Discurso durante a 216ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Constatação da excessiva carga tributária em nosso País, ressaltando a necessidade de uma efetiva reforma que desonere os cidadãos e as forças produtivas nacionais, com especial apelo para a implementação de medidas que estimulem os nossos exportadores.

Autor
Acir Gurgacz (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RO)
Nome completo: Acir Marcos Gurgacz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Constatação da excessiva carga tributária em nosso País, ressaltando a necessidade de uma efetiva reforma que desonere os cidadãos e as forças produtivas nacionais, com especial apelo para a implementação de medidas que estimulem os nossos exportadores.
Publicação
Publicação no DSF de 22/12/2010 - Página 60588
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • APREENSÃO, AUSENCIA, SOLUÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, SUPERIORIDADE, TRIBUTAÇÃO, INJUSTIÇA, CRITERIOS, REGISTRO, DADOS, RECEITA FEDERAL DO BRASIL, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), GRAVIDADE, INCIDENCIA, BENS, SERVIÇO, ONUS, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, FOLHA DE PAGAMENTO, INCENTIVO, ECONOMIA INFORMAL.
  • ANALISE, VIABILIDADE, REDUÇÃO, TRIBUTOS, CONTINUAÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, COMPARAÇÃO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, JUSTIFICAÇÃO, APOIO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, INICIATIVA, GOVERNO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, PROVIDENCIA, FAVORECIMENTO, CONSUMO, EXPORTAÇÃO, EMPREGO.
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, GOVERNO FEDERAL, IMPLEMENTAÇÃO, PROVIDENCIA, BENEFICIO, EXPORTADOR, ESPECIFICAÇÃO, MOTIVO, BUROCRACIA, EXPECTATIVA, REALIZAÇÃO, CANDIDATO ELEITO, ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, INICIO, LEGISLATURA, INCENTIVO, COMERCIO EXTERIOR, PRODUTO INDUSTRIALIZADO, AMPLIAÇÃO, EMPREGO, CONCLAMAÇÃO, DEBATE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ACIR GURGACZ (PDT - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente Mão Santa, que ora deixa a Presidência, e Presidente Alfredo Cotait, que ora assume a Presidência, Srªs e Srs. Senadores, nossos colegas que nos assistem pela TV Senado e que nos ouvem pela Rádio Senado, mais um ano termina, e um dos principais problemas do nosso País permanece ainda sem solução, como se fosse algo que não se pudesse modificar. Refiro-me, Sr. Presidente, à carga tributária imposta aos cidadãos e às forças produtivas, à nossa iniciativa privada, que é o verdadeiro motor deste País. Essa é uma carga tributária que se mostra, ao mesmo tempo, extremamente elevada e extremamente injusta em seus critérios.

            A todo momento, como sabem as Srªs e os Srs. Senadores, aparece alguém falando em reforma tributária. A todo momento, surgem análises - algumas mais aprofundadas, outras menos fundamentadas - sobre o que deve e o que não deve ser feito para resolver essa questão. A reforma tributária é vista por muitos como a grande solução para a maioria dos nossos problemas, os problemas do Brasil. E, no entanto, pouco é feito, há anos, de modo que a estrutura tributária vigente continua a mesma, independentemente do quanto reclamamos dela ou do quanto reclamamos dessa nossa carga tributária, Presidente Alfredo.

            Todos nós sabemos - e isso tem sido repetido à exaustão - que a arrecadação de tributos no Brasil atinge valores altíssimos, se compararmos com outros países, países desenvolvidos ou mesmo em desenvolvimento.

            Em 2009, por exemplo, a relação entre a arrecadação total do setor público e o tamanho da economia, medido pelo Produto Interno Bruto, chegou a praticamente 34%. Já seria um número muito alto, Sr. Presidente, mesmo em condições normais. Mas não nos podemos esquecer, entretanto, que 2009 foi um ano atípico, um ano em que o Governo Federal reduziu significativamente alguns tributos, como fez com o IPI dos automóveis, para incentivar a produção, e o consumo para combater a crise econômica, que vinha do exterior e nos ameaçava. O resultado todos vimos: foi eficiente e, segundo vários economistas, não causou sequelas à sustentabilidade fiscal do Estado.

            Portanto, é possível, Senador Presidente e Senador Mão Santa, reduzir a carga tributária. Está provado por “a” mais “b” que isso é possível e é viável para o crescimento e para o desenvolvimento do nosso País.

            Em 2008, a carga tributária tinha sido maior: acima dos 34%, chegando a 34,5% do PIB. E é bem provável que, agora, em 2010, colocadas em revisão muitas daquelas medidas de incentivo adotadas no ano passado, ela volte a se aproximar desse valor.

            Em outros países mais desenvolvimentistas, a situação é bem diferente. No Japão, a carga tributária não chega a 18% do PIB, como já citei aqui, em outra oportunidade. Em outras nações desenvolvidas, ela fica no mesmo patamar da nossa, mas a quantidade e a qualidade dos serviços prestados à população são muito superiores. Nos países emergentes, por fim, essa carga tributária é bem menor.

            Com tudo isso, é claro que só podemos chegar à conclusão de que, no Brasil, pagamos muitos impostos e recebemos muito pouco em troca. E tem mais: como eu já disse, além de excessivamente alta, nossa carga tributária também se revela muito injusta, onerando os segmentos populacionais de baixa renda, dificultando a ação de empreendedores e, de certa maneira, privilegiando as classes mais abonadas.

            De acordo com dados da Receita Federal do Brasil, a composição da arrecadação do nosso País, em 2008, foi a seguinte: 48% da arrecadação teve origem na tributação de bens e serviços, 24% sobre a folha de salários, 20,5% sobre a renda, 3,3% sobre a propriedade, 2,1% sobre transações financeiras, e 1,3% sobre os demais impostos.

            Vejamos: um peso tão grande da tributação sobre os bens e os serviços - beirando os 50% da arrecadação - é algo que não se presencia nem nas economias desenvolvidas, nem naquelas em desenvolvimento. Na verdade, ao jogar esse fardo sobre as forças produtivas e sobre os consumidores e ao atribuir um peso menor à variável renda, o que se faz é criar um sistema tributário regressivo, no qual os tributos pagos caem, proporcionalmente, à medida que aumenta a renda do próprio contribuinte.

            Voltemos, Sr. Presidente, aos números oficiais. Em 2003, um trabalho executado pelo Ipea, com base em dados do IBGE, chegou à conclusão de que, na faixa dos que ganhavam até dois salários mínimos, o pagamento de tributos correspondia a 48,9% da sua renda. Já na faixa acima de 30 salários mínimos, esse percentual caía para 26,3%.

            Em grossos números, isso significa que os mais pobres destinam praticamente metade de sua renda ao pagamento de tributos, enquanto para os mais ricos essa contribuição representa cerca de um quarto dos seus rendimentos.

            Outro questionamento que podemos fazer em relação à nossa carga tributária é que ela se mostra especialmente cruel com os setores mais produtivos da sociedade brasileira, ou seja, com aqueles setores que mais contribuem para o crescimento da nossa economia.

            Neste rápido balanço sobre essa nossa excessiva carga tributária, penso que cabe uma observação, também, sobre a forma como ela incide na folha dos salários, na folha de pagamento da população brasileira, dos trabalhadores brasileiros.

            As incidências são muito variáveis, com destaque para a contribuição previdenciária do empregador, 20%; o FGTS, 8%; o Sistema S, 3,1%; o salário-educação, 2,5%, e o seguro contra acidente de trabalho, que varia entre 0,5% a 6%.

            No total, a carga tributária sobre a folha de salários chega a um valor perto de 40% do salário; um valor bastante elevado, que acaba servindo como um desestímulo à formalidade e que, por isso mesmo, num efeito inverso, acaba afetando negativamente a arrecadação. Ou seja, o Governo aumenta os impostos e acaba perdendo com o não pagamento dos mesmos impostos.

            É, sem sombra de dúvida, um sistema tributário falho, remendado.

            E é exatamente por isso, exatamente porque nosso sistema tributário se mostra tão falho, que, de tempos em tempos, como afirmei no início do meu pronunciamento, surgem propostas para aperfeiçoá-lo. Mas por que isso não acontece? Temos que ultrapassar as limitações e diferenças que impedem que possamos fazer, de uma vez por todas, essa tão almejada reforma no Brasil, em nome do desenvolvimento do nosso País. Não podemos protelar mais uma medida tão importante para o desenvolvimento do Brasil.

            Tomemos como exemplo a proposta de emenda à Constituição nº 233, de 2008, apresentada pelo Governo Federal e atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados. É evidente, Srªs e Srs. Senadores, que ela tem aspectos positivos.

            Em primeiro lugar, ela reduz a complexidade do sistema tributário ao unificar a legislação do ICMS e ao substituir vários tributos federais cumulativos, como o Cofins, o PIS, a Cide-Combustíveis e o salário-educação, por um Imposto Sobre Valor Agregado - IVA.

            Ela também busca desonerar os investimentos, as exportações e a folha de salários. Busca desonerar os investimentos ao instituir uma progressiva redução do prazo para o aproveitamento dos créditos originados do ICMS, recolhido na aquisição de bens de capital. Busca desonerar as exportações ao prever a cobrança do ICMS no Estado de origem, mas com a progressiva apropriação dos recursos pelo Estado de destino. E busca desonerar a folha de salário ao extinguir o salário-educação e ao reduzir a contribuição previdenciária do empregador de 20% para 14%.

            Por fim, há de se destacar, ainda, que a PEC nº 233, 2008, deixa claro o objetivo de dar um basta à guerra fiscal entre os Estados e de reformular a política de desenvolvimento regional, para torná-lo mais harmônico e equitativo.

            De qualquer forma, Sr. Presidente, se existe um ponto a ser questionado na proposta encaminhada pelo Governo Federal é o fato de que ela, simplesmente, não oferece nenhuma garantia de que a carga tributária será realmente reduzida.

            Há um compromisso, é certo, de que as alíquotas somadas do IVA e do novo ICMS não poderão aumentar a carga tributária, compromisso que, aprovada a PEC nº 233, seria regulamentado em lei complementar.

            Mas isso, Srªs e Srs Senadores, ainda me parece muito pouco.

            Se existe quase um consenso em nosso País de que a carga tributária é não apenas injusta, mas também elevada, as medidas que vierem a ser tomadas devem contemplar os dois fatores. Devem torná-la mais justa, mas, ao mesmo tempo, devem torná-la menor.

            Vejamos, por exemplo, o modelo de tributação a que estão submetidas as exportações. Hoje em dia, existe quase um consenso internacional sobre o pressuposto de que as exportações de um país devem ser dispensadas de tributação como forma de se beneficiar o balanço comercial.

            No entanto, o que realmente acontece é que as empresas brasileiras que querem exportar seus produtos têm de enfrentar, além de uma política cambial desfavorável, um modelo tributário que as obriga a embutir em seus preços tributos como a contribuição previdenciária do empregador, o IPTU e o IOF. Isso é a própria elevação do chamado Custo Brasil.

            E tem mais. Embora teoricamente elas possam se beneficiar de um sistema de créditos que compensaria a cobrança de certos tributos federais e estaduais, como o IPI, o Cofins, o PIS e o ICMS, a verdade é que, na prática, essa compensação não funciona a contento. Tantas são as limitações impostas pela lei e pela burocracia que os créditos vão se acumulando sem que possam, efetivamente, ser utilizados pelas empresas exportadoras.

            Há sete meses, o Governo anunciou um pacote de medidas de apoio aos exportadores que visava eliminar algumas barreiras importantes que travam as exportações brasileiras.

            Essas medidas incluíam, principalmente, a promessa de devolução mais rápida dos créditos tributários dos exportadores que têm o direito de receber de volta alguns tributos pagos, na medida em que o destino final do produto é o exterior; a exclusão do valor das exportações do faturamento total de micro e pequenas empresas, de modo a estimular sua participação no comércio exterior sem retirar-lhes as vantagens do Simples; a criação do Fundo Garantidor do Comércio Exterior para cobrir riscos comerciais; e a criação de uma linha de crédito de R$7,5 bilhões para financiar as exportações de bens de consumo.

            Infelizmente, Sr. Presidente, apesar do esforço governamental, quase nenhuma dessas medidas puderam ser efetivamente implantadas. Com exceção da linha de financiamento - dos R$7,5 bilhões, R$6 bilhões já foram utilizados pelos exportadores -, as outras medidas acabaram emperradas ou imobilizadas em função de hesitações e de disputas internas dos órgãos governamentais brasileiros.

            É assim, por exemplo, que a criação do Eximbank brasileiro, o banco de financiamento à exportação, foi travada por uma disputa entre o Ministério da Fazenda e o Ministério do Desenvolvimento. A modificação do Simples - e a criação do Simplex, que estimularia as exportações das micro e pequenas empresas - é objeto de um projeto de lei que tramitava na Câmara, mas foi retirado de pauta a pedido da Receita Federal, que pediu mais tempo para analisá-lo.

            Com relação aos créditos tributários, Sr. Presidente, enfrentamos o problema da burocracia. Até hoje, segundo reportagem do jornal Estado de S. Paulo, apenas duas firmas exportadoras conseguiram ter acesso mais rápido aos seus créditos tributários. As outras demais continuam ainda tentando se viabilizar para ter esses créditos a seu alcance.

            Ora, temos mais de 18 mil exportadores. Mais de 4 mil empresas tentaram se cadastrar para usufruir do novo sistema, mas apenas 90 tiveram seus cadastros validados - e dessas, apenas aquelas 2 conseguiram a restituição mais rápida dos seus créditos. O gargalo, portanto, é excessivamente estreito, o que sugere que mudanças devem ser feitas para a implantação da medida.

            Não podemos deixar 10 bilhões de reais de crédito tributário dos exportadores parados nos cofres da União, e 20 bilhões, nos cofres dos Estados brasileiros.

            Talvez, Sr. Presidente, o Governo precise rever as exigências, que são fortes demais. É preciso realmente simplificar. Ao lado de exigências razoáveis, pede-se também que a empresa exporte mais de 30% do seu faturamento. O Governo poderia, também, viabilizar, com maior celeridade, a devolução do dinheiro para empresas que não vendem o suficiente no mercado interno para compensar todos os créditos.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos agora nas últimas semanas do Governo Lula - um Governo que, sem sombra de dúvida, deixou uma marca definitiva na história deste País. Faço votos de que o próximo Governo, que se iniciará com o novo ano sob o comando da Presidenta Dilma Rousseff, dê continuidade ao trabalho que foi realizado ao longo dos últimos oito anos e se esforce para retomar os projetos inacabados ou ainda não plenamente implementados, como esse pacote de medidas de estímulo aos exportadores, que não se concretizou, como esperávamos, e que é preciso que se concretize.

            Aumentar as exportações é um objetivo estratégico de suma importância. Certamente, conseguir isso depende de fatores muitas vezes fora de nosso alcance, fatores que dependem de acertos e entendimentos internacionais, sempre muito difíceis de conseguir nesse domínio comercial, dado o estado de permanente competição que vige entre os interesses em jogo. Cabe a nós, sem hesitação, fazer o que for necessário para garantir a competitividade de nossos exportadores.

            Tenho certeza de que o próximo Governo terá uma especial sensibilidade para essa questão, assim como também para a questão da tributação em geral. De minha parte, quero dizer que estarei atento a esses dois pontos e que já estudo a possibilidade de apresentar oportunamente, no início da próxima legislatura, projetos de lei no sentido de aperfeiçoar e aprofundar esse conjunto de medidas, de modo a torná-las mais eficazes e, portanto, de modo a garantir que atinjam o seu objetivo, que é estimular as exportações brasileiras, estimular as exportações não apenas de matéria-prima, mas principalmente de produtos manufaturados - esse é o grande objetivo nosso -, gerando não apenas renda, mas gerando mais emprego para os brasileiros.

            Tenho certeza de que é muito mais importante para o Brasil gerar mais empregos do que ter despesas com o salário-desemprego.

            Espero que, a partir de fevereiro, quando se inicia uma nova etapa de trabalhos no Congresso Nacional, possa discutir esses dois assuntos, que estão relacionados entre si, e encontrar rapidamente as soluções exigidas pela sociedade brasileira.

            Esse é um tema, Sr. Presidente, da maior importância para o nosso País. O Brasil precisa debater, precisa discutir a questão da carga tributária brasileira.

            Volto a colocar: é muito mais importante nós reduzirmos o custo do salário do que aumentarmos o seguro-desemprego em nosso País. Esse é o desafio do próximo Governo. O próximo Governo, junto conosco, aqui no Senado, e junto com os Deputados na Câmara Federal, precisamos trazer esse tema à discussão.

            Quero aqui, mais uma vez, me colocar à disposição dos meus colegas, à disposição do Governo Federal, à disposição da nossa Presidente Dilma Rousseff, para que possamos debater, discutir com a sociedade essa reforma tão importante para todos nós, brasileiros, que é a reforma tributária.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/12/2010 - Página 60588