Discurso durante a 205ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise das últimas eleições no País. Necessidade urgente de uma reforma política. (como Líder)

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Análise das últimas eleições no País. Necessidade urgente de uma reforma política. (como Líder)
Aparteantes
Acir Gurgacz, Papaléo Paes.
Publicação
Publicação no DSF de 14/12/2010 - Página 58510
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • ANALISE, CORRUPÇÃO, PROCESSO ELEITORAL, CRESCIMENTO, DESPESA, CAMPANHA ELEITORAL, COMPROVAÇÃO, PRIORIDADE, REFORMA POLITICA.
  • QUESTIONAMENTO, CONTRADIÇÃO, SISTEMA, COLIGAÇÃO PARTIDARIA, FAVORECIMENTO, TEMPO, PROPAGANDA ELEITORAL, CRITICA, DESVALORIZAÇÃO, IDEOLOGIA, PROGRAMA, PARTIDO POLITICO, APOIO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, JARBAS VASCONCELOS, SENADOR.
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, NORMAS, HORARIO GRATUITO, RADIO, TELEVISÃO, CRITICA, PROPAGANDA, MANIPULAÇÃO, ELEITOR.
  • REGISTRO, ESFORÇO, SENADO, APROVAÇÃO, MATERIA, PARALISAÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, EXPECTATIVA, INTERESSE, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ARTICULAÇÃO, REFORMA POLITICA.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, certamente, esta será uma semana de agenda cheia no Senado Federal, e devo aproveitar esta segunda-feira para fazer a última análise do ano relativamente ao processo eleitoral concluído em outubro.

            Não tenho dúvida em afirmar que essa foi uma eleição corrupta, talvez a mais corrupta de todas as eleições no Brasil. E olha que houve um esforço no Congresso Nacional para a redução de despesas, com uma mini reforma eleitoral que se aprovou com o objetivo de reduzir despesas, eliminando aquelas referentes a showmícios, a outdoors, a placas enormes, a brindes, a camisetas etc. Mas, ao invés de constatarmos uma redução das despesas, verificamos que os orçamentos das campanhas eleitorais foram engordados. Não são poucas as denúncias que dizem respeito à corrupção eleitoral. Obviamente, estamos nos referindo a despesas até desconhecidas, não contabilizadas. Mas há sérias denúncias de corrupção eleitoral que se somam à denúncia que formulamos relativa ao crescimento das despesas nesta campanha eleitoral.

            Isso reforça a tese de que a responsabilidade prioritária do Congresso Nacional, a partir do próximo ano, será a reforma política, que interessa mais ao País do que aos políticos. Certamente, essa reforma, se interessasse mais aos políticos do que ao País, teria sido concretizada. Digo isso porque muitos imaginam que estamos aqui defendendo, em causa própria, uma reforma que nos possa ser benéfica. Não é o caso. Entendo que a reforma política beneficia o País, sobretudo se conferirmos à Nação um modelo capaz de reduzir a incidência da corrupção no processo eleitoral, já que a corrupção na administração pública quase sempre começa nas campanhas eleitorais. Portanto, a reforma política é indispensável.

            O que particularmente constato - não disputei eleição neste ano e, por isso, talvez, eu tenha tido mais tempo para prestar atenção ao que vinha ocorrendo - é que as coligações são absurdas. Não se justifica aceitar coligações como aquelas que estamos praticando no Brasil. Para as eleições proporcionais, busca-se coligação com o objetivo de beneficiar determinados partidos mais poderosos, somando votos. E acontecem situações estapafúrdias. O eleitor vota em alguém que tem um pensamento político à direita e elege alguém que tem pensamento político à esquerda, ou vice-versa. Para exemplificar, sem demérito aos que citarei, o eleitor vota em Tiririca e elege o Delegado Protógenes. Eu indagaria: o que tem a ver o Delegado Protógenes com o Tiririca? Certamente, nada.

            Portanto, estabelecemos um cenário de contradições imperdoáveis e revelamos uma incompetência sem precedentes, ao admitir que esse seja o processo eleitoral vigente, com contradições, com contaminações irreversíveis, com vícios insanáveis, elegendo uma representação popular certamente com distorções imperdoáveis.

            E a coligação na majoritária? Há alguma relação entre partidos que ressalta a preocupação programática? Eu não diria de preocupação ideológica, porque os partidos políticos no Brasil se constituíram em siglas para registro de candidaturas. E não é inusitado ver alguém da extrema direita candidatando-se, por exemplo, pelo PCdoB. Isso já ocorreu. Vou evitar citar nomes, para não gerar constrangimentos, mas é o que ocorre. Essa é uma agressão à inteligência. É a dissolução do que há de programa partidário. É por essa razão que as pessoas desconhecem os programas partidários no Brasil. Há aqueles que se filiam no PSDB, o meu Partido, sem saber que o PSDB tem um programa da socialdemocracia, e muitos imaginam que o PSDB é um partido da direita. Há aqueles que se filiam no PPS, por exemplo, e mal sabem tratar-se de um partido que defende o socialismo.

            Enfim, isso é o que ocorre no Brasil. Não se valoriza o programa partidário, não há ideário, os programas são constantemente rasgados e atirados na lata do lixo da história política brasileira, e aqueles que respeitam o programa acabam sendo, até em determinados momentos, mal interpretados e, muitas vezes, são punidos porque respeitam o programa partidário.

            Enfim, o que estou pretendendo dizer é que devemos evitar a coligação na majoritária com o único objetivo de ampliar o tempo disponível no rádio e na televisão para a campanha eleitoral. Essas coligações têm tido, única e exclusivamente, este objetivo: aumentar o tempo de televisão para o candidato a Governador, a Prefeito, a Presidente da República.

            Essas coligações podem continuar ocorrendo, mas o partido não deveria levar seu tempo de televisão. Certamente, dessa forma, realizaríamos coligações mais coerentes programaticamente e evitaríamos as distorções gritantes que acabam, na continuidade, promovendo desentendimentos internos, a que assistimos, muitas vezes, nas campanhas eleitorais.

            É evidente que, em relação à coligação na proporcional, essa já é uma tese mais difundida, e o que se prevê é que não haverá mais, brevemente, a coligação para as eleições proporcionais.

            Propostas não faltam, como, por exemplo, a PEC nº 29, do Senador Jarbas Vasconcelos, que dispõe sobre o fim das coligações para as eleições proporcionais e que está aguardando a inclusão na Ordem do Dia.

            Vou conceder um aparte ao Senador Papaléo Paes, que sempre nos dá grande satisfação quando intervém nesta Casa.

            O Sr. Papaléo Paes (PSDB - AP) - Senador Alvaro Dias, V. Exª nos traz um tema extremamente importante no processo democrático brasileiro, principalmente quando fala sobre os programas partidários. Em nosso País, onde há algumas dezenas de partidos políticos, realmente, consegue-se dificultar a análise, por parte do eleitor, sobre a relação do seu candidato com o programa do seu partido político. O que vemos, por exemplo, na eleição majoritária? V. Exª fala muito bem. Dou um exemplo micro: no Estado do Amapá, quando começam as pré-convenções, começamos a ver o corre-corre. Então, o que vemos? Muitos partidos que são partidos carregados numa pasta, num colecionador, debaixo do braço. Ali há um partido político que se está coligando, levando seu nome para, por exemplo, tentar eleger um governador, para tentar eleger seus deputados, enfim, para fazer coligação principalmente levando o tempo de televisão. Realmente, vejo que essa é uma das dificuldades relacionada a essa questão que podemos imaginar e que diz respeito a uma reforma política que venha a trazer benefícios para a evidenciação da qualidade ou dos programas partidários. Vejo que precisamos, realmente, passar por essas alterações. Esse é um caminho muito feliz, por intermédio de V. Exª, para tentarmos valorizar a questão partidária, que, hoje, realmente, está completamente alienada. Os partidos, normalmente, usam todo e qualquer artifício para eleger seus candidatos, para estes chegarem ao poder, mas, quando eles chegam ao poder, o descrédito é tão grande com seus programas, que eles mudam completamente suas condutas. Senador, o grande exemplo disso vejo no Partido dos Trabalhadores. O Partido dos Trabalhadores nos deu o grande exemplo de que, quando se chega ao poder, vira-se uma coisa só, ou seja, despreza-se aquilo que foi trabalhado durante décadas e décadas, para se adaptar àquilo que é mais conveniente a um grupo de pessoas que não representa o programa partidário. Parabéns a V. Exª! Continue lutando por esse processo, que é de grande valia para a democracia do País! Obrigado.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Papaléo Paes. Cada ponto que abordamos tem uma relação estreita com outros pontos. Quando afirmamos que as coligações, especialmente para as eleições majoritárias, têm por objetivo aumentar o tempo de televisão, chegamos à necessidade de mudar também a utilização do tempo de televisão. Por que não transformar o tempo, em horário nobre, na televisão e no rádio, num espaço democrático para o debate entre os candidatos?

            Quando falamos que a campanha se tornou cara, estamos dizendo que ela se tornou cara sobretudo em razão da produção dos programas de tevê e de rádio, que é onde se gasta mais, onde se gasta de forma exorbitante. Há marqueteiros que se julgam vitoriosos quando seu candidato vence; quando perdem, nunca são derrotados. Ou seja, a população é iludida, pois está votando em alguém que não existe, que é peça de ficção. O que existe é o marketing que está por trás dele, porque, supostamente, existe algum gênio transformando a figura que é apresentada diante da Nação numa eleição presidencial.

            Por isso, estou advogando: o horário de rádio e de tevê pode ser mais bem aproveitado em respeito a quem elege, deve ser utilizado para o debate entre os candidatos, sem os efeitos especiais produzidos pelos Spielbergs da política nacional, daqueles que se julgam os verdadeiros transformadores da realidade, que exploram o imaginário, que fazem com que a ficção prevaleça sobre o real e que geram uma extraordinária inversão de valores no País. Prevalece a mentira à verdade, e quem se elege pode acabar sendo a grande frustração, no amanhã, do povo que o elegeu.

            Por isso, é indispensável esse debate no Congresso Nacional. Isso diz respeito ao interesse do povo brasileiro, não ao interesse dos políticos brasileiros. Esse debate é fundamental e tem de ter início no próximo ano.

            É bom dizer, Senador Mão Santa, que, em um presidencialismo forte, como o nosso, somente quando o Presidente da República se interessa pelo processo de reforma, as reformas ocorrem. Esperemos que a Presidente eleita, Dilma Rousseff, tenha esse interesse, porque se trata de prioridade, e, certamente, esse compromisso foi assumido durante a campanha eleitoral.

            Concedo um aparte, com satisfação, ao Líder do PDT, Senador Acir Gurgacz.

            O Sr. Acir Gurgacz (PDT - RO) - Senador Alvaro Dias, V. Exª traz um assunto da máxima importância para a política brasileira. A corrupção começa exatamente nas campanhas eleitorais, na hora em que alguns candidatos vão buscar o voto. Quando estes praticam o abuso do poder econômico, de forma direta ou indireta, ali começa todo o ciclo de corrupção. Faz parte da pauta do PDT também essa importante reforma tributária. Houve problemas nessas eleições relacionados a alguns candidatos do PDT. Não vou citar aqui quais foram os Estados, mas, em praticamente todos os Estados do País, houve problemas relativos ao abuso do poder econômico. Algumas mudanças foram feitas ao longo dos últimos anos, mas ainda não foram necessárias para trazer a questão política ou as regras políticas para a realidade brasileira, para aquilo que esperamos, para aquilo que a população brasileira espera de todos nós. Talvez, não somente o financiamento público seja necessário, mas também uma reforma ampla, para que possamos, realmente, fazer com que o pensamento do eleitor se transforme em eleição ou se transforme no resultado das eleições brasileiras, em nível municipal, estadual ou federal. O importante é que essa reforma aconteça, como disse V. Exª, logo nos primeiros meses do ano que vem. É uma necessidade nacional. Cumprimento V. Exª pelo pronunciamento desta tarde, Senador Alvaro Dias.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Acir. V. Exª sabe que a reforma política é a matriz de todas as reformas, e, se ela ocorrer com êxito, certamente as demais se completarão com muito sucesso, com maior celeridade, da forma mais adequada possível, para atender o interesse coletivo. Estamos defendendo teses que já foram debatidas no Senado e até aprovadas. V. Exª fez referência ao financiamento público de campanha. Já deliberamos sobre essa matéria no Senado - tive a satisfação de ser o Relator, inclusive -, e houve uma aprovação no Senado. A proposta foi à Câmara e dorme sono profundo nas gavetas da outra Casa.

            Com as questões essenciais da reforma política, sempre houve uma preocupação do Senado Federal. Antes, o Senador Sérgio Machado, do Ceará, foi Relator em uma Comissão. Aqui, sempre, houve a presença de Marco Maciel, muito interessado em questões referentes à reforma política, e há projetos de autoria dele, como, por exemplo, a Lei de Fidelidade Partidária, que passou pelo Senado. Há a cláusula de desempenho, para uns, ou a cláusula de barreira, para outros - prefiro cláusula de desempenho -, que limitaria a representação de partidos no Congresso Nacional, que, portanto, limitaria o número de partidos beneficiados pelo fundo partidário e também nos espaços de rádio e de televisão, o que possibilitaria aquilo que pregamos anteriormente, ou seja, utilizar o espaço do rádio e da televisão para o debate durante a campanha eleitoral, porque haveria um número menor de candidatos postulando os cargos eletivos majoritários.

            Portanto, essa engenharia legislativa é que oferecerá o modelo compatível com as aspirações do nosso povo. O que importa dizer é que o modelo existente é superado, é retrógrado e é reiteradamente condenado nas urnas ou em qualquer pesquisa que se faça no País. A rejeição que há por parte da população, essa descrença generalizada em relação às instituições públicas, aos partidos políticos e aos políticos de forma geral tem origem exatamente em um modelo político que provoca desencanto na população do País. Essa descrença não somente afasta talentos da vida pública, que não se sujeitam a uma competição desigual, já que a máquina pública é utilizada arbitrariamente, já que o poder econômico se sobrepõe, muitas vezes, ao talento pessoal, mas também toma conta de quem vota, de quem elege, porque este percebe a fragilidade, a incompetência, a insuficiência do modelo político existente no País, que acaba se constituindo numa fábrica de blefes, com a inversão de valores sobrepondo-se sempre, com pessoas ocupando funções para as quais não foram preparadas devidamente.

            Enfim, Sr. Presidente, essa é responsabilidade nossa, do Senado Federal, é responsabilidade da Câmara dos Deputados, mas, acima de tudo, é responsabilidade da Presidente eleita Dilma Rousseff, porque é este o sistema: estamos sob a vigência do presidencialismo, e o Presidente da República é o maior legislador do País. Prerrogativas do Poder Legislativo foram subtraídas ao longo do tempo e continuam sendo subtraídas diariamente com a edição de medidas provisórias. A pauta é elaborada lá, do outro lado rua; a Ordem do Dia é imposta aqui.

            Portanto, com o interesse da Presidente eleita Dilma Rousseff, poderemos fazer reforma política. Sem a participação efetiva, a articulação e a liderança do processo por parte dela, dificilmente haverá a reforma. Podemos até alcançar esse desiderato, mas isso é improvável. Prefiro acreditar que ela irá participar desse processo, articulando-o politicamente, liderando-o, para que se estabeleça aqui um grande debate, que extrapole os limites do Congresso Nacional e que chegue a todas as partes do País por meio dos segmentos organizados e dos especialistas em Direito Eleitoral. Mas não somente estes devem participar; todos aqueles que se envolvem direta ou indiretamente com a organização da Nação devem estar atentos para uma nova realidade política que devemos construir com a reforma que haveremos de realizar, para que um novo modelo, moderno e compatível com as aspirações do nosso povo, possa vigorar.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/12/2010 - Página 58510