Discurso durante a 217ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao modo como se dá a tramitação do Orçamento pelo Congresso Nacional, o seu descumprimento pelo Poder Executivo e os prejuízos que tais ações acarretam para o Brasil.

Autor
Heráclito Fortes (DEM - Democratas/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • Críticas ao modo como se dá a tramitação do Orçamento pelo Congresso Nacional, o seu descumprimento pelo Poder Executivo e os prejuízos que tais ações acarretam para o Brasil.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 23/12/2010 - Página 60955
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • OPORTUNIDADE, ENCERRAMENTO, DISCUSSÃO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI ORÇAMENTARIA, CONCLUSÃO, SESSÃO LEGISLATIVA, QUESTIONAMENTO, TRAMITAÇÃO, INEXATIDÃO, NUMERO, PRESENÇA, SENADOR, REGISTRO, IMPASSE, CONGRESSO NACIONAL, MOTIVO, DESCUMPRIMENTO, EXECUTIVO, COMPROMISSO, EXECUÇÃO, ORÇAMENTO.
  • COBRANÇA, PRIORIDADE, IMPLANTAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, BRASIL, COMBATE, CORRUPÇÃO, MANIPULAÇÃO, NATUREZA POLITICA, LIBERAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, DESRESPEITO, LEGISLATIVO, DENUNCIA, ATENDIMENTO, INTERESSE ECONOMICO, EMPREITEIRO.
  • PROTESTO, IRREGULARIDADE, SUPERIORIDADE, EMENDA, ORÇAMENTO, MINISTERIO DO TURISMO, COBRANÇA, AMPLIAÇÃO, RECURSOS, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), REPUDIO, CONTINUAÇÃO, LONGO PRAZO, CORRUPÇÃO, COMISSÃO MISTA, LOBBY, INTERESSE PARTICULAR.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos aqui, às 17 horas e 38 minutos, marcando tempo enquanto se discute, na Câmara dos Deputados, os minutos finais do Orçamento da União para o presente exercício.

            Senador Cristovam Buarque, o que se está vendo aqui, no último momento da sessão legislativa, e a Nação toda está a assistir, é exatamente a maneira desorganizada e leviana com que se trata o Orçamento de um País como o nosso.

            A discussão e os impasses perduram na Câmara, porque se parte do primeiro ponto: o Governo não honra aquilo que assume, ano após ano, no que diz respeito ao cumprimento dessa peça mais importante da atividade legislativa que é o Orçamento.

            É inaceitável que o Brasil não tenha tido ainda a coragem de implantar um Orçamento impositivo, em que o aprovado obrigatoriamente tenha de ser pago. Vive-se o ano inteiro nesse verdadeiro clube da falsa felicidade, dando-se possibilidade à produção de atos de corrupção no Orçamento. Não é fato estranho nem é fato novo. Nós temos na história recente vários episódios que têm início marcante no famoso caso dos anões e que, ano a ano, vêm se repetindo.

            No Brasil não se faz Orçamento para a Nação nem para a prioridade; faz-se para atender empreiteiras ou faz-se para atender interesses não muito claros, às vezes. A briga lá está, ora envolvendo somente os do Governo, ora envolvendo Governo e Oposição. Mas o fato é um só: o Ministro que manipula as verbas do Orçamento e que é o representante político do Executivo na relação com o Congresso usa e abusa dessa manipulação para atender os seus compromissos políticos, desmoralizando o que esta Casa aprova e o que esta Casa vota.

            Eu imagino a partir do ano que vem o que será feito, Senador Cristovam, com essa maioria avassaladora no Congresso por parte do Governo.

            Seria melhor que se rasgasse este processo atual de discussão e votação, porque é uma peça de ficção, Senador Marco Maciel. E nós somos responsáveis por isso, porque nós não exigimos o cumprimento do Regimento que juramos preservar. A ficção começa exatamente na presença dos Parlamentares nesta Casa. Nós estamos aqui com um painel há quatro ou cinco dias acusando o número de 74 Senadores. Eu desafio a imprensa, eu desafio o Governo a mostrar 10% desses Parlamentares na Casa ou pelo menos em Brasília, até porque nós estamos à beira de uma greve no setor aéreo. E todo mundo, desejando voltar para sua casa, para estar com a família no período natalino, abandonam Brasília e deixam-na a Deus dará. Essa votação não passa de um “arrumadinho”, não passa de um “ajeita”, em que, para que se chegue a um consenso, é preciso que o responsável pelas questões orçamentárias, o Parlamentar responsável pela parte do Governo assuma compromissos que ele mesmo não sabe se vai cumprir.

            Esse Orçamento é desmoralizante. Aí, vê-se uma corrida para emendas, por exemplo, para o Ministério do Turismo. E parte-se do pressuposto de que é exatamente para melhorar o fluxo turístico e a infraestrutura turística no Brasil. Mas, na realidade, é para a realização de carnaval fora de época, de micaretas e de eventos de pouca explicação.

            Nós estamos aqui neste plenário com o futuro Ministro da Ciência e da Tecnologia. Essa é uma das áreas em que o Brasil precisa investir para continuar crescendo, e tinha de ser uma prioridade. Vamos ver o que esse Ministério vai ter no ano que vem, Senador Mercadante.

            Se nós queremos ser grandes, se nós queremos ser integrantes do Bric, precisamos investir na pesquisa, investir na ciência e na tecnologia. Não é possível e não é aceitável que esses recursos sejam repassados para eventos que não têm nenhum futuro para o Brasil, que se vão na noite, nos tamborins e nos abadás.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, anteontem tivemos aqui um protesto, oportuno ou não, de um bispo que se negou a receber, embora aqui estivesse presente, estivesse sido convidado para tal, estivesse aqui com esse objetivo, se negou a receber uma homenagem concedida pela Casa, que tinha como nome “Dom Hélder Câmara”.

            Gostaria que os protestos do senhor bispo não fossem somente pelo aumento dos Parlamentares, porque esse é o menor crime e o menor erro que o Parlamento comete, até porque as informações que chegaram a ele não são as informações mais corretas. Este Parlamento não reformulou e não corrigiu os salários nos últimos quatros anos. É melhor se votar e dar o salário digno e fiscalizar os Parlamentares que usam os penduricalhos, inclusive os orçamentários, para melhorar a sua vida do que criticar o salário em si. Mas seria bom que os representantes da Igreja também protestassem contra os desvios que se fazem no Orçamento. Que protestassem quando o rolo compressor do governo não permite que as CPIs, como a das ONGs, funcionem e que esse estado de corrupção continue montado de maneira forte no Estado brasileiro.

            Estamos vendo aqui, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um final de legislatura triste. Todos esperando o tocar das campainhas do Congresso Nacional para que, por meio de acordos, se cumpra uma votação que é simbólica e sem número regimental e que precisará, Senador Cristovam, da conivência e do silêncio de V. Exª, que precisará da conivência e do silêncio meu, do silêncio do Senador Marco Maciel, do Senador Botelho, do Senador Mercadante, do Senador Acir, do Senador Mão Santa, porque nós vamos votar algo que nós sabemos, Senador Mozarildo Cavalcanti, que será uma agressão à lei, logo nós desta Casa que somos o seu guardião. Esse Orçamento será votado com a fictícia presença de 74 Senadores, mas, na verdade, não passa de uma ilusão.

            Senador Mão Santa, com o maior prazer.

            O Sr. Mão Santa (PSC - PI) - Senador Heráclito Fortes, quis Deus estar presente o Senador Mercadante. Senador Mercadante, Senador Mercadante, um minuto de atenção. V. Exª é um homem de bem. Eu quero dizer isso depois de oito anos. Eu o conhecia de nome. Eu quero ver V. Exª até Presidente da República. V. Exª vem de uma família honrada, de general, constituída, professor de Economia e tudo. Olha, merece ser Ministro. Confiamos. Se esse aqui é o maior problema... Agora, tudo o que o Heráclito está dizendo me enche de orgulho. Tudo! Tudo é verdade. O Cristo disse: “em verdade, em verdade, eu vos digo”. Eu sou verdade. Olha, atentai bem, maior imoralidade. O Luiz Inácio teve um acerto: quando ele passou naquela Câmara e disse que havia 300 picaretas. Se ele vier hoje... Eu acho que há mais, porque aquilo é uma farsa. Mercadante, isso que ele diz do turismo é a verdade. Não é do seu Partido, não. Mas existe um mocinho lá do Rio Grande do Norte - e Deus fez a beleza do turismo de lá - que inventou um negócio de Carnaval fora de época, mandou uma malandra, pagou as passagens, fez para incrementar o turismo - e Deus é que fez Natal bonito -, e todo o País soube; ele deu passagem... Aí a Câmara Federal... Mercadante, V. Exª não pertence a isso. V. Exª pertence ao País. Então, todo o País soube que ele deu dezenas de fachadas aí e passagem. Aí, a Câmara Federal, para não punir o Deputado - e não puniu... Deviam enforcá-lo, cassá-lo, suspender... Sabe o que ele fez, Marco Maciel, para dar satisfação? Impediu que nós, Senadores, tivéssemos a companhia de nossa mulher numa viagem necessária. Olha, tem sido difícil. O Papaléo, nunca mais eu vi a mulher dele, porque, em uma passagem lá do Amapá para cá, vai todo o ordenado. E o gaiato do Rio Grande do Norte, que é amigo do Sr. Michel Temer, fez essa escola e entrou no Piauí, que é amigo do bonitinho lá do Piauí, que fez a indústria mais imoral: Carnaval fora de época. Isso está aí em todos os jornais denunciado. Está aí: só para o Piauí, 15 milhões. Mercadante, um minutinho. V. Exª soube que se arrombou um açude em Cocal. Nós pedimos uma medida provisória. Prometeram dinheiro e nada. E as vítimas sofrendo, perderam as casas, as fazendas, o sustento, mas nada de apoio, e fizeram um Carnaval fora de época antes da eleição. Olha aí, com um dinheiro... E sabe como é, Mercadante? Ô, Mercadante, V. Exª é responsável! Mercadante, contratam, dão dinheiro para o Prefeito, e a cidade em calamidade, 400 mil, 500 mil, contratam esses artistas fabulosos, Chiclete com Banana e outros, e aí mandam um empresário vender os abadás. Não é abadá, Cristovam? Então, com a miséria, com isso, transformando as cidades em Sodoma e Gomorra, uma irresponsabilidade. E os malandros ainda ganham dinheiro com a venda dos abadás. Se o dinheiro vai para a Prefeitura, se é público, não tinha que cobrar. No Piauí, foram 15 milhões. E agora, nesse orçamento, há uma imoralidade que é denunciada - está na Época -, “A Serra Vermelha”. Por que Marina Silva teve 20 milhões de votos? Porque eu fui lá, e ela impediu aquela malandragem. Uma empresa... Vão dar 150 milhões de indenização para pagar uma firma JB Carbon, que financiou e garantiu o caixa dois das vitórias que eles tiveram com a corrupção no Piauí. Está aí na revista Época. Então, Heráclito, minha solidariedade e meus aplausos por, até o último instante, V. Exª trazer a esta tribuna a verdade. E é uma vergonha! Focalize a imprensa aí. Setenta e quatro?! Isso é uma farsa! Ó, farsista! Aumentou o número dos 300 picaretas. Aqui não há sete Senadores do PT; embora seja um homem de vergonha e de senso, só está aqui o Mercadante, do Partido dos Trabalhadores, do Governador. Tudo é mentira, é uma farsa! O Luiz Inácio acertou quando passou na Câmara Federal e disse que era uma Casa de 300 picaretas.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

            Meu caro Senador Aloizio Mercadante, essa questão não é individualizada. Nós, individualmente, não temos nenhuma responsabilidade sobre os erros cometidos na peça orçamentária. Esse é um vício histórico que vem de muito tempo, mas é preciso coragem para corrigi-lo. Nós não podemos acusar, não podemos colocar sob suspeita, individualmente, ninguém. Nós temos uma estrutura de funcionamento nesta Casa que nos obriga a aceitar, por exemplo, acordos como esse que parece que vem chegando aí. Pelas circunstâncias, pela data, pela pressão, a formatação dessa peça orçamentária é que precisa ser mudada.

            Fique certo V. Exª de que vou representar, como Líder, o Partido no Orçamento. Se houver a menor possibilidade que seja de aumento das dotações orçamentárias para a área que V. Exª vai ocupar, tem, de antemão, a minha solidariedade. As divergências políticas que nos separam não nos separam dos interesses do País. E é um absurdo que o Brasil não tenha tido uma atenção orçamentária maior com esse Ministério que V. Exª vai assumir. Mas quero dizer que, em parte, a culpa pertence aos ocupantes recentes, porque não tiveram a capacidade de diálogo, porque não vieram a esta Casa para dialogar e para mostrar, e é o que acho que não faltará a V. Exª, por ter vivência nas duas Casas durante longos anos.

            O Presidente Lula anunciou, no seu primeiro ano de Governo, que colocaria, em todas as escolas brasileiras, computadores a preço acessível aos estudantes pobres. Imagine, se tivesse conseguido - com o desperdício, com o desvio -, essa geração nova, que é vocacionada a essa tecnologia moderna, o que nós teríamos ganho em competitividade? É o que nós precisamos, se realmente nós queremos ser Bric. Porque, se formos ver os outros Países, a Índia e a China estão investindo maciçamente nesta área; a Coreia do Sul avançou, nos últimos anos, porque deu prioridade exatamente a esse setor.

            A questão não é essa. A questão é que não é possível dar prioridade... E agora mesmo se vê inflarem-se os orçamentos, Senador Cristovam, do Ministério do Turismo e do Ministério da Cultura. Mas pensam V. Exªs que o do Ministério da Cultura é para comprar livros ou para pesquisar? Não é, não; é para festa. E, se nós examinarmos a fundo, vamos ver que há, inclusive, a digital de funcionários do Ministério do Turismo, que são os organizadores dessas micaretas.

            No Senado, meu caro Senador Augusto Botelho, o partido mais forte, o partido mais unido, o partido majoritário não é o PT, não é o PMDB; é o “Partido do Orçamento”, que se reúne nas caladas da noite e cujo acesso é conferido a poucos. E nós, às vezes, somos obrigados a engolir, goela abaixo, o que vem por aí.

            Senador Cristovam, ouço V. Exª com o maior prazer.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Heráclito, é uma pena que seu discurso esteja ocorrendo faltando poucas horas para terminar não só o ano, mas a própria Legislatura. Nós não debatemos aqui o nosso papel de Congressistas na elaboração, na participação, na aprovação do Orçamento da União. Essa é uma omissão que, um dia, vão nos cobrar fortemente na história. Quando eu digo nós, eu me incluo plenamente. Nós somos omissos na maneira como o Orçamento tramita nesta Casa. Aí está a chave do futuro do País, aí está a chave da ética. Todo mundo fala em corrupção no comportamento dos políticos; esquece-se a corrupção nas prioridades das políticas. Tão grave quanto o político que põe dinheiro no bolso, somos nós que aprovamos projetos que não vão para o bolso de ninguém, mas cujos recursos vão para obras desnecessárias, para finalidades distintas daquelas que servem para construir o futuro do País. Nós somos coniventes, porque ficamos na posição mais cômoda de não influir. De fato, da maneira como hoje é feito o Orçamento, da maneira como hoje funciona a Comissão de Orçamento, é quase impossível ajudar, é quase impossível participar. Terminamos ficando omissos para não sermos coniventes com a maneira como ele é feito; terminamos ficando omissos para não assinarmos embaixo de gastos desnecessários ou de gastos cujas prioridades não são aquelas sintonizadas com as reais exigências do futuro do País. Lamento que estejamos discutindo isso neste último momento, mas, felizmente, pelo menos no encerramento deste ano e desta Legislatura, este assunto voltou. Quem sabe se não conseguimos trazer isto entre tantas outras coisas fundamentais que jogamos para diante, para diante, para diante? Ao invés de discutir o futuro, discutimos o passado. Preocupam-me muito as notícias de que - mesmo como Senador, talvez por omissão, termino sem saber se esses números são verdadeiros - estejam reduzindo gastos, despesas, investimentos na educação de base e na ciência e na tecnologia, as duas pernas fundamentais da construção do futuro, ao lado da infraestrutura obviamente. Nós terminamos fazendo o Orçamento descomprometido com o futuro do País e com o falso aval do Congresso, porque não mergulhamos nele, não trabalhamos nele. Eu assumo a sua crítica a todos nós da omissão que temos tido em relação ao Orçamento.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - O erro é coletivo.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - É coletivo, mas nenhum de nós pode dizer que está fora disso. E eu quero dizer que quem quiser fazer revolução hoje deve ser na Comissão de Orçamento do Congresso. Houve um tempo em que a revolução era tomar o capital dos capitalistas. Não é mais isso. Não há problema em o capital estar nas mãos dos capitalistas; ao contrário, funciona até melhor. É na distribuição dos recursos públicos do Orçamento - primeiro a definição de quanto vai para o Orçamento e quanto fica nas mãos das pessoas - e como é gasto esse recurso, que está a revolução. Eu costumo dizer, Senador Acir, que, se Che Guevara estivesse vivo, ele não subiria a Sierra Maestra; ele viria debater o Orçamento na Comissão de Orçamento. É aí que está a possibilidade de mudar, mas nós abandonamos isso, porque é tão disfuncional a maneira como o Orçamento passa aqui que eu, pelo menos, considero perda de tempo participar dessas Comissões. Lamento muito! Só em um ano aceitei fazer parte dele e, imediatamente depois, fiquei de fora, apesar de saber que é lá que deveria estar o centro de quem quiser, por exemplo, mudar a educação, de quem quiser mudar a saúde. Então, lamento dizer que concordo com o seu puxão de orelha em todos nós. Lamento que seja no final e, sinceramente, espero que, no próximo ano, ninguém tenha que fazer esse discurso aqui. Lamento muito, mas agradeço ao senhor que tenha puxado a orelha. Quem sabe um de nós - ou eu próprio - não agarre de volta este seu discurso das últimas horas e traga de volta a tentativa de saber como influir na elaboração para fazermos um Orçamento democrático e comprometido com o futuro!?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Concordo com V. Exª e agradeço o seu aparte.

            Acho que chegou o momento de se começar a trabalhar essa peça orçamentária, tendo como prioridade os interesses do País.

            Senador Mercadante foi testemunha ocular, como eu fui também, de episódios muito tristes que esta Casa viveu, como o escândalo do Orçamento. Notei que, a partir daí, tanto ele como eu e os homens sérios que viveram aquele episódio fugimos de participar do Orçamento, não sei se por ato de covardia ou se por um ato de preservação. Mas, se examinarmos, meu caro Senador, vamos ver que muito pouca coisa mudou de lá para cá. Os lobistas são os mesmos; as pessoas envolvidas, as mesmas, e os interesses pequenos e menores são os mesmos.

            Mas, Senador Cristovam, eu hoje vinha para cá, da minha casa, lembrando-me um pouco daquele discurso de despedida que fiz ontem e lembrando-me do seu aparte; um aparte que me tocou, que me comoveu. E eu pensando cá com os meus botões: “Será que o Senador Cristovam Buarque ficou feliz quando eu, em determinado momento, disse que ele era o Senador de uma nota só, que era o Senador da educação?”. Logo a seguir, vi que V. Exª não foi um Senador de uma nota só; pelo menos de duas notas.

            Talvez nem V. Exª valorize a obra mais importante que realizou como Governador do Distrito Federal e como exemplo para o Brasil. E hoje constatei. Isso serve para a discussão que estamos tendo aqui agora. Tudo é uma questão de educação, tudo é uma questão de autoridade, tudo é uma questão de cumprir lei.

            Eu vinha no trânsito violento de Brasília, um trânsito violento não por haver desastres, porque, por esse aspecto, ainda temos a felicidade de não ver isso, mas pelo pique, pelo horário, e via, Senador Cristovam, vários anos depois de V. Exª deixar o Governo do Distrito Federal, as pessoas obedecendo religiosamente a uma prática implantada aqui por V. Exª, de se respeitar o pedestre. Isto é comovente: como motoristas, muitas vezes de poucas letras, de pouca instrução respeitam um ato que é um ato de cidadania e que não custou nenhuma fortuna, a não ser uma pequena campanha educativa que ainda hoje é seguida.

            E digo que, infelizmente, não vou ter mais a oportunidade de me redimir com o Senador Cristovam e dizer que, pelo menos, de duas notas ele é um Senador.

            Essa é uma obra dignificante, que não agrada as empreiteiras, que não agrada porque não envolve milhões, não envolve fortunas, mas que ficou incutido na consciência da sociedade, mas, infelizmente, o Governo Federal não incutiu isso pelo Brasil afora.

            Aliás, o brasileiro gosta de seguir os bons exemplos. Ele é obediente à lei. É só mostrar-lhe, com argumento e com razão, que ele vai e segue. Não conheço no Brasil nenhum exemplo melhor do que esse.

            Se tivermos a capacidade de mostrar que o Orçamento não é para ser usado como está e que os desperdícios do Orçamento custam a todos nós brasileiros, porque atrasamos de uma maneira muito consequente nosso próprio desenvolvimento quando deixamos de investir em educação e em segurança... Esse exemplo agora do Rio é outro. O Rio de Janeiro, de repente, começou a se moldar para viver essa nova fase em que a recuperação - e o direito de ir e vir - de uma região degradada pela violência começa a fazer efeito.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, agradeço esta oportunidade, mas não poderia deixar de fazer este registro. É um registro que faço envergonhado por ter passado por esta Casa durante 28 anos e não ter tido forças, não ter visto nenhum avanço para melhorar a aprovação do Orçamento. Repito: nós estamos com o painel acusando 74 Srs. Senadores. Há quatro dias, pelo menos, o painel é mantido. Senador Cristovam, não temos 10% dos companheiros aqui. Essa é a maior prova de que o Orçamento do Brasil é uma ficção, porque nós vamos rasgar o Regimento aprovando bilhões que não sabemos sequer como serão usados. Não sabemos sequer se serão usados, porque o Governo se investe de um poder tirânico e o direciona apenas aos projetos que lhe interessam - e muitas vezes não de interesse do Brasil, mas de interesses eleitoreiros ou interesses inconfessáveis.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/12/2010 - Página 60955