Pronunciamento de Francisco Dornelles em 22/11/2010
Discurso durante a 187ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Posicionamento contrário à criação da Contribuição Social da Saúde por lei complementar, diante de sua natureza cumulativa. Críticas à gerência da saúde pública do atual Governo e defesa de sua reformulação.
- Autor
- Francisco Dornelles (PP - Progressistas/RJ)
- Nome completo: Francisco Oswaldo Neves Dornelles
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
TRIBUTOS.
SAUDE.:
- Posicionamento contrário à criação da Contribuição Social da Saúde por lei complementar, diante de sua natureza cumulativa. Críticas à gerência da saúde pública do atual Governo e defesa de sua reformulação.
- Aparteantes
- Alvaro Dias, Mozarildo Cavalcanti.
- Publicação
- Publicação no DSF de 23/11/2010 - Página 51552
- Assunto
- Outros > TRIBUTOS. SAUDE.
- Indexação
-
- JUSTIFICAÇÃO, DISCORDANCIA, UTILIZAÇÃO, LEI COMPLEMENTAR, CRIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO SOCIAL, SAUDE, MOTIVO, CUMULATIVIDADE, REGISTRO, DESRESPEITO, ORDEM JURIDICA, BRASIL, POSSIBILIDADE, PREJUIZO, SISTEMA, ARRECADAÇÃO, PAIS, REPUDIO, RECRIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), CRITICA, GESTÃO, JOSE GOMES TEMPORÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), QUESTIONAMENTO, ORADOR, DISPOSITIVOS, RECEITA VINCULADA.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. FRANCISCO DORNELLES (PP - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu pretendo ser muito breve, Sr. Presidente. Eu quero me referir à discussão que, hoje, toma conta da Câmara, de alguns setores do Governo, sobre a Contribuição Social da Saúde, que é prima, que é, na realidade, a própria CPMF disfarçada.
A CPMF, Sr. Presidente, foi criada em 1996, por meio de uma emenda constitucional, e teve sua vigência prorrogada por três anos por emendas constitucionais. Todas as prorrogações de sua vigência sempre foram feitas por emenda constitucional. Eu pergunto o seguinte: por que motivo a CPMF foi criada por emenda constitucional e teve sempre a sua vigência prorrogada por emenda constitucional? E a resposta é uma só: porque a Constituição não permite que ela seja criada nem prorrogada por lei complementar.
O capítulo da Constituição dedicado à Seguridade abriu caminho para que a União criasse uma série de contribuições, substituindo aqueles impostos cuja receita era compartilhada com Estados e Municípios.
Assim, a União diminuiu o IPI, metade era Estados e Municípios, e criou a Cofins, criou a CPMF, criou contribuições cuja receita ela não tinha que distribuir a Estados e Municípios. A CPMF foi uma delas; a CPMF tem o encanto da facilidade, mas é uma incidência retrógrada, atrasada, cumulativa, que incide sobre o consumo, o investimento, as exportações, desestimula a intermediação bancária e, indiretamente, atinge as pessoas de renda mais baixa.
O art. 195 da Constituição estabelece que a Seguridade Social pode ser financiada por contribuições sobre o lucro, sobre o faturamento e estabelece também, no seu § 6º, que ela pode criar outras contribuições para a Seguridade Social, desde que sejam não cumulativas. Então uma contribuição cumulativa como a CPMF só pode ser criada por emenda constitucional, e isso foi reconhecido seja no Governo Fernando Henrique, seja no Governo Lula: sempre, todas as contribuições cumulativas foram criadas por emenda constitucional.
Ora, Sr. Presidente, se nós admitirmos que uma contribuição cumulativa poderá ser criada por lei complementar, nós estamos estabelecendo um precedente muito perigoso: hoje, é a contribuição social da saúde; amanhã, é a contribuição social da segurança; depois de amanhã, é a contribuição social da educação; depois, é a contribuição social do meio ambiente. Nós vamos criar um precedente da maior periculosidade; nós vamos fazer aqui um sistema de arrecadação baseado em contribuições criadas por lei complementar, sem qualquer garantia para o contribuinte.
Eu tenho visto também alguns argumentos de que essa Contribuição Social da Saúde, criada com outro nome, não é a CPMF.
Sr. Presidente, se o Senador Mozarildo Cavalcanti chegar ao Senado usando um crachá escrito “Deputado Mozarildo Cavalcanti”, não será esse crachá que vai fazer com que ele seja um Deputado porque ele foi eleito Senador, foi diplomado pelo Tribunal Superior Eleitoral como Senador, é um Senador dos mais brilhantes desta Casa, fala como Senador, de modo que não será um crachá que vai transformar o Senador Mozarildo em Deputado.
Por isso, em termos tributários, o que caracteriza uma incidência, uma contribuição é o seu fato gerador e a sua base de cálculo; não é o nome que ela tem. Pode-se dar à contribuição social da saúde o nome que quiser. Se for cumulativa, só pode ser criada por lei complementar.
Verifico também, Sr. Presidente, essa idéia de que a saúde precisa de dinheiro. Todos os setores precisam de dinheiro, não é só a saúde. Mas é importante priorizar a saúde. Todavia, eu acredito que a saúde tem que melhorar a sua gerência. Tenho pelo Ministro Temporão o maior respeito, a maior admiração; ele é um homem culto, inteligente, preparado, mas a gerência do Ministério da Saúde é do pior gabarito; nunca houve uma gerência tão falha como a gerência do ilustre querido Ministro Temporão. De modo que, realmente, não é a receita que vai resolver o problema da saúde. Temos que reformar a gerência do Ministério da Saúde para depois pensar em recursos para o Ministério da Saúde.
Eu também tenho muitas dúvidas sobre a chamada receita vinculada. É muitas vezes um engodo, Sr. Presidente. O senhor admite que um setor tenha uma dotação orçamentária, tenha recursos orçamentários de cem.
Quando se estabelece uma receita com destinação a esse setor - vamos admitir uma receita que dê trinta -, o que acontece? O Governo, colocando 30, diminui a outra dotação para 70, e continua a mesma dotação de 100.
De modo que é um engodo muitas vezes essa receita vinculada para um determinado setor. Isso significa aumento de carga tributária.
Para terminar, Sr. Presidente, não aceito em nenhuma hipótese a criação de uma contribuição cumulativa por lei complementar. É um precedente perigoso. Se tivermos que discutir a instituição de uma CPMF, com que nome seja, tem que ser mediante emenda constitucional.
Eu não a apoiaria nem mesmo por emenda constitucional, porque acho que a criação de mais uma incidência neste momento seria realmente uma agressão a todos aqueles que querem um setor tributário com maior racionalidade.
Se houvesse a troca de um tributo por outro, poderíamos admiti-la, se se trocasse uma incidência por outra incidência, mas não simplesmente a criação pura e simples de uma incidência, de uma contribuição - fala-se em contribuição social sobre a saúde -, por lei complementar, o que é uma agressão e um desrespeito ao ordenamento jurídico do País.
Gostaria de conceder um aparte ao Senador Mozarildo Cavalcanti.
O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Dornelles, é uma honra muito grande estar no plenário neste momento e ouvir o pronunciamento de V. Exª, com a serenidade e o conhecimento que lhe são característicos e ter a oportunidade de aparteá-lo. Primeiramente, concordo integralmente com a abordagem que V. Exª fez a respeito não só da parte técnica legislativa, no que tange à criação de uma nova contribuição, no caso aqui, como diz V. Exª, uma CPMF fantasiada de outra coisa. Eu tive a oportunidade de, junto com V. Exª e outros Senadores, portanto a maioria, debatermos e sermos contra a CPMF. Sou médico e para alguns colegas era algo paradoxal eu não querer que a CPMF continuasse, porque a alegação sempre foi a de que o recurso ia para a saúde. V. Exª disse muito bem que o problema da saúde não é falta de dinheiro; é, na verdade, má gestão, em outras palavras, corrupção, Senador Dornelles. No meu Estado eu tenho dois exemplos, um federal e um estadual. A Funasa, no meu Estado, é um exemplo de corrupção às vistas, escancaradamente, tanto que dois superintendentes já foram presos pela Polícia Federal por corrupção. A mesma coisa se dá na Secretaria de Estado. Há poucos meses eu denunciei o fato de jogarem fora medicamentos dentro do prazo de validade ou com prazo de validade perto de vencer para adquirir os mesmos medicamentos com preços superfaturados, sem licitação. Hoje, o Senador Papaléo deu um exemplo do que acontece lá no Amapá. Daqui a pouco vou fazer um pronunciamento mencionando outro caso ocorrido no meu Estado, onde material e medicamentos foram jogados fora para adquiri-los de novo. Essa má gestão é associada à corrupção. Na compra de materiais - equipamentos, materiais de uso permanente ou não, como o caso de medicamentos, gaze, etc -, há uma corrupção escancarada. Então, não é pondo mais dinheiro numa caixa furada que vamos resolver o problema. A saúde tem que ser, realmente, tratada de maneira forte para podermos oferecer aos cidadãos e às cidadãs pobres deste País uma saúde de respeito.
O SR. FRANCISCO DORNELLES (PP - RJ) - Muito obrigado, Senador. Fico muito honrado pelo aparte de V. Exª e quero reitero a minha plena concordância.
Nós temos, realmente, de aperfeiçoar a gerência do problema saúde. Acho que existe uma centralização muito grande em Brasília, o que impossibilita, muitas vezes, o exercício de fiscalização. Muitas vezes vemos o Governo Federal querendo operar determinados hospitais municipais e estaduais, ou nos Estados e nos Municípios, longe, inclusive, de qualquer tipo de controle.
Agora, criar uma contribuição social sobre a saúde, cumulativa, por lei complementar é uma agressão ao ordenamento jurídico do país e um precedente perigosíssimo para a criação de uma centena de outras contribuições que vão desorganizar completamente o sistema de receitas no país.
Muito obrigado pelo seu aparte.
Dou a palavra ao Senador Alvaro Dias.
O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Dornelles, é muito bom ouvi-lo com uma exposição que tem um conteúdo técnico que oferece segurança àqueles que eventualmente defendam politicamente a rejeição de qualquer imposto que venha para substituir a CPMF. A exposição que V. Exª faz, com conteúdo técnico, é, de certa forma, irrespondível. E, na verdade, além do que disse o Senador Mozarildo, que falta competência e há a desonestidade na aplicação dos recursos, o que se vê é um descaso absurdo com a saúde pública no Brasil e uma incapacidade para se estabelecer corretamente as prioridades. Porque veja, Senador Dornelles: as despesas, nos anos de 2003 a 2010, do Governo cresceram num percentual de 47% do PIB e apenas 2% desse percentual se destinou à saúde pública. Portanto, não se considera saúde prioridade. Foram destinados 8% para a educação; também não se considera educação prioridade, ou seja, a máquina cresceu exorbitantemente. Depois de V. Exª, eu pretendo ir à tribuna exatamente para abordar essa questão. Um Governo que não estabelece as prioridades com correção certamente abre espaço para o desperdício em prejuízo da sociedade. Quero apenas cumprimentá-lo pela exposição que faz e pela forma com que aborda essa matéria, colocando como prioridade a questão técnica.
O SR. FRANCISCO DORNELLES (PP - RJ) - Muito obrigado, Senador Alvaro Dias. É uma honra muito grande receber um aparte de V.Exª
Para terminar, Sr. Presidente, eu queria dizer o seguinte: a CPMF foi criada pela Emenda Constitucional nº 12. Foi prorrogada pela Emenda Constitucional nº 37. Teve nova prorrogação mediante a Emenda Constitucional nº 42. O Presidente Lula enviou a Proposta de Emenda Constitucional nº 87, que foi rejeitada.
De modo que, todos os governos sempre entenderam de foram correta que uma contribuição cumulativa só poderia ser criada ou prorrogada por emenda constitucional. De modo que, nós não podemos aceitar essa tese de que, criando uma contribuição com outro nome, mas com o fato gerador e a base de cálculos idênticos à da CPMF, o que faz com que essa contribuição seja cumulativa, que ela pode ser criada por lei complementar. Isso seria um precedente extremamente perigoso abrindo caminho para a desorganização completa do sistema de arrecadação do País.
Sr. Presidente, é uma honra muito grande falar numa sessão presidida por V.Exª
Muito obrigado.
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