Discurso durante a 14ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com os abusos cometidos por delegados da Polícia Civil de São Paulo contra uma escrivã, conforme imagens que circularam durante o final de semana, na internet e nos telejornais.

Autor
Marta Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO ESTADUAL.:
  • Indignação com os abusos cometidos por delegados da Polícia Civil de São Paulo contra uma escrivã, conforme imagens que circularam durante o final de semana, na internet e nos telejornais.
Publicação
Publicação no DSF de 23/02/2011 - Página 4602
Assunto
Outros > ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • CRITICA, IMPRUDENCIA, ABUSO, AUTORIDADE POLICIAL, DELEGADO DE POLICIA, RELAÇÃO, AGRESSÃO, ESCRIVÃO DE POLICIA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, CRIAÇÃO, ELABORAÇÃO, LEGISLAÇÃO, OBJETIVO, REDUÇÃO, VIOLENCIA, RELAÇÃO, MULHER.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Boa tarde, Presidente João Pedro, Senadoras e Senadores, subo hoje à tribuna para manifestar minha indignação em relação às imagens que circularam durante o final de semana, na Internet e nos telejornais do País, mostrando o abuso cometido por delegados da Polícia Civil de São Paulo contra uma escrivã. As imagens, para quem pôde ver, não deixaram dúvidas da truculência e do abuso da autoridade policial. A escrivã, acusada de receber propina, foi revistada por policiais homens, que lhe tiraram as peças íntimas alegando que precisavam confirmar a prova incontestável do delito.

Eu não defendo aqui que o suposto crime não tivesse sido apurado. Defendo tão somente aquilo que a própria investigada solicitou: que a revista tivesse sido feita por policiais mulheres, como está garantido em lei, no art. 249 do Código de Processo Penal Brasileiro, que diz que “a busca em mulher será feita por outra mulher, se não importar em retardamento ou prejuízo da diligência”, o que não era o caso, uma vez que a autoridade policial feminina se encontrava na sala onde a escrivã foi despida e, portanto, a busca não seria retardada.

            O caso, ocorrido em 2009, na 25ª DP, no bairro de Parelheiros, na zona sul da capital de São Paulo, só veio a público nesse final de semana, quando também foi noticiado que o inquérito policial instaurado por abuso de autoridade pelo Ministério Público tinha sido arquivado pela Corregedoria do Estado. Esse fato me causou estranheza, causa-me estranheza, uma vez que as imagens não mentem. Foi um horror ver aquilo na televisão, já que a Corregedora, uma mulher, está perfeitamente ciente da implicação da lei no caso de revista feminina.

            Quero fazer aqui, no plenário desta Casa Legislativa, uma reflexão sobre esse fato, com base no que acredito deve acontecer em várias delegacias, cadeias e presídios do País, quando não ocorre em capitais, como Manaus. O que me choca sobremaneira é que não tenhamos, por parte dos governos estaduais, um preparo de policiais civis e militares para uma situação como essa.

            Nós temos de fazer um grande debate nacional no sentido de chamar para a discussão o Ministério da Justiça, a Secretaria de Direitos Humanos, os representantes das Secretarias de Segurança Pública dos Estados para a criação de um pacto de não violência às mulheres em delegacias, cadeias e presídios brasileiros. Sei que a Ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, já se manifestou sobre o ocorrido e condenou a agressão cometida pelos policiais. Uma nota foi encaminhada à Polícia e ao Governo de São Paulo, pedindo punição exemplar aos envolvidos. Também tenho notícias de que, mesmo com o caso encerrado pela Corregedoria e pelo Judiciário, o Governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, mandou investigar as imagens, fato que fez a Secretaria de Segurança Pública do Estado decidir afastar da Corregedoria da Polícia Civil os Delegados Eduardo Henrique de Carvalho Filho e Gustavo Henrique Gonçalves, que cometeram esse abuso.

            Apesar de o Governador e de a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo tomarem providências, o abuso de autoridade policial se faz crescente no meu Estado. Na semana passada, vários estudantes foram espancados, e um deles foi covardemente espancado, quebrado, por cerca de 20 policiais durante um protesto em frente à Prefeitura de São Paulo. Mesmo sangrando visivelmente, o estudante foi imobilizado, sufocado e espancado por vários membros da Polícia Militar e da Guarda Municipal. Os Vereadores José Américo e Antonio Donato, do meu partido, que tentaram dialogar com os policiais, também foram agredidos por membros da PM.

            Que autoridade policial é essa que, em vez de garantir que a lei seja cumprida, como no caso da escrivã, e de proteger seus cidadãos, como no caso do estudante espancado, age de forma autoritária e truculenta? É necessário mais do que medidas paliativas por parte de governos estaduais e municipais. Faz-se necessário medidas preventivas, preparo técnico e psicológico desses agentes de segurança que lidam todos os dias com situações extremas. Não é aceitável punir um delito com abuso de autoridade, descumprindo-se o que diz a lei. Não é aceitável preservar a ordem pública com desordem e violência contra os cidadãos.

            Quero abordar, ainda hoje, uma pesquisa - que foi comentada há aproximadamente uma hora pela Senadora Gleisi Hoffmann -, realizada pela Fundação Perseu Abramo em parceria com o Sesc, que afirma que, a cada dois minutos, cinco mulheres são espancadas no País. Essa pesquisa foi divulgada segunda-feira, pelo jornal O Estado de São Paulo. O estudo aponta que 1,3 milhão de mulheres foram agredidas no Brasil até a metade do ano passado.

            Parece que estamos vivendo uma situação de uma violência muito grande no País. É a polícia que espanca, é um prefeito que falta ao respeito a uma cidadã mulher e pobre, é a pesquisa que mostra o nível de espancamento de mulheres que ainda existe neste nosso Brasil.

            Leio aqui o que diz o Professor da USP Gustavo Venturi, que supervisionou o estudo: “Os dados mostram que a violência contra a mulher não é um problema privado, de casal. É social e exige políticas públicas”. Para o professor, a pequena diminuição do número de mulheres agredidas entre 2001 e 2010 -pequena diminuição, quer dizer, caiu o número um pouquinho - pode ser atribuída à Lei Maria da Penha, que agora uns falam, como comentou a Senadora Gleisi Hoffmann, que pode ser flexibilizada, o que não aceitamos. A lei é muito clara. Ela mostra a expressão da crescente consciência do problema da violência contra as mulheres.

            Agora, de acordo com o estudo, entre os pesquisados, 85% conhecem a lei, e 80% aprovam a lei. Mesmo entre os 11% que a criticam, a principal ressalva é ao fato de que a lei é insuficiente.

            Por tudo o que abordei na tarde de hoje e pela necessidade de estender a todas e a todos a justiça e a equidade de tratamento, reafirmo nossa responsabilidade, como legisladores e legisladoras que somos, para garantir:

            - primeiro, que abusos gerados por autoridades policiais não mais aconteçam em meu Estado e em todo o País;

            - segundo, que executemos um pacto de não violência às mulheres em delegacias, cadeias e presídios brasileiros;

            - e, terceiro, que ajudemos a formulação de políticas públicas que diminuam as agressões contra as mulheres e fortaleçam o cumprimento da Lei Maria da Penha.

            Era isso, Sr. Presidente. Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/02/2011 - Página 4602