Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa de uma reforma tributária urgente e de uma reforma política gradual, priorizando-se, para esta, formas efetivas de coibir o abuso do poder político e econômico e o uso da máquina administrativa, bem como criar mecanismos de fiscalização no processo eleitoral.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA. REFORMA POLITICA.:
  • Defesa de uma reforma tributária urgente e de uma reforma política gradual, priorizando-se, para esta, formas efetivas de coibir o abuso do poder político e econômico e o uso da máquina administrativa, bem como criar mecanismos de fiscalização no processo eleitoral.
Publicação
Publicação no DSF de 08/02/2011 - Página 1616
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA. REFORMA POLITICA.
Indexação
  • RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, IMPLANTAÇÃO, REFORMA POLITICA, DEFESA, URGENCIA, REALIZAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, GARANTIA, CONTINUAÇÃO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.
  • NECESSIDADE, SETOR PUBLICO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, CRITICA, GOVERNADOR, ESTADO DE RORAIMA (RR), CORRUPÇÃO, CAMPANHA, REELEIÇÃO, ABUSO, PODER ECONOMICO, COMENTARIO, INVESTIGAÇÃO, POLICIA FEDERAL, ANALISE, EVOLUÇÃO, POLITICA NACIONAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Acir, que preside a sessão neste momento, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, senhores telespectadores da TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, tenho o prazer de ocupar esta tribuna nesta tarde de segunda-feira, dia 7, para abordar um tema que, vamos dizer, tem sido destacado, enfatizado, tanto pela Presidente Dilma, que assumiu e veio ao Congresso ler sua Mensagem, como por todos os políticos que se têm pronunciado. A imprensa, de modo geral, tem abordado muito este tema, da necessidade da reforma política, conquanto eu entenda que a reforma política não é a mais urgente reforma que nós devemos fazer. Entendo que a reforma tributária, a reforma que vai justamente eliminar alguns e baixar outros impostos, é a mais urgente.

            A carga de impostos no Brasil é muito alta, uma das maiores do mundo, e isso impede não só o desenvolvimento do País, como também inibe a maior geração de empregos, já que as empresas, tendo de pagar mais impostos, contratam menos funcionários, menos empregados.

            Mas não há dúvida de que a reforma política ocupa um lugar de destaque nessa questão das reformas, porque se comentam, se denunciam as mazelas, digamos assim, da atividade política no País, como se o problema estivesse nas pessoas, somente nas pessoas. Está nas pessoas também, mas não está somente naquelas que disputam ou exercem cargos políticos mediante eleição, sejam elas vereador, prefeito, deputado estadual, governador, parlamentares federais, deputados e senadores, ou o próprio Presidente da República.

            Muitos questionam vários aspectos da legislação atual. Eu diria que nós estamos evoluindo há algum tempo nessa questão. Lembro-me da minha primeira eleição, em 1982, quando o grande charme de uma campanha política era a distribuição de camisetas. Era uma dureza. Quem tinha dinheiro, quem podia, comprava milhares, milhões de camisetas para distribuir; quem não tinha, às vezes, mal comprava para sua equipe de trabalho. Isso gerava uma desigualdade terrível, porque, por onde se andava via-se alguém com a camiseta de um candidato, com número etc. Isso foi proibido pela legislação eleitoral. Um grande avanço, porque igualou, botou no mesmo patamar todos os candidatos, os que podiam e os que não podiam comprar camisetas.

            Proibiram também brindes outros. E showmícios. Foi outro grande passo, porque os candidatos ricos promoviam verdadeiros shows para encaixar neles pedaços de comício e, com isso, portanto, amealhar a atenção do eleitor, que dificilmente saía de sua casa para ir somente ouvir discurso e propostas de trabalho de algum candidato. Com a eliminação dos showmícios, também demos um passo forte para igualar todos os candidatos num ponto só.

            A aprovação recente da Lei da Ficha Limpa também foi um grande passo, conquanto tenha sido aprovada muito em cima da eleição. Gerou até uma insegurança jurídica, porque não se sabia quem ela atingia ou não atingia; se ela valia dali para a frente ou desde o momento em que foi aprovada. Tanto que isso ainda não foi dirimido no Supremo. Espera-se que o Supremo Tribunal Federal, dentro em breve, decida essa questão. O certo é que, de qualquer forma, essa lei já vale para a próxima eleição, para as eleições municipais de 2012. Então, foi um avanço também.

            Estamos avançando, portanto, passo a passo. É preciso que essa reforma política seja dividida de acordo com o grau de urgência das medidas. Por exemplo, discute-se já a questão do voto proporcional, voto distrital puro, voto distrital misto, voto em lista fechada. Para mim, esses são planos muito mais complexos que poderíamos trabalhar, dizendo - até usam este termo - que vamos fazer uma reforma fatiada; isto é, vamos ver o que é mais urgente e aprovar logo, vamos ver o que é menos urgente e aprovar em seguida.

            E, de preferência, como disseram vários Senadores aqui, aprovar uma reforma política para valer, de 2014 para frente, porque aí não se mexe com muitos interesses. Sei que isso é muito difícil - eu tenho repetido isso -, mas, se não aprovarmos alguma reforma política neste ano de 2011, dificilmente aprovaremos no ano que vem, que é um ano eleitoral - mesmo sendo eleições municipais, para vereadores e prefeitos -, e, mais difícil, em 2013, véspera das eleições gerais no Brasil.

            Então, é preciso definir o que é urgente para fazermos agora. Eu poderia dizer, com a experiência que já tenho de campanha política - dessa campanha, por exemplo -, que o fundamental é encontrar formas mais efetivas de coibir o abuso do poder político e econômico.

            Por exemplo, um governador que disputa sua reeleição no cargo exerce um poder muito grande: o uso da máquina administrativa. Infelizmente, usam e abusam desse poder político de comandar essa máquina administrativa nos Estados, e isso contamina, de forma perniciosa, a livre manifestação - até mesmo das pessoas mais simples, calculem daquelas pessoas que estão ali, funcionários públicos e, principalmente, funcionários terceirizados, que geralmente são ameaçados de perder os seus empregos se o governador que está exercendo o mandato perder!

            Então, é preciso definir: vamos permitir que, agora em 2012, prefeitos que vão para a reeleição fiquem no cargo durante todo o processo eleitoral ou eles terão que se desincompatibilizar alguns meses antes? Não sei se três meses, se seis meses, se quatro meses, mas essa é uma tese que defendo. Digo isso porque, lá em Roraima, o governador - que estava no cargo porque o titular havia morrido - usou e abusou, de todas as formas, da máquina administrativa para se reeleger.

            Então, é de pensar: isso aí realmente permite uma disputa igual? Por mais que se diga: “Ah, mas se, nas eleições de 2012, o governador ou, no caso, o prefeito sair, o substituto dele vai trabalhar para ele”. Em tese, sim, mas não é a mesma coisa de ele estar com a caneta na mão, nomeando, demitindo, comprando, deixando de comprar, pagando, deixando de pagar.

            Então, é realmente importante pensar nisso. Acho que é fundamental - não que se acabe com a reeleição, sou favorável à reeleição - que não se permita que o candidato possa, no cargo, disputar sua reeleição.

            A mesma coisa é a questão do poder econômico. É lógico que não somos tão inocentes a ponto de pensar que, qualquer que seja a regra que estabeleçamos, por mais rígida que seja, ela evitará que os desonestos usem de desonestidade para ter caixa dois, caixa três ou caixa quatro. Mas, pelo menos, é preciso que se discuta o financiamento público de campanha. Eu já ouvi pessoas dizerem: “Se nós formos mudar para o financiamento público de campanha, o povo vai pagar para que haja candidaturas?”. O pior é que o povo está pagando, Senador Acir, e pagando duplamente. Por quê? O que acontece? De onde sai o dinheiro que as empresas doam para financiar candidatos? Em sua grande maioria, sai de obras superfaturadas, de compras superfaturadas; portanto, às custas do dinheiro de todo mundo que paga imposto, do povo em geral.

            Então, sou favorável a que encontremos uma fórmula de financiamento público de campanha - pode ser uma fórmula mista -, mas que se regulamente. Repito, não tenho a ilusão de pensar que vamos acabar com essas colaborações desonestas, porque isso depende da pessoa humana e, se há um cara desonesto, ele vai encontrar uma forma de fazer isso. Como ocorreu no meu Estado. O abuso do dinheiro foi visível. Foi, inclusive, fotografado e filmado candidato - ou o emissário de candidato - jogando R$100 mil pela janela do carro quando perseguido pela Polícia Federal. Isso foi só uma amostra grátis. Mas a imprensa brasileira noticiou que, no primeiro turno, a Polícia Federal conseguiu apreender R$4 milhões no Brasil todo. Só no meu Estado, foram apreendidos R$ 2,5 milhões. Quer dizer, o menor colégio eleitoral do Brasil foi onde houve mais apreensões de dinheiro no primeiro turno. Então, não precisa nem ser muito inteligente para concluir que o abuso do poder do dinheiro lá foi terrível.

            Nós precisamos, nessa reforma, abordar esses pontos urgentes. Já neste ano, precisamos definir essa posição, até porque o Presidente Sarney está constituindo uma comissão que vai priorizar a reforma política para que, neste semestre ainda, possamos ter um projeto elaborado, aproveitando os projetos que já estão em andamento na Câmara e no Senado. De forma que se possa, de fato, acabar com essa lenga-lenga de só se falar em reforma política - todo mundo fala, todo mundo fala, e ninguém faz. Por que ninguém faz? É porque os Deputados não querem, é porque os Senadores não querem, é porque o Presidente da República - agora, a Presidente da República - não quer? Todos dizem que querem. Então, aproveitemos e façamos um grande mutirão para fazer agora, neste semestre ou neste ano, essa reforma.

            Outro ponto importante dessa reforma da legislação eleitoral é aumentar os mecanismos de fiscalização. Não adianta apenas dizer: “É proibido fazer isso”. Se não houver formas de fiscalizar e coibir os atos ilícitos, não tem jeito. O que acontece numa eleição? A Polícia Federal, por exemplo, no meu Estado, não tinha contingente, não tinha recursos humanos suficientes para fazer a fiscalização em todo o Estado. Embora seja um Estado com uma quantidade de eleitores pequena, Senador Gilvam, o eleitorado está pulverizado: no norte, no sul, no leste e no oeste, em pequenas comunidades, comunidades indígenas, comunidades ribeirinhas, no Sul do Estado. Então, não tinha como a Polícia Federal estar presente, com o número de pessoas que tinha, no Estado. Então, ficava uma na... até porque o poder estadual, que tem também os seus órgãos de inteligência, sabia como é que iria se deslocar a Polícia Federal, para um lado ou para o outro.

            São dois pontos que considero importantes: não permitir que a pessoa concorra a sua reeleição no cargo de governador, de prefeito ou de presidente da República; e, depois, a punição. O ausência de julgamento e de punição deixa o cidadão e a cidadã achando que não adianta, não adianta fiscalizar, não adianta flagrar, não adianta verificar que houve delito, porque não se julga. É verdade! Infelizmente, eu, que acredito muito na Justiça, que confio muito na Justiça, preciso admitir isto: por uma razão ou por outra, por falta de conclusão dos inquéritos na Polícia Federal e, portanto, da denúncia do Ministério Público Federal, ou pelos mecanismos de procrastinação que os advogados usam, os TREs não julgam. O governador assume ou reassume o seu mandato e ficam os processos pendentes de solução. E o governador - agora, já no exercício do seu mandato - começa a usar sua influência, o dinheiro e os cargos para, junto com uma boa banca de advogados, promover o retardamento e até a mudança dos julgamentos.

            Então, é preciso que analisemos até a composição dos Tribunais Regionais Eleitorais. Eu não tenho nada contra o fato de, por exemplo, a OAB indicar dois membros dos TREs - ou mais, proporcionalmente ao tamanho dos TREs -, mas essa escolha precisa ser melhor organizada. Não se pode pensar que se possa pegar um advogado, por mais ilustre que seja, e, de repente, transformá-lo em Juiz Eleitoral, componente do Tribunal Regional Eleitoral, portanto. E esse advogado, que tem uma banca de advogados na cidade, usa esse tempo que passa lá para, no mínimo, dar prestígio à sua banca de advocacia depois. No mínimo.

            É preciso que analisemos muito bem isso e que possamos aumentar o efetivo da Polícia Federal em todas as unidades da Federação. Não é possível continuar ouvindo, onde quer que se vá, essa reclamação da Polícia Federal de que não tem recursos humanos para fazer o trabalho normal. Eu até citei aqui, dias atrás, que, quando houve aquela operação para retirar as quatrocentas famílias da reserva indígena Raposa Serra do Sol, a Polícia Federal levou uma quantidade enorme de delegados e de policiais federais, que ocuparam o Estado todo. Ocorre que essa foi uma operação isolada, não estava havendo nada de tanto relevo em outros Estados. A eleição, porém, se dá em todos os Estados. Então, a Polícia Federal tem de estar mobilizada em todos os Estados, e aí não há gente suficiente para fiscalizar.

            Então, Senador Acir Gurgacz, queria deixar aqui, para reflexão... Faço este pronunciamento justamente para provocar, para que não deixemos... Vão passando os meses depois da eleição e nós vamos esquecendo essa questão e não fazemos a reforma política.

            Fico feliz que o Presidente Sarney tenha tomado a decisão de fazer uma comissão para que, de fato, façamos essa reforma política, porque, senão, vamos ficar nesta história: discursamos, fazemos propostas, mas não acontece nada, embora tenha ressaltado no início que, ao longo desta década, estamos evoluindo. Repito: proibimos o uso de camisetas, de brindes etc., de showmícios, aprovamos a Lei da Ficha Limpa, mas precisamos avançar mais. Inclusive, que a Justiça Eleitoral atue de maneira permanente, já que ela é permanente, na questão da educação do eleitor. Tem uma coisa que é fundamental: não adianta fazer a reforma política, mudar a lei, se o eleitor não estiver convencido de que ele é que fará a grande reforma política neste País; que o voto dele não pode ser vendido, negociado, e que ele não pode, de alguma forma, ser vítima da pressão de quem está no poder.

            Portanto, quero deixar estas observações aqui, pedindo aos meus pares, Senadores e Senadoras, que possamos nos concentrar, neste primeiro semestre, nestas reformas: a reforma política, a reforma tributária, quer dizer, aquela que vai rever a carga de impostos que a população paga. Mas também não poderia deixar de ressaltar, mesmo aqui, neste pronunciamento em que quero enfatizar a reforma política, a urgente necessidade de uma verdadeira reforma na saúde pública deste País.

            Muito obrigado, Senador Acir Gurgacz.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/02/2011 - Página 1616