ayres Britto sempre teve uma conduta ética, honrada, decente; professor emérito, figura ilustríssima.

            Narro para V. Exªs um episódio que aconteceu logo quando foi indicado pelo Presidente da República para ocupar o cargo de Ministro da Justiça.

            Questionou-se muito pelo fato de ele ter sido filiado ao PT, Partido dos Trabalhadores. Questionavam se ele teria isenção política suficiente para ir para o Supremo Tribunal Federal. E lembro, com todas as letras, que disse a ele: “Olha, Britto” - naquela época, ele ainda não era Ministro -, “posso lhe dizer com tranquilidade que vários saíram daqui do Parlamento - da Câmara ou do Senado - para comporem o Supremo Tribunal Federal e foram grandes Ministros”. Lembrei o exemplo de vários e dizia-lhe ainda que um deles, inclusive hoje, está na Suprema Corte, que é o Ministro Nelson Jobim - hoje já não se encontra mais. E o Ministro Nelson Jobim jamais desonrou a Corte por ter pertencido a um partido político.

            Mas o fato é que esse genro do Ministro Ayres Britto foi filmado por um candidato a governador, então candidato, que tinha um processo no Supremo Tribunal Federal e esse processo não foi concluído porque a votação foi interrompida em decorrência de sua renúncia. O objetivo era afastar o Ministro Ayres Britto do julgamento. Com o afastamento do Ministro Ayres Britto, o Supremo Tribunal Federal tem cinco Ministros que dizem que a lei deve obedecer ao princípio da anualidade, que, embora seja uma alteração à Constituição, a lei da inelegibilidade deve obedecer ao princípio da anualidade, mudando uma tradição na jurisprudência remansosa do Supremo Tribunal Federal. E outros cinco ministros dizem que a lei deve entrar em vigor imediatamente, inclusive o Ministro Ayres Britto. Aliás, foi uma votação singular. O Presidente do Supremo tentou levantar a tese de que a alteração feita no Senado ensejava o retorno para a Câmara, que o processo legislativo não estava pronto, não estava completo. E foi fragorosamente derrotado por oito votos a dois. E é óbvio, a Lei Complementar nº 95 é claríssima: diz que os verbos têm de estar no mesmo tempo. E fizemos alteração de cinco tempos verbais para ficar em consonância com todos os outros verbos da lei. O Supremo derrubou essa tese.

            O Supremo também disse que a lei era constitucional, por seis votos a quatro. O Ministro Toffoli, embora votando a favor do princípio da anualidade, reconheceu que a lei era constitucional. Portanto, algum outro dispositivo poderia ou não ser aplicado, mas a lei como um todo era constitucional. E, finalmente, o empate de cinco a cinco no princípio da anualidade.

            Ora, procurado ou armado, não sei como foi, mas admito, acho, entendo que o genro do Ministro foi, no mínimo, imprudente. Mas qual era o objetivo do candidato? Afastar o Ministro Ayres Britto e derrubar a Lei do Ficha Limpa. Tanto é verdade que o próprio advogado já disse claramente que também vai contestar os despachos do Ministro Lewandowski, para dá-lo como suspeito, porque ele teria também sido parcial nos seus despachos. O Ministro Ricardo Lewandowski nada mais é do que também alguém que é a favor da entrada imediata da vigência da dita Lei da Ficha Limpa.

            Então, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é óbvio que há uma grande armação para tentar afastar algum julgador que é favorável à entrada em vigor, imediatamente, da Lei da Ficha Limpa, que, aliás, está valendo. São quantos os candidatos aí que tiveram as suas cabeças decepadas em decorrência dessa lei. É uma lei que deve ser decidida se entra em vigor ou não este ano, em decorrência já dos votos declarados, cinco a favor do princípio da anualidade, cinco contra e, com o novo Ministro, que, aliás, nós vamos escolher aqui. O Presidente vai indicar e nós vamos escolher.

            Mas o que eu quero dizer é o seguinte. Se tem alguém que eu coloco a mão no fogo por ele - e olha que eu coloco a mão no fogo por pouquíssimas pessoas - é o Ministro Ayres Britto. Não há nada que leve a crer que ele esteja envolvido com esse ato hediondo do seu genro. Nada! Repito. Ninguém pode responder por uma pessoa próxima de nós. Eu não posso responder pelo meu filho, embora responda. Eu adoro o meu filho. Ele é um menino exemplar, mas, se em algum momento, ele fizer algo errado na vida, eu tenho de pagar por ele? Eu tenho de pagar por um irmão? Alguém tem de pagar pelo pai? Feio é quando há um conluio: o pai e o filho praticando corrupção. Mais feio ainda é quanto é mãe e filho. Aí é horrível, não é? Junta mais uns dois e dá formação de quadrilha, aí desviando a pessoa para o mal caminho.

            O Ministro foi extremamente digno, como o é. Ele pediu abertura de investigação contra ele mesmo, na Procuradoria Geral da República. Não precisava tomar essa atitude. Nada vai ser apurado contra ele.

            Mas eu peço ao Ministro Ayres Britto e peço também ao Ministro Lewandowski: não se deixem atemorizar por esse tipo de atitude. É muito comum aquele que está enlameado tentar buscar os outros para essa lama. Quantas vezes nós já enfrentamos essa situação aqui, não é verdade? Alguém que está completamente sujo começa a espalhar boato de que também os outros estão sujos. Essa é uma situação comum. É a história do porco que tenta buscar para dentro do chiqueiro todos que estão fora.

            Então, o Ministro Ayres Britto não deve se encabular com isso. Pague pelo erro aquele que cometeu o erro. O Ministro Lewandowski não deve se intimidar com a tentativa de colocarem-no como suspeito porque deu um despacho mais duro quanto a determinado candidato. Ministro tem de dar despacho duro mesmo, ou leve, de acordo com a sua consciência. E nós aplaudimos o Ministro Lewandowski, homem claro, correto, decente. E aplaudimos também o Ministro Ayres Britto.

            Agora, vamos lembrar que o Ministro Ayres Britto, quando entrou aqui, tinha essa pecha de que tinha pertencido ao PT, de que era amigo do Presidente Lula, que iria cometer vários desatinos em favor da causa petista, e, hoje, não vou dizer que é um desafeto do Palácio do Planalto, mas, hoje, é considerado uma pessoa não grata lá, eu acredito, porque foram várias as decisões que desagradaram o Palácio do Planalto.

            Mostrou ele que Ministro do Supremo não é preposto de quem quer que seja, assim como o Senador também não deve ser preposto de quem quer que seja. Nós também fazemos parte de um poder, nós também temos a altivez necessária para concordar ou discordar de qualquer coisa que nos é trazida.

            Então, neste momento, eu não tenho nada haver com isso, mas eu quero deixar aqui a minha posição claríssima, reconhecendo a dignidade, a decência, a probidade, a competência do Ministro Ayres Britto e dizer que se o genro dele utilizou-se do seu nome, utilizou-se da sua figura, do seu poder para angariar vantagem, que pague o genro. A OAB vai investigar, o Ministério Público vai investigar, mas o Ministro Ayres Britto tem de continuar com a cabeça erguida, com a sua altivez, continuar com a sua história de dignidade, não se deixar abater.

            Contra ele não pesa nada, nenhuma suspeita. E, repito, não pela amizade de longos anos, não pela posição favorável a um projeto a que eu também sou favorável e tive oportunidade de relatar e que foi aprovado por unanimidade nesta Casa, mas pela história de vida que ele tem. O Ministro Ayres Britto é um homem honrado, é um homem decente, é um homem bom de coração, é um homem de virtude, é um homem competente que engrandece o Supremo Tribunal Federal e engrandece o Brasil, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/2010 - Página 46410