Discurso durante a 208ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Projeto de Lei do Senado nº 166, de 2010, de autoria do Senador José Sarney, que reforma o Código de Processo Civil.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Outros:
  • Projeto de Lei do Senado nº 166, de 2010, de autoria do Senador José Sarney, que reforma o Código de Processo Civil.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, na sessão extraordinária de ontem, apresentei um breve resumo das atividades da Comissão Especial que examinou o PLS nº 166, que trata da reforma do Código de Processo Civil. Focalizei, também, algumas novidades que constam dessa proposta.

            Retorno, agora, a esta tribuna para prosseguir na síntese de outras inovações. Uma delas institui a figura do chamado amicus curiae. Amicus curiae é uma expressão latina que significa “amigo da Corte”. Trata-se de alguém que, tendo conhecimento ou algum atributo, alguma qualidade que possa auxiliar o juízo do magistrado, é convidado para dar um parecer que seja útil, que seja robusto, a fim de que o magistrado possa prolatar um julgamento que seja o mais adequado possível.

            O projeto muda, também, em outro aspecto: extingue a chamada nomeação à autoria. Todavia, admite emendar a petição inicial para corrigir o polo passivo sempre que o réu arguir essa ilegitimidade, que o réu colocar em dúvida se, realmente, está presente esse pressuposto, e se o autor concordar com esse questionamento. Com isso, aproveita-se o processo - obviamente, depois de se fazer a correção admitida pelas duas partes. Aí, o processo passa a correr normalmente, dirigido a quem se deve dirigir efetivamente, a quem deve ser demandado.

            Outra mudança que o projeto traz é com relação ao limite das testemunhas, que passa a ser de cinco testemunhas, quer para o autor, quer para o réu. Atualmente, o Código de Processo admite até 10 testemunhas e isso, não raro, tem sido utilizado para procrastinar, para protelar o andamento dos processos.

            Então, veja V. Exª que todas as mudanças que estão sendo propostas são na direção de dar maior celeridade, dar maior velocidade e dar maior fluidez ao processo.

            A permissão para o juiz aumentar prazos e inverter a ordem de produção de provas é um questionamento que ouvimos, também, nas audiências públicas. Essa circunstância só será admitida em processos complexos e muito volumosos. Então, é uma característica que dá ao magistrado uma certa mobilidade para que o processo tenha maior segurança e rapidez, sem perder a segurança jurídica.

            As autoridades - e, aqui, também há uma mudança relevante - que têm prerrogativa para indicar dia, lugar e hora para serem ouvidas como testemunhas passarão a ter um prazo de 30 dias para fazê-lo. Não o fazendo, o juiz fixará a data ao seu livre arbítrio. Hoje, enquanto a autoridade que está nessa circunstância não designa o dia, o processo fica paralisado.

            Então, veja V. Exª que são numerosos os casos em que o processo pode-se prender, pode enfrentar obstáculos, e o projeto, o PLS 166, vai removendo, uma a uma, essas dificuldades, esses obstáculos.

            Na audiência de instrução e julgamento - é outra mudança -, o juiz poderá, mediante consentimento das partes, alterar a ordem da oitiva das testemunhas. Quem imagina que essa seria uma mudança no sentido de dar maiores poderes ao juiz pode perceber que há um condicionamento ao qual o juiz está subordinado para que ele possa promover essa mudança.

            São instituídos honorários recursais. O objetivo da regra é remunerar os advogados pelo trabalho adicional em segundo grau, também no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal. Essa regra, embora pareça que repercutirá apenas na vida dos profissionais da área dos advogados, tem uma outra função, desestimular aqueles recursos que são manejados com objetivo meramente protelatório. Se a parte perde em primeiro grau, perde em segundo grau, será condenada a pagar a cada recurso a verba adicional, mas há um limite. O limite é até de 25%, incluindo-se todo o andamento desde a primeira fase, que não é recursal, passando-se por todas as fases, chegando-se até a última instância.

            Portanto, não está sendo achacado aqui aquele que estiver recorrendo, até porque o Estatuto da Ordem dos Advogados que está em vigor hoje admite honorários de até 20%, e, nesse caso dos recursos, essa hipótese vai corresponder ao somatório de todas as medidas, para alcançar esses 25%.

            Os prazos para interposição dos recursos são padronizados em 15 dias. A única exceção que estamos prevendo é a do recurso de embargos de declaração, cujo prazo fica mantido em cinco dias.

            Outra mudança relevante: o juízo de admissibilidade da apelação será feito tão somente no tribunal. Hoje, ele é feito, num primeiro momento, na instância singela, ou seja, no primeiro grau; e depois é feito o mesmo juízo de admissibilidade no tribunal. Então, o que estamos fazendo? Nós estamos admitindo apenas no tribunal. Isso significa que o processo ganha celeridade, rapidez; é o fim daquilo que, na área jurídica, se chama de juízo de admissibilidade bipartido na apelação.

            Fica criado - e isto aqui é um fato relevante, talvez um dos mais relevantes ou o mais relevante de todos, de todas as mudanças - o chamado incidente para a resolução de causas repetitivas. É uma solução que vem do direito alemão, uma experiência bem-sucedida lá, que certamente vai produzir extraordinários resultados na redução das demandas, ou melhor, no andamento, na rapidez dos processos.

            A potencialidade de gerar a multiplicação de processo de uma questão de direito é a circunstância que autoriza o manejo desse incidente. A medida que pode ser suscitada pelo juiz ou pelo relator pode também ser invocada pelas partes. A mesma legitimidade se estende ao Ministério Público, à Defensoria Pública, e podem participar, apresentando subsídios para o julgamento e soluções, qualquer das partes e o chamado amicus curiae. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada a todos os processos que versem idêntica questão de direito, ou seja, de uma só vez, será possível julgar uma infinidade de processos.

            Honra-me, Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Valter Pereira, não vou fazer considerações sobre o mérito da exposição de V. Exª, mas, antes que conclua seu discurso, gostaria de prestar-lhe uma homenagem pelo excepcional trabalho que vem realizando como relator dessa matéria, que é de importância vital para o País.

E V. Exª, antes de concluir, deixa-nos o exemplo de modelo que podemos aproveitar em todos os debates que possivelmente travaremos nos próximos anos, nesta Casa: essa participação, que vai além das paredes do Congresso Nacional, no debate de questões de importância para a organização da Nação. Nós temos de ouvir mais; temos de buscar o aconselhamento popular; temos de buscar a contribuição da inteligência por meio das representações organizadas da sociedade, e foi o que V. Exª fez: saiu de Brasília; foi a vários pontos do País, a várias capitais; reuniu juristas, especialistas do assunto, ouviu-os, colheu os ensinamentos, a experiência que cada um pode apresentar; e os traz, para o Congresso Nacional dar a palavra final. Creio que esse é o modelo, quando discutimos aqui outras questões de legislação - reforma política, reforma tributária, reforma da Previdência. Temos de buscar as representações organizadas da sociedade para a contribuição fundamental, a fim de que a legislação que se aprove aqui atenda às expectativas da Nação brasileira. V. Exª está de parabéns pelo esforço, pela dedicação e pela competência com que se houve nessa tarefa que lhe foi delegada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e pelo Congresso Nacional.

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Muito obrigado, Senador Alvaro Dias. V. Exª disse muito bem: é preciso que o processo legislativo seja crismado pela legitimidade que está na sociedade.

            Nós tivemos um momento de grande repercussão - e V. Exª viveu intensamente esse momento -, que foi a Assembléia Nacional Constituinte, que dotou o País de um novo ordenamento jurídico e que, mais do que isso, deu as balizas de um Estado de direito democrático. E ali houve uma discussão muito grande, que se travou aqui, neste Plenário, no Plenário da Câmara dos Deputados.

            No caso específico do Código de Processo Civil, fizemos o inverso: levamos a discussão para outros Estados. Fomos discutir com operadores do direito em cerca de dez Estados da Federação, onde o pensamento jurídico aflora com mais intensidade. E conhecemos experiências extraordinárias, experiências que hoje estão sendo incorporadas no nosso Código e que, na verdade, a própria Magistratura e o Ministério Público já estavam enxergando e sobre as quais estavam à frente da própria legislação.

            Felizmente, a discussão que foi travada nessas audiências públicas deu o resultado que esperávamos. A Magistratura que discutiu está conhecendo e participou da elaboração do processo, ou do projeto. Do mesmo modo, o Ministério Público, as procuradorias, tanto municipais como estaduais, a Advocacia-Geral da União, o Ministério da Justiça, a Defensoria Pública, os advogados de maneira geral - tanto que foi consultada a OAB, que teve participação direta, discutindo, debatendo não só nas audiências públicas, mas em outras reuniões também convocadas para esse fim. Então, se nós temos um projeto que foi largamente discutido foi exatamente o Código de Processo Civil.

            Acho que o Presidente Sarney teve uma visão muito importante sobre a oportunidade de se mexer nesse Código, até porque aquele que estava orientando, que estava regendo os processos em nosso País é um código de 73, um código que veio de um regime autoritário. O primeiro código que se faz com o apoio, com o crisma da vontade popular, na discussão e na aprovação, é exatamente o Código de Processo Civil.

            Aliás, tem que se fazer justiça: outro código que foi gestado aqui pelo Senado e que foi objeto de uma discussão também ampla e memorável foi o Código de Processo Penal, outra ferramenta relevante para a administração de um momento que realmente precisa dar à sociedade e ao Estado um novo aparato para se fazer justiça e para se combater este grande mal que é a criminalidade.

            Então, veja o seguinte: tanto o Código de Processo Civil como o Código de Processo Penal remanescem da ditadura, Senador Cotait. Na verdade, os códigos que estão nascendo agora são os primeiros que nascem dentro de um regime de liberdade e de democracia.

            Não vou me alongar nesta discussão, até porque nós temos outra discussão para a noite de hoje, que é a terceira discussão do projeto. E, nesta próxima sessão, então, vamos completar sobre essas mudanças que são mais pronunciadas, aquelas questões que geraram algum sussurro e que precisaram passar por mudanças. Nós fizemos várias mudanças, embora mantendo o texto original que foi elaborado por uma comissão de notáveis, por uma comissão de juristas, por especialistas do porte do Ministro Luiz Fux, que comandou essa comissão. Portanto, não é aqui uma obra só de Senadores.

            É claro que as normas inseridas nessa proposta são preocupações, são inquietações que brotaram aqui, no Senado, e precisavam ser enfrentadas.

            Honra-me, Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Valter Pereira, eu não poderia deixar também de ressaltar, em nome do meu partido, o PSDB, a importância da participação do Ministro Luiz Fux nessa engenharia jurídica que nos leva a ter esse resultado, e certamente será um texto final aplaudido por todos aqueles que entendem do Direito. O Ministro Luiz Fux teve, além da sua competência reconhecida, muita disposição para realizar o trabalho que realizou. Ele também percorreu as principais capitais do País buscando uma participação efetiva de todos aqueles que militam no foro: os magistrados, os advogados. Enfim, quem quis participar da elaboração participou. Isso graças a esse espírito democrático e à abertura que ofereceu o Ministro Luiz Fux, com essa parceria que se estabeleceu com o Congresso Nacional. Portanto, além da nossa gratidão, como parlamentar e como representante de um partido, os nossos aplausos pela eficiência com que se conduziu, liderando todo esse processo. V. Exª, aqui, como Relator, e o Ministro Fux, externamente, mobilizando, estimulando, motivando o debate, cooptando as pessoas a participarem, com a contribuição indispensável da inteligência de cada um. Portanto, os nossos cumprimentos! Essa parceria apresenta resultados que significam avanços, avanços em um legislação que tem sido cobrada pela sociedade. A mudança da legislação e o seu aprimoramento têm sido cobrados no cotidiano. Portanto, esse trabalho tem que ser aplaudido.

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Muito obrigado a V. Exª. A sua intervenção faz justiça não só ao Ministro Luiz Fux, mas a toda a comissão que ele liderou. E houve um atributo que considero fundamental para um trabalho dessa natureza, que é a completa ausência de dogma, o descompromisso com qualquer dogma. Isso é fundamental, porque, quando se tem um juízo preconcebido sobre determinados assuntos, determinadas posturas, é muito difícil se conduzir a um resultado positivo, como ao que nós estamos chegando. E nós tivemos, tanto da parte do Ministro Luiz Fux, como da parte dos membros da nossa comissão, um descompromisso total com qualquer dogma que pudesse frear, que pudesse inibir o trabalho dessa comissão.

            Portanto, nós vamos reservar para a sessão da noite as outras novidades que o Código traz e que justificam sua aprovação, para o aprimoramento da principal ferramenta que todos os operadores do Direito precisam para distribuir justiça.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


            Modelo1 5/6/241:38