Discurso durante a 170ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a "Lei da Ficha Limpa" e sua apreciação pelo STF, na próxima quarta-feira. Expectativas com os debates dos candidatos ao segundo turno presidencial no Brasil, com menção à experiência norte-americana.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL. ELEIÇÕES.:
  • Considerações sobre a "Lei da Ficha Limpa" e sua apreciação pelo STF, na próxima quarta-feira. Expectativas com os debates dos candidatos ao segundo turno presidencial no Brasil, com menção à experiência norte-americana.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 26/10/2010 - Página 48211
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL. ELEIÇÕES.
Indexação
  • ELOGIO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DEFINIÇÃO, DATA, VOTAÇÃO, VIGENCIA, LEGISLAÇÃO, INELEGIBILIDADE, REU, CORRUPÇÃO, CONFIANÇA, APLICAÇÃO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, INICIATIVA, AÇÃO POPULAR, MOBILIZAÇÃO, COMBATE, IMPUNIDADE, NECESSIDADE, BRASIL, CONTINUAÇÃO, APERFEIÇOAMENTO, MATERIA, DEBATE, REFORMA POLITICA.
  • CRITICA, CONTEUDO, DEBATE, CANDIDATO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OMISSÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS, ELOGIO, MODELO, ELEIÇÕES, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), DISCUSSÃO, MATERIA, RELEVANCIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr. Senador Cristovam, Srª Secretária-Geral da Mesa, somos nós. Coincidência, sexta-feira, Senador Cristovam, eu estava sozinho aqui, quando a Secretária pediu-me para abrir e fechar a sessão. E eu fui no caminho do Mão Santa e felicitei o Supremo Tribunal Federal pela notícia de que ele marcou para esta quarta-feira a decisão sobre o Ficha Limpa.

            Cheguei aqui já eram duas e meia, quando o nosso querido amigo me avisa: “Ligeiro, que ainda tem tempo”. Eu, quando cheguei às duas e meia, não vi a bandeira, eu não tinha mais chance nenhuma.

            E estou aqui para dizer que agora falo com mais tranquilidade o que, na sexta-feira, eu apenas anunciei. Foi uma grande decisão do Supremo Tribunal Federal. Uma grande decisão. O Relator, uma pessoa por quem eu tenho o maior respeito, homem encarregado dos quarenta processos do mensalão, fez questão de entregar o relatório e dizer ao Presidente que estava à disposição. E o Presidente, com muita felicidade, marcou para quarta-feira, depois de amanhã. Quarta-feira, depois de amanhã, nós teremos a posição do Supremo Tribunal Federal relativa a essa matéria.

            Eu fico muito feliz com relação a esse momento e quero levar ao Supremo Tribunal Federal meu respeito, a minha admiração e dizer que o Supremo fez por merecer o respeito de toda a Nação. É a decisão que o País esperava e a decisão que a sociedade brasileira esperava.

            Este ano foi intenso. Muito intenso. Projeto de iniciativa popular. No início, um milhão e duzentas mil assinaturas, mais a internet, mais de três milhões de assinaturas. Um milagre. Não mais do que um milagre, na minha opinião.

            O projeto foi aprovado na Câmara por imensa maioria e foi aprovado nesta Casa por unanimidade.

            Convém salientar que esta Casa ao aprovar o projeto por unanimidade não quis dizer que o projeto não tenha equívocos e que precisa muitas modificações para melhor. Tem! O projeto pode fazer algumas injustiças. Nós ficamos no máximo, que é uma atuação da sinalização da seleção da classe política, mas há alguns equívocos que, às vezes, podem fazer até graves injustiças.

            Mas se nós decidirmos aprovar por unanimidade e não aprovamos as emendas, e todos os Senadores tinham emendas - eu também tinha algumas -, foi porque achávamos que se nós aprovássemos as emendas o projeto voltaria para a Câmara dos Deputados e praticamente seria impossível o projeto ser votado este ano. Então, houve um entendimento e praticamente todos os senadores falaram dizendo isso: “Vamos votar a favor, reconhecendo que imediatamente após teremos que fazer algumas alterações que são profundamente necessárias. Mas o importante é ele entrar em vigor. O importante é este final de legislatura marcar o início do fim da impunidade neste País.

            O que parecia que nunca começaria, o que parecia que se ia ficar para as calendas gregas - “deixa pra lá, deixa, não sei o quê, pois é, não sei o quê” - de repente aconteceu. E foi saudado pela imensa esmagadora maioria da sociedade brasileira. Que coisa interessante! De repente, ficou entregue na mão do Supremo.

            O Tribunal Superior Eleitoral, que é um órgão que nem sei se existe em outro País. Nos Estados Unidos, na Inglaterra, na França e na Alemanha quem cuida da questão eleitoral é a justiça comum. Aqui não. Nós temos uma justiça especial para cuidar das questões eleitorais. Pois o Superior Tribunal Eleitoral, que é órgão máximo da Justiça Eleitoral, não é o órgão supremo, porque há o Supremo Tribunal, que dá a palavra final, mas sobre questões eleitorais a essência do conhecimento está ali, decidiu por imensa maioria essa questão.

            Chegada no Supremo, aconteceu aquele empate. Uma dúvida, uma interrogação. No início, esperavam alguns Ministros, esperavam alguns políticos que o Presidente da República indicasse o Ministro que falta - são dez, falta um. Eu disse desta tribuna que achava muito delicado esperar um novo Ministro, até porque, na minha opinião, esse novo Ministro, se fosse indicado - e queriam esperar a vinda do novo Ministro para decidir -, quem o Presidente da República iria indicar? Em cima de uma decisão como essa, em cima de uma votação como essa, vir para cá, para a Comissão de Justiça, para o plenário, e a gente escolher, chegar lá e dar o voto de desempate...? Eu duvido. Olha, eu duvido que esse Ministro daria um voto de desempate. Acho que votaria em branco. É uma matéria delicada. Diria que não participou, que não acompanhou, que já deve ter dado juízo por aí quando era advogado, quando era procurador, quando era não sei o quê. Seria muito difícil. Por isso, essa posição do Supremo de reconsiderar e marcar para quarta-feira, depois de amanhã.

            Confesso que imaginava que ou sairia na semana passada ou não sairia mais. Achava esta semana muito delicada. Vocês já se deram conta de que segunda-feira, a esta hora, o ambiente será de festa para alguns e de choro para outros, mas nós já saberemos quem será o Presidente. Vejam o avanço da Justiça Eleitoral brasileira! Lembram-se de quando levávamos dez, quinze, trinta dias, para se apurar um resultado? Hoje, sabe-se na hora. Não existe país no mundo que tenha uma metodologia tão competente como a nossa para fazer eleição. Para fazer eleição, ninguém melhor do que nós, na formulação, no escrutínio, na busca do eleitor; agora, na campanha, no resto, falta muito. Aí falta muito!

            Interessante que eu estive nesta tribuna felicitando pelo segundo turno, que eu sempre desejei, dizendo que o segundo turno no Brasil seria semelhante ao dos Estados Unidos, à eleição normal. Nos Estados Unidos, a eleição é exatamente assim: um candidato ali e o outro candidato ali. E a eleição é decidida naqueles quatro debates, em que um fala e o outro responde, um fala e o outro responde. Agora, nós também tivemos. Tivemos o debate... Mas que confusão sem graça! Que coisa mais triste! O que aconteceu?

            Interessante que a Record, que vai fazer o debate de hoje, disse que não vai ter pergunta de jornalista, porque foram as perguntas dos jornalistas que deram toda a atrapalhada ao longo do debate. Não sei até que ponto, mas a verdade é que estão ruins os programas, tanto de um quanto do outro. Não era aquilo que a gente imaginava. A questão do aborto - perdoem-me pelo que vou dizer -, num país laico como o Brasil, não podia ser o debate como o que estão fazendo. Uma questão de corrupção aqui, corrupção lá, que deve ter, não me parece que... Não é por aí. Depois, é um empate. Um partido e o outro partido. “O salário mínimo vai ser de seiscentos”. Aí o outro partido: “Não, seiscentos é muito, tem que ser...”. Passamos tanto tempo aqui brigando por quanto dar aos aposentados, quanto não dar aos aposentados... “Vou dar 10% para os aposentados!”. E a confusão generalizada. “Eu vou fazer oitocentas mil casas!”. “Pois eu vou fazer um milhão!”. “Eu vou fazer tantos trilhos de metrô!”. “Pois eu vou fazer tantos e mais tantos!”.

            Então, fica uma coisa que não tem conteúdo, não tem substância. Foi uma pena. E eu que apostava tanto nisso! Lembro-me de um debate nos Estados Unidos. O Vice-Presidente do Clinton, que disputou com o Bush, quando entrou na campanha, já era Presidente nomeado, tinha ganhado o Prêmio Nobel. Ele era... O Clinton, que fez um grande governo, teve aquele desgaste dos namoros, aquela coisa toda que o abateu muito. O vice não, o vice era uma pessoa... Estava tão bem, que essa equipe da assessoria dizia para ele o seguinte: “O senhor já ganhou. O senhor não pode perder. Então, cuidado com as perguntas e não perde voto.”

            “Então o senhor vai retirar as tropas do Iraque ou não vai?”. “Pois é, eu não sei, não sei o quê, pois é, pois é não sei o quê, pois não sei o quê!”. “E a penitenciária, aquela de Cuba, o que é que o senhor vai fazer?”. Pois é, eu não sei, não sei o quê!”. Foi de tal maneira... E o Bush, do jeito dele: “Eu vou atacar o Iraque. Eu não mexo na penitenciária”. O pessoal preferiu o brutalhão do Bush dizendo as coisas ao outro, que não dizia nada com nada. O debate se decidiu na eleição. E todo mundo reconheceu que foi um erro do democrata, porque estava vitorioso e não teve coragem de falar. Mas falaram. O debate é assim lá. Aqui, não. Aqui não se fica sabendo nada.

            E outra coisa. O Obama deu um exemplo para o mundo inteiro: o uso da internet. Milhares, milhões de pessoas deram dois dólares, cinco dólares, dez dólares... Os Estados Unidos têm o auxilio oficial, o governo dá o dinheiro, e aí não pode pegar, ou então não pega o dinheiro do governo e pode pegar. Ele não pegou o dinheiro do governo e não foi buscar grandes empresários; foi buscar essa faixa. Dizem que a vitória dele foi aí. Nessa área de internet, etc., ele movimentou a mocidade. Os jovens foram para a rua. Os jovens que, na anterior eleição, a esmagadora maioria - lá o voto não é obrigatório -, não foram votar, votaram nessa em uma imensidão e deram a vitória.

            Então, esperava-se o que seria a internet agora no Brasil. “Como vai ser?”. E dizia-se “a Marina tentou usar isso e mais aquilo”. Cá entre nós, foi uma desgraça. O que recebi de internet falando mal da mãe, do avô, do bisavô desse, daquele, daquele outro, cá entre nós, foi insuportável. Não porque... “Senador, me conta: é verdade que a Marina estava lá, e o pai do cara que ela matou...?”. Eu digo: “Nunca ouvi falar”. Eu sempre soube que a Marina... A Marina não, a Dilma. Eu sempre soube que a Dilma realmente participou da luta. Agora, desse aspecto de Havana eu nunca ouvi falar”.

            “É verdade que o Serra não sei o quê...?” Conheço o Serra, conheço a integridade, a seriedade dele... Maluquices!

            De repente vamos discutir se a esposa do Serra fez ou não fez um aborto lá no Chile, na época da ditadura, não sei o quê, não sei o quê, não sei o quê. Mas isso é assunto, meu Deus? Isso é assunto?

            Eu vi na Internet, recebi, achei um absurdo, mas, de repente, estava na televisão. De repente, estava na televisão. Aonde vamos chegar? O que isso influencia num processo eleitoral? Cá entre nós, é uma coisa engraçada.

            Nas eleições passadas, eu falava daqui... E posso até dizer - Senador Cristovam, já lhe dou um aparte - que o Duda Mendonça fez falta, porque o Duda Mendonça - eu discordava dele - fez uma lavagem cerebral no Lula, mudou o Lula. O Lula era um antes do Duda e outro depois do Duda. O Lula, antes do Duda, era aquela roupa de trabalhador, aquela barba enorme... Era o Lula. O Lula hoje, na campanha, é um aristocrata. Uma roupa de primeira... Ele agora até lançou moda no mundo, porque não tinha visto nenhum presidente, nem no Brasil e nem em lugar algum, com roupa especial da Presidência confeccionada para ele. E ele tem a sacola, as coisas... O Duda melhorou.

            Lembro-me da primeira eleição que o Lula ganhou. O Duda era mais importante que o Lula. As manchetes eram maiores para o Duda do que para o Lula, porque o Duda dizia o que o Lula ia fazer, depois o Lula fazia. Quando o Lula fazia, no jornal diziam: “O Duda tinha razão, o Lula fez”. Vai ser “Lula paz e amor”; o Lula ia lá e virava “paz e amor”, e a imprensa publicava. O Lula tem que mudar a roupa; e o Lula mudava. O Lula tem que mudar aquela barba, aquela barba não pode ser daquele jeito, tem que mudar; dali a dez dias, o Lula apareceu com a barbinha bacana.

            Critiquei muito aquilo. Aliás, muita gente criticou, pois se transforma o candidato num produto, num sabonete, quer dizer, o candidato não diz o que ele pensa, não diz suas ideias, diz o que alguém prepara para ele. Eu critiquei aquilo. Mas, cá entre nós, agora ficou pior. Mexer com a esposa do candidato de uma maneira ridícula que nem aconteceu? Mexer na outra candidata com relação a coisa que não tem nada a ver? Muito ruim a campanha! Muito, muito ruim essa campanha! Vamos ver o debate de hoje.

            Achei interessante que a imprensa está publicando que na Record não haverá perguntas de jornalistas. Tomara que a Record, pelo menos, deixe um falar e o outro responder. Tudo bem que não haja pergunta de jornalista, mas pergunta encomendada pela direção da empresa não é grande coisa. Que um fale e o outro responda. Pelo menos o cidadão assume a responsabilidade por aquilo que está falando e pelo que o outro está respondendo.

            Pois não, Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Simon, a sua fala provoca tantos temas diferentes, embora todos relacionados, que não sei se vou esgotar o meu aparte agora. Então, não sei se me resguardo para falar no final ou se faço outro, se o Presidente me permitir.

            O PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Não diga isso, porque a sociedade vai ficar com mágoa de mim. O Brasil espera o pronunciamento de V. Exª.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Também, muito obrigado. Até porque será por um outro assunto, embora tenha que ver. Lamento, mas os presidenciáveis não estão discutindo a crise mundial, da economia, da ecologia, como se o Brasil fosse uma coisa isolada, como se não houvesse ainda globalização. Vou falar depois sobre essas crises por que o mundo está atravessando. Sobre a sua fala, em primeiro lugar, de fato, é triste o debate. Veja, por exemplo, o debate que o senhor puxou, sobre aborto: não depende de Presidente. Se um dia isso for descriminalizado, vai depender do Congresso, de plebiscito, como sugeriu a Senadora Marina; não depende da crença do Presidente. Agora, quer ver uma coisa que dependeria e não se debateu? Um outro tipo de aborto também: o aborto de crianças depois de elas nascerem e terem suas vidas interrompidas por falta de incubadora na maternidade.

            O PEDRO SIMON (PMDB - RS) - O seu artigo no jornal O Globo domingo foi sensacional.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Muito obrigado. Isto dependeria do Presidente: haver ou não haver incubadora em todas as maternidades deste País; haver ou não haver remédio para uma criança pequena. Ela morre por falta de remédio, Senador Acir. Isso é uma forma de aborto pós-parto. Isso depende do Presidente. Não se debateu. O debate ficou muito pobre. E aí o senhor disse que a gente esperava da Internet mais presença. A Internet virou apenas um instrumento dos boatos e das fofocas.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Infelizmente.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Já pensou? Tanto a ex-Ministra Dilma, como o ex-Governador Serra, eles têm o tal de Twitter cada um. Eles podiam estar debatendo entre eles. Se eu debato com o que chamam seguidores, por que eles não poderiam estar debatendo entre eles, e a gente assistindo aqui? Todos os dias, eles falando um com o outro, naqueles 140 toques que caracterizam o Twitter, aquelas mensagens curtas; isso podia ser feito. Facebook, Orkut... Tudo isso poderia permitir um debate permanente e não só na televisão, e não só no horário eleitoral, em que a gente não vê o debate dos grandes temas. Os grandes temas que vão nortear o Brasil para o futuro...

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - No que tange à paixão de V. Exª, a educação, a única coisa que aparece é o número de escolas que cada um vai fazer. E está aumentando. Repare V. Exª que, do início para agora, está aumentando. Um diz: “Vou fazer mil”. O outro: “Vou fazer mil e cem”. “Vou fazer mil e quinhentas”. “Vou fazer mil e oitocentas”. É só o que aparece.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - É só o que aparece. Ou, então, o caso do Plínio de Arruda Sampaio, que ia gastar 10%, mas não dizia em que ia gastar. O que resolve a educação não é gastar mais dinheiro, mas gastar bem mais dinheiro. Mas, se chover no quintal de uma escola, na primeira chuva vira lama se a gente não souber como conduzir esse dinheiro. Então, a gente perdeu a grande chance de nesta eleição discutir o futuro do Brasil. Cada um promete mais infraestrutura para crescer; ninguém discute se o certo é crescer ou não. De repente o certo é buscar a felicidade. E a felicidade pode ser maior no bom transporte público do que no engarrafamento de carros privados. Mas a gente só quer ver quem promete maior taxa de crescimento; não maior taxa de bem estar. Então, faltou debate. Agora, da sua fala, o que eu acho muito interessante - a gente já conversou isso na semana passada - é que este País conseguiu o maior avanço, em todo o mundo, em como contar os votos, mas não em como definir os candidatos. Nós estamos na véspera da eleição final e não sabemos quais são os candidatos a deputado que vão ter os seus votos contados. Contar foi rápido. Agora, saber se reconhece ou não a gente não sabe ainda. Só amanhã que o Supremo vai decidir. E a gente não sabe se vai dar empate de novo.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Depois de amanhã.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Depois de amanhã, quarta-feira. E não sabe se vai dar empate de novo. Ou seja, a gente está chegando à diplomação sem saber quem foram os eleitos ou não. Contar foi fácil; reconhecer não está sendo. É um atraso do sistema político, do sistema legislativo, do sistema eleitoral. Nós nos concentramos no avanço técnico. Demos um pequeno salto no avanço ético, com a Ficha Limpa, mas não concluímos o trabalho da Ficha Limpa, que foi, sem dúvida alguma, o grande avanço que já demos. E nisso aí temos que reconhecer o seu papel, Senador Pedro Simon, que desta Casa foi talvez o que mais lutou por isso no meio de todas as desconfianças de muita gente. Pois bem. Nós precisamos dar um salto agora para modernizar o sistema legislativo, o sistema eleitoral, no debate, inclusive usando as técnicas novas. Nós temos todas as técnicas novas; não usamos para o debate. Temos todas as técnicas novas para contar os votos; não usamos na modernização do sistema legislativo, do sistema eleitoral. Tudo isso mostra que estamos priorizando a modernidade técnica e não a modernidade ética, não a modernidade dos valores. Aliás, como eu disse no artigo que o senhor citou, uma das causas da vinda dos valores éticos, sobretudo o aborto, é o fato de que nós temos tido, sim, uma degradação nos valores morais da sociedade brasileira: a corrupção generalizada, a desagregação das famílias, a droga generalizada no seu consumo, o consumismo, a supervalorização da riqueza acima da decência. Porque a gente fala muito da corrupção dos que roubam o dinheiro para si, mas existe uma perversão em que a riqueza vale mais do que os valores éticos.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - E, quando se fala em riqueza, aparece um cara rico, ninguém está preocupado em saber qual foi a origem.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Ninguém está procurando saber a origem. É verdade. O que vale é o tamanho do carro, a casa na praia, são todos os símbolos externos de riqueza, não os internos de riqueza. E fico à vontade em falar porque sei que o senhor tem voto de pobreza, como Franciscano que é. Então, essa degradação dos valores morais faz com que as pessoas comecem a buscar religiosidade. É a maneira de proteger a sociedade. Quando a política não dá uma regulamentação satisfatória para que as coisas funcionem bem e as coisas começam a se desagregar, as pessoas buscam outras coisas, inclusive a religiosidade. E aí, com o vazio do debate, cai-se no debate do aborto ou do cristianismo, como se a gente não tivesse judeu, muçulmano, ateu neste País. O debate foi de quem era mais cristão. E eu fiquei me perguntando: neste País, como se sente um judeu, que vai ter um Presidente dele também? O Presidente não é só dos cristãos. Agora, além disso, há um fato que provocou o esvaziamento do debate, Senador Pedro Simon. Nesses últimos oito anos especialmente, misturamos tanto os Partidos, misturamos tanto as ideias que não há mais marcos ideológicos sendo debatidos entre eles. Não existem mais. Alguns acham que é moderno não haver Esquerda ou Direita. Eu acho que moderno é redefinir Esquerda e redefinir Direita. Tinha gente que era de Direita há um tempo e, hoje, não é mais; tinha gente que era de Esquerda e não é mais. Mas que há dois polos na discussão, há. São muitos polos, mas, de vez em quando, a gente se junta, de um lado ou do outro. E o Governo Lula contribuiu para esse marasmo ideológico, porque os sindicatos se agregaram, os estudantes se agregaram, os banqueiros se agregaram, os partidos todos se agregaram, e, no fim, ficou o que por aí chamam, de uma maneira pouco correta, de geleia geral. E não há debates ideológicos. Veja mesmo o debate sobre estatização ou privatização. É um debate antigo. A gente tem de saber é como fazer uma empresa servir ao interesse público, e não se ela é do Estado, se é do Governo. Uma empresa privada pode servir aos interesses públicos se produzir o que a população precisa, se pagar imposto, se o lucro for bem aplicado e se gerar emprego. É uma empresa que tem um caráter público, mesmo sendo privada. E há empresa estatal que não tem caráter público, porque serve aos seus funcionários. Uma universidade, uma instituição de ensino superior particular pode ter caráter público, basta formar bons professores para o ensino médio. Já tem um caráter público. Aí é preciso o Governo entrar para fazê-la gratuita, comprando as vagas. Aí, não, o Governo atual preferiu investir em novas estatais. Vamos precisar de dez anos para que elas funcionem. Por que não comprar vagas nas que estão aí, desde que de qualidade? E já começaria a funcionar publicamente de acordo com o interesse público, imediato. Mas o debate ficou entre estatal e privada; e não entre interesse público ou interesse não público. Então, perdemos a grande chance de debater o futuro, e com dois candidatos que poderiam trazer esse debate.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - De alto gabarito.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Eu acho que tanto o José Serra como a Dilma Rousseff são pessoas que poderiam trazer o debate bom.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Vamos fazer justiça - eu o estou aparteando, não estou lhe tirando o aparte -, de certa forma, eu não diria que a culpa disso foi dos candidatos. Os candidatos foram empurrados para isso. Quer dizer, foram metidos nessa questão em que eles não tinham por que entrar, nem queriam entrar. Mas foram para o lado de cá, foram para o lado de lá, quando viram, estavam no meio da jogada. Não creio que isso aí é o que eles, o que a Dilma e o Serra queriam. Eu acredito que eles foram levados a fazer isso.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - É bem possível. Agora, raramente, a gente tem dois candidatos com esse nível. Raramente, a gente tem dois candidatos com esse nível.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Na minha opinião, nós tivemos três, quatro...

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Jogamos fora a chance.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Nós tivemos quatro candidatos espetaculares: os dois, mais a Marina e mais o Plínio.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Jogamos fora essa chance de eles dois elevarem o debate...

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É verdade.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - ... e envolverem todo o País no debate. Era capaz até de a gente ver gente do PSDB votando na Dilma; gente do PT votando no Serra se debatêssemos ideias, e não os nomes dos dois, os partidos dos dois, e quem está de um lado ou de outro. De qualquer maneira, a democracia é muito melhor, mesmo quando o debate é pobre, do que não haver democracia. Por isso, a gente tem é que comemorar que vamos ter eleição dia 31 e até apelar para que as pessoas votem, porque muita gente que, com raiva da falta de debate, vai preferir não votar. Há muita gente que, por falta do debate mais profundo, vai preferir viajar, por exemplo, aproveitando os feriados. Eu acho que isso seria lamentável, porque seja rico ou pobre o debate, vamos torcer para que o próximo Presidente, a próxima Presidenta tenha uma votação expressiva, não no voto que cada um vai ter, mas no voto que os dois terão, somando todos os eleitores do Brasil. Será uma pena se o índice de abstenção, de nulo, de branco for alto. Será uma pena. Seja qual for o debate, vamos comemorar por termos a chance de escolher o próximo Presidente ou a próxima Presidenta.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Senador, eu lhe digo o seguinte: torci muito para a vitória de Exª e acho que a sua manutenção no Senado na próxima Legislatura foi o melhor que poderia ter acontecido para este Senado. Não consigo imaginar este Senado se no ano que vem V. Exª não estivesse aqui. Deus o livre! E acho até, pelo que estamos vendo, que V. Exª, que nós teremos parceiros bons no ano que vem, mas V. Exª realmente é excepcional. É uma figura extraordinária.

            Eu me lembro de quando V. Exª era candidato a Presidente da República na outra vez. Eu fico pensando se V. Exª tivesse ido para o segundo turno, porque o tempinho de V. Exª era tão curto e tão difícil, que nem o Jefferson Péres podia dizer alguma coisa naquele tempo. Mas V. Exª defendeu com profunda convicção uma grande bandeira como candidato.

            A Marina dizia, conversando com amigos, que faria, se fosse Presidente da República, não um Ministério de notáveis, não é isso, mas ela não procuraria a governabilidade, como o Fernando Henrique e o Lula procuraram. Eles se agarraram a um balaio que nem sabiam, pois o balaio era fechado, só depois é que eles iam abrir para ver o que havia dentro, porque precisavam daquele partido para a governabilidade.

            Ela disse que escolheria o que a sociedade reconheceria como o mais competente, o mais capaz naquela área, fosse qual fosse o partido a que pertencesse. Foi quando eu mexi com ela e disse: “Bom, mas aí o Cristovam estaria em vários lugares, desde a educação até o social”. E ela riu: “É, o Cristovam está em todas as minhas listas”.

            Mas queira Deus que, nessas 48 horas que nos faltam, que o Supremo tome uma grande decisão. O que nós estamos falando aqui hoje, quarta-feira passa a ser página virada se o Supremo tomar uma posição. Repare V. Exª no que eu estou dizendo. Este nosso debate aqui passa a ser página virada porque será um outro Brasil. Será um outro Brasil. A sociedade, o povo vai começar a acreditar! “O fulano de tal fez tantos votos, tem tanto dinheiro, tem uma fortuna, e há não sei quanto tempo, há 40 anos, não acontecia nada, mas agora aconteceu!”. Está mudando.

            A eleição, daqui a quatro anos, não vai ser a mesma. Não vai ser a mesma! O Supremo tem hoje a decisão.

            Eu gostaria de me dirigir ao Supremo. Srs. Ministros, a lei que os senhores vão decidir, nós sabemos que tem equívocos, nós sabemos que falta. Mas, Srs. Ministros, foi o que conseguimos fazer. Srs. Ministros, foram anos e anos, e anos e anos e anos, tentando encontrar uma linha de ética e de dignidade para a política brasileira. Não foi fácil, Srs. Ministros. Os senhores acompanham tudo e sabem que não é fácil. Mas, Srs. Ministros, nunca chegamos tão perto. Nunca, nunca, nunca, nunca chegamos tão perto! Os senhores é que vão decidir. Em primeiro lugar, meus cumprimentos pela coragem e pelo gesto. O gesto, já admiro, mas a coragem de fazer isso 48 horas antes da eleição é uma grande atitude, é um gesto que realmente eu não imaginava. Tanto que quando falei aqui, na quinta-feira, eu disse: morreu, na semana que vem não vai acontecer. Pois eu me enganei feio: o Supremo teve coragem.

            Deus os oriente na decisão! Se nós, aqui - e somos Senadores que não temos obrigação de ter nem cultura, nem inteligência, nem capacidade, porque temos de ter voto, e alguns conseguem até na luta, alguns conseguem com mais dinheiro - queremos, na hora de votar e na hora de discursar, ficar de bem com a sociedade e com a nossa consciência, isso é muito mais importante para o Ministro do Supremo, que tem uma história, que tem uma biografia, um homem notável que está ali no máximo posto, no Brasil, do Poder Judiciário, e está ali para o resto da vida, até a aposentadoria. É claro que eles têm uma história! É claro que eles têm uma biografia! É claro que eles têm um compromisso! Mas eu me atrevo a dizer: as questiúnculas jurídicas, por mais importantes que elas sejam - eu retiro “as questiúnculas” e digo: as questões jurídicas, por mais importantes que elas sejam, tem de se visto o representativo desse projeto no conjunto da sociedade brasileira, o que ele representa. E isso eu acho que... Eu já repito, pela milésima vez, só atuei como advogado de defesa, nunca fui assistente de acusação, nunca quis ser juiz, porque não tenho capacidade nem grandeza de ter essa... Eu sou um covarde na hora de mandar alguém para a cadeia ou decidir se ele vai para a cadeia ou se ele não vai. Admiro quem faz isso.

            Mas eu acho que eles deviam olhar, olhar, como muito bem diz o hoje 1º Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal quando era Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, na decisão do Tribunal Superior Eleitoral, que essa é uma questão - me perdoem, me perdoem até a falta de humildade, mas eu não acho que precise receber lições com relação a defender os direitos humanos, os direitos do cidadão. Eu estive desse lado nas horas mais difíceis. Como estudante, eu estava lá; como político, eu estava lá; na hora da ditadura, eu estava lá; na hora da luta, eu estava lá, sempre defendendo a sociedade, os direitos humanos, o direito à vida, o direito à defesa. Sempre! Não é a mim que vão dizer: “Mas, olha, ninguém pode ser condenado antes que se esgotem todos os direitos que ele tem de defesa!”. Aqui, no Brasil, esses direitos às vezes levam 30, 40 anos. Assim como nós temos gente importante, lá de São Paulo, que teve 30, 40 processos - condenado, condenado, condenado, condenado! - que prescrevem, porque o tempo passou e não aconteceu nada.

            Esse projeto é o início da mudança!

            E é uma coisa interessante: o fim desse primeiro capítulo que começa o início das mudanças, em termos de fim da impunidade, o último capítulo vai ser dedicado ao Supremo Tribunal Federal. Se for aprovado, a gente vai lembrar. Daqui a duas eleições, quando nós tivermos o voto distrital, quando nós tivermos a reforma partidária, quando nós tivermos eleições absolutamente limpas, quando nós tivermos verbas apenas públicas de campanha, quando mudar e a gente olhar para trás, pode ser que a gente se lembre de que tudo começou com um projeto de iniciativa popular. Mas na verdade a gente vai dizer: aconteceu porque o Supremo Tribunal tomou a decisão. Se a quarta-feira for o dia que vai iniciar, o Brasil vai dizer: foi o Supremo! Mas também se, na quarta-feira, for o dia em que essas pretensões vão morrer e vão começar tudo de novo, haverá de se dizer: foi por causa do Supremo.

            Que Deus os oriente, que Deus os inspire! Mas meus cumprimentos, minha admiração muito grande pela coragem da decisão de quarta-feira, de realizar a votação.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/10/2010 - Página 48211