Pronunciamento de Roberto Cavalcanti em 10/11/2010
Discurso durante a 180ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Comemoração do transcurso dos 20 anos de vigência do Código de Defesa do Consumidor.
- Autor
- Roberto Cavalcanti (PRB - REPUBLICANOS/PB)
- Nome completo: Roberto Cavalcanti Ribeiro
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.
CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.:
- Comemoração do transcurso dos 20 anos de vigência do Código de Defesa do Consumidor.
- Publicação
- Publicação no DSF de 11/11/2010 - Página 49832
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM. CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, ANIVERSARIO, VIGENCIA, CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, CUMPRIMENTO, PRESENÇA, AUTORIDADE, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, CIDADANIA, REGULAMENTAÇÃO, RELAÇÃO, CONSUMO, PROTEÇÃO, CONSUMIDOR, CONSCIENTIZAÇÃO, DIREITOS, DEVERES, REGISTRO, HISTORIA, ATENÇÃO, MATERIA, ESPECIFICAÇÃO, BRASIL, REFERENCIA, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, COMENTARIO, EVOLUÇÃO, ATUAÇÃO, SISTEMA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR (SNDC).
- CRITICA, EMPRESA, DESRESPEITO, CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, ESPECIFICAÇÃO, SETOR, CARTÃO DE CREDITO, LEITURA, TRECHO, DIVERSIDADE, ARTIGO DE IMPRENSA, NOTICIARIO, REFERENCIA, SUPERIORIDADE, RECLAMAÇÃO, AREA, CONFIRMAÇÃO, DIRETOR, DEPARTAMENTO, PROTEÇÃO, DEFESA, CONSUMIDOR, DADOS, PERCENTAGEM, IRREGULARIDADE, TAXAS, IMPORTANCIA, URGENCIA, REGULAMENTAÇÃO, COBRANÇA, TARIFAS, PREVENÇÃO, ABUSO.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Cumprimento o Sr. Presidente, Senador Mão Santa; cumprimento o Senador, ex-Presidente da República, Fernando Collor de Mello, Presidente da Comissão de Infraestrutura do Senado Federal, responsável por essa lei ter sido sancionada e, principalmente, Sr. Presidente, pelos vetos - a coragem, muitas vezes, de fazer com que um projeto seja sancionado não sendo precedido de uma análise mais consubstanciada. Porém V. Exª, à época, dava a demonstração da competência, da lucidez, do bom assessoramento, fazendo com que, inclusive, alguns vetos constassem do ato ao sancionar este projeto, no qual o Brasil fez com que houvesse uma lei, que, 20 anos após, estivesse cada vez mais pujante, demonstrando que se acostou aos interesses do nosso País; Exmº Sr. Vicente Leal de Araújo, Ministro do Superior Tribunal de Justiça; Exmº Sr. Advogado Carlos Aquino, meu amigo aqui presente, representando os advogados do Estado da Paraíba; funcionários do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça, minhas senhoras e meus senhores, não é fácil falar sobre um tema recorrente após o Senador Mão Santa ter se pronunciado, em nome próprio e em nome do Senador José Sarney, depois de suceder o autor da propositura, a quem também saúdo, o Senador Renato Casagrande, após a Senadora Marisa Serrano e o ex-Presidente da República Fernando Collor. Então, não é fácil abordar o mesmo tema. Escapei, ainda, de ter tido o Senador Eduardo Suplicy, que, na ordem de inscrição, deu um vacilo e, por isso, tive o privilégio de falar antes dele.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por iniciativa do ilustre Senador Renato Casagrande e de outros nobres colegas, a quem desejo saudar pela feliz iniciativa, vamos comemorar hoje, nesta sessão, os 20 anos de vigência do Código de Defesa do Consumidor.
A criação do Código de Defesa do Consumidor foi uma importante conquista da sociedade brasileira, não apenas em função de sua existência ter contribuído para o estabelecimento das relações comerciais mais justas, mas, também, por ele se constituir num importante instrumento de fomento à cidadania. Refiro-me ao fato de que, a partir da sua criação, os brasileiros, sobretudo aqueles das camadas menos favorecidas da população, desenvolveram melhor compreensão dos direitos e deveres dos cidadãos a partir das relações comerciais, desde então melhor ordenadas por uma legislação que passou a dar-lhes proteção justa e adequada.
Como se sabe, a proteção ao consumidor é uma preocupação antiga dos povos. O Código de Hamurabi, um dos mais antigos conjuntos de leis escritas conhecido, datado de 1.700 a.C., já incluía regras para proteger os que compravam barcos, por exemplo. Os seus construtores eram obrigados a construí-los novamente em caso de defeito estrutural dentro do prazo de um ano. Esboçava-se, já então, preocupação com os prejuízos causados aos consumidores por maus fornecedores de bens ou serviços e com a necessidade de protegê-los contra isso. Assim, estabelecia-se como o consumidor deveria ser compensado e em que prazo.
No mundo ocidental, após a Segunda Guerra Mundial, quando surge a sociedade de massa com contratos e produtos padronizados, a necessidade de se estruturar melhor as relações comerciais e de se proteger o consumidor torna-se cada vez mais premente.
Nos Estados Unidos, a partir de provocações do ativismo de Ralph Nader, John Kennedy tomou as primeiras iniciativas nesse sentido. Em mensagem ao Congresso enviada àquela Casa em 1962, Kennedy identificou os pontos mais importantes dessa questão. Para ele, os bens e serviços colocados no mercado deveriam ser sadios e seguros para o uso. Deveriam também ser promovidos e apresentados de uma maneira que permitisse ao consumidor fazer uma escolha satisfatória. A voz do consumidor deveria ser ouvida no processo de tomada de decisão governamental sobre o tipo, a qualidade e o preço de bens e serviços colocados no mercado. Ainda segundo Kennedy, o consumidor deveria ter o direito de ser informado sobre as condições de compra e sobre os serviços e, principalmente, ter direito a preços justos.
A partir da iniciativa norte-americana, a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas também reconheceu esses princípios em Genebra, em 1973, chamando-os de Direitos Fundamentais do Consumidor.
Por essa mesma época, a Comunidade Europeia esboçava uma Política de Proteção e Informação dos Consumidores, dividindo seus direitos fundamentais em cinco categorias: proteção da saúde e da segurança; proteção dos interesses econômicos; reparação dos prejuízos; informação e educação; e representação ou direito de ser ouvido.
No Brasil, a defesa do consumidor começou a ganhar forma mais definida a partir da Constituição de 1988. Já no relatório da Subcomissão dos Direitos Políticos, dos Direitos Coletivos e Garantias da Assembleia Nacional Constituinte recomendava-se que os direitos do consumidor e o instrumento para a sua proteção deveriam constar de forma explícita no texto constitucional, como acabou ocorrendo.
Em seu artigo 5º, inciso XXXII, a Constituição incumbiu o Estado de promover a defesa do consumidor, determinando no artigo 48 do Ato das Disposições Transitórias que o Congresso elaborasse, num prazo de 120 dias da data da promulgação da Constituição, um código de defesa do consumidor. Como a realidade nem sempre obedece às idealizações, demorou um pouco mais para que se elaborasse esse código. Somente em 11 de setembro de 1990 foi promulgada a Lei nº 8.078, estabelecendo as normas de proteção e defesa ao consumidor, na forma que determinava a Constituição Cidadã. Estava ali produzido um dos seus frutos mais cidadãos, como já disse antes.
De lá para cá, as relações entre vendedores de produtos e serviços e consumidores nunca mais foi a mesma no Brasil. Comerciantes tiveram que se adaptar aos novos tempos, melhorando suas práticas, e o consumidor brasileiro passou a ter a referência e o amparo da lei para buscar seus direitos contra os recalcitrantes.
Demorou um pouco para que os governos, nas esferas estadual e federal, se estruturassem adequadamente para a proteção do consumidor. Hoje, no entanto, o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, integrado por órgãos estaduais e municipais e pelas entidades privadas de defesa do consumidor, cobre todas as Unidades da Federação. A coordenação do Sistema cabe ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, órgão da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, como estabelece o próprio Código.
Além disso, as facilidades de informação pela Internet em relação ao tema da defesa do consumidor, na página do Ministério da Justiça e dos Procons, nos Estados e no Distrito Federal, representam um extraordinário avanço no que diz respeito à proteção e à defesa do consumidor brasileiro.
Entretanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em algumas áreas cruciais da economia, o consumidor, apesar dos avanços introduzidos pelo Código, continua inteiramente desamparado.O paradoxal é que esse quadro de desamparo se verifica exatamente em setores que lideram as reclamações. Nesses, os cartões de crédito são os campeões absolutos.
A esse propósito e no interesse do consumidor, proferi dezenas de discursos desta tribuna. Para se ter uma ideia, colecionei, em discurso anteriormente pronunciado, um mosaico de notícias recolhidas ao acaso na grande imprensa de todo o País, um punhado de enfáticas manchetes que dão uma boa noção de como anda esse mercado. Passo a citar: “O cartão é o campeão de reclamações no Departamento de Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça: 77% se referem à cobrança indevida”; “Governo alerta contra cobranças indevidas nos cartões de crédito”; “Dívidas no cartão de crédito explodem”; “Dívida acumulada nos cartões é bolha prestes a estourar”; “Cartões de crédito lideram ações judiciais”; “Regulamentação de cartões é urgente”; “Comércio aguarda redução das tarifas dos cartões de crédito”.
Como se pode constatar, Sr. Presidente, a situação é nada mais, nada menos do que dramática. O Diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça (DPDC), Ricardo Morishita, declarou que “desde setembro de 2009, tivemos um crescimento de reclamações relacionadas aos cartões de crédito. (...) É importante a regulamentação do processo tarifário dos cartões nos mesmos moldes em que ocorreu com a regulamentação das tarifas dos bancos”.
A regulamentação serviria para coibir alguns abusos, como a duplicidade nas cobranças e cobranças irregulares, além da desfaçatez de cobrar simultaneamente anuidade e taxa de administração sem atacar o cerne da questão: os juros estratosféricos.
O próprio DPDC tem números que assombram. Das reclamações registradas pelo órgão, 35% se referem a questões financeiras; e dessas, 70% estão ligadas à cobrança de taxas irregulares pelas empresas de cartões de créditos.
Com o adiamento da intervenção do Banco Central no conflito, afastada para 2011, os consumidores vão precisar de mais paciência; a desculpa agora é que o Ministério da Justiça aguarda nova proposta das empresas, uma vez que até hoje não houve referência às taxas cobradas no crédito rotativo, uma das maiores preocupações do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor. No jogo de empurra, as operadoras alegam que o assunto constará da regulamentação do Banco Central e pedem prazo para continuar com a farra dos cartões de créditos.
Enquanto no Brasil o quadro é de “toma que o filho é teu”, nos Estados Unidos, Amex, Visa e Mastercard são alvos das autoridades antitruste. O Departamento de Justiça Americano denunciou, no dia 4 próximo passado, em um Tribunal de Nova York, “as regras impostas por American Express, Mastercard e Visa que limitam a capacidade dos comerciantes de reduzir o custo do uso dos cartões e, como consequência, os preços que cobram dos consumidores”.
No lado brasileiro, entendo que a grande notícia a ser celebrada nesta sessão, que comemora os 20 anos de vigência do Código de Defesa do Consumidor, é que, na Paraíba, cansado de esperar a regulamentação, o consumidor Sérgio Almeida Bezerra entrou com uma ação revisional de contrato (nº 001.2008.011.790-4) contra o cartão Hipercard, conforme relatei desta tribuna há pouco tempo.
No dia 5 de outubro, a Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba, numa decisão histórica, considerou abusiva as taxas de juros cobradas nas faturas do Hipercard. Ao sentenciar, aquele Tribunal reconheceu que é inadmissível a limitação dos juros ao percentual de 12% a.a, e que a Lei de Usura não se aplica às instituições financeiras. Mas declarou a abusividade da cláusula contratual 6.2, que aplicava juros remuneratórios, que, só no período reclamado pelo consumidor Sérgio Almeida Bezerra, oscilavam entre 119,88% a 178,68% a.a.
A sentença considerou, também, a capitalização como configuração de cobrança de juros sobre juros, e garantiu o recálculo da dívida, reduzindo os juros a percentuais praticados no mercado de capitais nas datas dos respectivos empréstimos, com compensação dos valores pagos a maior.
A Hipercard apelou da decisão, alegando que o Banco Central facultou às instituições financeiras cobrarem a comissão de permanência do consumidor após o vencimento das obrigações; portanto, não haveria qualquer proibição legal que impedisse a aplicação cumulativa com os juros remuneratórios e multa contratual.
Entretanto, Srªs e Srs. Senadores, o Relator entendeu que a alegação não merecia acolhida porque, atualmente, vigora o sistema introduzido pelo Código de Defesa do Consumidor. E o Código de Defesa do Consumidor admite a revisão do contrato quando, no curso da execução, se tornar excessivamente oneroso para uma das partes e se vislumbra, no caso, que houve uma cobrança exagerada, mesmo em face de planilhas divulgas no site do Banco Central do Brasil.
Fechando a sentença, o Tribunal de Justiça da Paraíba reconhece que houve má-fé contratual e dá ganho de causa ao suplicante, condenando a Hipercard por juros abusivos, uma vez que a cobrança de juros sobre juros só é permitida se expressa no contrato e redigida com destaque.
Para finalizar, Sr. Presidente, no caso, o contrato não atendeu ao disposto no Código de Defesa do Consumidor - que no momento estamos comemorando 20 anos - e, dessa forma, o cliente não tinha conhecimento da cláusula. Logo, a Justiça da Paraíba entendeu que ele não estava obrigado a cumpri-la.
Sr. Presidente, a corajosa novidade introduzida pelo Tribunal de Justiça paraibano não deixa outra opção ao Governo central que não a de regulamentar a atuação das administradoras de cartões de crédito no mais breve tempo possível, e consiste na mais emblemática vitória brasileira dos direitos do consumidor inscritos no Código cujos 20 anos de vigência se comemora hoje, contra o poderosíssimo sistema financeiro internacional.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais do que um conjunto de leis, o Código de Defesa do Consumidor representou um avanço que extrapola as relações de consumo.
Ao longo desses anos, trabalhou incansavelmente para mudar a mentalidade das pessoas no que se refere a direitos tutelados pelo Estado, mas que, em última análise, dependem da participação consciente de cada um de nós, o que implicou mudança de patamar na construção coletiva da mais difundida ferramenta de cidadania que hoje conhecemos. Depois dele, as relações de consumo jamais foram as mesmas e os cidadãos, transformados em consumidores esclarecidos, assumem orgulhosamente o papel que lhes cabe na fiscalização da sua aplicação.
Desse modo, Sr. Presidente, quero cumprimentar, por seu intermédio, a sociedade brasileira, que soube incorporar o Código de Defesa do Consumidor ao seu cotidiano, e também todos os funcionários que, com zelo, se dedicam a essa tarefa tão nobre de proteger o consumidor. É a eles e ao Código que podemos recorrer sempre que tivermos qualquer dos nossos direitos de consumidores desrespeitados.
Agradeço, Sr. Presidente, pela tolerância do prazo, mas em função da importância do tema e do registro deste fato, qual seja, desta decisão do Tribunal de Justiça da Paraíba e da presença do Presidente Fernando Collor aqui na Mesa, ele, que sancionou esse projeto de lei, tive por obrigação me alongar um pouco mais.
Peço desculpas e renovo minha exaltação de agradecimento.
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