Discurso durante a 13ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca da política de reajuste anual do salário mínimo; e outros assuntos.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), GOVERNO ESTADUAL.:
  • Considerações acerca da política de reajuste anual do salário mínimo; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 22/02/2011 - Página 4007
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • ELOGIO, TARSO GENRO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ATUAÇÃO, PROJETO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, POLITICA SOCIAL, JURISDIÇÃO, REGIÃO SUL.
  • ANALISE, REALIDADE, PLANO DE ASSISTENCIA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), CRITICA, CARENCIA, LEITO HOSPITALAR, LOTAÇÃO, HOSPITAL.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, DEBATE, SENADO, RELAÇÃO, REAJUSTE, SALARIO MINIMO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - É com alegria que volto à tribuna sob a Presidência de V. Exª.

            Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu não vou outra vez, como fiz na sexta, na quinta e na quarta-feira, falar hoje sobre o salário mínimo, mas quero dizer que tanto o Correio do Povo, do Rio Grande do Sul, quanto o Portal IG colocam hoje com clareza como estou vendo o debate da questão da política do salário mínimo.

            Resumo dizendo que não tenho nenhuma dúvida de que essa política de salário mínimo, Senadora Vanessa Grazziotin, ajudei a construir - se não me engano, V. Exª na época fez parte da Comissão Mista, viajamos o País e construímos a proposta da vinculação ao PIB como sugestão. Ali tínhamos colocado, lembro-me, o dobro do PIB. Claro, foi uma sugestão, e as centrais sindicais e o Presidente Lula construíram um grande entendimento, com o qual concordamos e assinamos embaixo, e a política salarial vigente é aquela quase do nosso sonho.

            Para aqueles que não conhecem o teor dessa política salarial, ela retirou o salário mínimo de US$70,00 no Governo Lula e elevou para US$322,00. Digamos que, no período da Presidenta Dilma, seja mantida, como quero que se mantenha, essa política salarial. Foi mais que quatro vezes em dólares. O valor do salário mínimo poderá chegar a US$1.200,00 durante o Governo da Presidenta Dilma.

            Por isso, o mais importante de tudo é reafirmar a política salarial da inflação mais o PIB, o que nos levará a ter, durante o Governo da Presidenta Dilma, o maior salário mínimo de toda a América Latina. Hoje, o nosso salário mínimo ainda fica em quarto ou quinto lugar, em termos de América Latina.

            Falo isso, Sr. Presidenta, só para ilustrar que esse debate vai continuar. A nossa bancada reúne-se amanhã, eu me reunirei com todas as centrais sindicais e confederações na terça-feira à tardinha e vamos caminhar para aquilo que entendemos seja o melhor para os trabalhadores, para os aposentados, para quem ganha o mínimo, para quem ganha mais que o salário mínimo.

            Mas, Srª Presidenta, como eu disse, eu não ia falar sobre salário mínimo e, no fim, já falei uns cinco minutos sobre ele. Quero falar um pouco hoje sobre o Governo do meu Estado, o Governo do Rio Grande do Sul, que é liderado pelo nosso Governador Tarso Genro.

            O Governador Tarso Genro, Srª Presidente, lá do Rio Grande do Sul, está fazendo uma grande administração: está agindo de fato como um timoneiro à frente de um grande projeto de desenvolvimento para o nosso Estado, cumprindo aquilo que nós pregamos. Nós, porque eu que estava junto com o Tarso - e aí, Senadora Vanessa, permita que eu me dirija a V. Exª, junto com Abgail -, caminhávamos juntos, rumo ao Senado, eu e ela éramos candidatos da Frente Popular.

            Quando caminhamos, tanto nós como Tarso, o Vice-Governador Beto Grill e toda a equipe, enfim, hoje secretários, assessores e servidores, estão fazendo aquilo com o que nós nos comprometemos, ou seja, “com o pé no barro” e muito trabalho.

            O nosso Governo no Rio Grande está alicerçado em sete pilares, que foram construídos com a participação de toda a sociedade nas caravanas, que, na época, o candidato a Governador fez o Governador Tarso Genro:

            1 - Desenvolvimento econômico, modernização inovação, capilaridade territorial, através de grandes, médias e pequenas empresas, junto com os trabalhadores, buscando o desenvolvimento, como também o trabalho permanente com a base produtiva lá instalada, com planos microrregionais, que eu entendo essenciais para o desenvolvimento;

            2 - Políticas sociais, que visem à inclusão no direito à segurança, qualificação do SUS, inclusão educacional e digital, como também articulação de políticas públicas com a União e com os Municípios, dando, assim, o estímulo às políticas sociais. Avançaremos, também, na capilarização do micro e pequeno financiamento nos territórios de desenvolvimento microrregional;

            3 - Democracia participativa: com sistema inovador de participação e controle social do Estado, transparência, participação direta presencial, virtual e através dos conselhos que estão sendo instalados;

            4 - Ação internacional: visando à União Européia e ao Mercosul, tendo o Rio Grande do Sul como centro propulsor de integração política, econômica, cultural e da participação cidadã;

            5 - Cultura política: requalificada, transitando do conflito para o debate de ideias. Valorização da esfera da política, dos partidos e também da atividade parlamentar. Democracia de intensidade, com a valorização dos movimentos sociais como fonte de energia para uma política sustentável. Antecipação dos conflitos, buscando a estabilidade e a tranquilidade para produzir;

            6 - Unidade político-programática: da unidade popular pelo Rio Grande, com tolerância e reciprocidade, coesão no comportamento político no Parlamento, a valorização dos secretários como representantes dos partidos que compõem a unidade popular;

            7 - Transversalidade: nas ações, projetos e programas orientados pelos eixos, que estabelecerão a hierarquia dos gastos de governo, dos convênios a serem firmados com a União, com os Municípios, com a iniciativa privada, assim como na contratação de homens e mulheres que sejam técnicos preparados para desenvolver o nosso projeto.

            Srª Presidenta, o Governador Tarso Genro esteve aqui, em Brasília, no último dia 10, quando se reuniu com a diretoria do Banco Mundial. Na pauta desse encontro, estava o empréstimo de US$400 milhões ao nosso Estado. Lembramos que o Rio Grande do Sul obteve um empréstimo de US$1,1 que, infelizmente, Srª Presidenta, na nossa avaliação, embora tenhamos votado favoravelmente pela importância da matéria, teve uma taxa de juros altíssima.

            O nosso Governador afirma que os recursos desse empréstimo serão empregados para desenvolver ações sociais, modernizar a gestão da máquina pública, resolver gargalos de infraestrutura e montar um sistema de controle dos chamados desastres naturais. Esses recursos podem, de fato, viabilizar uma série de iniciativas importantes em diversas áreas.

            Faço questão de registrar ainda que o Governo gaúcho apresentou, entre seus primeiros projetos à frente do Poder Executivo, uma propositura que institui a Política Estadual de Combate à Pobreza Extrema e também outra que institui o programa Casas da Solidariedade, que deverá fornecer os meios de hospedagem aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), que, por insuficiência de condições de serviços de saúde no seu domicílio ou em decorrência da complexidade de tratamento ou procedimento indicado, necessitam de atendimento específico em local diverso do seu domicílio. Também lembramos o projeto que cria o Fundo Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Altas Habilidades, Fundo da Pessoa com Deficiência, vinculado à Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos.

            Informo ainda, Srª Presidenta, que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vai financiar o Plano de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul, a reorganização da gestão da Companhia Rio-Grandense de Saneamento (Corsan) e a recapitalização da Nossa Caixa. Valor total desse empréstimo encaminhado pelo Governador Tarso Genro: R$1,3 bilhão. As medidas foram anunciadas recentemente pelo Presidente do BNDES, Luciano Coutinho, durante almoço de trabalho no Palácio Piratini, na última sexta-feira, com o Governador Tarso Genro e o secretariado gaúcho.

            Srª Presidenta, tenho certeza absoluta de que a parceria do Governo do Rio Grande do Sul e o Governo Federal tem tudo para dar certo e vai gerar bons frutos por muitos anos para o Rio Grande e para o Brasil. Portanto, o Governo Tarso Genro e a Presidenta Dilma Rousseff estão de parabéns.

            Srª Presidenta, permita-me ainda, dentro do tempo que tenho, fazer uma reflexão, na tribuna da Casa, sobre a questão da saúde. Já falei aqui, diversas vezes, Srª Presidenta Vanessa Grazziotin, sobre a importância do investimento maior na saúde.

            Retorno à tribuna para uma breve reflexão sobre o estado da saúde no Brasil. No final do ano, falei sobre o SUS. Hoje, no entanto, pretendo discorrer a respeito do regime ético, político e econômico que orienta na atualidade os planos de saúde no País, salientando, infelizmente, as suas inúmeras deficiências, irregularidades, distorções, abusos e - por que não dizer? - inoperâncias.

            Na verdade, vale esclarecer que o surgimento dos planos de saúde no Brasil e no mundo só faz sentido à medida que os Estados ditos neoliberais abdiquem do seu compromisso com o bem-estar físico e mental das populações. Enquanto o SUS tem como finalidade a garantia do acesso universal em todos os níveis de atenção, os serviços privados são financiados por meio de sistema de reembolso direto, que se traduz no pagamento direto aos prestadores privados na ocasião da utilização e pelo sistema de saúde suplementar. Por sua vez, o sistema de saúde suplementar é baseado na contratação privada de planos.

            Pois bem, em princípio, caberia ao SUS ocupar o espaço que hoje é destinado às prósperas máquinas de dinheiro em que se transformaram, infelizmente, grande parte dos planos de saúde. Repito, Srª Presidenta: não todos, mas grande parte dos planos de saúde. Para reverter os efeitos maléficos dessa herança, temos que, no mínimo, controlar os abusos da saúde privada, afinal de contas atualmente no Brasil praticamente um quarto da população está associada a algum tipo de plano. Isso se explica pelo fato de que, nos dias de hoje, os brasileiros com uma condição financeira melhor se obrigam a procurar os planos de saúde do sistema privado, em detrimento da saúde pública considerada numa situação difícil.

            Srª Presidenta, na perspectiva da classe média, hospitais superlotados, falta de medicamentos, greve de funcionários, aparelhos quebrados, filas para atendimento e prédios malconservados configuram os principais problemas identificados em hospitais e postos de saúde. Não por acaso, a população mais afetada é aquela que depende do atendimento médico diretamente; ou seja, os mais pobres ou mesmo a classe média.

            Diante de tal realidade, resta ao Estado regulamentar e vigiar a atuação das firmas ligadas ao setor, de modo a evitar que a comercialização da saúde não desumanize por inteiro o já dramático processo de interação entre pacientes, médicos e hospitais.

            A impressão que se tem pelos relatos colhidos em todo o País e que recebi é a de que vigora uma arbitrariedade fora dos padrões morais e normais no mercado dos planos de saúde, inviabilizando uma segurança sanitária decente aos brasileiros.

            Srª Presidenta, há poucos dias, um médico do Rio de Janeiro comentava, e a imprensa toda ficou sabendo, a que extremos da ética os profissionais da saúde chegaram no Brasil com o avanço dos planos privados. No caso dele, um paciente à beira da morte precisava com urgência de um medicamento caro. Consultada a operadora vinculada ao paciente, esta se negou a autorizar sob o argumento de que, para avaliação do pedido, precisava de dois dias úteis. “Ora, se fosse para esperar 48 horas numa situação de UTI, melhor seria procurar a funerária”, desabafou o médico. Ao seu alcance, o máximo que pode fazer se resumiu em sugerir à família do paciente que fosse acionar o Tribunal de Justiça para pressionar a operadora.

            Na opinião dele, cada vez mais os médicos dos hospitais brasileiros se veem presos aos impasses dolorosos similares, nos quais o dever da salvação de uma vida se choca com as burocracias “convenientemente” instaladas para maximizar os recursos das empresas nos planos de saúde.

            Eu mesmo, Sr. Presidente, posso citar dois exemplos bem próximos a mim. Um assessor meu possui um plano de saúde, eu diria, dos melhores ou muito bom. Apresentou um quadro de diverticulite e foi ao hospital. Fui visitá-lo. Embora ele tivesse, Senador Eurípedes, plano de saúde, encontrei-o nos corredores do hospital, numa maca, depois de três dias, sem que o plano de saúde respondesse. Disseram simplesmente que, pelo plano de saúde, não havia mais vaga e, assim, ele não tinha direito a um leito.

            A mãe de uma assessora do meu gabinete - e esses dois exemplos me levaram à pesquisa que faço e denuncio aqui no Senado - também possui um plano de saúde dos melhores. Ela paga o equivalente a R$1.500,00 e tem o plano há mais de 20 anos. Pois bem, ela precisou de uma internação e ficou no hospital por vários dias, sem diagnóstico. Ficou na enfermaria aguardando uma vaga no quarto e vaga para uma cirurgia. Vale salientar que essa senhora tem 74 anos e nem sequer pôde usar o Estatuto do Idoso, que é de nossa autoria e que foi aprovado na Casa.

            Tais relatos, Sr. Presidente Mozarildo Cavalcanti, que é médico, refletem com riqueza simbólica o quadro desenhado no mapa brasileiro. Segundo levantamento divulgado há bem pouco tempo pela Associação Médica Brasileira (AMB), nada menos do que 92% dos médicos entrevistados declararam que os planos de saúde interferem na autonomia dos profissionais para bem decidir sobre as alternativas terapêuticas aplicadas aos pacientes. Sr. Presidente, V. Exª é médico e essa pesquisa que fiz foram os médicos que me passaram. Embora tais autorizações estejam legalmente inscritas nas normas em vigor, não há como negar que se trata de um quadro grave no campo da imoralidade e do desrespeito à vida.

            Sintoma disso, na visão da AMB, é que a relação dos médicos e operadoras de planos vem se desgastando aos poucos, sobretudo em virtude das intervenções das firmas em reduzir custos, restringindo a independência dos médicos para prescrever e tratar os doentes. Com efeito, foi montada uma situação puramente comercial, que interfere brutalmente no ato médico de julgar a mais apropriada forma de curar seus pacientes.

            Por outro lado, Sr. Presidente, as operadoras alegam que, desde a resolução de novembro de 1988, o Conselho Nacional de Saúde delegou suficientes poderes para bem gerenciar os serviços de saúde, mediante o dinheiro depositado pelo conjunto de beneficiários dos planos. Mais que isso, a própria Resolução nº 211, de 2010, fixa um punhado de procedimentos antes da autorização para a cobertura obrigatória.

            A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) rejeita as críticas, sustentando que os médicos têm, sim, que prestar esclarecimentos e explicações sobre quaisquer prescrições de procedimentos e medicamentos. Essa formalidade legal pode estar, entretanto, encobrindo, segundo os médicos, outras irregularidades muito comentadas no meio hospitalar.

            Sr. Presidente, sei que o meu tempo terminou, mas, diante desses fatos, gostaria de destacar que, ainda nesta semana, Senador Lindbergh Farias, eu vi um programa de televisão nos Estados Unidos chamado Programa História Real da Humanidade. Nesse programa, uma senhora dizia o seguinte: “Meu marido estava para morrer. Primeiro, disseram que eu não tinha alguém que doasse para que houvesse o transplante, porque eu não encontrava a pessoa. Encontrei a pessoa. O cidadão faria a doação para que se realizasse o transplante. Fui defender para que houvesse a operação junto ao hospital, que era dono do plano de saúde”. Mas, simplesmente, negaram a eles o direito ao transplante.

            Ela contava na televisão - e eu assisti do início ao fim -, que perguntou àquela companhia do plano de saúde privado dos Estados Unidos: “Vocês estão negando o direito à operação do meu marido porque ele é negro?” Claro que eles disseram que não, mas negaram o plano.

            Chegando em casa, ela conta ao marido que, infelizmente, não poderia ser realizado o transplante no hospital. Ele disse: “Lamento porque vou deixar você e o Júnior”. Casualmente, Júnior é também o nome do meu filho caçula. Calculem a minha emoção ao ver o programa.

            Ela ainda relata, no programa de televisão, que em cinco dias o marido morreu e o hospital não fez o transplante, embora o doador estivesse lá, na porta do hospital.

            É esse desrespeito à vida, Srªs e Srs. Senadores, que eu trago ao debate no Senado da República. Temos de aprofundar, sim, a questão dos planos de saúde.

            Tenho aqui outros exemplos. Tenho o exemplo, Senador Lindbergh Farias, de alguém que esteve presente em um debate sobre como pressionar os planos de saúde para que atendam a demanda da população naquilo que ela tem direito. Alguém que estava lá, a mando dos planos de saúde - e nós conseguimos a gravação -, disse: “Eu estava muito preocupado porque eles poderiam, naquela reunião, obrigar a que os planos de saúde tivessem o mesmo dever universal que tem o SUS. Felizmente, não foi nada disso que aconteceu”, segundo o espião dos planos de saúde presente naquele debate sobre o tema.

            Este País, efetivamente, só atenderá a toda população como ela merece... E há aqueles que pagam duplamente: pagam o SUS, porque nós descontamos em folha, todos nós, para fortalecer o plano de saúde estatal - e defendo aqui o SUS - e pagam também plano de saúde privado. O dia em que o plano de saúde privado tiver que dar o mesmo atendimento universal que o SUS dá hoje a toda população, aí sim, com esse equilíbrio, a história será outra.

            Mas meu tempo terminou.

            Agradeço muito a tolerância de V. Exª, que, muitas vezes, já falou sobre esse tema aqui. Mas hoje tive um pouco mais de ousadia, fazendo uma crítica dura aos planos de saúde que não respeitam a vida. E repito aqui: “não” a todos aqueles que não respeitam a vida dos pacientes.

            Peço que meu pronunciamento seja publicado na íntegra.

            Era isso e obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PAULO PAIM

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            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) -Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o governador Tarso Genro do Rio Grande do Sul está como que um timoneiro à frente de um grande projeto de desenvolvimento para o nosso querido estado.

            Cumprindo o que foi dito durante a campanha eleitoral, ele, o vice-governador Beto Grill, secretários, assessores e servidores estão, como diz o dito popular “com o pé no barro” e trabalhando diuturnamente.

            O nosso governo lá no Rio Grande está alicerçado em sete pilares, que foram construídos com a participação de toda a sociedade: São eles:

             1 Desenvolvimento econômico: modernização, inovação, capilaridade territorial do desenvolvimento, através de grandes, médias e pequenas empresas. Como também o privilégio à base produtiva já instalada, com planos microrregionais essenciais.

            2 Políticas sociais: que visem a inclusão no direito à segurança, qualificação do SUS, inclusão educacional e digital, como também articulação de políticas públicas com a União e com os municípios, o estímulo às políticas sociais locais. A capilarização do micro e pequeno financiamento nos territórios de desenvolvimento microrregional.

            3 Democracia participativa: com sistema inovador de participação e controle social do Estado, transparência, participação direta presencial, virtual e através dos Conselhos.

            4 Ação Internacional: visando a União Europeia e o Mercosul, tendo o Rio Grande do Sul como centro propulsor de integração política, econômica, cultural e de participação cidadã.

            5 Cultura Política: requalificada, transitando do conflito para o debate de ideias. Valorização da esfera da política, dos partidos, da atividade parlamentar. Democracia de intensidade, com a valorização dos movimentos sociais como fonte de energia política. Antecipação dos conflitos, buscando a estabilidade e a tranquilidade para produzir.

            6 Unidade político-programática: da Unidade Popular pelo Rio Grande, com tolerância e reciprocidade, coesão no comportamento político no parlamento, a valorização dos secretários como representantes dos partidos que compõe a Unidade Popular.

            7 Transversalidade: nas ações, projetos e programas orientados pelos eixos, que estabelecerão a hierarquia dos gastos de governo, dos convênios a serem firmados com a União, com os municípios, com a iniciativa privada, assim como na contratação de cargos de confiança.

            Sr. Presidente, Tarso Genro esteve em Brasília no último dia 10, quando reuniu-se com a diretoria do Banco Mundial. Na pauta do encontro estava um empréstimo de US$ 400 milhões, cerca de R$ 670 milhões, ao Estado.

            Ao contrário do financiamento anterior, US$ 1,1 bilhão, liberado apenas para o governo estadual trocar dívidas com juros mais caros por outra com juros menores e condições mais favoráveis, a nova operação com o Bird será aplicada em investimentos.

            O nosso Governador afirma que os recursos serão empregados para desenvolver ações sociais, modernizar a gestão da máquina pública, resolver gargalos de infraestrutura e montar um sistema de controle de desastres naturais.

            Esses recursos podem, de fato, viabilizar uma série de iniciativas importantes em diversas áreas.

            Faço questão de registrar ainda que o governo petista gaúcho apresentou, entre seus primeiros projetos à frente do Poder Executivo:

            1. Uma propositura que institui a Política Estadual de Combate à Pobreza Extrema

            2. Outra que institui o Programa Casas da Solidariedade que deverá fornecer os meios de hospedagem aos usuários do Sistema Único de Saúde - SUS - que, por insuficiência de condições de serviços de saúde de seu domicílio ou em decorrência da complexidade do tratamento ou procedimento indicado, necessitem de atendimento específico em local diverso de seu domicílio.

            3. E o projeto que cria o Fundo Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Altas Habilidades - Fundo da Pessoa com Deficiência -, vinculado à Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos.

            Srªs e Srs. Senadores, informo também que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) financiará o Plano de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul, a reorganização da gestão da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), e recapitalizará a CaixaRS. Valor total de R$ 1,3 bilhão (um bilhão e trezentos milhões de reais).

            As medidas foram anunciadas pelo presidente do BNDES, Luciano Coutinho, durante almoço de trabalho no Palácio Piratini, na última sexta-feira, com o governador Tarso Genro e o secretariado gaúcho.

            Tenho absoluta certeza de que a parceria governo do RS e governo federal tem tudo para dar bons frutos por muitos anos. Por tanto, o governo Tarso Genro e a presidenta Dilma Rousseff estão de parabéns.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como segundo assunto, retorno à tribuna para uma breve reflexão sobre o estado da saúde no Brasil. No final do ano que passou falei mais detidamente sobre o Sistema Único de Saúde (SUS).

            Hoje, no entanto, pretendo discorrer a respeito do regime ético, político e econômico que orienta, na atualidade, os planos de saúde no País, salientando suas deficiências, irregularidades, distorções, abusos, inconsistências e, por que não, inoperâncias.

            Na verdade, vale esclarecer que o surgimento dos planos de saúde no Brasil e no mundo só faz sentido à medida que os estados ditos neoliberais abdicaram de seu compromisso com o bem-estar físico e mental das populações.

            Enquanto o SUS tem como finalidade precípua a garantia de acesso universal em todos os níveis de atenção, os serviços privados são financiados por meio do sistema de desembolso direto, que se traduz no pagamento direto aos prestadores privados na ocasião da utilização e pelo sistema de saúde suplementar.

            Por sua vez, o sistema de saúde suplementar é baseado na contratação privada de planos.

            Pois bem, em princípio, caberia ao SUS ocupar o espaço que hoje é destinado às prósperas máquinas de dinheiro em que se transformaram os planos de saúde.

            Para reverter os efeitos maléficos dessa herança maldita, temos que, no mínimo, controlar os abusos da saúde privada. Afinal de contas, atualmente, no Brasil, praticamente a quarta parte da população está associada a algum tipo de plano.

            E isso se explica pelo fato de que, nos dias de hoje, os brasileiros com uma condição financeira melhor estão procurando os planos de saúde e o sistema privado, em detrimento da saúde pública considerada em estado de crise aguda.

            Na perspectiva da classe média, hospitais superlotados, falta de medicamentos, greves de funcionários, aparelhos quebrados, filas para atendimento e prédios mal conservados configuram os principais problemas identificados em hospitais e postos de saúde da rede pública. Não por acaso, a população mais afetada é aquela que depende desse atendimento médico, ou seja, as pessoas mais pobres.

            Diante de tal realidade, resta ao Estado regulamentar e vigiar a atuação das firmas ligadas ao setor, de modo a evitar que a comercialização da saúde não desumanize por inteiro o já dramático processo de interação entre pacientes, médicos e hospitais.

            A impressão que se tem, pelos relatos colhidos no País todo, é de que vigora uma arbitrariedade fora dos padrões morais e normais no mercado de planos de saúde, inviabilizando uma segurança sanitária decente aos brasileiros.

            Há bem poucos dias, um médico do Rio de janeiro comentava nos jornais a que extremos da ética os profissionais da saúde chegaram no Brasil com o avanço dos planos privados.

            No caso dele, um paciente à beira da morte precisava com urgência de um medicamento muito caro para sua sobrevivência. Consultada a operadora vinculada ao paciente, essa se negou a autorizar sob o argumento de que, para a avaliação do pedido, precisaria de dois dias úteis.

            Ora, se fosse para esperar 48 horas, melhor seria procurar a funerária, desabafou o tal médico. Ao seu alcance, o máximo que pode fazer se resumiu em sugerir à família do paciente que fosse acionar o Tribunal de Justiça para pressionar a operadora.

            Na opinião dele, cada vez mais os médicos dos hospitais brasileiros se veem presos em impasses dolorosos similares, nos quais o dever da salvação de uma vida se choca com as burocracias “convenientemente” instaladas para maximizar recursos das empresas dos planos de saúde.

            Eu mesmo, Sr. Presidente, posso citar dois exemplos bem próximos a mim. Um assessor meu, que possui um plano de saúde tido como muito bom, apresentou um quadro de diverticulite e foi ao hospital. Fui visitá-lo e simplesmente há três dias ele estava no corredor do hospital, pois não havia quarto disponível.

            A mãe de uma assessora do meu Gabinete, também possui um plano de saúde bem conceituado. Ela paga o equivalente a R$ 1.500 mensais e tem o plano há mais de 20 anos.

            Pois bem, ela necessitou de internação ficando no hospital por vários dias sem diagnóstico. Ficou na enfermaria aguardando uma vaga no quarto e vaga para cirurgia.

            Vale salientar que ela tem 74 anos e também não pôde fazer-se valer das regras do Estatuto do Idoso.

            Tais relatos refletem com riqueza simbólica o quadro desenhado em todo o mapa brasileiro. Segundo levantamento divulgado há bem pouco pela Associação Médica Brasileira (AMB), nada menos do que 92% dos médicos entrevistados declararam que os planos de saúde interferem na autonomia dos profissionais para bem decidir sobre as alternativas terapêuticas aplicadas aos pacientes.

            Embora tais autorizações estejam legalmente inscritas nas normas em vigor, não há como negar que se trata de algo enquadrado no campo da imoralidade.

            Sintoma disso, na visão da AMB, é que a relação dos médicos e operadoras de planos vem se desgastando aos poucos, sobretudo em virtude das intervenções das firmas em reduzir custos, restringindo a independência dos médicos para prescrever e tratar os doentes.

            Com efeito, foi montada uma situação puramente comercial, que interfere brutalmente no ato médico de julgar a mais apropriada forma de curar seus pacientes.

            Por outro lado, Sr. Presidente, as operadoras alegam que, desde a resolução de novembro de 1988, o Conselho Nacional de Saúde delegou suficiente poderes para bem gerenciar os serviços de saúde, mediante o dinheiro depositado pelo conjunto de beneficiários dos planos. Mais que isso, a própria Resolução 211, de 2010, fixa um punhado de procedimentos antes da autorização para a cobertura obrigatória.

            A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) rejeita as críticas, sustentando que os médicos tem, sim, que prestar esclarecimentos e explicações sobre quaisquer prescrições de procedimentos e medicamentos. 

            Essa formalidade legal pode estar, entretanto, encobrindo outras irregularidades muito comentadas no meio hospitalar. Não é de hoje, por exemplo, que se alastram indícios sobre a existência de eventuais gratificações - por parte das operadoras - a médicos comedidos na requisição de exames em geral.

            Profissionais conveniados aos planos, sem vinculação hospital, alegam que são constantemente ameaçados de descredenciamento caso não sigam as recomendações das operadoras.

            Pior que isso é constatar as denúncias a respeito da ocorrência de contratos diferenciados entre os planos de saúde e os hospitais, fazendo com que determinados procedimentos sejam aceitos num estabelecimento e não em outros.

            Desse modo, direta ou indiretamente, a gestão atual das operadoras tem, sim, afetado as condições necessárias para um atendimento digno aos pacientes brasileiros.

            Todos os dias e em todos os cantos, médicos da rede hospital privada reclamam dos baixos rendimentos por consulta, resultando na sobrecarga de serviço e na queda de qualidade no atendimento.

            Infelizmente, a administração hospitalar brasileira encara o plano de saúde como seu cliente principal. Em virtude da extorsiva vinculação financeira, não hesita em executar tudo que lhe é burocraticamente determinado.

            O que parece é que os hospitais cederam, com incompreensível mansidão, ao argumento muitas vezes falso do excesso de desperdício nos procedimentos médicos. 

            Diante de tudo que foi falado aqui, creio que é urgente que o Estado brasileiro aja contra o descalabro que reina no âmbito das relações entre hospitais, médicos, pacientes e planos de saúde. Para os especialistas mais otimistas, a regulação vigente tem evoluído no sentido de consolidar os avanços realizados na área da vigilância das empresas, fortalecendo os aspectos técnico-assistenciais.

            Mas isso não tem sido suficiente, pois, ao longo desses anos, o número de beneficiários de planos de saúde cresceu significativamente, apresentando uma distinção marcante quanto ao tipo de contratação, em prejuízo gritante do paciente e do médico.

            Gostaria, Srªs e Srs. Senadores, antes de finalizar, de falar sobre o documentário “Sicko”, de Michael Moore, produzido em 2007. É um filme que critica a indústria de seguros de saúde dos Estados Unidos.

            A associação comercial Planos de Seguro de Saúde dos Estados Unidos (AHIP, na sigla em inglês), principal grupo de pressão das empresas do setor, teve um enviado secreto na estréia mundial de “Sicko” no Festival de Cannes, na França. O agente saiu rapidamente da estréia e foi participar de uma teleconferência com executivos da indústria, entre eles, Wendel Potter que disse:

            “Tínhamos muito medo e nos demos conta de que teríamos que desenvolver uma campanha mais sofisticada e cara para conseguir rechaçar a idéia da cobertura de saúde universal. Temíamos que isso realmente despertasse a opinião pública. Nossas pesquisas nos diziam que a maioria das pessoas estava a favor de uma intervenção maior do governo no sistema de saúde.”

            Sr. Presidente, assistindo outro dia o Programa História Real da Humanidade, vi a luta de uma mulher branca casada com um homem negro. Eles tinham um filho: o Júnior. Casualmente o mesmo nome do meu filho. Calculem a minha emoção.

            No programa ela lutava para salvar o marido acometido de uma doença grave que necessitava de um transplante. A operação sairia por um valor considerável. A mulher foi ao hospital em que trabalhava e onde seria decidida se a operação seria realizada ou não. Ela mesma fez a defesa perante o conselho que determinaria a realização da operação.

            O resultado foi que o Plano de Saúde não iria pagar as custas. Ela chorou e apelou mediante a posição inflexível do Plano de Saúde. E fez a seguinte pergunta:

            Esta posição inflexível de vocês é por que o meu marido é negro? Eles responderam que não. Mas para a mulher desesperada a impressão que chegou foi esta.

            O marido disse : o que mais sinto é que vou deixar você e o Júnior. Ela respondeu: Não vamos jogar a toalha. Não desista, mas infelizmente, em cinco dias ele morreu.

            É lamentável a gente ver que eles não entendem que a vida não tem preço.

            Quantas situações como esta acontecem no Mundo? Quantos morrem, milhares, milhões?

            Como vemos essas falas revelam o medo que as empresas de planos de saúde tem, de perder o poder instaurado.

            Agora, concluindo, vale questionar se a solução do problema no Brasil não estaria no fortalecimento do SUS em todas as suas categorias.

            A arrogância dos planos de saúde se sustenta na fragilidade do Poder Público em atender as necessidades sanitárias gerais dos brasileiros.

            Enquanto isso não acontece, devemos, sim, buscar aperfeiçoamentos urgentes no processo de regularização, vigilância, controle e punição do setor privado de financiamento de saúde no Brasil.

            Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/02/2011 - Página 4007