Discurso durante a 167ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Discriminação à participação feminina na vida político-partidária no Brasil. Defesa da reforma política.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. FEMINISMO.:
  • Discriminação à participação feminina na vida político-partidária no Brasil. Defesa da reforma política.
Publicação
Publicação no DSF de 20/10/2010 - Página 47946
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. FEMINISMO.
Indexação
  • CONGRATULAÇÕES, VITORIA, RENATO CASAGRANDE, SENADOR, ELEIÇÕES, GOVERNADOR, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), ELOGIO, COMPETENCIA.
  • ANALISE, RESULTADO, PRIMEIRO TURNO, ELEIÇÕES, FRUSTRAÇÃO, INFERIORIDADE, NUMERO, MULHER, CANDIDATO ELEITO, DEMONSTRAÇÃO, EXISTENCIA, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, SOCIEDADE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), NECESSIDADE, MOBILIZAÇÃO, LUTA, IGUALDADE, DIREITOS, HOMEM, GARANTIA, PARTICIPAÇÃO, POLITICA.
  • DEFESA, REFORMA POLITICA, PROPOSTA, CONVOCAÇÃO, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, EXCLUSIVIDADE, ASSUNTO, APOIO, IMPLANTAÇÃO, FINANCIAMENTO, SETOR PUBLICO, CAMPANHA ELEITORAL, IMPEDIMENTO, ABUSO, PODER ECONOMICO, IMPORTANCIA, CONSCIENTIZAÇÃO, RESPEITO, TRABALHO, DONA DE CASA, COBRANÇA, REGULAMENTAÇÃO, PROFISSÃO, EMPREGADO DOMESTICO, EXPECTATIVA, VITORIA, DILMA ROUSSEFF, CANDIDATO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUMENTO, CONFIANÇA, FEMINISMO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, mais uma vez, Senador Casagrande. Eu disse há pouco na minha pequena fala na Presidência, ao saudá-lo e parabenizá-lo, que há a certeza do sucesso do seu trabalho como Governador do Estado do Espírito Santo. Digo isso porque, nesses últimos quatro anos, trabalhamos bastante juntos em várias ações inclusive em âmbito internacional, o que nos assegura a certeza da sua competência e do seu compromisso político - não político-partidário - com a causa do seu Estado e da população do povo capixaba. Então, essa certeza é que faz com que a gente diga que o Espírito Santo decidiu nas urnas o que seu povo merece que é seu governo.

            Como o próprio Senador Casagrande há pouco disse, trabalhamos juntos em várias questões, inclusive no âmbito de grandes propostas sobre a questão de mudanças climáticas e também, Senadora Níura, sobre as mulheres.

            Hoje, venho a esta tribuna mais uma vez para falar das mulheres na política. A gente fala sempre das mulheres no trabalho, da discriminação contra as mulheres nos mais variados setores, inclusive na família. Muitas mulheres são discriminadas dentro da sua própria família, são humilhadas, menosprezadas; às vezes até sofrem agressões.

            No trabalho, a discriminação ainda é bastante significativa, mas é na política o espaço mais difícil, Senadora Níura. A senhora sabe disso com toda a certeza. Nós todas sabemos.

            Dos resultados desse primeiro turno de campanha no qual já temos definidas algumas governadorias, senadores, senadoras, deputados estaduais, deputadas estaduais, deputados federais e deputadas federais. É lamentável que Mato Grosso não tenha conseguido sequer uma única representante do sexo feminino entre as eleitas para a próxima legislatura. E o pior: entre as mulheres de outros Estados, o resultado também não foi para ser comemorado.

            Seria a discriminação a maior culpada pela redução da bancada feminina em Mato Grosso e em outros lugares do Brasil?

            Fica evidente que a discriminação contra as mulheres tem sido instrumento de uso político-eleitoral, principalmente nestas eleições, mas não somente ela. Acredito que outras causas também tenham influenciado resultados negativos. E isso não aconteceu somente em Mato Grosso.

            Apesar das regras que estimulam a participação das mulheres na política, a presença feminina no nosso Congresso Nacional permanecerá exatamente a mesma no próximo pleito: 56 parlamentares, 12 no Senado e 43 na Câmara. Interessante notar que o número permanece absolutamente inalterado, mesmo tendo quase dobrado o número de candidatas concorrendo à Câmara em relação à disputa de 2006, 40% a mais de candidatas. E o resultado foi exatamente o mesmo. Não mudou. O resultado no final nas urnas não acompanhou o crescimento; como acabo de dizer, pelo contrário, ficou absolutamente estagnado.

            As modificações promovidas pela minirreforma eleitoral, a Lei 12.034, de 2009, da qual fui uma das principais articuladoras, lutando pela questão de gênero no Senado, conseguiu alavancar um número de candidatas na corrida eleitoral. No entanto, nas eleições, os números são outros. De acordo com essa lei, 30% das vagas passaram a ser destinadas às mulheres, que começaram a contar com 5% da cota dos fundos partidários para suas campanhas; mais dinheiro para incentivá-las a entrar na política e lutar pelos seus direitos e os direitos de todos os cidadãos discriminados. Também ficaram reservados a elas pelo menos 10% do tempo na propaganda eleitoral.

            No entanto, o que podemos ver é que a discriminação ainda impera; que, muitas vezes, o eleitor parece não estar vendo capacidade na mulher de exercer a política a partir do pleito eleitoral

            Não sei, Senadora Níura, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, senhores telespectadores. Por quê? Por que nós conseguimos 12% aqui no Senado e não conseguimos avançar. É difícil entender. Nós mulheres hoje somos 52% da sociedade; somos, em número considerável, em percentual consideravelmente mais elevado do que os nossos filhos, os homens; hoje, mulheres com curso superior são em percentual maior no Brasil do que os companheiros homens. Não que isso seja uma necessidade, não que isso diga que somos melhores; mas é um indicador. Hoje o número de mulheres com curso superior no Brasil é maior do que o de homens. No entanto, no exercício de determinadas funções, nós mulheres não conseguimos galgar o espaço a que temos direito na sociedade.

            Além dessa dificuldade, ainda temos a questão do preenchimento de vagas por mulheres; apenas algumas chegam, em seus partidos, a oferecer um nome para serem candidatas, mas, na verdade, não disputam a eleição.

            De acordo com o levantamento da Organização das Nações Unidas, o Brasil poderá apresentar queda ainda maior no próximo levantamento que mede a presença da mulher no Parlamento em diferentes países. Esse dado é do jornal O Globo.

            Até a última eleição, em 2006, o Brasil encontrava-se, entre os países, na posição de número 104, mas desceu para a posição 106, em relação a ser um país em número de mulheres no parlamento nacional. Não podemos deixar isso acontecer e temos que nos mobilizar: mulher deve participar da política! Eu digo que nas próximos eleições, daqui a dois anos, eleições municipais, extremamente importantes. Já foi dito há pouco aqui, em discurso do Senador Papaléo Paes, sobre a importância do município, é no município que as pessoas vivem, é lá que as pessoas moram, é lá que as pessoas levam a sua vida no dia a dia. Nós precisamos de mulheres participando da política do município, precisamos de mulheres vereadoras, de mulheres prefeitas, de mulheres vice-prefeitas, de mulheres que realmente mostrem a sua competência, a sua vontade, a sua determinação de fazer política lá no município.

            Eu já conclamo desde agora. Alguns dirão: acabamos de sair de uma eleição. Essa eleição de que a Senadora Serys Slhessarenko está falando é a eleição que acontecerá daqui a dois anos. Mas nós precisamos nos mobilizar. Mulheres no poder, sim, também e em igualdade de condições com os homens! Os homens comprometidos, os homens que realmente fazem política para o engrandecimento do País, de cada Estado e de cada município.

            Voltando a Mato Grosso e tirando o meu Estado como exemplo, não teremos sequer uma única representante mulher para defender a questão de gênero ou para ter a visão feminina em projetos, medidas provisórias e discussões que envolvam todos os temas de interesse do País e do nosso Estado.

            E como isso seria importante.

            Srª Senadora, senhoras e senhores que nos veem e nos ouvem, tenho certeza de que muitas categorias, instituições e organizações sentirão e perceberão a diferença de se ter menos mulheres no Parlamento, mas penso que a questão deva ser analisada mais profundamente e, por isso, estou nesta tribuna dando voz aos meus pensamentos.

            Precisamos, para o próximo pleito, fazer uma profunda reforma política no Brasil. E vou além: acho que deveríamos avançar e fazer a convocação de uma assembleia constituinte específica para votar essa reforma política. Por que não fazermos já um plebiscito sobre esse tema, ouvindo diretamente o povo brasileiro? Aliás, o PT já tomou esta decisão no seu 3º Congresso por entender que “a reforma não pode ser um debate restrito ao Congresso Nacional”, que já demonstrou ter muita dificuldade de aprovar medidas que prejudiquem os próprios interesses estabelecidos no Congresso Nacional.

            A verdade é que este modelo adotado nas disputas eleitorais está falido. O que assisti em Mato Grosso, neste processo eleitoral, reforça enormemente minhas convicções sobre este assunto. Por exemplo, a necessidade de financiamento público de campanha e uma legislação muito dura sobre caixa dois. Imaginem que, em nosso Estado, teve candidato declarando intramuros ter gasto a astronômica quantia de R$13, R$14 milhões para ser eleito Deputado Federal. Corria à boca pequena que, somente para colocar um cartaz em certas residências de bairros de pessoas mais despossuídas de recursos econômicos, pagavam até R$800,00. Um absurdo!

            Pergunto: Como passar credibilidade ao eleitor, senhoras e senhores? Como afirmar peremptoriamente que a vontade do eleitor foi respeitada? É muito complicado.

            Qual seria o caminho para as mulheres mato-grossenses ou fora de Mato Grosso, para que consigam ter uma participação política em seus Estados ou em nosso Estado?

            Acredito que o aumento do número de mulheres, participando do dia a dia dos partidos, desenvolvendo uma vivência partidária, contribuirá de forma significativa para o incremento de mulheres politicamente fortalecidas, impedindo o lançamento de candidaturas frágeis ou para cumprir cotas em legendas como ainda acontece hoje.

            Quer um exemplo? É só pegar, Senadora Níura, o mapa de votação nos Estados. Eu não sei se a senhora já teve oportunidade, em todos os Estados do nosso País, de verificar o grande número de candidatas que tiveram zero voto. Ou seja, seus nomes foram usados apenas para cumprir as cotas. E isso não é bom. Não é bom para o Brasil. Não é bom para os nossos Estados. Não é bom para nós, mulheres.

            Repito, o Brasil precisa da aprovação de uma reforma política que viabilize candidaturas desprovidas de poder econômico, de modo que qualquer cidadão, seja homem ou mulher, desprovido de recursos financeiros, possa concorrer de forma igualitária a cargos eletivos.

            Cito como exemplo a questão do financiamento público de campanha e o voto em listas com alternância de gênero. Isso reduziria o “caciquismo” político dos partidos, que hoje têm seus quadros diretivos majoritariamente controlados pelo sexo masculino.

            Eu queria ainda dizer aqui aquilo que eu repito sempre e que não vou me cansar de repetir nunca, Senadora Níura, que preside a nossa sessão neste momento: nós, mulheres, somos 52% da sociedade e que os nossos filhos, nossos companheiros, os homens todos, absolutamente todos os nossos filhos, precisam ter o entendimento diferenciado da participação das mulheres em todos os setores. É o respeito no trabalho, é a luta conjunta para que a mulher tenha direitos absolutamente iguais no trabalho, é o respeito para que a mulher tenha condições de, ao exercer uma função no trabalho e tendo a mesma função que o homem, ter a mesma remuneração e os mesmos direitos assegurados.

            Eu já falei nessa tribuna e repito que, quando Obama, Presidente dos Estados Unidos, assumiu a presidência daquele país, declarou que nenhuma mulher teria salário menor do que o homem exercendo a mesma função.

            Senadora Níura, não sei se a senhora se recorda, foi um frisson na imprensa mundial, em todos os países, inclusive no nosso País.

            Ao ler a manchete, no outro dia, fiquei pensando que interessante: eu, Senadora Serys, Senadora de Mato Grosso, no Senado da República do meu Brasil, já tinha protocolado este projeto no Senado da República há mais de dois anos à época. Então, nós não estamos atrás de grandes proposições em nível nacional com relação à questão da mulher. Estamos juntos, com certeza, mas, infelizmente, às vezes, esta questão em determinados países é tratada de forma mais lenta ou talvez como algo não tão significativo nas propostas políticas de um país.

            Também com relação ao respeito à mulher na família, há outro problema. Nós, mulheres, um número bastante significativo, fomos à luta. De um determinado tempo para cá, principalmente - porque há um século nós não tínhamos esse direito de trabalhar fora, aliás, não tínhamos o direito nem de estudar e muito menos de votar, o nosso direito ao voto tem setenta anos - fomos à luta, trabalhar fora, nas mais diferentes profissões. Temos Ministras do Supremo, temos grandes juízas, temos grandes políticas, temos a iminência de ter uma mulher Presidente da República nos próximos dias, temos a possibilidade de ter mulheres em altos cargos de grandes empresas, mas ainda temos muitas mulheres que, de forma consagrada, exercem a função de dona de casa e, muitas vezes, Senadora Níura, não são respeitadas. Recebem muitas vezes palavras, frases de mau jeito: “Você não trabalha!” Aliás, na maioria das vezes, as mulheres que exercem a função de chefes de família, que não trabalham fora, que trabalham dentro de casa, talvez trabalhem tanto quanto aquelas que trabalham fora de casa - ou talvez mais ainda - e não recebem o respeito daqueles que as rodeiam.

            Por isso, eu não vou me cansar nunca de dizer que se respeitem todas as mulheres: aquelas que trabalham nas lides da casa, aquelas que, como donas de casa no dia a dia, pegam com certeza muito pesado, também coordenando ou mesmo fazendo as lides domésticas. E, por falar em domésticas, mais de 95% das pessoas que estão no trabalho doméstico são mulheres. E temos vários projetos, de nossa autoria, já aprovados no Senado e que tramitam na Câmara dos Deputados.

            Portanto, são as mulheres que exercem o trabalho doméstico, são essas mulheres, como profissionais, que merecem ter a profissão regulamentada e serem respeitadas, com salário, com carteira assinada e com todos os direitos assegurados, na Constituição Federal, a todos os trabalhadores e trabalhadoras do nosso País. E que se incluam também as nossas domésticas e os nossos domésticos, apesar de eles serem em número bastante pequeno.

            Então, eu queria também fazer esta fala se aprofundar um pouco: além de mulher na política, mulher trabalhadora de um modo geral e mulher respeitada na família.

            Senadora Níura, a história da discriminação contra a mulher só vai ser superada quando homens e mulheres tiverem esse entendimento, porque, enquanto nossas crianças, nossos pequeninos meninos estiverem crescendo dentro de uma família, ouvindo uma mulher da família ser discriminada, maltratada, humilhada, muitas vezes até sofrendo lesão corporal, esses garotinhos vão crescer achando que podem ter o mesmo procedimento com as mulheres em seu entorno, sejam elas a mãe, a namorada, a esposa, a irmã, a filha.

            Isso só vai mudar quando realmente a nossa mentalidade mudar e a gente disser: Não! Homens e mulheres têm direitos absolutamente iguais e têm de ser respeitados! Mas essa construção precisa da força e da determinação dos nossos companheiros homens. Que eles nos ajudem nessa construção, que precisa ser coletiva. Nós, sozinhas, não vamos dar conta de construir direitos absolutamente iguais entre homens e mulheres.

            Acredito que nós, nos próximos dias, teremos a possibilidade de eleger a primeira mulher Presidente da República, Dilma Rousseff, minha companheira, minha grande companheira, nossa grande companheira! E eu digo sempre que vou me sentir Presidente da República com uma mulher na Presidência e vou poder dizer às meninas do meu País: você pode ter a expectativa de ser realmente uma política que merece o respeito dos brasileiros e das brasileiras em qualquer cargo político-eleitoral, chegando você, mulher, a qualquer cargo político-eleitoral! Com uma mulher Presidente da República, todas as outras possibilidades para nós mulheres, na política, estarão asseguradas, porque nós mulheres estaremos com a autoestima elevada e com a convicção de que, se uma mulher chegou ao patamar máximo da Presidência da República, nós mulheres temos possibilidade de fazer política com competência.

            Digo sempre: não geramos um filho sozinhas, mas o gestamos. E quem gesta nove meses uma criança é capaz, sim, de fazer política pública com competência, para preservar a vida de seu filho.

            Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/10/2010 - Página 47946