Discurso durante a 168ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Discrepância de gastos entre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), fato este que justifica um amplo e urgente debate sobre a necessidade da reforma da Previdência, com a unificação das regras dos dois regimes.

Autor
José Bezerra (DEM - Democratas/RN)
Nome completo: José Bezerra de Araujo Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Discrepância de gastos entre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), fato este que justifica um amplo e urgente debate sobre a necessidade da reforma da Previdência, com a unificação das regras dos dois regimes.
Aparteantes
Augusto Botelho, João Faustino.
Publicação
Publicação no DSF de 21/10/2010 - Página 48078
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, COMENTARIO, EXPERIENCIA, EUROPA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REGISTRO, DEFICIT, AMBITO, REGIME GERAL DE PREVIDENCIA SOCIAL, GESTÃO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), PARTE, SERVIDOR, REGIME JURIDICO UNICO, NECESSIDADE, URGENCIA, REVISÃO, POLITICA PREVIDENCIARIA, ESPECIFICAÇÃO, UNIFICAÇÃO, MODELO, REFERENCIA, TEXTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AUTORIZAÇÃO, IGUALDADE, NORMAS, APOSENTADORIA, DEFESA, ORADOR, IMPORTANCIA, LIMITAÇÃO, VALOR, BENEFICIO PREVIDENCIARIO, CONCLAMAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, AMPLIAÇÃO, DEBATE, MATERIA.
  • SUGESTÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), CONVITE, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), DEBATE, PREVIDENCIA SOCIAL, GRAVIDADE, CRISE.
  • EXPECTATIVA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AÇÃO DIRETA, INCONSTITUCIONALIDADE, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, QUESTIONAMENTO, DESCUMPRIMENTO, CENTRALIZAÇÃO, GESTÃO, PODERES CONSTITUCIONAIS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JOSÉ BEZERRA (DEM - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderia deixar de abordar questão tão fundamental para a Nação na minha curta passagem por esta Casa: Previdência Social.

            Peço, portanto, a atenção dos senhores e de todos aqueles que nos acompanham pela TV Senado ou pela Rádio Senado. Afinal, qual a Previdência que queremos? O Brasil que produz e os trabalhadores que trabalham querem saber.

            Quais as razões que levam a tamanho silêncio sobre esse assunto? Não tenho notícias sobre a verdade do caixa previdenciário, seja o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), sob os cuidados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), seja o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS - a Previdência do servidor público), ainda sem comando efetivo, e que esconde um rombo aparentemente incalculável.

            Sobre o que acontece no chamado Primeiro Mundo, sabe-se que os doentes serão responsáveis pelo seu tratamento médico, os pais assumirão integralmente a educação dos seus filhos e os trabalhadores ficarão responsáveis pela sua aposentadoria.

            O modelo ainda não chegou ao Brasil, mas está a caminho. Da América para a outra América.

            Auditadas as contas, a Previdência dos Estados Unidos é superavitária - receita maior do que a despesa, aí por volta de US$72 bilhões) ou 0,6% do PIB.

            Fechando a conta, existiam 40 trabalhadores contribuindo para cada aposentado quando a América criou o seu sistema previdenciário. Hoje a relação é de 3 para 1. Em 2018, quebra.

            Descendo para a América do Sul, quando foram consolidadas as leis previdenciárias brasileiras, há 50 anos, existiam oito contribuintes para cada aposentado. Hoje a conta não fecha, é deficitária, o cobertor é curto: mais despesas, menor receita. No final de cada ano anunciam-se bilhões no prego, buraco coberto pelo Tesouro. Até quando?

            Para não ocupar tanto a paciência dos senhores, deixemos de lado a farra com o caixa previdenciário nacional, por todos nós conhecido há mais de meio século. Voltemos os olhos para o que está acontecendo lá fora. Somente assim compreenderemos melhor o que nos aguarda.

            As contas particulares da previdência na Europa e nos Estados Unidos foram abertas faz tempo. Quem está ingressando agora no mercado de trabalho fará a opção: a) aplicar um terço de suas contribuições previdenciárias; b) esperar uma solução mágica.

            Caso o trabalhador não use esse rico dinheirinho guardado ao longo de sua vida, a poupança passa para a família, em caso de morte. Sim, está escrito, pois, atualmente não é assim que funciona. Em caso de morte prematura perde-se todo o dinheiro. Trocando em miúdos: o Governo dos Estados Unidos não ficará livre do endividamento público. O Tesouro terá de cobrir o que deixará de ir à receita previdenciária.

            É prudente avisar que os fundos de pensão estão observando a cena. Afinal, muita grana fluirá para o mercado de ações (algo em torno de US$30 bilhões/ano, estima-se).

            Não há segredo. Só se pode enfrentar déficit previdenciário diminuindo benefícios e/ou aumentando as contribuições. O Brasil, ao longo do tempo, fez as duas coisas.

            Sr. Presidente, volto a pedir a atenção de todos para o seguinte: o déficit da previdência do servidor público já supera o rombo do INSS. No ano passado, por exemplo, o Tesouro desembolsou R$47 bilhões - pasmem -, para cobrir esse déficit, ante R$43 bilhões do regime geral (previdência do trabalhador da iniciativa privada).

            Assim, pelo segundo ano consecutivo, o déficit da previdência dos servidores públicos superou o saldo negativo, apurado pelo regime dos aposentados do INSS. E, atenção: apenas os servidores públicos federais. O regime próprio inclui ainda os Estados e as prefeituras que aderirem ao regime. Portanto, um rombo incalculável.

            Somente no serviço público federal há cerca de 900 mil aposentados e pensionistas. Já o regime geral atende a cerca de 27 milhões de aposentados e pensionistas. E dois terços recebem um salário mínimo. Já para os que recebem mais do que um salário mínimo, a média salarial não chega a R$800,00.

            Está mais do que evidente que essa discrepância de gastos entre um regime e outro justifica um amplo e urgente debate sobre a necessidade da reforma da Previdência.

            E qual seria essa reforma? Ora, Srªs e Srs. Senadores, a reforma que a própria Constituição Federal recomenda, qual seja, a unificação das regras dos dois regimes. Sem essa reforma nenhum governo conseguirá folga no orçamento para atender a eternas demandas, como educação - falada aqui pelo Senador João Faustino e que tanto fala aqui o Senador Cristovam Buarque -, a saúde - do Senador Botelho -, a segurança, a infraestrutura etc. Sem isso, a sociedade vai viver eternamente reclamando a respeito desses itens importantes que fazem o tripé da democracia e de todo o governo.

            Qualquer especialista no assunto sabe que o regime de previdência do servidor caminha para o colapso financeiro. E todos fingimos que nada está acontecendo. A maior aposentadoria pública dos Estados Unidos é de US$5 mil, mas o cidadão terá de provar que recolheu US$1 milhão ao longo de sua vida. O modelo é quase perfeito. Se já não funciona, imaginem o modelo brasileiro.

            Todos nós acompanhamos o que está acontecendo na Espanha do Primeiro-Ministro Zapatero: corte dos salários dos funcionários públicos, congelamento das pensões e outras vantagens, inclusive um tal “cheque-bebê”. E agora estamos assistindo ao caos que está se instalando na França. Ou seja, acabou a farra. E repito, não há segredo. Só se pode enfrentar déficit previdenciário diminuindo benefícios ou aumentando as contribuições. O Brasil, ao longo do tempo, fez as duas coisas.

            Esta Casa deve estar preparada para analisar a reforma que a Constituição Federal autorizou - e até aqui nada foi feito -, ou seja, igualar as regras de aposentadorias e pensões dos funcionários públicos com as que vigoram para os trabalhadores privados.

            Portanto, entre as mudanças que esta Casa deverá aprofundar ao longo do próximo ano está a limitação do valor da aposentadoria ao máximo de dez salários mínimos, aplicados a aposentados do INSS. Um ministro das Cortes Superiores, por exemplo, se aposenta com quase R$ 30 mil; um desembargador não fica muito atrás.

            Afinal, o que foi autorizado pela Constituição Federal na última reforma da Previdência? Entre novos e antigos, haverá uma faixa intermediária daqueles servidores que ingressaram no serviço público desde o dia 1º de janeiro de 2004. Estes poderão optar entre a regra atual ou a nova regra.

            O Sr. João Faustino (PSDB - RN) - Senador José Bezerra, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. JOSÉ BEZERRA (DEM - RN) - Pois não, Senador João Faustino.

            O Sr. João Faustino (PSDB - RN) - V. Exª traz a esta Casa nesta tarde um tema de Estado, um tema fundamental para que o Estado brasileiro possa bem servir, bem apoiar e bem valorizar o cidadão, a pessoa humana. V. Exª traz o tema que é da Previdência Social, uma instituição dita por muitos brasileiros como pré-falimentar, uma instituição precária, de legislação sempre duvidosa, com uma gestão sempre inoperante ou, em algumas circunstâncias, ineficiente. A verdade é que a Previdência no Brasil tem enveredado por caminhos mais diversos, que vai desde a cobrança da contribuição do inativo, que é um verdadeiro absurdo - um aposentado que já contribuiu a vida inteira para a Previdência Social e, no momento da sua aposentadoria, se vê novamente obrigado a contribuir -, vai desde aí até o incentivo que o Estado brasileiro promove para a economia informal. Hoje nós diríamos que grande parte da força de trabalho brasileira está na economia informal. Nós temos um microcrédito que vai destinar-se exclusivamente ao fortalecimento da economia informal, consequentemente sem nenhuma contribuição, sem nenhuma participação, sem nenhum fortalecimento da Previdência Social. Este é um tema que merece, como V. Exª está fazendo agora, o destaque necessário pela sua importância. Eu quero parabenizar V. Exª por trazer a esta Casa o tema Previdência Social, que deve estar na pauta, todos os dias, do Estado brasileiro. Muito obrigado.

            O SR. JOSÉ BEZERRA (DEM - RN) - Muito obrigado, Senador João Faustino. E, com certeza, na pauta do futuro Presidente da República.

            O Sr. Augusto Botelho (Sem Partido - RR) - Senador José Bezerra.

            O SR. JOSÉ BEZERRA (DEM - RN) - Pois não, Senador.

            O Sr. Augusto Botelho (Sem Partido - RR) - Gostaria de fazer um aparte a V. Exª. Só gostaria de complementar dizendo que hoje, em O Globo, há um artigo intitulado “Previdências desiguais: renda concentrada.” Mostra bem claro que o déficit da Previdência, do INSS, é de 42,8 bilhões para amparar 23,5 milhões de aposentados e pensionistas. No nosso regime, o regime geral, no regime público, o déficit é de 47 milhões para amparar 1 milhão de pessoas.

            O SR. JOSÉ BEZERRA (DEM - RN) - Novecentas mil pessoas, quase um milhão.

            O Sr. Augusto Botelho (Sem partido - RR) - Quase 1 milhão. É uma desigualdade muito grande. Fora que a pessoa se aposenta com um salário para o qual não contribuiu. V. Exª falou nos Estados Unidos. A pessoa se aposenta mas tem de ter contribuído com “x”. A aposentadoria, agora com a mudança na expectativa de vida das pessoas aqui no Brasil, vai levar a um problema sério na Previdência. Que se mude essa Previdência, que se tente fazer uma mudança, respeitando-se o direito adquirido, e que se comece, para quem começar agora, de outra forma, senão vamos engatar, vamos quebrar. Parabéns pelo discurso de V. Exª.

            O SR. JOSÉ BEZERRA (DEM - RN) - Muito obrigado, Senador.

            E que não venham novamente - porque minha passagem por esta Casa foi muito curta - prejudicar os pobres trabalhadores da iniciativa privada, que contribuem com 10 salários mínimos, mas de cerca de R$319,00. O salário mínimo, no Brasil, é de R$510,00; dez salários seriam R$5.100,00. O salário mínimo da Previdência tem outro nome, é o salário mínimo previdenciário.

            Pergunto: o que farão as duas Casas do Congresso, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais com a criação dos fundos de previdência complementar? É tão grave e tão complexo o assunto que a grande maioria prefere silenciar. E não vai conseguir. Todos nós teremos que enfrentar a reforma. Para o bem do Brasil.

            Um bom começo seria esta Casa, por intermédio de sua Comissão de Assuntos Sociais, convidar para esse amplo debate os economistas do Ipea, por exemplo. Eles têm na ponta do lápis os dispêndios que apresentam maior potencial de sustentar o crescimento econômico de longo prazo, com destaque para os dispêndios com a Previdência Social.

            Em 2003, a Emenda Constitucional nº 41 fez os ajustes nos regimes próprios de previdência, que regem a previdência do servidor público de carreira, mas nos Estados que implantaram o regime próprio de previdência, ninguém com juízo aceita dirigir as unidades de previdência dos servidores. Por quê? Porque o § 20 do art. 40 da Constituição Federal diz que não pode existir mais de um regime próprio de previdência social para os servidores públicos e mais de uma unidade gestora do respectivo regime em cada ente estatal. Traduzindo: uma única unidade gestora de previdência responde pela arrecadação e concessão de benefícios do servidor público, pertença ele ao Executivo, ao Judiciário, ao Legislativo, ao Ministério Público ou aos Tribunais de Contas.

            Na prática, isso não funciona. O gestor da unidade centralizadora transfere receitas, mensalmente, aos outros Poderes e órgãos sem direito a auditar essas folhas de aposentados. E o que acontece? No momento da concessão das pensões, descobre-se que há gente pagando aposentadorias milionárias, muito além do teto constitucional. Um caos, o verdadeiro caos.

            “Ah, mas isso é inconstitucional” - bradou a Associação dos Magistrados Brasileiros, que propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.297.

Consulto a página do Supremo Tribunal Federal na internet e vejo que os autos estão conclusos ao relator desde abril de 2005.

            Está, portanto, com o Supremo o futuro da previdência do servidor público. Dirá que a reforma de 2003 é inconstitucional? Ok. Então chegará o momento em que esta Casa será chamada a botar as coisas em ordem. Sendo assim, que cada Poder construa e administre a sua própria previdência.

            Sr. Presidente, se nenhum modelo de previdência precisa estar em crise para ser formulado, imagine a nossa situação, que é muito grave.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/10/2010 - Página 48078