Discurso durante a 174ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Congratulações à candidata Dilma Rousseff pela sua vitória nas eleições presidenciais. Crítica pela falta de debate de assuntos relevantes na campanha eleitoral.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. SEGURANÇA PUBLICA. SAUDE.:
  • Congratulações à candidata Dilma Rousseff pela sua vitória nas eleições presidenciais. Crítica pela falta de debate de assuntos relevantes na campanha eleitoral.
Publicação
Publicação no DSF de 04/11/2010 - Página 48792
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. SEGURANÇA PUBLICA. SAUDE.
Indexação
  • BALANÇO, ELEIÇÕES, AVALIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, MARINA SILVA, SENADOR, DEBATE, MEIO AMBIENTE, COMENTARIO, PERDA, QUALIDADE, CAMPANHA ELEITORAL, DISCRIMINAÇÃO, RELIGIÃO, SAUDAÇÃO, ESCOLHA, POPULAÇÃO, CONTINUAÇÃO, MODELO, ECONOMIA, POLITICA SOCIAL, GOVERNO FEDERAL, VITORIA, DILMA ROUSSEFF, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONFIANÇA, ORADOR, MANDATO, IMPORTANCIA, PIONEIRO, MULHER, CHEFE DE ESTADO, BRASIL.
  • OMISSÃO, CANDIDATO, DISCUSSÃO, DIFICULDADE, PUNIÇÃO, CRIME, BRASIL, QUESTIONAMENTO, PRERROGATIVA, MAIORIDADE, IMPUTABILIDADE PENAL, PROGRESSÃO, LIMITAÇÃO, PENA, IMPORTANCIA, DEBATE, SOCIEDADE, MODERNIZAÇÃO, PARADIGMA, ORDEM JURIDICA.
  • REGISTRO, AUSENCIA, DEBATE, APERFEIÇOAMENTO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), DISCORDANCIA, SUPERIORIDADE, ONUS, ESTADOS, MUNICIPIOS, COBRANÇA, DEFINIÇÃO, QUANTITATIVO, CONTRIBUIÇÃO, UNIÃO FEDERAL, QUESTIONAMENTO, ORADOR, MODELO.
  • AVALIAÇÃO, POLEMICA, ASSUNTO, PREVIDENCIA SOCIAL, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, NECESSIDADE, ATENÇÃO, CANDIDATO ELEITO.
  • CRITICA, CANDIDATO, LEGISLATIVO, CAMPANHA ELEITORAL, PROMESSA, CAPTAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, DESVALORIZAÇÃO, FUNÇÃO LEGISLATIVA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

            Eu gostaria de ressaltar a V. Exª, Sr. Presidente, que é uma honra muito grande despertar a atenção de um Senador da estirpe de Inácio Arruda. Portanto, só posso agradecer a V. Exª o prestigiamento deste momento importante para mim.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, depois de uma campanha rica de dossiês, de intrigas e de promessas, terminou o segundo turno e começou a ser escrita uma nova página na história deste País pelas mãos da Presidente eleita, Dilma Rousseff, auxiliada por seu vice, Michel Temer, que representou nessa chapa o meu partido, o PMDB. É verdade que as maledicências roubaram a cena tanto dos noticiários como da propaganda eleitoral realizada no rádio e na televisão, mas é preciso reconhecer as virtudes que resultaram desse importante embate.

            Por sua própria natureza, a campanha presidencial fez com que o Brasil fosse passado a limpo. Nesse sentido, é de se realçar o extraordinário tempero que foi adicionado a esses debates por nossa colega, a ilustre Senadora e ex-Ministra Marina Silva. Autêntica militante das causas ambientais, ela foi uma espécie de luz amarela que conseguiu mostrar os riscos de um modelo econômico predatório. E o mais importante de tudo, Sr. Presidente: a sua pregação encontrou eco na sociedade. Os quase 20 milhões de votos amealhados por uma candidata de tão modesta estrutura financeira e partidária sinalizaram que a sustentabilidade é uma exigência muito maior do que se supunha antes.

            Da mesma forma foi a contribuição do ex-Governador José Serra. Como candidato de oposição, abriu as vísceras do Governo, mas - e isso foi um dado muito importante - conteve aquela exorcização do Estado na economia. Sua conduta deve até ter contrariado parceiros que fizeram das ideias neoliberais, especialmente da dogmática privatização, uma panaceia de todos os males. Serra até parecia um estranho no ninho tucano, mas, na verdade, acabou sintonizando-se com a maioria que prefere um modelo capaz de conciliar o fortalecimento da iniciativa privada com a função indutora do Estado na economia e no processo de desenvolvimento.

            Por sua vez, a candidata eleita, Dilma Rousseff, fez uma brilhante, uma extraordinária estreia eleitoral. Alicerçada num grande arco de 10 partidos políticos encabeçados todos pelo PT, sua candidatura foi turbinada por siglas como o PMDB, o PDT, o PSB e o PCdoB, do meu amigo Inácio Arruda. O generoso horário de rádio e televisão que conquistou deu-lhe o tempo necessário para capitalizar as realizações do atual governo e, sobretudo, para estabelecer uma comparação entre as correntes econômicas adotadas pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo Presidente Lula. Dilma soube fazer de forma exemplar esse cotejo. Com isso, conquistou a confiança para seguir a opção pelo social, realizar um desenvolvimento sustentável e garantir a personalidade do Brasil nas relações internacionais.

            No entanto, a candidata petista não navegou apenas nas virtudes do Presidente Lula. Ela foi compelida a atravessar também duras turbulências, turbulências que, certamente, a amadureceram. Um de seus grandes desafios será distinguir as simples maledicências eleitorais das críticas fundadas, daquelas que realmente reclamam atitudes, daquelas que preconizam mudanças.

            De certa forma, a sociedade já está conseguindo separar o joio do trigo. A prova disso foi o pífio resultado da exploração da religiosidade na campanha eleitoral, com enfoque na questão do aborto. Questão esta que foi, hoje, enfrentada por outro colega, pelo Senador Magno Malta, que, sendo evangélico, sendo um prócer evangélico, deixou claro para todos nós aquilo que a sociedade conseguiu entender também: que a religião e a política não caminham necessariamente juntas.

            O pífio resultado dessa exploração da religiosidade nesta questão do aborto simplesmente acabou anulando um pouco do brilho da campanha, porque questões fundamentais deixaram de ser discutidas, de serem enfrentadas, em razão dessa discussão. Nenhum tema se afigurava mais distante das prioridades do povo do que esse. A despeito disso, quanto tempo não se perdeu na discussão de tema que sequer pode ser decidido lá pelo Planalto? Quanto tempo não se perdeu na discussão de um assunto que só pode ser enfrentado aqui no Legislativo, através de mudanças profundas no ordenamento jurídico do País? Todos nós sabemos da proteção constitucional e da proteção legal que esses temas enfrentam e que só podem ser deslindados com medidas tomadas pelo Congresso Nacional.

            Curiosamente, o que os políticos não deram conta de entender, a população conseguiu tranquilamente. Tanto compreendeu que, apesar da extraordinária religiosidade do nosso povo, o veredicto que ele deu, a decisão que ele tomou obedeceu a outros impulsos. Obedeceu ao julgamento de resultados da economia e da política social adotada pelo Presidente Lula.

            Em que pesem as virtudes dos debates havidos, o que me intrigou, entretanto, Sr. Presidente, foram questões que deixaram de ser discutidas, que deixaram de ser enfrentadas ou que foram enfrentadas com timidez. Na questão da criminalidade, por exemplo, focalizou-se a fronteira como porta de entrada das drogas e das armas. Diagnóstico correto que exige atenta e implacável vigilância, atenta e implacável repressão. Aqui desta tribuna temos feito pronunciamentos constantes sobre isso. E é preciso reconhecer que o atual Governo tem avançado significativamente nessa direção, valendo-se de tecnologias, valendo-se de investimentos em pessoal, de qualificação, como podemos atestar, por exemplo, o desempenho da Polícia Federal no combate a esses males. Até uma aeronave não tripulada está sendo testada hoje para fazer esse controle. E, com certeza, é mais uma tecnologia que vai estar em operação permanente para o combate desse flagelo.

            Entretanto, Sr. Presidente, não basta prender o traficante. É preciso fazê-lo cumprir a pena. E aí começam os problemas. O primeiro deles: os direitos dos delinquentes têm sido muito mais protegidos do que os direitos da sociedade. Isso vem acontecendo em razão de prerrogativas que dispõem sobre a maioridade penal, o limite da pena, a progressão da pena. Enfim, matérias legislativas que enfrentam paradigmas e que precisam ser discutidas em toda a sociedade, porque esses benefícios decorrem de um ordenamento jurídico irreal, construído sob padrões culturais de um passado remoto. É um ordenamento que exige profundas mudanças, não só em normas mas sobretudo em paradigmas, porque sem mudar os paradigmas não vamos conseguir mudar as normas também. São mudanças que teremos de enfrentar na Constituição e teremos de enfrentar na legislação.

            Outra questão que foi tratada apenas na superfície foi a da saúde pública. Nesse quesito, os dois finalistas prometeram ampliar a rede física, espalhando policlínicas e hospitais regionais, ou disseminando maternidades, além de garantia de aumento de recursos para a saúde. Entretanto, nenhum deles entrou na discussão do Sistema Único de Saúde, introduzido pela Constituinte de 88. Embora recheado de virtudes, a universalidade trazida com a adoção do SUS tem revelado inúmeros defeitos que exigem análises, estudos profundos e sobretudo mudanças. Antes, uma unidade de saúde era o abrigo do trabalhador que precisava de socorro ou de qualquer pessoa que não tinha como pagar o tratamento que necessitava. Hoje, além de atender esses necessitados, ela tornou-se fornecedora de remédios caros para quem tem poder aquisitivo de adquiri-los com os próprios recursos.

            O certo é que a União decidiu por um modelo universalista, que a todos iguala, mas extremamente oneroso. E transferiu o grosso dessa conta para Estados e Municípios pagarem. Hoje é assim: Estados são obrigados a aplicar 12% e Municípios, 15% de suas receitas, dos seus próprios impostos, na área de saúde. E a União, que instituiu essa responsabilidade, não está subordinada a quaisquer quantitativos.

            Por uma questão de justiça, é necessário consignar que não foi o atual Governo que se esquivou, não foi o atual Governo que se furtou a esse encargo. Mas essa omissão inquestionavelmente será debitada na conta da Presidente Dilma Rousseff. Portanto, esse debate ela vai ter que travar doravante, embora não o tenha enfrentado de forma ampla na campanha eleitoral, até porque, sendo elevados demais para Estados e Municípios os encargos a que me referi, muitos deles vêm maquiando os gastos, introduzindo despesas estranhas à saúde, a fim de simular o cumprimento dessas obrigações. E para comprometer mais ainda, são fixados preços irrisórios para exames, procedimentos médicos e internações, comprometendo a qualidade do tratamento e estimulando a fraude. Hoje, é incalculável o volume de fraudes cometidas no Sistema Único de Saúde.

            O desafio, portanto, da nova Chefe de Governo é um desafio de opção. É preciso definir claramente se mantém um sistema universalista de tamanho custo, de tamanha precariedade, ou se adota um modelo mais realista e eficiente. Manter o status quo, manter a situação do jeito que está é que não pode, porque essa é a pior solução.

            Se essa discussão foi tímida na campanha, com certeza exigirá ousadia do Governo da Presidente Dilma Rousseff. Seus desafios, entretanto, não param por aí. Na Previdência Social, aposentados reclamam perdas crônicas, que têm encontrado aqui ressonância durante toda a Legislatura. Produtores rurais e ambientalistas enfrentam contenciosos para demarcar a sustentabilidade.

            No entanto, não foi apenas a superficialidade das discussões desses e de outros assuntos pelos candidatos à Presidência que me chamou a atenção nesta campanha. Futuros legisladores também se esquivaram de incursões mais ásperas nessa campanha. O que menos ouvi nas pregações de candidatos a deputado e senador foram questionamentos sobre legislação ou compromisso de criar ou mudar normas jurídicas. Nem no campo penal, nem na esfera comercial e tampouco nos critérios distributivos dos recursos públicos ouvi propostas nesse sentido. Candidatos que já exerciam mandatos disputavam o título de quem tinha mandado mais dinheiro para Municípios e Estados, confundindo a função legislativa com as atribuições do Poder Executivo. Obras construídas com recursos de emendas orçamentárias de uns parlamentares eram apresentadas como realizações de outros. Enquanto candidatos disputavam a paternidade dos recursos federais, os eleitores deixavam de saber o que eles tinham feito ou pretendiam fazer enquanto legisladores para melhorar a segurança, a saúde, a educação, o meio ambiente, etc. A verdade é que esse tipo de embuste acaba produzindo resultados, apesar de se constituir verdadeiro estelionato eleitoral. Muito provavelmente porque a força do nosso regime presidencialista acaba fragilizando o vigor do Poder Legislativo.

            De qualquer forma, todo debate eleitoral traz oportunas reflexões e reacende esperanças. E o discurso da Presidente Dilma Rousseff logo após a proclamação dos resultados deu todos os motivos para levantar as expectativas do primeiro governo a ser comandado por uma mulher em nosso País. Foi determinada na meta de erradicar a miséria, generosa ao estender a mão aos vencidos, ética ao descompromissar-se com virtuais desvios e sincera ao anunciar que vai bater à porta daquele que lhe deu vida política para socorrer-se das dificuldades. Mais do que o reconhecimento da população ao Presidente Lula, esse extraordinário vulto da história política contemporânea, a vitória de Dilma é o rompimento de grandes preconceitos que ainda aprisionam as potencialidades da mulher no Brasil e mundo afora.

            Por tudo isso, quero felicitá-la pela vitória, bem como ao seu parceiro Michel Temer, e desejar que sua profissão de fé se transforme em um itinerário seguro, capaz de transformar em realidade as esperanças de milhões e milhões de brasileiros.

            Era o que tínhamos a dizer. Muito obrigado pela tolerância de V. Exª, Sr. Presidente.


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