Discurso durante a 200ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do momento de transição política, ora em curso, entre o atual e o próximo Governo Federal, com críticas a decisões de Governo que teriam sido recentemente anunciadas, especialmente a de criação de um fundo de proteção para jogadores de futebol, tendo como respaldo financeiro o Fundo de Pensão dos Trabalhadores da Petrobras-Petros, a aquisição de um novo avião presidencial top de linha, e à incoerência do discurso do Governo quanto à disponibilidade de recursos para execução de obras do PAC.

Autor
Heráclito Fortes (DEM - Democratas/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. PREVIDENCIA SOCIAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Análise do momento de transição política, ora em curso, entre o atual e o próximo Governo Federal, com críticas a decisões de Governo que teriam sido recentemente anunciadas, especialmente a de criação de um fundo de proteção para jogadores de futebol, tendo como respaldo financeiro o Fundo de Pensão dos Trabalhadores da Petrobras-Petros, a aquisição de um novo avião presidencial top de linha, e à incoerência do discurso do Governo quanto à disponibilidade de recursos para execução de obras do PAC.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/2010 - Página 57084
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. PREVIDENCIA SOCIAL. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, CONTINUAÇÃO, DIRETRIZ, POLITICA NACIONAL, SUCESSÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, CRITICA, BANCADA, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, SUJEIÇÃO, POSIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, FALTA, AUTONOMIA, OPINIÃO.
  • CRITICA, ALEGAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), PRETENSÃO, UTILIZAÇÃO, FUNDO DE PREVIDENCIA, TRABALHADOR, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), CRIAÇÃO, FUNDOS, PROTEÇÃO, ATLETA PROFISSIONAL, FUTEBOL.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANUNCIO, AQUISIÇÃO, AERONAVE.
  • COMENTARIO, PRETENSÃO, ANULAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, OPOSIÇÃO, GOVERNO, APREENSÃO, RISCOS, COMPROMETIMENTO, DEMOCRACIA.
  • DENUNCIA, INEFICACIA, PROGRAMA, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, AREA, ESPORTE, EMPREGO, CULTURA, REPUDIO, PERDA, FUNDOS PUBLICOS, QUESTIONAMENTO, DIFERENÇA, DISCURSO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REFERENCIA, EXECUÇÃO, PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO (PAC).

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos vivendo um momento de transição - que não é bem transição, é uma continuação - que tem tudo para ocorrer sem nenhuma alteração, sem nenhuma novidade, Senador Mozarildo, até porque a Presidente eleita tem uma convivência estreita de oito anos com o atual Presidente. Mas alguns fatos começam a mostrar que a Presidente eleita quer demonstrar ao País e ao mundo que tem personalidade própria. O revoltante disso é a hipocrisia de alguns que lhe dão sustentação no Parlamento brasileiro e silenciaram o tempo todo com relação à posição do Brasil diante das atrocidades cometidas pelo Governo do Irã no que diz respeito ao capítulo de direitos humanos. Mas foi só a Presidente eleita, ontem, mostrar que tem uma posição própria e que não tem posição complacente quando está em jogo a vida humana, e já aparecem as solidariedades de oportunidade para com a palavra da Presidente eleita. É nojento! Vê-se o silêncio dos que se solidarizam hoje somente porque a Ministra, que sabe o que é sofrimento, que sabe o que é dor e o que é tortura, mostrou a sua clara posição contra o que ocorre no capítulo de direitos humanos no Irã.

            É lamentável, Senador Mozarildo Cavalcanti, mas é isto que estamos vendo, é o acocoramento de um Poder que tinha tudo para ser livre, para ter opinião própria, para ser uma caixa de ressonância, e não uma Casa apenas de dizer amém.

            Esperei, hoje, Senador Delcídio Amaral, que alguma voz questionasse uma declaração irresponsável e leviana do Ministro da Previdência na euforia da entrega de taças, ontem, do Teatro Municipal, de que iria fazer um fundo de proteção aos jogadores de futebol, tendo como respaldo financeiro o Fundo de Pensão dos Trabalhadores da Petrobras, o Petros. É muito engraçado! Por maior respeito que eu tenha aos jogadores brasileiros, pela alegria que eles nos dão, nós não podemos desrespeitar os trabalhadores da Petrobras que, anos a fio, contribuíram para esse fundo e que são merecedores dos seus benefícios. Não há como, Sr. Presidente, sem que haja protesto e questões na Justiça, não há como Governo nenhum transformar em beneficiário quem não contribuiu.

            É Natal - estamos próximos -, mas esse Papai Noel é inaceitável, porque a única forma para resolvê-lo seria o Governo bancar isso às próprias custas. Aí, Senador Paim, eu pergunto: e os aposentados que padecem? E os merecedores de cuidados especiais, por quem V. Exª pede, agora, a inversão da pauta, dando-lhes prioridade, a quem o Ministro da Previdência não teve a sensibilidade de propor benefícios? E, aos mutilados no dia a dia do trabalho, por que não se cria também um fundo especial? E aos que têm familiares que foram vítimas da violência nos morros cariocas ou na luta do tráfico pelo Brasil afora?

            Irresponsável o País, infeliz o País que tem um Ministro irresponsável, que, aproveitando-se do oba-oba da entrega de taças para jogadores - que merecem, que fizeram e que lutaram para conquistá-las -, aproveita-se do momento para, com a palavra fácil e de maneira leviana, prometer aquilo, Senador Paulo Paim, que nós sabemos, de antemão, que o bom senso veta de maneira definitiva.

            Por que não se cria um fundo especial - e, aí, sim, se criam mecanismos, tirando da renda dos estádios, dos passes das vendas milionárias dos jogadores - para beneficiá-los? Mas o trabalhador da Petrobras, que corre o risco no dia a dia, arriscando a vida nas plataformas, não pode ser penalizado pela leviandade de um Ministro que quer aparecer.

            O silêncio foi total. A indignação foi da arquitetura do Municipal, que, a seguir, desabou, envergonhada com a desfaçatez de quem, em fim de mandato, promete o que, de antemão, sabe que não vai cumprir. Aliás, essas gastanças de fim de mandato nunca foram boas conselheiras.

            Agora, o Presidente da República já anuncia que vai comprar um novo avião, top de linha, para que o Brasil alcance voos mais longos na sua tentativa desesperada de ser participante do Conselho de Segurança da ONU. No mundo inteiro, países mais ricos - e as exceções são poucas - viajam nos aviões de carreira das companhias. Existem exceções para os países milionários, como os Estados Unidos, a França, às vezes, a China. Aliás, a maioria dos países que fazem opção por uma frota própria é mais por questão de segurança do que por qualquer outra justificativa. E o Brasil alimenta a ideia da compra desse avião, nem bem ainda adaptado à aquisição do Aerolula, que acho que não completou sequer cinco anos, um avião impróprio para o apetite desbravador do Presidente da República. Mas impróprio porque é tecnicamente impróprio pela sua pouca autonomia, pela má distribuição do peso. Os que viajaram nele - o Senador Paim deve ter ido, o Senador Delcídio Amaral deve ter voado algumas vezes - sabem: toda vez que é preciso fazer um voo mais longo, os passageiros passam pelo constrangimento de se sentarem nas últimas fileiras, porque o balanceamento do avião não permite que se sentem normalmente nas suas cadeiras.

            Era preciso que o Governo dissesse primeiro por que precisa comprar outro avião, por que o que usa hoje é inadequado. Quem diz isso são os que voaram, são os técnicos. Estou vendendo o peixe pelo que comprei, mas é fácil fazer essa avaliação.

            Sr. Presidente, a determinação do Presidente Lula de dizimar a oposição no próximo mandato vai fazer com que se compre e se venda sem protestos nesta Casa. Não sei se esse será o melhor caminho para a democracia, não sei se esse será o melhor caminho, meus caros Senadores, para este País.

            Abre-se o jornal hoje e se fala do escândalo das emendas parlamentares. Não é um escândalo localizado em Brasília; é um escândalo disseminado no Brasil inteiro. E eu, atentamente, ouvi aqui o Senador Paulo Paim, da base do Governo, queixar-se de uma emenda sua que não foi paga, empenhada e não paga.

            No entanto, o que se vê pelo Brasil afora é um esbanjamento de dinheiro em programas de pouco resultado, como o Segundo Tempo, do Ministério dos Esportes, que muitas manchetes ainda ocupará na imprensa deste País, e o ProJovem, Senador Mão Santa, que o Piauí conhece muito bem. Nós recebemos uma denúncia inicial de que o ProJovem, nos últimos quatro anos, havia torrado R$32 milhões. O Secretário que foi gestor do programa, respondendo ao Deputado Estadual que fez a denúncia, de maneira arrogante e prepotente, disse: “Não são R$32 milhões, são R$70 milhões”. E fica por isso mesmo!

            Os carnavais fora de época são financiados com recursos públicos, num contraste com a pobreza do Norte e do Nordeste brasileiro. No Piauí, nós vimos a desfaçatez do patrocínio de um carnaval fora de época no Município de Cocal, menos de um ano após aquele desastre, aquela tragédia da Barragem de Algodões, num cenário triste em que sequer os desabrigados haviam conseguido um novo teto para viver. Gastam-se trezentos, quatrocentos mil reais com shows superfaturados, num desrespeito à vida humana. Mas não tem problema, o Governo terá maioria arrasadora. É o que pensam!

            Mas hoje eu criei uma esperança nova. Vi aqui o Paim - que é fiel ao Governo, mas é daqueles que acredita que “ao rei se dá tudo, menos a honra” -, protestar, e o protesto não é um protesto pessoal dele, mas um protesto da comunidade que ele representa e que lhe deu o direito de representá-la por mais um bom tempo. O silêncio, muitas vezes - nesses casos, especialmente -, não é bom conselheiro. Nós não podemos, Sr. Presidente, nos curvar diante disso. Aliás, essa fase de transição traz acertos, traz desacertos, não traz unidade de pensamento.

            Anteontem, nós vimos o Presidente Lula convocar os prefeitos e pedir-lhes que apresentassem projetos, porque, se houver projeto, o País tem dinheiro. O PAC 2 é o aperfeiçoamento do PAC 1, disse o Presidente da República. Em seguida, o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, reconduzido pela força dele, declara que os programas sociais, com exceção do Bolsa Família e do Minha Casa, Minha Vida, serão todos cancelados, redistribuídos ou redirecionados por falta de recursos.

            É preciso que essa linguagem seja unificada para que o País entenda o que acontece, até porque, a partir de 1º de janeiro, o Presidente Lula será um retrato na parede. Espero que ele não saia com a paranoia que o passado histórico registra lá na década de 50: que era de colocar de novo o retrato do velho, relembrando aqueles que, por esperteza e oportunismo em relação à deposição do Getúlio, o que não é o caso, esconderam - como é da vida, e a vida ensina isso - o retrato do Getúlio nos lugares de mais difícil acesso nas repartições públicas, atendendo os interesses dos que vivem do poder e não das convicções.

            O Presidente Lula agora anunciar a compra de um avião que só ficará pronto daqui a três anos e meio, Senador Paulo Paim, é um mau sinal. É um mau sinal porque demonstra que a Presidente Dilma poderá não ter sossego e poderá ter uma sombra que não será benéfica para o País.

            A oposição, Sr. Presidente, senhoras e senhores Senadores, continuará. A oposição não morre, nasce sempre outra e, às vezes, minhas senhoras e meus senhores Senadores, a verdadeira oposição dorme no seio do governo e, quando mostra as suas entranhas, tem a vantagem de saber os segredos, os erros e os desacertos cometidos, porque com eles conviveu.

            Faço aqui o registro da seguinte manchete de jornal, Senador Mão Santa: “Petros administrará fundo voltado a jogadores de futebol”. Faço isso em respeito a duas categorias: a dos funcionários da Petrobras, que não podem ter o seu patrimônio assaltado, e a dos jogadores de futebol brasileiros, que não podem ser enganados com uma promessa dessa natureza, difícil ou quase impossível de ser cumprida.

            Portanto, deixo este registro para a reflexão do País, Sr. Presidente, num momento em que essa transição tem tudo para ser apenas a troca de um retrato por outro, porque, se fecharmos os olhos, vamos ver na retina que, pelo menos no momento, parecem fundir-se numa coisa só.

            Não é a terceira dimensão que volta com toda força na comunicação brasileira, mas é, realmente, o produto de um trabalho - e louve-se - da determinação de um Presidente da República que precisa apenas aprender algo que a história ensinou não só no Brasil, mas no mundo inteiro: ninguém governa governante.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/2010 - Página 57084